A literatura e as terras sinistras da Romênia

Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Lendo o jornal A Relíquia, um informativo dos antiquários, leiloeiros, galeristas e colecionadores, em que são publicadas interessantes matérias sobre artes, eu me senti motivada a escrever sobre o papel da crueldade nos romances e contos de ficção. A edição de número 305 traz um breve ensaio sobre o Castelo de Poenari, onde o príncipe Vlad Tepes viveu no século XV, brutal governante da Valáquia, que inspirou o irlandês Bram Stoker, a criar o aterrorizante romance “O Conde Drácula” no século XIX.

Apesar de ser um assunto que até me incomoda pesquisar e escrever, é relevante por ser o personagem vilão com maior número de aparições na mídia, como também é fonte de inspiração de outros personagens, como o Lobisomem, por exemplo. A história do Conde Drácula, instigante, envolvente e assustadora, impacta a todos por ter sido tão bem construída que chega a criar a impressão de que existe na realidade. É importante ressaltar que a obra compõe a literatura universal.

Mas a questão a que trago aqui são as razões pelas quais a crueldade impulsiona a ficção dado que, nas obras literárias, o enredo causa suspense quando é contraposto com a bondade através das relações de causa e efeito. A crueldade abrange palavras e ações que ameaçam e causam sofrimento em outra pessoa. Tem origem na ausência de sentimentos de estima, respeito e de valores éticos, bem como na sensação de prazer em causar medo e dor alheia.  O herói na literatura é o personagem que enfrenta os desafios impostos por um vilão, pela natureza ou pelas tragédias inesperadas que o surpreende. Ao vencer o mal ou as dificuldades, preenche os vazios do leitor, empondera-o, fazendo-o refletir a respeito do enfrentamento dos impedimentos que a vida lhe apresenta.  

A ficção explora o pensamento maniqueísta que se define na contraposição entre o bem e o mal. Nesse universo imaginário a crueldade não tem limites, muito menos as possibilidades de o herói em defrontar-se com o perigo. O vilão e o herói coexistem no limiar entre a fantasia e a realidade, uma vez que se situam no desejo inconsciente de o leitor salvar o mundo, de proteger as pessoas e a si, além de fortalecer as capacidades pessoais. As sociedades cultivam mitos e lendas que confrontam o herói com os fatos ou vilões porque o ser humano precisa imaginar a presença de heróis na vida quotidiana como forma de buscar o melhor da experiência existencial. A identidade com os heróis literários decorre da fantasia da perfeição que inspira a sensação de completude. 

Para as crianças e os jovens os heróis exercem a função de ensinar valores como responsabilidade, altruísmo, trabalho em equipe, coragem, cuidar das pessoas, dos animais e da natureza, respeito, amizade, justiça, valor do ser humano, dentre outras.

O Conde Drácula nos traz questões a serem refletidas, como o perigo da sedução, a importância de manter a calma diante do perigo e pensar antes de agir, uma vez que as decisões impensadas podem trazer arrependimentos. Acima de tudo, o mal existe e pode estar bem ao nosso lado e é preciso, por conseguinte, ter cuidado com estranhos. 

Para finalizar, ressalto uma ideia que me tocou: às vezes o mundo não precisa de mais um herói; às vezes o que ele precisa é de um monstro!

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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