Blog de terezamalcher_17966

Qual livro?

segunda-feira, 07 de março de 2022

Taí, esta é uma pergunta que volta e meia a gente se faz. É um questionamento que guarda um valor imenso, caso seja para dar um livro a um filho, neto ou a uma criança. Caso seja um professor. A pergunta também é pertinente para quem quer presentear alguém ou para a escolha de uma leitura pessoal.

Confesso que para mim é uma questão bem delicada, posto que a leitura pode tocar as pessoas no mais fundo das emoções. Especialmente se for criança ou jovem porque, acima de tudo, o conteúdo de um livro influencia os processos de amadurecimento pelos quais está passando.  

Taí, esta é uma pergunta que volta e meia a gente se faz. É um questionamento que guarda um valor imenso, caso seja para dar um livro a um filho, neto ou a uma criança. Caso seja um professor. A pergunta também é pertinente para quem quer presentear alguém ou para a escolha de uma leitura pessoal.

Confesso que para mim é uma questão bem delicada, posto que a leitura pode tocar as pessoas no mais fundo das emoções. Especialmente se for criança ou jovem porque, acima de tudo, o conteúdo de um livro influencia os processos de amadurecimento pelos quais está passando.  

A escolha de um livro precisa considerar aspectos diversos, a começar pelo fato de que o processo de produção literária pulsa na imaginação dos escritores que constroem textos; pulsa nos traços dos ilustradores que a recontam através de imagens ou apenas na capa e contracapa; pulsa nas telas dos diagramadores que configuram o texto nas páginas com harmonia, intercalando-o com ilustrações, no caso dos infantis; pulsa no planejamento dos editores que produzem o livro; pulsa, enfim, no leitor que decodifica o texto e reflete sobre as mensagens nele contidas. 

O leitor está no mundo concreto, vivendo e convivendo com as diversidades do existir. A cada instante se depara com questões conflitantes e instigantes. Buscando respostas, vai conhecendo a si mesmo e o outro, apreendendo o ambiente e lidando com a interminável quantidade de informações e solicitações. O fato é que somos seres de relacionamento e nos vemos através do que nos toca. 

O livro é, de fato, um objeto de consumo. Um bom presente, inclusive. Trata-se de um produto intermediário entre o leitor e a vida, a natureza e a civilização em toda sua história. 

Escritores e toda a equipe de produção editorial sentem a existência de modo particular. É essa sensibilidade que vai fazendo com que delineiem palavras, imagens e configurem o livro, um objeto de inteireza criativa e original.

 Vamos dizer, então, que quem participa do fazer do livro literário manifesta com sensibilidade um modo próprio de sentir, pensar e viver. O livro é expressão criada por artistas sobre os fatos da vida. 

Quando o leitor está entretido num livro, percebe, mesmo que de modo inconsciente, que o que vive está ali, sendo experimentado pelos personagens ou exposto no texto. É um acolhimento. Lendo, compartilha a solidão do sentimento do existir. Não é à toa que os leitores gostam de conhecer os escritores de seus livros e ver os personagens no cinema ou teatro. 

O leitor tem necessidade de falar de si, da sua visão particular que a cada dia constrói do mundo. E a literatura possibilita isto. Falando de um texto, fala também de si. Escuta outro leitor, conversa a respeito, debate temas. Interage culturalmente.

O leitor que aproveita a literatura sente no seu quotidiano o livro pulsar como um coração, até porque, independentemente da idade, ele é um eterno aprendiz. 

E, aí, meu amigo, qual livro você me daria?

 

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Soneto 27

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Shakespeare foi abençoado nas ideias que fundamentaram sua vasta e diversificada obra. Ele conseguiu abranger os meandros da existência humana, incluindo até os momentos de vigília antes do adormecer. 

Shakespeare foi abençoado nas ideias que fundamentaram sua vasta e diversificada obra. Ele conseguiu abranger os meandros da existência humana, incluindo até os momentos de vigília antes do adormecer. 

