Blog de palavreando_27591

Tratado da felicidade

sábado, 30 de setembro de 2023

O que é felicidade? Como alcançá-la? Não. Não espere das próximas linhas — respostas. São despretensiosas, como a própria felicidade. Seria a felicidade despojada? 

A filosofia, a teologia, a ciência, a literatura tentam desde sempre abordar o tema sem fechá-lo. Fato é que todos nós queremos ser felizes, ao ponto de que a felicidade seja o objetivo da vida. Existimos, persistimos e até teimamos. E é válida essa insistência, tanto quanto justa. Justo é ter uma vida plena e não há plenitude sem felicidade.

O que é felicidade? Como alcançá-la? Não. Não espere das próximas linhas — respostas. São despretensiosas, como a própria felicidade. Seria a felicidade despojada? 

A filosofia, a teologia, a ciência, a literatura tentam desde sempre abordar o tema sem fechá-lo. Fato é que todos nós queremos ser felizes, ao ponto de que a felicidade seja o objetivo da vida. Existimos, persistimos e até teimamos. E é válida essa insistência, tanto quanto justa. Justo é ter uma vida plena e não há plenitude sem felicidade.

Se é estado de espírito, que seja. Se é coleção de momentos, que seja. Se é imaginação, que se realize. Só quem pode definir felicidade, somos nós mesmos, com a gente mesmo. Ainda que existam conceitos, estudos biológicos e até quânticos, dogmas e drogas, cada um tem um jeito para chamar de seu. Minha felicidade. Sua felicidade. Nossa felicidade. 

Ainda que singular, difícil ser feliz sozinho. Não é preciso morrer para descobrir que “felicidade só existe se for compartilhada”.  

Dirão: “felicidade não é querer ter tudo, é não precisar de nada”. Talvez. Percepção. Às vezes, se é feliz e nem se sabe, e, a nostalgia é quem traz o sentimento de felicidade vivida, mas nem sempre apreciada enquanto presente. Relembrar é trazer para perto e compreender que a saudade flutua entre os altos e baixos de se atrever. A vida é um atrevimento, quase sempre divertido. 

Se a paixão é perigosa, corra o risco. Se apaixone por pessoas, por sonhos, por projetos. Se aventure. Se engaje em lutas coletivas. Se meta a pertencer. Felicidade também é o que nos dá sentido de existir. E haverá saborosos enganos, mas até se confirmar como tal, terá sido feliz a entrega. Riremos de tudo ao final.

Faça o seu próprio tratado da felicidade. Sugiro apenas uma cláusula: é regra ser feliz, tanto quanto se revogam todas as regras. As amarras que nos impõem não são dos nossos tempos. Livre pra poder voar. Liberdade!  

Não precisa ir tão longe para enumerar tantas atrocidades cometidas “por mandado” de Deus. E os homens, em nome do bem, seguem a fazer tanto mal. Coitado de Deus, marionete de púlpitos. Respeito aos que foram assassinados por resistirem. Suas memórias cintilam como sinal de que foram eles e poderiam ser nós. Até Jesus foi crucificado. E seria de novo! Até quando? 

Ainda há muita luta pelo direito de ser feliz, mas a luta por si só nos concede certa felicidade. Herdaremos o céu, sem acreditar em promessas. Eles não, ainda que prometam o que não lhes cabe. Que Deus os perdoe. Que nos perdoemos por todas as vezes que nos negamos a busca pela felicidade e a contemplação da mesma.

Que a felicidade seja a guia e guiados pela felicidade cumpramos o tratado que pactuamos com a gente mesmo. 

O que é felicidade? Como alcançá-la? Sagrada é a sua resposta, sua forma de viver isso,  tanto quanto é a de cada um. Que sua felicidade lhe proteja e lhe conceda muitos dias de paz divertida.

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Tempo de despertar

sábado, 23 de setembro de 2023

A brisa leve traz novidades. Sussurra aos ouvidos atentos que tempos bons vêm. Há maior querência aos despertos. A atmosfera vibrante é chamado provocante. A melhor das coerências é ser feliz. 

Se dizem não, o mundo faz que sim. Sim! É pleno o campo da criatividade e por ele passeiam memórias e afetividades. Nascem flores multicoloridas e até brotam estrelas. Berço esplêndido para os sonhos que recusam classificações de ingênuos demais ou sagazes de menos. Os sonhos, todo e qualquer sonho, merecem respeito.

A brisa leve traz novidades. Sussurra aos ouvidos atentos que tempos bons vêm. Há maior querência aos despertos. A atmosfera vibrante é chamado provocante. A melhor das coerências é ser feliz. 

