Blog de palavreando_27591

Eu já escuto os teus sinais

sábado, 17 de dezembro de 2022
Foto de capa
(Foto: Pexels)

Não vem de tão longe e se achega cada vez mais perto. Vem como fantasia de porta-bandeira, cheia de plumas multicoloridas, paetês brilhosos de sol e lua, com flâmula e tudo. Se despido, segue vibrante e concreto, bailando como se voasse pela avenida dos tempos que não envelhecem. 

Não há como voltar atrás. Até os mais incrédulos já enxergam. O que vem é repleto de poesia sábia que só os apaixonados podem declamar. Seus versos são de canção nova experimentada em tantas outras que entregam esperança encarnada na alma.

Não vem de tão longe e se achega cada vez mais perto. Vem como fantasia de porta-bandeira, cheia de plumas multicoloridas, paetês brilhosos de sol e lua, com flâmula e tudo. Se despido, segue vibrante e concreto, bailando como se voasse pela avenida dos tempos que não envelhecem. 

Não há como voltar atrás. Até os mais incrédulos já enxergam. O que vem é repleto de poesia sábia que só os apaixonados podem declamar. Seus versos são de canção nova experimentada em tantas outras que entregam esperança encarnada na alma.

Adeus, estações sombrias! Adeus, cara fechada tomada por ódio. Adeus a esse rancor amargurado que traveste hipocrisia. O amor venceu e seu pódio convoca a diversidade de ser feliz. Se nós somos tantos e tão diferentes, realcemos o respeito ao que nos une: liberdade! De ser quem se é e de ser quem quiser, mesmo sem saber quem se pode tornar a ser. Porque uma vida é pouca para o tanto que podemos ser e experimentar.

O que mata e corrói não é liberdade, mas caça aos livres. A inveja aprisiona. A maldade apequena. A arrogância envenena e, pouco a pouco, mata a si próprio. Deixe o julgamento para os juízes, mas voe como os astronautas, os paraquedistas, as crianças que pulam de sofá em sofá como super-heróis que são. 

Cada vez mais perto está. Eu sei. De espantar os pessimistas e ressabiar os falsos moralistas. É de pulsão essa satisfação em saber que esse sopro se achega cada vez mais forte e traz consigo novos dias de memórias boas. Filho da esperança quer ser pai de bonança. Abre os braços para a paz e abraça forte o amor que finca raízes no quintal.

Há jardins por florescer nos paralelepípedos das ruas e entre as flores, sementes de doces começam a perfumar de infância toda vizinhança. Os meus vizinhos da África, da Austrália e de toda a Europa haverão de celebrar como se faz nas primaveras. 

O brilho no olhar de volta, a confiança retomada para não ter mais que precisar de coragem para ser feliz. Se faz feliz – vai! Simplesmente, vai. Depois de tanto, tal aprendizado está por se estabelecer nas enciclopédias, nas filosofias, nos ditados populares, nas salas de terapia, no cotidiano das cidades, nos livros de pouca ajuda, de autoajuda, nos gibis que ensinam muito mais. 

A felicidade já está por vir puramente por se caminhar por ela, até ela. Será sonho? O sonho é o que move tudo. Sonhos são de uma potência acima dos desejos e das ambições ao ponto que ambos — ambição e desejo — são apenas subprodutos dos sonhos.

Não vem de tão longe e se achega cada vez mais perto. Talvez já tenha vindo em outros momentos. Se está voltando ou não, eu não sei. Mas sei que está muito perto, cada vez mais próximo. Tem frescor. Tem sabores tantos que ultrapassam o que o paladar pode determinar como conhecido. É repleto de plenitude como se no peito se pudessem carregar estrelas destinadas ao firmamento. 

Ninguém pode deter o que está para acontecer. Fé na vida, nas horas dos dias. Fé no outro e na própria ingenuidade. É intenso esse sentimento que vem e se achega cada vez mais perto. Sensivelmente empático e espontaneamente otimista. A janela é maior do que nós para dar vista a um mundo incrivelmente fabuloso. 

Você vem ver? Pois, eu já escuto os teus sinais.

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A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Sou como vela

sábado, 10 de dezembro de 2022
Foto de capa
(Foto: Pexels)

Acendo vela para meu anjo da guarda. Peço que me proteja, inclusive de mim mesmo. Que a luz, mais do que ilumine meu caminho, seja guia para esse encontro não só quando preciso. Peço diante da vela que eu possa ver o que não vejo, sentir o que preciso sentir, esteja atento aos pedidos do mundo e se for minha missão que eu possa cumpri-los. Rogo que a vaidade não me entorpeça e vigilante possa sequer flertar com a arrogância, sabedor de que a arrogância é o acúmulo da vaidade despercebida. 

Acendo vela para meu anjo da guarda. Peço que me proteja, inclusive de mim mesmo. Que a luz, mais do que ilumine meu caminho, seja guia para esse encontro não só quando preciso. Peço diante da vela que eu possa ver o que não vejo, sentir o que preciso sentir, esteja atento aos pedidos do mundo e se for minha missão que eu possa cumpri-los. Rogo que a vaidade não me entorpeça e vigilante possa sequer flertar com a arrogância, sabedor de que a arrogância é o acúmulo da vaidade despercebida. 