Está nas minhas mãos o livro “44 Sonetos Escolhidos: Homenagem ao Bardo, nos 450 anos de nascimento 1564-2014”, no qual a tradutora, Thereza Christina Rocque da Motta, seleciona 44 sonetos dele. O 27 se reporta ao momento em que nos deitamos, olhamos vagamente para o teto, as paredes do quarto, sem direção, na verdade, e a imaginação acaba por nos embalar, relaxando o corpo cansado.

Ei-lo.

Cansado do trabalho, corro ao leito,

Para repousar meus membros exaustos de viagem;

No entanto, inicia-se uma jornada em minha mente,

Depois que a atividade do meu corpo cessa:

Assim, meus pensamentos (vindos de muito longe)

Começam uma lenta peregrinação até onde estás,

E fazem que meus olhos sonolentos não se fechem,

Encarando o negror que os cegos veem:

Exceto que a visão imaginária de minh’alma

Traz tua sombra invisível,

Que, como uma joia suspensa no escuro,

Adorna a noite turva, a renovar seus traços.

                           Vê! Assim de dia, minhas pernas e, à noite, minha mente

   Nem por mim, nem por ti, encontram paz.

 

O poema 27 vai ao encontro a que um amigo da família, já falecido, o psiquiatra, Dr. Jadyr de Araújo Góes, dizia: a mente trabalha incessantemente durante o dia e durante a noite, de modo que nossos melhores pensamentos e ideias surgem quando dormimos. Por isso, quando temos algo a resolver e não sabemos como, é aconselhável nos deixarmos dormir. Quando acordamos, podemos vislumbrar uma solução. 

Nosso corpo é o maior aliado que temos. Muitas vezes, o usamos de forma inadequada, principalmente as nossas capacidades mentais. Infelizmente, vivemos em uma moderna cultura que nos acostuma a colocar fora de nós os melhores recursos a que podemos recorrer. Ao reconhecermos que os momentos de vigília são nobres, quando nosso pensamento vai longe, trazemos imagens da alma, fatos esquecidos, reflexões sobre o que nos sensibiliza. Ainda experimentamos um turbilhão de ideias geniais — loucas ou sensatas. São momentos em que a divindade, a saudade, a criatividade e a inteligência se misturam e nos mostram alternativas. Nos trazem o novo.

Ah, é o nosso momento furta-cor! 

 

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Contrapontos

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Ao ler o conto de Antônio Carlos Vianna, “Dona Katucha”, do seu livro de contos
“Jeito de Matar Lagartas”, Companhia das Letras, eu me deparei com algumas
questões relevantes sobre o envelhecer, a etapa da vida que evolui para a morte,
processo inevitável e implacável. É caracterizada por transformações corpóreas e
mentais degenerativas, que tocam as emoções, a cognição, a sexualidade e a
espiritualidade não somente daquele que envelhece, mas das pessoas que com ele
convivem. É contextual por mais solitário que o sujeito seja.

Ao ler o conto de Antônio Carlos Vianna, “Dona Katucha”, do seu livro de contos
“Jeito de Matar Lagartas”, Companhia das Letras, eu me deparei com algumas
questões relevantes sobre o envelhecer, a etapa da vida que evolui para a morte,
processo inevitável e implacável. É caracterizada por transformações corpóreas e
mentais degenerativas, que tocam as emoções, a cognição, a sexualidade e a
espiritualidade não somente daquele que envelhece, mas das pessoas que com ele
convivem. É contextual por mais solitário que o sujeito seja.
Dona Katucha quer se manter eternamente jovem, possuindo dificuldades em
aceitar o momento fronteiriço que está vivendo. Os anos de envelhecimento
contornam o tempo de vida e delineiam a finitude. O envelhecimento e a morte fazem
parte da vida saudável. Mas o que seria de nós caso a morte não existisse e fôssemos
eternamente adolescentes? Quanta inteligência criativa Oscar Wilde teve para
escrever “O Retrato de Dorian Gray”! Será que Antônio Carlos Vianna se inspirou nessa
obra universal e inquestionável?
Ao ler o delicado trabalho da Dra. Ana Claudia Quintana Arantes, médica
especialista em Cuidados Paliativos, em seu livro “A Morte é um Dia que Vale a Pena
Viver”, editado pela Casa da Palavra, eu me pus a refletir sobre a vida. O
envelhecimento e a morte nos remetem à vida, que é soberana nas etapas existenciais
pelas quais passamos, mesmo no momento da morte. É plena pelas incontáveis
possiblidades que temos para experimentar as circunstâncias nas quais estamos
inseridos.
As biografias! A dos que participaram, de algum modo, da construção das
civilizações, como Nelson Mandela, Charles Chaplin e Santo Agostinho. Por que
também não falar de Rita Lee? Quando o indivíduo mergulha em suas ideias e
vontades toca a vida de muitos e move seu destino pelos seus esforços e talentos. Não
é necessário nascer em berço de ouro. É preciso fortalecer os tesouros guardados em
nossas células.