Se dizem não, o mundo faz que sim. Sim! É pleno o campo da criatividade e por ele passeiam memórias e afetividades. Nascem flores multicoloridas e até brotam estrelas. Berço esplêndido para os sonhos que recusam classificações de ingênuos demais ou sagazes de menos. Os sonhos, todo e qualquer sonho, merecem respeito.

Reverência ao que vem. Fé no futuro com pé no presente. Uiva o vento e abraça quem dele faz vestimenta. Quando assobia o vento ao pé do ouvido, escapole da alma a timidez e com ela fora de nós, de repente se é livre. Para ser quem se é. E os que não se desapontam, você pode chamar de amigo.    

Trovadores versam sobre esse clima de festa, sobre essa sincronia com a natureza em que não há invadido ou invasor. Tudo como um só grande ser. Uns chamam de energia, outros de Deus. Mistério sem pretensão de desvende, sem ambição de ser segredo. Talvez, a intenção desse tempo seja apenas ser trova enredada em poesia. Será que os poetas sabem mais que os filósofos? Não. Poemas não são vãs filosofias. 

Tempo de colher. Tempo de despertar. Se tenho medo? Perguntam-me. Tenho medo, mas não tenho escolha — respondo a mim mesmo. E você? 

Aberto, livre, disposto. Seja arranha-céu. Abandono aos penduricalhos e nos braços priorize buquês de flores. A estação vindoura espalha vivacidade e não pede continência. Harmonia. Prazer em ser. Que honra é viver. 

Navega como barquinho à vela pelos oceanos. Não precisa mergulhar em águas profundas para saber do mar. Mas para amar é necessária certa profundidade. O amor não é raso e bom saber que também não é raridade, ainda que cada um seja um tanto exclusivo.                     

E nenhuma estação é como a outra. Nem mesmo as que se repetem a cada dezembro, março, junho e setembro. Se as estações são diferentes, igualmente nós não somos as mesmas pessoas do outono passado.

O eu que já não gostou do Horário de Verão, hoje tem saudade e pede seu retorno em outubro. Sem arrependimentos, precisamos admitir que o que experimentamos nos transforma. Vigora, pois, a essência. Temos o nosso próprio perfume, cuja fragrância é inimitável.        

Esse cheiro de terra molhada. Esse sabor rotulado de novo é mesmo novo. Tem gosto de fruta caída. Desperta. São as cores da temporada das flores. O sol de ouro que traz alvoroço diz que a espera pela primavera acabou. 

Se Francisco, El Hombre dança com o trovão, só flutuando é que se pode florescer. Se a estação traz sentido para dizer “te amo”, a boa nova que anda nos campos traz certeza de que este tempo desperta muito mais do que canções de primavera.


 

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Fernanda

sábado, 16 de setembro de 2023

Se você já gostou de uma Fernanda, você tem que ler essa crônica. Se você nunca gostou de uma Fernanda, também. Porque esse texto não é sobre Fernanda, Amanda, Ricardo ou Guilherme. É sobre gostar de si mesmo e de alguém para além de si mesmo. Alguéns, tanto quanto o  plural permitir. 

Se você já gostou de uma Fernanda, você tem que ler essa crônica. Se você nunca gostou de uma Fernanda, também. Porque esse texto não é sobre Fernanda, Amanda, Ricardo ou Guilherme. É sobre gostar de si mesmo e de alguém para além de si mesmo. Alguéns, tanto quanto o  plural permitir. 

Amar a si é libertador para amar tantos quantos mais à volta. Que se achegam, que convidamos ou que simplesmente esbarramos e fazemos do esbarrão encontro para a vida. E nos deparamos com situações, que como esbarrão, fazem com que nos encontremos. De repente, descobrimos-nos encantados da gente mesmo.     

Nessas horas é que lembro da companhia da bailarina da caixinha de música. Dançando… Rodopiando naquele chão barato de espelho duvidoso, sob trilha que não sei o compositor. Seria Chopin, Wagner, Bach ou Schubert? Ela, presa ali, àquela pequena caixinha de música. Eu, preso àquela magnitude, sem poder chamá-la aos meus braços. Foi quando aprendi a dançar sozinho e ao dançar sozinho, a libertei, nos libertamos.      

Na memória, os versos daquela virtude, cujo pecado sei saborear. Ora, como identificar sombras sem luz? A bailarina, não mais, presa à caixinha de música. Deu vontade de fazer-lhe carinho, quando seu rosto, sob a luz vermelha, reluzia. De repente, vi que no espelho refletia meu próprio rosto sob a luz azul. Eu não sei de cores. Mas era minha alma sorrindo. E tal sorriso me dizia: seja feliz. Sim! Nada além disso. Apenas, seja feliz.

