Quanto tempo tem o seu tempo?

Wanderson Nogueira

Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

sábado, 02 de setembro de 2023

Diriam que eu tenho 35 anos de idade com alma de 22. Disseram-me que ele tem 26 com experiência de 50. Dela? Falaram-me que não se pergunta a idade a uma dama. Mas seu sorriso de hoje escancara que seus setenta e poucos não conseguem esconder que tem menos de 30. Amanhã, pode ser que não haja a mesma suposição. 

Essa roupa que veste a nossa eternidade é só uma materialidade que, como toda matéria, sofre as avarias do uso. O que há dentro, esse mistério que nos sustenta, não é passível de ser contado pelas voltas que o ponteiro dá no relógio. 

Novo com cabeça de velho, ancião com mente de jovem. O tempo que vem antes de nós ou como usamos o tempo que temos é que, talvez, determine quem somos ou nos tornamos. Não são quantas primaveras riscamos no calendário, mas o que fazemos de cada estação. 

Na vasta coleção de clichês de minhas crônicas, acumulo outros mais: a vida é uma aventura, cujas inércias deliberadamente conscientes não se repõem. Então não espere, porém respire. Faça o que te motiva e alimente as suas paixões, sejam quais forem. Não se julgue e nem se apegue ao receio de estar sendo observado. Na grande maioria das vezes, ninguém está atento para lhe aplaudir, tampouco vão lhe vaiar pela paralisia. Não pare, pois o vento não se recolhe — nunca.

Quanto tempo tem o seu tempo? Depende para que — responderia uma criança. Dias desses, conversava despretensiosamente com Caetano, um lindo menino de 6 aninhos. Ele me contou que está aprendendo sobre o tempo. Seria comum pensar em uma criança aprendendo sobre a lógica de que um dia tem 24 horas e cada hora 60 minutos. 

Na minha mediocridade de adulto, esperava que ele me falasse sobre isso, já prevendo que, quando encontrar com ele daqui a 4 anos, já me falará sobre a matemática do tempo para além dos minutos, os milésimos de segundo, quantos anos formam um século e milênio… 

Caetano, sagaz como é, pode ir além, pensei, e avançar para os difíceis cálculos da física quântica. Quem sabe? Não sei até onde Caetano irá nisso. Mas me surpreendeu a perspectiva dele, quando perguntei: “E o que você tem aprendido”? Disse-me ele: “Quando estou feliz o tempo passa mais rápido”. Dali em diante, entramos em uma conversa filosófica sobre a velocidade desse tal tempo sobre as coisas. 

A equação poética de que o tempo não é o mesmo para todos e nem para as diferentes formas que usamos. Nada de números, mas de sensações, emoções, sentimentos. Talvez o tempo seja mesmo o que menos importa. O que importa são as peças que montamos nele, no ritmo de nossas intensidades. E tão mobilizados e entretidos com o que estamos fazendo e vivendo, o tempo se torna tão coadjuvante, possivelmente apenas e no máximo tablado de palco para dançarmos. 

Na filosofia da vida, Caetano chegou a um lugar onde muita gente jamais chegará. Ou que chega, mas desaprende. Que Caetano, eu, você, nunca nos percamos desse achado e navegando deixemos fluir… A felicidade, o encontro, as bandeiras, o saborear, o imergir.             

Caetano tem 6 anos. Minha amiga tem 33. Aquela mulher que dá comida aos pombos na praça, suponho que tenha 60. Minha avó morreu aos 94. Minha mãe aos 52. Eu não sei com que idade encontrarei outro grande amor e que idade esse grande amor terá. O que me definirá é o tanto o quanto serei feliz com ele. Porque mais importante que ficar decifrando o tempo é responder para si mesmo: quanto posso e o que quero para o que não me interessa saber nisso que chamam de tempo? 

Afinal, quanto tempo tem o seu tempo?

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