Viver a vida é superar o medo de ser feliz. E de sofrer. O sofrimento e a felicidade
são dualidades intrínsecas à existência. Se as emoções são únicas, tão particulares
quanto as impressões digitais, o envelhecer é individual. Se podemos ter em mãos o
livre arbítrio, decidimos nosso modo de viver, mesmo nas situações em que não
podemos ter escolhas. Eis, portanto, a sabedoria que construímos nos anos vividos,
que nos aponta para formas de enfrentamento e superação. A inteligência e a
criatividade são nossas parceiras, embora nem sempre utilizadas.
Ah, as palavras de Rainer Maria Rilke, devem ser guardadas em mesinhas de
cabeceira para que possamos ter coragem para enfrentar a vida, em todos seus
mistérios, desafios, tristezas e maravilhas. Posto que a todo instante é preciso tomar
decisões e agir. Fazer algo. O viver sem bravura e perseverança é o mesmo que ter a
vida e não conseguir vivê-la com méritos.
O processo de viver é desencadeado pelas relações de causas e consequências. O
envelhecer é resultado de como vivemos épocas passadas, do modo como ocupamos o
espaço na família, nas comunidades, no trabalho e nas relações amorosas e sociais. A
maneira como ocupamos os espaços é essencial para o nosso equilíbrio físico,
cognitivo, emocional e espiritual. Quando o buscamos com plenitude, estamos
inteiros, dialetizando, a mente, o corpo, as emoções e a espiritualidade.
O envelhecer nos é inquietante!

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Um coro musicado por gaitas, trombones e violinos

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

Vivemos mergulhados em narrativas, em tantas que podemos confundir as nossas com as incontáveis que nos cercam. Envolvemos e somos envolvidos de modo que a nossa voz se mistura com as de num coro de vozes diversas, algumas afinadas, outras desafinadas. Às vezes, musicadas por gaitas, trombones e violinos.

Vivemos mergulhados em narrativas, em tantas que podemos confundir as nossas com as incontáveis que nos cercam. Envolvemos e somos envolvidos de modo que a nossa voz se mistura com as de num coro de vozes diversas, algumas afinadas, outras desafinadas. Às vezes, musicadas por gaitas, trombones e violinos.

Peguei o livro de Raimundo Carrero, “A Preparação do Escritor”, pensando nas vozes que me fazem ser o que sou a cada momento. O escritor é uma criatura construída por intermináveis vozes narrativas, a cada texto ele se esforça para reunir suas vozes com outras imaginadas. Na vida e na literatura somos narrados e narradores. Somos resultado de uma profunda indefinição, por isso e só por isso, buscamos elaborar narrativas genuínas. Assim, construímos nossa identidade individual. 

Quem quer ser um João Ninguém?

Fazemos magia quando construímos um texto? Talvez. O autor não é o narrador, tampouco o narrador é o autor. O autor é apenas um ser humano que tem uma ideia. Já o narrador nada mais é do que um ser ficcional, portanto inexistente, que conta a história do autor. Costura os panos das mangas. O autor tem uma ideia abstrata, o narrador a concretiza num texto. Na literatura quem conta a história é simplesmente um narrador. Mas na vida quem narra é o indivíduo; o escritor é o maior inventor e contador de histórias de todos os tempos. 