A vida nem sempre tem que ser carnaval, pois até carnaval tem suas quartas-feiras de cinzas. Seu sorriso é branco? Não sei a cor do batom da vida. A vida são contradições aleatórias — disse-me. E no carrossel da antinomia, de repente, se faz valer a norma de não haver norma, nem só uma ou duas opções. Não há essa de preto no branco. 

Minha Escola de Samba é Azul e Branco, meu time é Azul, Vermelho e Branco, mesmas cores do meu partido. Mas minha pele tem arco-íris tatuado e dele faço todas as cores, ao ponto de não me importar nomear as cores, os sentimentos, os bocejos ou taquicardias. Vivo conexões comigo mesmo, com as pessoas que meu imã atrai e me deixo atraído por tudo que me eleva, seduz e me conduz.

A bailarina passeia por aí. Se perdida, achada. Se achada, memória. Eu, não mais preso às caixinhas. Nas gavetas, apenas cuecas, meias, penduricalhos. Os anéis que tenho, carrego nos dedos. Meus pensamentos vibram, mesmo quando tristes. 

Sou, somos tempestade e bonança. Vento bom que nem sempre tem a pretensão de secar as roupas do varal ou a intenção de espalhar o feno duramente  recolhido. A única oportunidade que tenho e temos é viver. O que fazemos das possibilidades é o que nos torna tão criativos.   

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Quanto tempo tem o seu tempo?

sábado, 02 de setembro de 2023

Diriam que eu tenho 35 anos de idade com alma de 22. Disseram-me que ele tem 26 com experiência de 50. Dela? Falaram-me que não se pergunta a idade a uma dama. Mas seu sorriso de hoje escancara que seus setenta e poucos não conseguem esconder que tem menos de 30. Amanhã, pode ser que não haja a mesma suposição. 

Essa roupa que veste a nossa eternidade é só uma materialidade que, como toda matéria, sofre as avarias do uso. O que há dentro, esse mistério que nos sustenta, não é passível de ser contado pelas voltas que o ponteiro dá no relógio. 

Diriam que eu tenho 35 anos de idade com alma de 22. Disseram-me que ele tem 26 com experiência de 50. Dela? Falaram-me que não se pergunta a idade a uma dama. Mas seu sorriso de hoje escancara que seus setenta e poucos não conseguem esconder que tem menos de 30. Amanhã, pode ser que não haja a mesma suposição. 

Essa roupa que veste a nossa eternidade é só uma materialidade que, como toda matéria, sofre as avarias do uso. O que há dentro, esse mistério que nos sustenta, não é passível de ser contado pelas voltas que o ponteiro dá no relógio. 

Novo com cabeça de velho, ancião com mente de jovem. O tempo que vem antes de nós ou como usamos o tempo que temos é que, talvez, determine quem somos ou nos tornamos. Não são quantas primaveras riscamos no calendário, mas o que fazemos de cada estação. 

Na vasta coleção de clichês de minhas crônicas, acumulo outros mais: a vida é uma aventura, cujas inércias deliberadamente conscientes não se repõem. Então não espere, porém respire. Faça o que te motiva e alimente as suas paixões, sejam quais forem. Não se julgue e nem se apegue ao receio de estar sendo observado. Na grande maioria das vezes, ninguém está atento para lhe aplaudir, tampouco vão lhe vaiar pela paralisia. Não pare, pois o vento não se recolhe — nunca.

Quanto tempo tem o seu tempo? Depende para que — responderia uma criança. Dias desses, conversava despretensiosamente com Caetano, um lindo menino de 6 aninhos. Ele me contou que está aprendendo sobre o tempo. Seria comum pensar em uma criança aprendendo sobre a lógica de que um dia tem 24 horas e cada hora 60 minutos. 

Na minha mediocridade de adulto, esperava que ele me falasse sobre isso, já prevendo que, quando encontrar com ele daqui a 4 anos, já me falará sobre a matemática do tempo para além dos minutos, os milésimos de segundo, quantos anos formam um século e milênio… 

Caetano, sagaz como é, pode ir além, pensei, e avançar para os difíceis cálculos da física quântica. Quem sabe? Não sei até onde Caetano irá nisso. Mas me surpreendeu a perspectiva dele, quando perguntei: “E o que você tem aprendido”? Disse-me ele: “Quando estou feliz o tempo passa mais rápido”. Dali em diante, entramos em uma conversa filosófica sobre a velocidade desse tal tempo sobre as coisas. 