Acendo vela para relembrar os que amei e sigo a amar, mesmo não estando eles mais aqui nesse espaço-tempo. A luz da vela conecta com a espiritualidade de quem enquanto carne reconhece que tem alma. É a tal luz que relembra momentos que me fizeram ser quem eu sou e me trouxeram até aqui. Pudera ter as mãos que me carregaram até ontem, pudera ter essa presença física, não só... Ilumina o reencontro em outras esferas, ilumina as memórias que me fazem um ser repleto de saudades. Saudades boas mais do que doídas, ainda que vez em quando doam.     

Acendo vela na mesa de jantar para recobrar a gratidão em ter o alimento. Trazer para perto essa força celestial que me faz humano. Iluminar a graça de compartilhar com os que se sentam à mesma mesa e pedir que tantos outros possam ter tanto quanto tenho.  

Acendo vela para ilustrar o romance ou o desejo dele. Nem sempre será namoro, casamento, amor, mas a simples luz de vela mostra a intenção de querer mais do que apenas um encontro, a vontade de estender para muitas outras luzes de vela no mesmo rosto. Marcar a silhueta das faces encontrados e em sua sombra feita por luz ser cumplicidade, intimidade maior do que luz artificial de abajur. Beijar diante da música que não se quer findar, do silêncio que nem trovão pode quebrar.

Na fé de prosseguir para além de nós mesmos, na força da fé de encontrar o que deixamos, o que perdemos por ganhar, o que honramos e devemos honrar, o que precisamos para seguir pelos dias. Nos apelos ao sobrenatural e na compreensão da existência para além do que conhecemos, acendemos velas para ver além do que nossos olhos podem enxergar. Há tantos mistérios no viver que viver é transcender. 

E, nós, cada um de nós, somos como velas. Muitas vezes precisamos ser acesos para iluminar ou a alegria do que nos ilumina é tanta que acendemos por fluxo natural. Contagiados, acabamos por acender outro e mais outro e, de repente, se tem uma plateia inteira de velas acesas que brilham mais do que o sol. O sorriso é fósforo que causa fagulhas e o amor é a combustão mais do que perfeita para se manter aceso.

Mas como todas as velas também, por vezes, somos apagados com um simples tocar de dedos. São as circunstâncias impostas, os medos infligidos, a coragem sabotada, as rasteiras coletivas da histeria cotidiana do rancor e do ódio. A inveja que mina nossos talentos e a própria intenção de persistir. Gente que nos sopra sorrateiramente ou ventos imprevistos que tentam abalar a nossa fé no outro e no mundo. Há vezes que nos derretem ao ponto de sermos apenas parafina grudada à superfície e sem pavio não encontramos saídas para acender de novo.

Mas vela se refaz e mesmo derretida pode ser vela de novo. Talvez, seja parte do viver se refazer e ter constância nesses feitos e desfeitos. Mais do que insistir é compreender que nem sempre é necessário ser teimoso. É preciso se deixar queimar até perto do fim para se fazer vela em novo molde, para acender de novo e ascender na convicção de que a felicidade é o objetivo maior. 

Não importa se vela branca, amarela ou vermelha. Com cheiro de alecrim, rosas ou lavanda. Somos tantos que não cabe julgamento ou comparação. Somos tão únicos e renascemos de maneiras tão únicas que tantas vezes já somos outro, mas nunca igual a nada que já se viu.

Assim, acendo vela para meu anjo da guarda, para os amores que tive e terei, pela gratidão de poder existir. Acendo vela para o que sou, fui e quero ser ao ponto que sou como vela que se junta a outras velas para quem sabe, iluminar o mundo.

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Estrelas cadentes

sábado, 03 de dezembro de 2022

Estrelas cadentes são meteoritos que entram na atmosfera terrestre e com a pressão do ar queimam na escuridão da imensidão — dizem os homens da ciência. Os seres da poesia dirão que são estrelas — como as que apreciamos no grande teto sobre nós — que findam e explodem como fogos de artifício.

De forma bela, encerram sua viagem pelo espaço e desabrocham em luz antes de se chocarem com o fim. Ao invés de despencarem até arrebentarem em solo, se desfazem luminosas, riscando o firmamento de claridade. 

Estrelas cadentes são meteoritos que entram na atmosfera terrestre e com a pressão do ar queimam na escuridão da imensidão — dizem os homens da ciência. Os seres da poesia dirão que são estrelas — como as que apreciamos no grande teto sobre nós — que findam e explodem como fogos de artifício.

De forma bela, encerram sua viagem pelo espaço e desabrocham em luz antes de se chocarem com o fim. Ao invés de despencarem até arrebentarem em solo, se desfazem luminosas, riscando o firmamento de claridade. 

Os ingênuos — somente os ingênuos sonham sorrindo — farão pedidos, e, de uma maneira ou de outra serão atendidos. É assim há muitos anos. Vêm da nossa ancestralidade de esperançosos. Foram os esperançosos que nos trouxeram até aqui. Serão os esperançosos que nos farão caminhar e resistir ao sempre presente mal.

Somos como estrelas cadentes. Nossa viagem é ligeira. Passamos por planetas, astros maiores e menores, nebulosas, circundamos buracos negros. Por alguns satélites, até nos orientamos e nos encantamos por determinados cometas. Fazemos rastro de luz enquanto somos procura que se guia pela luz do Sol. 