Quando lemos um livro passeamos pelo âmago do escritor, que desponta em cada página através das narrativas que conta. A voz dele é capaz de penetrar na alma do leitor. E essa voz, a do narrador, passa a fazer parte constitutiva da identidade do leitor. Como aconteceu comigo quando li “O Pequeno Príncipe”, de Saint-Exupéry. Cada leitor desvela as vozes do autor através da voz de um narrador, aquele nascido no mundo imaginário. Mas o escritor nunca vai ter acesso à voz do leitor. Quem pensa que sabe de tudo, está completamente enganado. Porque o escritor é um leitor por excelência. Pelo menos deveria ser assim. Porém a grande parte dos leitores não faz literatura. Ou seja, as narrativas estão cheias de hiatos.

Mas é verdade. O narrador é sempre o principal personagem. Seja na ficção ou na realidade, aquele que narra uma história é o protagonista do momento. Sempre. Sempre estamos cercados por narrativas emergentes da realidade e da ficção. Mesmo assim, sabemos pouco. Ou quase nada. Por incrível que possa parecer, ainda pensamos que sabemos. Há quem se diga ser o dono de verdades! 

Por sorte a imperfeição e o desafino dão ao leitor beleza estonteante. Ao escritor, a imortalidade.   

“Navegar é preciso, viver não é preciso”, só Fernando Pessoa para terminar esta coluna.

 

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Em busca da lucidez plena

segunda-feira, 07 de fevereiro de 2022

Os conceitos são relevantes para que possamos saber com o que estamos lidando, fazendo ou mesmo querendo. São concepções que definem o modo como nos posicionamos diante das situações.

No Clube de Leitura Vivências, refletindo a respeito do livro “Amores Improváveis”, de Edney Silvestre, nós nos deparamos com a palavra “criatura” e conversamos livremente sobre o que pensávamos a respeito. Particularmente, não gosto da palavra, talvez porque tenha mais consoantes do que vogais. Ou porque minha avó se referia à “criatura” quando havia algo recriminativo em alguém.

Os conceitos são relevantes para que possamos saber com o que estamos lidando, fazendo ou mesmo querendo. São concepções que definem o modo como nos posicionamos diante das situações.

No Clube de Leitura Vivências, refletindo a respeito do livro “Amores Improváveis”, de Edney Silvestre, nós nos deparamos com a palavra “criatura” e conversamos livremente sobre o que pensávamos a respeito. Particularmente, não gosto da palavra, talvez porque tenha mais consoantes do que vogais. Ou porque minha avó se referia à “criatura” quando havia algo recriminativo em alguém.

Fui cutucada pela vontade de saber como somos definidos pelos diferentes conceitos que nos dão significados. A literatura, enquanto arte da palavra, se utiliza de todos os conceitos para expor-se e cumprir seus propósitos, o que me mostra que é uma arte que harmoniza os modos como somos tomados pelas diferentes áreas da produção do conhecimento.

Mas, afinal de contas, quem somos: criatura, ser, pessoa, sujeito, indivíduo? Ou somos um somatório de ideias, como confetes coloridos que dançam ao vento antes de tombarem ao chão?

De fato, os cidadãos são seres de identidade e possuem características intrínsecas. Temos um registro de nascimento que nos nomeia, informa a data e o local onde nascemos, a paternidade e a maternidade. Somos registrados como criaturas vivas. Temos existência concreta e própria. Não somos, por conseguinte, personagens ou seres imaginados.  

Nascemos situados num contexto natural, social, econômico e cultural, somos sujeitos subordinados a condições pré-estabelecidas, que podem ser modificadas pela ação das pessoas através do tempo. A pessoa é um indivíduo único capaz de interagir e transformar. Se o sujeito é subordinado às regras e circunstâncias, sua pessoa, usando a consciência que adquire ao longo da vida, é capaz de conquistar o livre-arbítrio, na medida em que desenvolve capacidades e responsabiliza-se pelos seus atos. Por meio das experiências existenciais, aprimora seu modo individual de ser, estar e de fazer, definindo uma personalidade, tornando-se único no mundo.   