A equação poética de que o tempo não é o mesmo para todos e nem para as diferentes formas que usamos. Nada de números, mas de sensações, emoções, sentimentos. Talvez o tempo seja mesmo o que menos importa. O que importa são as peças que montamos nele, no ritmo de nossas intensidades. E tão mobilizados e entretidos com o que estamos fazendo e vivendo, o tempo se torna tão coadjuvante, possivelmente apenas e no máximo tablado de palco para dançarmos. 

Na filosofia da vida, Caetano chegou a um lugar onde muita gente jamais chegará. Ou que chega, mas desaprende. Que Caetano, eu, você, nunca nos percamos desse achado e navegando deixemos fluir… A felicidade, o encontro, as bandeiras, o saborear, o imergir.             

Caetano tem 6 anos. Minha amiga tem 33. Aquela mulher que dá comida aos pombos na praça, suponho que tenha 60. Minha avó morreu aos 94. Minha mãe aos 52. Eu não sei com que idade encontrarei outro grande amor e que idade esse grande amor terá. O que me definirá é o tanto o quanto serei feliz com ele. Porque mais importante que ficar decifrando o tempo é responder para si mesmo: quanto posso e o que quero para o que não me interessa saber nisso que chamam de tempo? 

Afinal, quanto tempo tem o seu tempo?

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Essencial em toda e qualquer biografia

sábado, 26 de agosto de 2023

Mesmo quando fico muito tempo sem te ver, chateado pela ausência e sabendo que há outras pessoas que sabem mais de você do que eu, basta te reencontrar e parece que estivemos juntos ontem. Porque mais importante do que perto, é esse sentimento de estar permanentemente  junto. 

Mesmo quando fico muito tempo sem te ver, chateado pela ausência e sabendo que há outras pessoas que sabem mais de você do que eu, basta te reencontrar e parece que estivemos juntos ontem. Porque mais importante do que perto, é esse sentimento de estar permanentemente  junto. 

Se isso não é amor, eu não sei o que é amor. Amor de amigo e só o amor da amizade permite desacordos passageiros provocados por atrasos e desatenções. Amizade não tem contrato, ainda que se assine com a singeleza do olhar. É livre em liberdade plena para ser quem se é e aceitar o outro como e quando vem, ainda que nunca se vá. 

Para o que der e vier. Para construir e rearrumar. Para regar, mesmo que apenas com conversas de bar ou orações não divulgadas feitas no silêncio noturno de um cômodo qualquer. É o tal querer bem o tempo todo, mesmo sem ter encomenda expressa sobre. 

É reconhecer que imperfeições existem, mas admiti-las de bom grado e buscar harmonia, seja perdoando, se adaptando, se auto aconselhando, porém nunca julgando. O amor jamais se coloca no banco dos réus ou tem o martelo do juiz. No amor, a razão é do existir.    

Assim, amizade é convicção de trajetória. Dividir momentos tristes e felizes. Estar no luto, na luta e na festa. De um para o outro, de ambos. Porque a vida não é constante e nessa estrada não há só linha reta, nem sequência infinita de curvas. Nossos percursos são de desafio, dor e cura; alegria e lamento; expectativas, surpresas e frustrações; vitórias, derrotas e alguns empates — assim é a caminhada. De velocidades variáveis, onde se acelera ou freia, por intuição pura, obrigação ou vontade mesmo. 

Em alguns momentos se é carona, em outros o condutor. Mesmo viajando sozinho, nos pensamentos se carrega a leveza do sorriso ou a firmeza do olhar de quem não tiramos do peito. Assim, nunca se pega só. Por isso, tão fundamental é encontrar abraço e amparo, seja para celebrar ou simplesmente ter acolhida. 

A amizade é essencial em toda e qualquer biografia. É o que faz nossa existência não passar despercebida e mesmo quando findada, ser lembrada. É se escrever na história e nas histórias que talvez não virem capítulos da linha do tempo da humanidade, mas que certamente se multiplicam como das mais importantes para as vidas que se costuram. 

É saber de saudade, se vendo como tal ou tendo de tempos e de rostos, de momentos tatuados na alma. Provocar novas saudades, porque ainda que por vezes doída, é tão bom fabricá-las. Como é sublime estar junto. 

Bandeiras, companheirismo, intimidade. Força surreal que nos eleva. A magia do encontro, o desejo do reencontro, o encanto de viver, existir. O teimar com a imortalidade, o rechaçar a brevidade das coisas e inimigo do fim saber que ter amigo é ter tudo, até devaneios de eternidade. Se enquanto lembrado se é eterno, não seria desatino que o amor é mesmo para sempre.                  