Deciframos o desconhecido, mesmo sem ter exatidão do que se descobre ao descobrir, quando se descobre. Montamos em espaçonaves que nos levam de acordo com o combustível que a abastecemos. Pode ser de carência. Pode ser de euforia. Pode ser de otimismo ou de agudo pessimismo. Pode ser de paixão. Pode ser de fantasia. Pudera ser a sorte o único combustível possível. A determinação nem sempre determina glória. 

Mas essas aeronaves que pilotamos se alimentam de tudo e nos concedem certa liberdade em darmos a elas o que fabricamos. Aterrissamos em terrenos nem sempre planos. Às vezes, até mergulhamos em águas profundas sob-risco de se afogar. 

Mas, conscientes, navegamos na fina camada que nos garante ficar entre céu e mar. É suspeita quase certeira: há água em outros planetas para além da Terra. A ciência dirá que, com o tempo, nos desintegraremos como as estrelas cadentes. 

Os astrônomos têm razão. Mas os poetas acrescentarão que até lá haverá muita dor, alegria, encontros, ardores, expectativas e até desejos de eternidade. Entre dramas insanos e outros travestidos de sanidade, nossas histórias se desenharão sem rota totalmente planejada, sem garantias de que os destinos aplicados no GPS dos dias serão cumpridos, de que as viagens desempenharão com exatidão os minutos mostrados em tela.

Já sabemos e até nomeamos a distante HD1, a suposta galáxia mais distante de nós, a 13,5 bilhões de anos-luz. Conhecemos tão pouco sobre ela, tanto quanto conhecemos tão pouco sobre Earendel, a chamada “estrela da manhã” que demorou 12,9 bilhões de anos-luz para chegar ao nosso planeta. O que sabemos de Farfarout, Plutão, Saturno, Mercúrio ou da nossa Lua? E todos esses estão na mesma galáxia que nós! O que conhecemos da nossa própria morada?

Certeza é que há um ciclo: nascer, crescer, envelhecer, morrer. Ainda que para uns se envelheça menos por morrer cedo demais. Estrelas cadentes talvez tenham sede de vida. Uma sede repleta de agonia. Não porque sabem que vão morrer em explosão. Mas pela urgência de que estão próximas do fim quando cruzam a atmosfera terrestre.

O fim sempre está mais próximo a partir do nascimento. Essa sede pode ser menos angustiante se viver for viajar em plenitude mais do que explodir em luz.

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Nossa canção

sábado, 26 de novembro de 2022

Música é poesia traduzida em sons. Embalam histórias, enfeitam romances, conduzem conquistas, atenuam ou exageram dramas. Inspiram e se inspiram na vida. Acalmam a alma. Aquietam dores, mas também as fazem gritar, sair, encontrar seu próprio eco, para quem sabe escapulir ou mergulhar. Para se salvar. A mesma cólera que liberta, aprisiona. O que é se salvar? 

Música é poesia traduzida em sons. Embalam histórias, enfeitam romances, conduzem conquistas, atenuam ou exageram dramas. Inspiram e se inspiram na vida. Acalmam a alma. Aquietam dores, mas também as fazem gritar, sair, encontrar seu próprio eco, para quem sabe escapulir ou mergulhar. Para se salvar. A mesma cólera que liberta, aprisiona. O que é se salvar? 

Há canções que nos encorajam no medo e tantas outras que nos atravessam para se atrever e ir. Simplesmente ir. “Caminhando e cantando e seguindo a canção” mesmo que “na corda bamba sem sombrinha”. Pudera ir apenas “atrás do trio elétrico” desejando “que essa fantasia fosse eterna… e viver será só festejar”. Na sobriedade de sonhador “deixa a festa acabar, deixa o barco correr, deixa o dia raiar”. “Quando o segundo sol chegar”, quem sabe, saberemos de verdade a “cantar, e cantar, e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz”. 

O compositor é um poeta com talento para ouvir. Sua obra — palavras que se juntam em melodias, frases que se fazem em métricas, literatura matemática que forma em cifras. Um ser especial que sabe falar com Deus, seja Deus quem for. Que sabe falar sobre amor sem ter a audácia de entender o amor. Que gosta de gente, nem sempre obrigado a gostar do que a vida dá, mas sempre ciente de que caminho é para se caminhar. 

Quem desenha música é um esperançoso tenaz. Um inventor de velhas coisas novas, ainda que sabedor de que quase tudo já foi criado, segue a confeccionar inéditas canções. Não suspende seus acordes, pois tem “à arte de sorrir cada vez que o mundo diz não”.  Se “o mundo é um moinho”, o autor de canções diz que “numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo” e crava que “nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá”. Sim, para o artista das letras sempre chega algo “na bruma leva das paixões que vêm de dentro”. O sobrenatural. “Se eu sou algo tão incompreensível, meu Deus é mais”.

O cantor é alma exposta. A voz que conecta palco e plateia, Terra e Universo. O coração que se soma a outros instrumentos que fazem seu corpo ser inteiro. Junta meios, corre estradas, sonha em ser estrela que é vista mesmo em noites claras. Ou tão somente canta na varanda, nos pequenos bares, no cenário particular do chuveiro, no pequeno mundo de um quarto de segredos dedilhados em um violão. 