Agora algo me ocorre. A saúde é consequência do desenvolvimento das capacidades físicas e mentais que nos permitem integrar e aprimorar os conceitos que nos dão significados.

Ah, a literatura, em cada texto, tem a sabedoria de nos mostrar quem podemos ser.

O fazer desta coluna me evidencia que pensamos e desejamos tantas coisas, mas nunca podemos esquecer da nossa existência real, que se concretiza através de uma corporeidade, única dimensão constitutiva e construtiva que expressa a humanidade que temos e a vida que possuímos, através da qual fazemo-nos presente no mundo.

Desse e apenas desse modo, segundo Pierre Furter, somos seres em educação permanente, na medida em que estamos em constante processo de desenvolvimento e transformação. Vivemos num eterno despertar provocado pelas habilidades e conhecimentos que as experiências nos oferecem. Tocamos, de momento a momento, em todos os seres que abrigamos, na criatura, no indivíduo, no sujeito, na pessoa. Somos, enfim, seres em busca da lucidez plena. Como o que sucede neste instante.

Salve a literatura!

 

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Ilusão e utopia

segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Quinta-feira última, 27\01\2022, recebemos uma pérola no Clube Clássicos da Literatura, a Professora Glaucia Pereira Brito, que nos ofereceu uma palestra sobre Maria Firmina dos Reis (1822-1917), maranhense, primeira romancista brasileira,  esquecida durante décadas, cuja obra possui valor literário, histórico, cultural e social relevante.

Quinta-feira última, 27\01\2022, recebemos uma pérola no Clube Clássicos da Literatura, a Professora Glaucia Pereira Brito, que nos ofereceu uma palestra sobre Maria Firmina dos Reis (1822-1917), maranhense, primeira romancista brasileira,  esquecida durante décadas, cuja obra possui valor literário, histórico, cultural e social relevante.

Diante de uma apresentação impecável, suave e rica em detalhes a respeito da vida e da obra da escritora negra, viajamos na trajetória de uma inteligente mulher do século XIX, com uma escrita límpida, poética e reveladora da realidade brasileira da época, quando os negros, escravizados, eram prisioneiros das mais cruéis condições de sobrevivência. O Brasil está superando suas limitações para reconhecer e enaltecer a importância das contribuições que os negros trouxeram ao nosso país através do seu trabalho, suor e dor. É triste a discriminação que existe no Brasil, tradição cultural que ainda permeia a vida sobre seu solo.

Durante a exposição, falou-se rapidamente sobre a diferença nos modos com que autores constroem suas obras. Logo me reportei às primeiras aulas que assisti na universidade, quando estudei a obra do filósofo e pedagogo suíço, Pierre Furter, especialmente “Educação e Reflexão”, que tanto enriqueceu minha formação.

Depois da palestra, senti necessidade de pesquisar as diferenças entre ilusão e utopia, até porque fazem parte das nossas atividades mentais e emergem do contexto em que vivemos. As diferenças entre ambas são sutis e faz-se necessária a observação aguda dos modos de imaginar para distinguir uma da outra.

Tanto a utopia quanto a ilusão são processos criativos, porém a utopia possui a intenção de transformar a realidade concreta ao vislumbrar contextos perfeitos. Já a ilusão caminha em direção à fantasia e as representações mentais são configuradas de acordo com a realidade psíquica do sujeito. 

 As utopias tendem à permanência e são construídas como um projeto ou aspiração, enquanto a ilusão é transitória e fundamenta-se no pensamento mágico. A utopia é compromissada; a ilusão é livre. Ambas são inexistentes em sua concreticidade real e criadas através de narrativas, porém. 

A abordagem destes conceitos me aponta para estudos mais detalhados e amplos; por enquanto minhas reflexões são superficiais. Entretanto, eu me arrisco apontar para as obras de Márcia Medeiros, que nos oferece modos de ver e sentir a vida. Para o “O Pequeno Príncipe”, de Saint-Exupéry, uma obra que desvela a beleza da humanidade. Para as histórias do “O Sítio do Pica-Pau Amarelo”, de Monteiro Lobato, um retrato de época do Brasil. 