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Palco e plateia

sábado, 19 de agosto de 2023

Quando os dias estão depressa demais, desacelere os passos para acelerar o coração. Escolha uma poltrona ao centro e se satisfaça — plateia. Observe, vislumbre, imagine. Sinta a realidade, sem vesti-la. Suspire o que inspira o palco. O artista é de carne e osso. Mas sua alma flutua. Para além do corpo e dos pensamentos — sentimento. Afeta. Deixe-se afetar. De repente, mobilizado permita-se fazer parte de atmosfera até então desconhecida e que só você, no seu singular jeito de ser, poderá descrever. Se é que pode ser descrita. 

Quando os dias estão depressa demais, desacelere os passos para acelerar o coração. Escolha uma poltrona ao centro e se satisfaça — plateia. Observe, vislumbre, imagine. Sinta a realidade, sem vesti-la. Suspire o que inspira o palco. O artista é de carne e osso. Mas sua alma flutua. Para além do corpo e dos pensamentos — sentimento. Afeta. Deixe-se afetar. De repente, mobilizado permita-se fazer parte de atmosfera até então desconhecida e que só você, no seu singular jeito de ser, poderá descrever. Se é que pode ser descrita. 

Deixe a poesia invadir, esbarrar em você, seja ela de raiva ou paciência, seja ela de ópio ou transcendente. Se o mundo não chama, convoque-se. Plateia. Ao palco, o protagonismo do que sente. Revela. A arte é mesmo misteriosa, ainda que nunca se rogue de enigma. Percepção. 

Mergulhe. Na cena. Nas luzes da ribalta. Passeiam átomos, poeira cósmica e invisível aos olhos — enxerga. Há certa beleza apavorante que alimenta a coragem de render-se à música. Diz: “será que é de louça, será que é de éter, será que é loucura, será que é cenário, a casa da atriz. Se ela mora num arranha-céu. E se as paredes são feitas de giz. E se ela chora num quarto de hotel. E se eu pudesse entrar na sua vida”.

Entre na única vida que te pertence. A sua mesma. Todas as outras, até as imprestáveis, apenas se emprestam a você por alguns momentos. Três minutos ou menos se for esquete. Comédia ou drama. Musical? Quantos atos? Haverá intervalo. Quanto tempo dura uma transa? Em transe. Perguntas não importam. 

Não se mova, ainda que tudo dentro de você se mobilize para a fantasia de um salão de mascarados em Veneza, dos anos 60 da elite carioca ou do baile de favela de uma boate qualquer de Buenos Aires. Ou vá sem ir. A arte é de um mundo onde não há territórios que delimitam espaços, mas céus que nos expandem. Para sambódromos, lonas de circos, guerras de rimas, teatros de mamulengos, para o divino. 

Se as linhas que nos separam em cidades e nações são imaginárias, o artista derruba esses muros pela linguagem universal da dança, do bocejo, do riso largo, da orquestra, da lágrima, do dedo em riste, do peito aberto e do que ele floresce em cordel ou escultura. 

No magnífico espetáculo da vida, todos estão no palco, enquanto plateia. Todos são plateia, enquanto cena. Da coxia dá para ver. O bastidor mais interessante é o burburinho dessa conversa toda que se tem consigo mesmo. 

Que a arte mereça o respeito que a liberdade clama. Que nossas peças teatrais, que contam a história de cada um de nós, não se preocupem com o final, mas se empenhem por meios dignos. Felizes ou tristes, mas intensos, vívidos… Estamos vivos, aprendendo a não andar com os pés no chão.

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Das pequenas coisas — a vida

sábado, 05 de agosto de 2023

Viver é acumular pequenos feitos, que nos filmes nem são considerados feitos, mas valem mais do que troféus. Muitas vezes, somos obrigados a diplomas que apenas servem para enfeitar paredes. Noutras, somos instigados a ter, obter, reter riquezas que são valiosas apenas para cofres que apodrecem. Pesam os ombros. Aumentam a cifose no corpo e criam calos na alma.

Viver é acumular pequenos feitos, que nos filmes nem são considerados feitos, mas valem mais do que troféus. Muitas vezes, somos obrigados a diplomas que apenas servem para enfeitar paredes. Noutras, somos instigados a ter, obter, reter riquezas que são valiosas apenas para cofres que apodrecem. Pesam os ombros. Aumentam a cifose no corpo e criam calos na alma.