Cantar é um dom, mas cantar mesmo sem saber cantar é uma forma de ser, viver, se libertar. Cantar não é apenas espantar seus males, mas é fazer chamado: “Deus me proteja de mim e da maldade de gente boa”, porque “se ano passado eu morri, esse ano eu não morro”. Não há pecado em querer “a sorte de um amor tranquilo com sabor de fruta mordida” ou “um amor maior, um amor maior que eu”. Aliás, se “não existe amor em SP” e se “não precisa morrer pra ver Deus”, também “não existe pecado do lado de baixo do Equador”.  

Música é pluralismo. Para quem compõe, para quem canta, para quem ouve. E uma mesma canção tem sentidos múltiplos para sentimentos diversos. Ouvir música é se ouvir também, é escutar o seu momento, cada instante tão exclusivo em cada singular tempo que se tem. “o que foi prometido ninguém prometeu, nem foi tempo perdido, somos tão jovens”. Será? Respeitar mais do que entender. Por isso “chorar, sorrir também, e depois dançar na chuva quando a chuva vem”.

“Quem não gosta de samba, bom sujeito não é”. Quem não gosta de música não gosta de viver e não admira tudo o que a vida é. Paralelas mais do que linha reta. “É preciso saber viver”. Assim, encaixamos trilhas sonoras e trilhas nos visitam, mesmo sem convite. 

Nossas biografias são recheadas de sons, porque “a vida tem sons que pra gente ouvir, precisa aprender a começar de novo”. Cantamos novas músicas e tantas outras que sabemos de cor. Podemos ouvir, cantar, compor a mesma canção de formas diferentes, ainda que na mesma vitrola, mesmo que para os mesmos rostos, no mesmo violão. “Ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”. 

Se “Certas canções que ouço cabem tão dentro de mim”, “a sorrir eu pretendo levar a vida”. Ainda que “um nasce pra sofrer, enquanto o outro ri”, “vou sair pra ver o céu, vou me perder entre as estrelas”. De onde nasce o Sol, mesmo vendo que “enquanto todo mundo espera a cura do mal e a loucura finge que isso tudo é normal” não vou mais fingir ter paciência. 

Posto que há de se cantar — todos — ao sentir a “nossa canção” que “consideramos justa toda forma de amor”.

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O samba

sábado, 19 de novembro de 2022

Obra de arte que o negro esculpiu, ritmo oficial da marca Brasil, tem seu berço na casa de Ciata. Dos batuques vindos da África, do ritmo marcado pelos corpos escravizados, mas revolucionários em manter suas tradições, ritos, espiritualidades – identidade. 

Obra de arte que o negro esculpiu, ritmo oficial da marca Brasil, tem seu berço na casa de Ciata. Dos batuques vindos da África, do ritmo marcado pelos corpos escravizados, mas revolucionários em manter suas tradições, ritos, espiritualidades – identidade. 

O samba liberta. Das senzalas, da proibição a marginalização. Resistência de um povo ainda em construção. O samba clama nas rodas pela tal liberdade que ainda não veio e nas avenidas de tantos carnavais segue a cantar por reparação histórica, contra o preconceito, abaixo a discriminação. E o preto repete seu direito: escravizada a minha cor, mas minha alma jamais.

Será difícil entender que o sangue é vermelho para todas as cores? Sambamos na mesma roda e carregamos a mesma ancestralidade. Mas a crueldade da história, de muitos que vieram antes de nós, exige desagravo contínuo até se atingir igualdade. 

O samba segue a lamentar, segue a panfletar, segue a enfrentar e chamar para repetirmos versos em novos e velhos refrões: nos amarmos mais, nos cuidarmos mais uns dos outros... Desaprender o racismo estrutural, sem esquecer o passado para evitar repeti-lo. Convocar a história para compreender a âncora que não nos deixa seguir para futuros mais bonitos. 

Dos tambores de além-mar, dos atabaques da terra dos Baobás, cavaco, viola, até palmas das mãos. Pano branco estendido na mesa, no meio das praças, becos, vielas, fundos de quintal. Vozes e instrumentos que entoam consagração ao amor, à vida, à saudade, ao que é mortal e imortal. Em cada canto, relembrar os “Papagaios” que existem em cada cidade e se perpetuam em “Filhas de Bamba”. 

Nas quadras, se emocionar com os baluartes — hoje Velha Guarda — protagonistas de tantos desfiles e enredos. Das Tias “Celices”, Terezas, das donas “Glórias”, das baianas pretas da Unidos da Saudade e de todas as escolas de samba de todos os lugares.          

Toque do atabaque, que no axé dos orixás, faz quem vem de longe voltar cá. Reverencia Oxossi, Xangô, Yansã. No Império das Negas, rainha é Iemanjá. Tolerância religiosa é pouco. Fé não é algo apenas a se tolerar. É para respeitar! O Brasil é mais africano do que laico, mas à disputa de poder, a narrativa branca europeia esquece as raízes pretas e indígenas desse país de samba, carnaval e terreiros de matriz africana.     