Enfim, as pessoas deste planeta azulado, a safira do sistema solar, precisam da literatura através das múltiplas ilusões e utopias, criadas pelos sonhadores que desejam uma vida melhor.

 

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A literatura tem suas brevidades

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Nova Friburgo é uma cidade literária por essência. A inspiração brota
pelos seus vales, dança entre as árvores e é iluminada pelas estrelas. A
literatura está no ar, as ideias atravessam as pessoas que aqui criam suas
raízes; a literatura faz-se diversificada em diversos estilos. Eis que,
repentinamente, em nossas terras altas, surgiram os microcontos, que vieram
pelas mãos de Catherine Beltrão. Os textos mínimos se caracterizam por
mostrar a essência das coisas, para dizer o que é inerente a uma circunstância,
a algo ou a alguém.

Nova Friburgo é uma cidade literária por essência. A inspiração brota
pelos seus vales, dança entre as árvores e é iluminada pelas estrelas. A
literatura está no ar, as ideias atravessam as pessoas que aqui criam suas
raízes; a literatura faz-se diversificada em diversos estilos. Eis que,
repentinamente, em nossas terras altas, surgiram os microcontos, que vieram
pelas mãos de Catherine Beltrão. Os textos mínimos se caracterizam por
mostrar a essência das coisas, para dizer o que é inerente a uma circunstância,
a algo ou a alguém.
Aqui vou me preocupar com os fundamentos dos microcontos e não com
a técnica de fazê-los. Interessante que, ao elaborar esta coluna, minhas
pesquisas me conduzem a reflexões inesperadas, e, hoje, comecei com uma
frase de Graciliano Ramos. “A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar, como
ouro falso: a palavra foi feita para dizer.” Pensando na amplitude do conceito
de revelar fui até a janela e observei as árvores ao redor da minha casa e, mais
uma vez, constatei que em tudo há histórias, até na pequena rama da árvore
que acolhe um ninho de passarinhos ou na lagarta prestes a entrar no casulo
para se transformar em borboleta. Ah, a vida é feita de fatos! Quando contados
são reveladores e descortinam o acontecer.
E aí, nesse estilo literário minimalista, surge o grande desafio ao escritor:
buscar a essência das coisas, descobrir a palavra que mostra o que é. Filosofia
pura. Comecei, então, a percorrer alguns caminhos teóricos e encontrei Lacan.
Somos feitos de palavras! Inclusive, apenas uma palavra pode nos definir. Ao
construirmos um texto mínimo, de alguma forma, estamos desvelando nossas
palavras primeiras. As essenciais. Eu sou.
Escrever é um ato de coragem e sensibilidade. Reiner Maria Rilke disse
que é preciso buscar na alma as ideias. Na verdade, as histórias são contadas
com brevidade, não precisam de rococós. Por isso, talvez, os contos mínimos
retratem a inteligência dos sábios, aqueles que conseguem descrever em
poucas palavras, sob um ponto de vista, a realidade dos fatos; sempre
histórica.

Acredito que se façam microcontos em qualquer lugar, até na cadeira do
dentista, desde que a sensibilidade e a percepção do essencial sejam
captadas, quando o escritor possa ser capaz de retirar os excessos encruados
na ideia primeira. É um estilo literário de brevidade estonteante em que o texto
se desapega do supérfluo e do extravagante, detendo-se na simplicidade e na
sutileza. Na espiritualidade.
As histórias são baseadas nos fatos, porém são imateriais por excelência.
Estão numa dimensão em que a busca pelo significado das coisas acaba por
se conectar com os sentimentos e valores universais.
Para finalizar, arrisco meu primeiro nanoconto. Quando terminei de
escrever, encontrei Deus.