O que importa? Parece simples a pergunta, tanto quanto evidente a resposta. Mas ainda que tenhamos em mente, ainda que nos vista a certeza, corrompemos a poesia e nos auto sabotamos, conscientemente. De que adianta declamar versos e não vivê-los? Tomar para si como atitude as tais evidentes respostas talvez seja o desafio. É mais do que percepção, é o jeito de conduzir a vida. Diminuir a carga, acelerar os passos para evitar urgências diante da fatalidade de que o tempo que temos fica cada vez menor. É assim desde que nascemos. O tempo que nos é dado caminha para a morte de nossas células. 

Não há forma ou fórmula única. Mas há de saber aquilo que os mais velhos sempre dizem sobre o que se leva para o túmulo e para além dele. Tudo o que é material, inclusive nosso próprio corpo, vira pó. O que fica nas métricas humanas são apenas os 21 gramas. Uns dirão ser a alma. Se não sabemos do que se trata, podemos apenas recorrer ao sobrenatural.

Das pequenas coisas — a vida. Esse conjunto de degraus até podem levar ao topo, mas é em cada degrau que se é possível sorrisos despretensiosos, olhares impactantes, rubores incontroláveis, lágrimas de fazer mar, tremor nas pernas, vibração nas cordas vocais, palpitações intensas, encontros inexplicáveis, vivacidade. 

Nem tudo que vai para nosso incrível baú de memórias está registrado em fotografia. Deveras, quase tudo que está nesse incrível baú de espontaneidades não está disponibilizado em nuvens digitais ou materializado. É tão individual que só você tem acesso, nenhum hacker pode vasculhar e só com sua permissão é possível compartilhar, compartilhar-se. 

Portanto, ainda que a foto revele o time erguendo a taça do campeonato, você trocando aliança, assinando biografia, empunhando a chave da casa, do carro, do consultório, do escritório, a chave das chaves é invisível aos olhos e é encontrada no percurso. 

Talvez, tenhamos nítida percepção nesses momentos de pseudo finalização, mas nada do que é grande se faz sem as consideradas pequenas coisas. São elas que fazem um ato e é o conjunto de atos que possibilita a peça. Uma canção não é nada sem cada verso, tanto quanto é igualmente nada, tudo o que não toca um coração.

Que todas as pequenas luzes que acendem no cotidiano não sejam desprezadas. Se isoladas não iluminam o todo, que colecionadas possam iluminar toda a sua caminhada. Pelo dia a dia, por toda jornada ao topo, seja lá o que for o topo e qual for o topo. Pois ao fim, antes do fim de tudo, serão as pequenas coisas — a vida.

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Abaixo a síndrome de Cinderela

sábado, 08 de julho de 2023

Tem dias que eu acordo e o máximo que consigo é acordar. E, por que não estaria tudo bem com isso? A gente não tem que estar disposto todos os dias, todos os momentos. Deve ser muito chato ser feliz todos os dias, ou melhor, ter que se mostrar contente a todo instante, como se a vida fosse aquilo que se posta no Instagram. No TikTok, então, tudo se resume a quinze míseros segundos. 

Tem dias que eu acordo e o máximo que consigo é acordar. E, por que não estaria tudo bem com isso? A gente não tem que estar disposto todos os dias, todos os momentos. Deve ser muito chato ser feliz todos os dias, ou melhor, ter que se mostrar contente a todo instante, como se a vida fosse aquilo que se posta no Instagram. No TikTok, então, tudo se resume a quinze míseros segundos. 

Abaixo a síndrome de Cinderela. Imagina levantar todos os dias sorridente para varrer a casa, lustrar os móveis, lavar o banheiro cantarolando com os bichinhos. Ultrapassado e piegas até para filme da Disney. 

Reverência à preguiça, à impaciência, ao mau humor. O mundo caótico nos permite não ter que estar bem o tempo todo. Até a Bolsa de Valores cai e levanta. Por que nós, meros mortais, temos que ser diferentes do rei mercado? Ou diferentes da lógica da vida?

Monitor cardíaco em linha reta é sinal de morte. Variações de frequência é o que nos fazem vivos. Entre altos e baixos, mais vale um sorriso sincero do que sorriso de político mentiroso. Cara emburrada expulsa a hipocrisia. Não somos constantes. Somos uma espécie instável, que até busca o estável, mas que persegue mesmo é o inenarrável, a experiência, a aventura, os tais impactos que nos energizam, tudo o que nos vibra, reinventados, iluminados, iluminadores. 