Samba entoado pelas torcidas nos estádios para celebrar “negros maravilhosos” com seus dribles, gols e maestrias que orgulham nossos times. Relembrar os Camisas Negras, que no país das desigualdades, enfrentaram as regras de preconceito e abriram alas para Pelé, Everaldo. Para Natal, Cabrita, Paulo Banana.

Faz um samba aí, daqueles dos bons. Para tocar na roda que se faz todos os domingos no Córrego Dantas. Para sambar às segundas no icônico Samba do Trabalhador do Renascença. Para apresentar à Leci nas esquinas de Sampa. Para voltar à Bahia, onde tudo começou. Para embalar o ensaio da Portela, desfilar na Vilage ou no Imperador. Para tocar com garfo no copo americano no Bar do Bizu, ou se embriagar no América a performance dos Desafetos do Colírio. Chama o Gibi para o churrasco e faz mais um samba lá. Para Kaisso brincar na Grande Rio, campeã com Exu. Faz um samba aí, porque o samba é preto, é branco, é humano, raiz dos sonhos de quem ainda acredita que da “unidade vai nascer a novidade”. Axé.

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O samba

sábado, 19 de novembro de 2022
Foto de capa
(Foto: Freepik)

Obra de arte que o negro esculpiu, ritmo oficial da marca Brasil, tem seu berço na casa de Ciata. Dos batuques vindos da África, do ritmo marcado pelos corpos escravizados, mas revolucionários em manter suas tradições, ritos, espiritualidades – identidade. 

Obra de arte que o negro esculpiu, ritmo oficial da marca Brasil, tem seu berço na casa de Ciata. Dos batuques vindos da África, do ritmo marcado pelos corpos escravizados, mas revolucionários em manter suas tradições, ritos, espiritualidades – identidade. 

O samba liberta. Das senzalas, da proibição a marginalização. Resistência de um povo ainda em construção. O samba clama nas rodas pela tal liberdade que ainda não veio e nas avenidas de tantos carnavais segue a cantar por reparação histórica, contra o preconceito, abaixo a discriminação. E o preto repete seu direito: escravizada a minha cor, mas minha alma jamais.

Será difícil entender que o sangue é vermelho para todas as cores? Sambamos na mesma roda e carregamos a mesma ancestralidade. Mas a crueldade da história, de muitos que vieram antes de nós, exige desagravo contínuo até se atingir igualdade. 

O samba segue a lamentar, segue a panfletar, segue a enfrentar e chamar para repetirmos versos em novos e velhos refrões: nos amarmos mais, nos cuidarmos mais uns dos outros... Desaprender o racismo estrutural, sem esquecer o passado para evitar repeti-lo. Convocar a história para compreender a âncora que não nos deixa seguir para futuros mais bonitos. 

Dos tambores de além-mar, dos atabaques da terra dos Baobás, cavaco, viola, até palmas das mãos. Pano branco estendido na mesa, no meio das praças, becos, vielas, fundos de quintal. Vozes e instrumentos que entoam consagração ao amor, à vida, à saudade, ao que é mortal e imortal. Em cada canto, relembrar os “Papagaios” que existem em cada cidade e se perpetuam em “Filhas de Bamba”. 

Nas quadras, se emocionar com os baluartes — hoje Velha Guarda — protagonistas de tantos desfiles e enredos. Das Tias “Celices”, Terezas, das donas “Glórias”, das baianas pretas da Unidos da Saudade e de todas as escolas de samba de todos os lugares.          

Toque do atabaque, que no axé dos orixás, faz quem vem de longe voltar cá. Reverencia Oxossi, Xangô, Yansã. No Império das Negas, rainha é Iemanjá. Tolerância religiosa é pouco. Fé não é algo apenas a se tolerar. É para respeitar! O Brasil é mais africano do que laico, mas à disputa de poder, a narrativa branca europeia esquece as raízes pretas e indígenas desse país de samba, carnaval e terreiros de matriz africana.     

Samba entoado pelas torcidas nos estádios para celebrar “negros maravilhosos” com seus dribles, gols e maestrias que orgulham nossos times. Relembrar os Camisas Negras, que no país das desigualdades, enfrentaram as regras de preconceito e abriram alas para Pelé, Everaldo. Para Natal, Cabrita, Paulo Banana.

Faz um samba aí, daqueles dos bons. Para tocar na roda que se faz todos os domingos no Córrego Dantas. Para sambar às segundas no icônico Samba do Trabalhador do Renascença. Para apresentar à Leci nas esquinas de Sampa. Para voltar à Bahia, onde tudo começou. Para embalar o ensaio da Portela, desfilar na Vilage ou no Imperador. Para tocar com garfo no copo americano no Bar do Bizu, ou se embriagar no América a performance dos Desafetos do Colírio. Chama o Gibi para o churrasco e faz mais um samba lá. Para Kaisso brincar na Grande Rio, campeã com Exu. Faz um samba aí, porque o samba é preto, é branco, é humano, raiz dos sonhos de quem ainda acredita que da “unidade vai nascer a novidade”. Axé.

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Viciado em viver

sábado, 02 de julho de 2022
Foto de capa
(Foto: Freepik)

Eu sou vulnerabilidade e a admissibilidade de ser vulnerável. Sou a esquina, a paixão intrometida, o beijo de carnaval na dança da festa junina. Eu sou o vinho que não vinagra. Sou os verões que passam e as primaveras que fincam, raízes no varal dos dias de chuva, raízes no quintal das noites de sol. 