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Eles gostam de ler!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Sim, senhores, as crianças e os jovens gostam de ler!
Fiz, mais uma vez, esta constatação ao desenvolver uma oficina na
Biblioteca do SESC para um grupo de jovens, quando abordei a relação do
autor com o leitor, o processo criativo da escrita e os benefícios que a leitura
oferece.
Foi uma atividade agradável e todos demonstraram interesse. Ao longo
da oficina, observei que alguns participantes do grupo liam mais de um livro por
vez, como também a maioria conhecia os autores citados pelos colegas.

Sim, senhores, as crianças e os jovens gostam de ler!
Fiz, mais uma vez, esta constatação ao desenvolver uma oficina na
Biblioteca do SESC para um grupo de jovens, quando abordei a relação do
autor com o leitor, o processo criativo da escrita e os benefícios que a leitura
oferece.
Foi uma atividade agradável e todos demonstraram interesse. Ao longo
da oficina, observei que alguns participantes do grupo liam mais de um livro por
vez, como também a maioria conhecia os autores citados pelos colegas.
Alguns tinham orgulho de falar sobre o livro preferido e ficavam animados
quando havia outro colega que já o tinha lido. E o debate ia longe. As meninas
tinham preferência por romances; os meninos, por aventuras.
Além do mais, consideraram importante a leitura dos clássicos, inclusive
um deles assumiu o compromisso de buscá-los. Logo, os demais concordaram.
Que beleza!
Percebi que eles falavam com desenvoltura e não cometiam erros de
Português. Ao terminar o trabalho, tive uma sensação de alegria misturada com
paz ao ver um pedacinho do nosso Brasil querendo cultura e conhecer mais
sobre o mundo e a vida. Foi um momento de esperança.
A criança e o jovem querem ter acesso ao livro. Quando têm um livro
aberto na frente dos olhos, sentem o prazer de ler, querem conhecer a obra do
autor e o próprio.
Mas o acesso ao livro, na maioria das vezes, não é fácil. E quem pode
oferecê-lo? A família, a escola, o governo, clubes, associações. Enfim, há
âmbitos da sociedade que podem fazê-lo. Mesmo assim, o acesso é pequeno,
ainda pouco valorizado.
Noutro dia, conversando com uma vizinha que tinha um bebê, soube que
ela já estava fazendo uma biblioteca para a filha. O melhor estímulo que uma
criança pode ter para ler é conviver com a leitura em casa, vendo os pais
lendo, conversando a respeito e reconhecendo o valor dos livros.
Conheci, certa vez, a Jurema ou a Ju, uma bibliotecária. Muito ativa e
criativa, ela fez de uma pequenina sala o melhor espaço da escola; um lugar
gostoso de estar, instigante e cheio de novidades, aonde os alunos iam com

prazer, gostavam das atividades que ali eram realizadas e falavam da Ju com
sorrisos e os olhos brilhando.
Quando se quer, há meios de oferecer o livro ao leitor infantil e juvenil.
Eles, por sua vez, sabem fazer bom uso da leitura.
Pois é...

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Novos tempos para a AFL

segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

A Academia Friburguense de Letras, Casa de Salusse, lugar de literatura,
ideias e convivência, ganha, em 2022, ares renovadores: novos acadêmicos e
diretoria. A diretoria será representada por Maria Janaína Botelho Corrêa,
Presidente; Wander Lourenço, Vice-Presidente; Alfredo José Henrique, Diretor
Cultural; e Irapuã Guimarães, Secretário. O Conselho Fiscal será composto por
mim, Ordilei Alves da Costa e Catherine Beltrão. Os novos acadêmicos são
Juçara Valverde, Alfredo José Henrique e Catherine Beltrão. Ainda tem a