Voo pede aterrissagem é só aterrissa quem voa. O que é melhor? Não sei. De tal forma que, para diferenciar alegria de tristeza e todos os antônimos, é natural que antagônicos façam parte da jornada de cada um de nós. 

Ainda que bilhões, somos tão únicos. Deus é mesmo um sujeito criativo. Nós somos criativos. Tantas personalidades distintas, tantos personagens que abrigamos dentro de nós mesmos e convocamos, a bel-prazer ou não, todos os dias. 

Há manhãs frias que não dá a menor vontade de levantar da cama. Que acordar é o suficiente. Que estar à toa é a melhor opção entre todas as outras. E tudo bem. Você não precisa de tarja preta ou de hormônios injetáveis ou da vida que os outros dizem ter nas redes sociais. 

Desafio das seis da manhã, cem dias de provação, banho gelado às quatro da madrugada no inverno… Dispenso os coachs, assim como os pastores que vendem fé disfarçada de prosperidade, prosperidade mascarando sacrifício, e, que se “você não atingiu a graça é porque não se esforçou o suficiente”. Isso não é religião ou psicologia positiva, isso é capitalismo! Talvez até o capitalismo seja mais honesto.         

Eu gosto dos boêmios, loucos, entregues. Porque loucos, entregues, boêmios têm a virtude de não serem hipócritas. Com raríssimas exceções, moralistas moram nos armários. Criticam aquilo que fazem no escuro ou o que gostariam de fazer. Nos seus âmagos, querem (quando não os fazem às escondidas) aquilo que julgam errado. Invejam os livres e a liberdade é para eles um desejo, tanto quanto tormento. Não os condeno, mas ser um deles…

Amem a liberdade. Sejam amigos de suas próprias consciências. É onde mora Deus. Cinderela? Ela canta feliz arrumando a casa, junta as duas mãos e as leva ao rosto encantada, mostra no Instagram seu príncipe encantado. Mas o príncipe também arrota, os sapatos de cristal apertam e os bichos mordem. Não romantizar o cotidiano é um bom começo. Escolha bem o que entra no seu filme, lembrando que no filme da vida não tem cortes ou edição.    

É impossível vencer sempre e viver é transitar entre polos. Admitir a preguiça é tão justo, quanto se pegar sorrindo, do nada, no meio do trabalho árduo ou na caminhada pelo parque. E é assim que a gente se compartilha com o mundo. 

Há dias que acordar é o máximo que se pode fazer, outros, acordar é só o começo para coisas extraordinárias. E, claro, no meio disso tudo sempre tem as surpresas. Agradáveis ou não. Mas é tudo aquilo que foge ao nosso controle, e, imprescindível é saber conviver com isso. Haverá muita felicidade nisso e também tristeza. Isso é viver, isso é se manter vívido.

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Que sua embriaguez te lave a alma

sábado, 01 de julho de 2023

Do que se embriaga? Que aquilo que bebe não seja apenas para limpar a garganta, as vísceras, as angústias, espante a ansiedade ou devasse seus medos. Que não seja o vinho, a crença ou a pólvora que ateiem seus pensamentos de coragem. Mas que seja conforme a sua fé. 

Do que se embriaga? Que aquilo que bebe não seja apenas para limpar a garganta, as vísceras, as angústias, espante a ansiedade ou devasse seus medos. Que não seja o vinho, a crença ou a pólvora que ateiem seus pensamentos de coragem. Mas que seja conforme a sua fé. 

Se ébrio aos olhos alheios, mantenha-se convicto, ainda que cambaleante. Só você sabe o que sente, tanto que nem os mais empáticos saberão, ainda que possam supor. Suposição é pouco. Você não supõe! Você sente. Na pele, no peito, na alma. Nas tatuagens que a vida faz, com ou sem permissão. Viver nem sempre é transcender, ainda que prazer seja legítimo desejo e valha a busca. 

Por isso, que sua embriaguez te lave a alma. Respeito ao que te arrebata. Livre de julgamentos — principalmente os seus — seja o que te encanta. Que se embriague dessa luz que vem do universo, dos cheiros das florestas, do seu suor de esperança e gozo, dessa taça de vinho tinto que abraça em veludo as papilas. 

Beba essa loucura que é ingenuamente se entregar e entregue peça mais doses de paixão. Antes que evapore ou até virar amor. Beba mais e mais desse sentimento que causa rubor na face, tremedeira nas pernas e faz nascer asas no coração. 

Deixe-se voar e antes de aterrissar, se aterrissar, aproveite o voo… A paisagem, o céu, o vento silhuetando seu espírito. Você como tudo, mais do que o todo. 