Eu sou vulnerabilidade e a admissibilidade de ser vulnerável. Sou a esquina, a paixão intrometida, o beijo de carnaval na dança da festa junina. Eu sou o vinho que não vinagra. Sou os verões que passam e as primaveras que fincam, raízes no varal dos dias de chuva, raízes no quintal das noites de sol. 

Eu sou tudo que quero ser e também tudo que não posso. Pois ao não ser, também sou. Eu sou essa ânsia em viver querendo adiar ao máximo a morte. Não que eu seja inimigo do fim. Mas não gosto de ir embora, pelo menos enquanto admiro ficar. Sem ser avesso às mudanças, gosto de fazer morada na felicidade. 

Foi em uma roda de samba de segunda-feira que me disseram: “você é viciado em viver”. Nada talvez me defina melhor. Que meu vício não me abandone. Que eu siga a determinar a forma que meu vício me define. 

Viciado em viver, à minha maneira, e, totalmente aberto a descobrir novas formas de chorar e sorrir. A vida é meu ópio, é o que me mantém sóbrio sem ter pés no chão. 

Viver é mais do que respirar ou contar tempo a partir da certidão de nascimento. Viver é mais do que andar com passos firmes. Viver é, às vezes, se ver caminhar vacilante. Se a vida pede coragem, é porque admitimos ter medo. E teríamos medo se tivéssemos consciência do que é romper o ventre. Temos medo pela consciência do quanto é irrefreável a loucura que é se entregar as paixões que nos mobilizam. Se os afetos nos guiam, a arte dos nossos encontros — percebidos e não percebidos — afeta o mundo. 

Viver pede propósito, mas é muito mais achar o que não se procura. Enxergar o imprevisível, o invisível, o difícil de se notar. As surpresas que nos visitam — agradáveis e desagradáveis — é que causam os tais impactos que não permitem que sejamos roteiro pronto. 

Eu sou filme inacabado. Talvez eu, como você e todos, possamos ser medidos pela régua da vaidade. E o tamanho da vaidade é determinante para o nosso lugar na ínfima linha entre a arrogância e a submissão. Ambas são perigosas e é danoso não estar atento. 

Eu sou a vigilância desapegada de julgamento. Eu sou a fibra que vibra ondas entre as cordas do violão. Eu sou a voz que tenta aprender a também falar os dialetos do silêncio. Eu sou a vida que escapole, porque não me economizo. Viciado em viver — vivo — em exagero, em emoções que me movem. Se me acusam de não levantar bandeiras, respondo: eu sou a bandeira. 

Eu sou vendaval em tempos nublados. Eu sou tempestade nas fortalezas dos corações vazios pesados. Eu sou múltiplas extensões que iluminam o horizonte e sou também a utopia em alcançá-lo. No infinito de mim mesmo, eu sou quase imperecível, mas não invencível. E contemplo esse sentimento de não ser imbatível. Por proteção, talvez, eu sou mortal mesmo nas promessas de eternidade. Ainda que exagerado, a imortalidade seria uma maldade dos deuses com a humanidade.

Eu sou humano, mesmo quando acredito ser astral. Eu sou diverso querendo ser diversão. Eu vivo mais do que escrevo, eu vivo mais do que canto, ao ponto que ao ler e ouvir também vivo. Eu coleciono olhares para o álbum da vida, eu admiro rostos que não conheço, ainda que adoraria me aprofundar em suas histórias. 

Eu me entrego, sem me render. Eu vivo para não morrer. E não admito morrer em vida. Viciado em viver, eu sou a minha própria aventura e fiel à natureza considero ser parte de algo que não compreendo, mas que deposito fé. Estou em transformação constante. 

Viciado em viver, assino meu testamento com assinatura legível: eu sou quem eu sou e tudo além.

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Correio do amor

sábado, 25 de junho de 2022

Pulei a fogueira de São João só para poder te ver mais de perto. Comprei maçã do amor na primeira barraca que vi para tentar curar essa ânsia que é gostar de alguém.

Dizem que saciar a fome acalma os desejos para além do corpo. Não sei. Talvez fique mais gordo. Em festas juninas, isso é ainda mais possível pela soma de tantas iguarias ao talante de dançar com você para além da quadrilha.

Pulei a fogueira de São João só para poder te ver mais de perto. Comprei maçã do amor na primeira barraca que vi para tentar curar essa ânsia que é gostar de alguém.

Dizem que saciar a fome acalma os desejos para além do corpo. Não sei. Talvez fique mais gordo. Em festas juninas, isso é ainda mais possível pela soma de tantas iguarias ao talante de dançar com você para além da quadrilha.

No balancê, fiz gracejos para você me notar. Cumprimentei você, ainda que à distância. No Alavantú, quis tocar suas mãos, mas no breve tempo de dança, mal pude te abraçar e te rodopiar, pois ao Anarriê, tive que voltar ao meu lugar e seguir a só te observar de longe. 

Na ciranda de flor, quis ser a sua cesta e quase arranquei as flores para lhes entregar, mas distante, preservei minha loucura para mim mesmo. Que ela não passe, perdure ao ponto de gritar para todo mundo ouvir – sonho. 