A Academia Friburguense de Letras, Casa de Salusse, lugar de literatura,
ideias e convivência, ganha, em 2022, ares renovadores: novos acadêmicos e
diretoria. A diretoria será representada por Maria Janaína Botelho Corrêa,
Presidente; Wander Lourenço, Vice-Presidente; Alfredo José Henrique, Diretor
Cultural; e Irapuã Guimarães, Secretário. O Conselho Fiscal será composto por
mim, Ordilei Alves da Costa e Catherine Beltrão. Os novos acadêmicos são
Juçara Valverde, Alfredo José Henrique e Catherine Beltrão. Ainda tem a
alegria de acolher a jovem Camilla Poubel para o Anexo Jovem.
A cerimônia teve a honra de receber o Prefeito de Nova Friburgo, Johnny
Maycon, os representantes da Banda Euterpe Friburguense, Jorge Carvalho,
da Secretaria de Educação, Márcia Machado, e da Acianf, Roosevelt Consy.
É bom renovar, encher a Academia de propostas e abrir outras janelas.
Mas não podemos esquecer dos esforços da diretoria anterior, que, num
período de recesso forçado pela pandemia, cuidou de estruturar melhor sua
sede através de melhorias realizadas pelo Presidente Robério José Canto,
como o conserto do telhado, pintura interna e recuperação da entrada. Nossa
Casa não ficou literariamente adormecida, reuniu as poesias do seu patrono no
livro “Cisnes e outros poemas de Julio Salusse”. Além de realizar palestras de
cunho literário e histórico.
A AFL, aos 74 anos, está viva, com luzes acesas e portas abertas, o que
nos impulsiona a fazer mais, atrair pessoas que gostam de guardar palavras e
ampliar a cultura literária nesta cidade. Nova Friburgo, logo depois que foi
criada, já emanou tendências literárias. Além de ser lugar festivo e cultural,
desde seus remotos tempos, de acordo com as pesquisas da atual presidente,
em seu discurso, foi enriquecida pelos clubes literários, como o Club Minerva,
fundado em 1891, bem pelos periódicos, como o Beija-Flor, criado em 1895,
que publicava poesias, contos e comentários sobre eventos culturais da cidade.
A AFL, situada à Praça Presidente Getúlio Vargas e guardada por leões,
está diante de mais um biênio com tarefas importantes a realizar.

Faço questão de terminar esta coluna abraçando nossos antecessores
porque, hoje, tudo o que há e acontece entre suas paredes é fruto do trabalho
e dos esforços daqueles se dedicaram à causa literária em Nova Friburgo e
que construíram uma Casa para guardar escritores e amantes das letras.
Parabéns, Academia Friburguense de Letras!
Nós amamos você.

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Tempo de guardar e ser guardado

segunda-feira, 03 de janeiro de 2022

 

Guardar

Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro
Do que um pássaro sem voos.

 

Guardar

Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro
Do que um pássaro sem voos.

Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:

Para guardá-lo:

Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.

Gosto desse poema de Antônio Cícero. Gosto de guardá-lo em meus
pensamentos e, sempre quando olho ou toco algo que me sensibiliza, recito-o
baixinho, só para escutar. É bom resguardar o que nos enriquece ou que nos
faz ser o que somos. São bens que não podem ser esquecidos ou perdidos.
Está sobre minha escrivaninha um peso que era da Dona Lourdes, uma
vizinha a quem estimava e que faleceu com quase cem anos. Sua filha, Leda,
pediu para que eu escolhesse algo da casa da mãe para guardar de
recordação. Escolhi um peso de vidro com flores desenhadas ao fundo, na
certeza de que a energia da Dona Lourdes me iluminaria quando estivesse
produzindo textos ou fazendo qualquer outra coisa. Ela me incentivava nas
conversas quando tomávamos um cafezinho com bolo ou biscoito em sua sala.

Sempre que conversávamos, admirava sua firmeza de opinião, inteligência e
consideração pelas pessoas. Ah, eu era uma delas.
Guardo em vários cantos do meu quarto os bilhetes que recebi da
mamãe, da minha filha e de amigos. Enquadrei alguns, como um que escrevi
para mamãe, quando tinha oito anos, em que lhe ofereci meu coração de
criança. E da minha filha em que me deseja amor. Um está do lado do outro,
bem na minha frente.
Estou cercada de guardados!
Assim, movendo meu olhar entre minhas relíquias, espero que em 2022
possamos cuidar dos nossos guardados e fazer tantos outros. E sermos
guardados pelos 360 dias que vão nos acolher.

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