Se você tem algo é a você mesmo, e, é por isso, que faz bem se doar, se dar sem saber se receberá de volta, mas sabedor de que nada importa mais do que a relação que tem consigo mesmo. Se for demais, terá o caminho para se trazer de volta. Mas não temas ir. Ser errante é da nossa natureza. É assim que a gente se acha. 

Atreva-se à embriaguez para, de repente, descobrir-se em liberdade. Para além dos fevereiros de cada ano, para muito além do que te disseram ser liberdade. Beba dessa liberdade de ser feliz, sem qualquer moderação. Brinde à liberdade dos que estão à volta e de todos que sequer conhece. Um mundo melhor é feito pelo conjunto de livres e não pelo coletivo de raivosos preconceituosos. Ame e deixe amar, viva e deixe viver.

Abrace esse clichê e faça dele elixir da sua embriaguez. Embriague-se desse e de tantos outros clichês que, se não enobrecem a literatura, aliviam o existir. Existir pleno é mais importante do que teorizar ou ter assento nas academias de letrados.

De alma lavada, repita em constância achar-se embriagado. De lua, de mar, de poesias, de gente, de café, de propósitos, de carnavais, de magia, de cerveja, de encontros, de enganos, de mapas astrais, de perigos, de olhares, de canções, de versões de si mesmo, de verões e estações que vem e vão, de saudades, de fé. 

Experimente e siga a embriagar-se de tudo que valha à pena, enquanto valer à pena, enquanto for atrativo e lhe fizer feliz. Porque se há que se definir um sentido para o destino, esteja certo, é a felicidade. E, o melhor: a felicidade não está ao final de tudo, mas em cada gole, em cada dose, em cada gota que lava a alma.

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Ainda que queime o frio

sábado, 24 de junho de 2023

Os seis graus que fazem lá fora podem ser menos intensos do que o frio que faz dentro de um coração vazio.  Coração vazio pesa. Como sala cheia também pode ser muito vazia. Porque não é o espaço ocupado ou quantas pessoas estão ali, mas como preenchemos e somos preenchidos por olhares e compreensões. Como nos conectamos uns aos outros e como esse laço invisível nos traz para perto, junto, parte. Não nascemos para sermos sozinhos. 

Os seis graus que fazem lá fora podem ser menos intensos do que o frio que faz dentro de um coração vazio.  Coração vazio pesa. Como sala cheia também pode ser muito vazia. Porque não é o espaço ocupado ou quantas pessoas estão ali, mas como preenchemos e somos preenchidos por olhares e compreensões. Como nos conectamos uns aos outros e como esse laço invisível nos traz para perto, junto, parte. Não nascemos para sermos sozinhos. 

O frio do inverno traz para as fotografias dias bonitos. Céus rosados, luas destacadas no imenso pano azul-escuro. Que teto lindo é o que há sobre nós. Percebemos? 

Enquanto o sereno gélido rouba a nossa atenção, despercebido passa o tempo sem que ousemos roubar os minutos dele. E o tempo nos leva, enquanto consome, com fúria e cinismo, nossa pele, corpo, neurônios. Mas o tempo, sagaz, não se atreve a tomar nosso arbítrio. Assim, ainda que tente nos iludir e corromper, o tempo é o que a gente faz dele. Então, quem seria o vilão? Há tirano? 

Gostamos de nos tapear. Fingimos ingenuidade, mas é tão evidente o destino. Talvez seja mais fácil, apenas culpar outrem: o tempo, o frio, aquilo que passeia pelo vento lá fora. E o vento bate. Abrimos a porta. Até vampiro só entra se for convidado. Damos sangue sem saber que alma também evapora, ainda que perecível mesmo seja só o corpo. 

Talvez esse frio que congela a grama do quintal seja essa parte nossa que julga ou se faz indiferente. Ao fazer réus, nos condenamos. Ao sabor da indiferença, nos sabotamos. E no apocalipse cotidiano não é o frio que nos paralisa, afinal, “seja quente ou seja frio. Não seja morno, senão te vomito”.  

O tempo lá fora não define nossas particulares essências. Ainda que cientistas afirmem que lugares mais frios tendem a fazer pessoas mais fechadas, mais frias, poetas contraporão que lugares mais frios tendem a fazer as pessoas se abraçarem para se esquentarem e aquecidas compartilham seus próprios corações. 

Se coração vazio pesa, coração compartilhado nunca é solitário. Toda biografia merece ser testemunhada. Ainda que queime o frio, mesmo que queime o sol…

Publicidade
TAGS:

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.