Mesmo vestido em personagem, não desvencilhei de quem eu sou, e, exagerado, fui entrelaçado pelo caracol que me tomou. Até se desfazer, naqueles poucos segundos, dias e dias se passaram na minha fértil imaginação. 

Fui para além da dança, da estratosfera, do núcleo terrestre, dos devaneios que me faço e me inventam. Fui astronauta para te roubar a lua, fui carpinteiro para te reverenciar em escultura, fui sertanejo para te fazer modas de viola, fui poeta para te fazer música. 

No grande túnel, corri para me proteger em você, te proteger da chuva e da mentira das previsões equivocadas, das realidades tapeadas, de todas as agruras do cotidiano, do tempo, do mundo. Passeei por você, passeou por mim. Sei que me percebeu, talvez não tanto quanto eu te percebi, mas meu sorriso foi todo seu. 

Quantas inspirações me vêm e já penso em me declarar, revelar tudo que sinto… Seria o correio do amor da festa a solução? Preencher um coração de papel... Não caberá. Dois, três, quatro? O meu próprio coração perdido, querendo ganhar. Em tantas linhas que o locutor não lerá. Ouvirá? 

Nas tantas vidas que tive. Todos os erros que cometi para aprender a ser melhor para você, para nós. Temeroso do que eu diga, do quanto assuste, refuto a ideia e me concentro de novo na confusão da canção que embala a dança com os sons que vêm das vozes interiores e divinas que me guiam. 

Tomado o caminho da roça, a grande roda se fez e na gira que faz pela vida, fico à espera desses rodopios que a vida traz. Que eu possa esbarrar em você, e, que no encontro, possamos nos encontrar para além de olhares de longe, dessas lembranças impactantes diante de quem sequer se sabe o nome. Que, convictos, insistamos em vencer o medo de se apresentar: “sou o amor da sua vida e sei que você é o meu”.  

Se a grande roda antecipa a despedida, ao sair dela, tão somente direi: “bem-vindo amor”!

 

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(Foto: Freepik)
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É sobre Amor

sábado, 18 de junho de 2022
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É sobre amor. É tudo sobre amor. Todas as músicas soadas na fina agulha do tempo; todos os filmes condensados nos projetores de nossos anseios; todas as cartas que, na pretensão de ocultar intenções, entregam mais do que se pretendia revelar; todos os discursos empunhados como espada ou escudo para motivar a ida ou o ficar. Todos os clichês que colecionamos e reproduzimos, mesmo atentos, para não ser comum. 

É sobre amor. É tudo sobre amor. Todas as músicas soadas na fina agulha do tempo; todos os filmes condensados nos projetores de nossos anseios; todas as cartas que, na pretensão de ocultar intenções, entregam mais do que se pretendia revelar; todos os discursos empunhados como espada ou escudo para motivar a ida ou o ficar. Todos os clichês que colecionamos e reproduzimos, mesmo atentos, para não ser comum. 

É tudo sobre amor. As mensagens enviadas, editadas, não mandadas, recebidas e receptadas. O temor e a coragem. O dar a cara à tapa e o sangrar no silêncio das madrugadas não dormidas. Os mapas decifrados, as palavras não desvendadas. É sobre amor esse escrito e todos os outros. É sobre amor a flor da cerejeira que despenca do galho alto para rebentar no chão. E todas as sementes espalhadas pelo vento, tudo o que alimenta e toma a terra, vem dessa grita do amor que suave se faz firme, e, brando se faz intempestivo.    

É sobre amor. É tudo sobre amor. Essa ânsia em olhar e falar para a vida: me liga, me acha, me perturba, me tempera. Entrega aos céus, aos mares, esse desejo de ser sobre amor e amado - amar.

Sobre amor é saber receber, é querer dar mãos, braços, bocejo de intimidade, travesseiro. Sair de casa, chegar, voltar querendo voltar antes do que a hora permitirá. Olhar lá fora e para dentro de si. Enxergar enfloras no cimento, se despedaçar e juntar as partes vivas no frio mármore da sala sem tapete. 

É sobre amor cada dia. A espera. A partida. O querer sem querer quando menos se aguarda. Chega. E como queremos que chegue e finque. Raízes no peito e para além do tórax e da própria existência. Gosto de se gostar o que se conhece e saborear o que ainda não se sabe.

O que é virtude e pecado se colocados lado a lado? Talvez, um dentro do outro não confunda, mas reafirme que coexistem para que a vida exista e dê frutos. Filhos, nascimento e despedida. É tudo sobre amor. Essa temperança e aflição. A saudade e a esperança de adiar a nostalgia invasiva. Encontrar quem não se conheceu ainda ou reencontrar quem não pode ou não quis ficar. Olá! Reconhece? A si mesmo, o outro, o passado e o futuro? Para de se esconder!  

É sobre amor, viajar mesmo sem sair do lugar. As manhãs de preguiça, as noites de agitação. Namorar lua despida, sol ereto. Encontrar. Enxugar o teto, tatuar nome, beijo, rosto. Necessidade. Escapulir do esplêndido e flertar com o cotidiano que garante vivacidade — verdade. 

É real o amor que descortina a virgindade de quem ainda não cortejou a paixão. Sobre amor é aprender a saber amar, e, amado saber respeitar, venerar, retribuir ao seu modo. Que seja criativo, verdadeiro, único. Pois é no jeito exclusivo de ser que vivemos sendo a gente mesmo. Tão inimitável, quanto singular. 

Amar, às vezes, é deixar ir, mas em todas as demais é insistir para ficar. É tudo sobre amor, inclusive, o nosso próprio tempo de insistir em existir para além das músicas, filmes, cartas, defesas e ataques, para além da vida.    

 

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Carta para um amor

sábado, 11 de junho de 2022
Foto de capa
(Foto: Pexels)

Meu amor, te conheço mesmo sem sequer saber seu nome, mas já suponho te adorar e ao adorar, te prometo cuidado. Sabe, sei que vamos nos entender, mesmo quando não concordarmos. Porque seremos sempre dois, indivíduos, mas nós. Não me iludo com essas tolices de perfeição, mas acredito na felicidade. 

Meu amor, te conheço mesmo sem sequer saber seu nome, mas já suponho te adorar e ao adorar, te prometo cuidado. Sabe, sei que vamos nos entender, mesmo quando não concordarmos. Porque seremos sempre dois, indivíduos, mas nós. Não me iludo com essas tolices de perfeição, mas acredito na felicidade. 

Quero me molhar com você na chuva, bronzear de Sol sua Lua. Estudar seu signo, ascendente, Vênus, cada casa zodiacal. E, a cada inferno astral que tiver, enfrentar a astrologia e contradizê-la, provocando em você paraíso. Nesses dias, vou caçar conchas com você na beira da praia, vou subir montanhas e roubar estrelas. Da constelação adquirida, te fazer um cordão e quem sabe, através desses amuletos, flutuar seu corpo e me fazer voar nas asas das suas imaginações. 

Amor, chega logo. O jantar está posto. Velas acesas. Luz para fazer a sombra de nós dois se entranhar em beijos, corpo inteiro dentro de outro corpo. Seus lábios arrepiando lugares que sequer sabia que arrepiavam. Te beijar sem querer parar de beijar. Te respirar mesmo perdendo ar nas telas que te pintarei. Tantas cores existem na galáxia dos seus pensamentos e somadas aos meus sentimentos dão trilhões de aquarelas. 

Me veste de flores e sem pudores me arranca desses farrapos que mordem as sinas de quem, às vezes, esquece que pode amar mais do que sonha. Vem e amansa a imensidão que finge infinito, mas revela eternidade interrompível. 

Sorrio, finjo não chorar. Quero o sossego do amor sensato, o exagero do amor que se estende para além dos janeiros de cada ano. Bobagem não colecionar coragem de se dar e se entregar. Entregue, meu coração te conhece e me guia a aprender você e te descobrir e seguir te descobrindo a cada novo segundo. Salto no som de seus sussurros e pelas vozes da paixão tremem as minhas pernas, que bambas, seguem cheias de propósito para te acarinhar os pelos. 

Amor meu, não tarde. Mas ainda que não se apresse, não demore, estou aqui. Não precisa bater na porta, só venha. Na dança dos átomos, na velocidade da luz, entre espaçonaves alienígenas, no recanto das flores de baunilha, se achegue nas correntes de vento que fazem evaporar as casquinhas dos machucados sarados. Tatuo você no peito e mais forte do que sou, por admitir fraquezas, doo a dor que tenho para sangrar menos do que morrer. Vivo e vivendo você, sou mais do que pretendo.

Saudade já visita e arrebenta o coração antes mesmo de sair e fico ansioso para que a cesse rápido, que volte logo. Redenção à liberdade de perecer com você. Mergulho são, sem ser racional. Acordo mais cedo para não te perder e fazer das manhãs alimento para espantar a fome que sentirei nas horas da tarde. Tem bombons belgas na prateleira. 

Na fadiga do fim do dia, descansar no seu colo e ser repouso, sofá, cadeira, rede e cama. Deixei recados para você na gaveta. Declarações de amor para o Dia dos Namorados e para os demais dias de namorar você. 

Estampo a capa da revista em tom de procura, te acho, me deixo ser achado por você. Disfarço paciência, não escondo a ansiedade, a qualquer hora sei: você vai chegar. Reconheço a recusa a bocas fáceis, não quis desacatar os erros, nem quem me quis, mas no canto do espelho já vejo você e canto para me encantar de você. 

Meu amor, vem e só venha costurar esses laços invioláveis que se criaram antes mesmo de tudo existir. Estão protegidas as utopias para você surgir naquela esquina onde, o músico que não sei o nome, toca violoncelo. Serei a tempestade de seus verões, como a fortaleza de suas perdições. Tem sonhos no cume das árvores da floresta que plantei, no terreno lunar do quintal da nossa casa, no interior. 

Os imãs na geladeira perfilam o alfabeto que formam seu nome. O silêncio dos burburinhos das mesas dos bares, comentam sobre nós. E não escondo o quanto te quero, meu amor futuro que pretendo antecipar para esse presente que me presenteia energia e motivos para te sorrir largo. Sentimento bom de calma que toca a alma e faz a existência prazerosa. 

Não sei ainda o seu nome, mas agora e depois da hora vou te chamar de meu amor.

 

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