Blog de terezamalcher_17966

2023 e o Aleph

segunda-feira, 02 de janeiro de 2023

Quando escrevi a coluna sobre os escritores cegos, na qual me referi ao escritor argentino Jorge Luis Borges (1899 – 1986), uma vontade inquieta de conhecer sua obra tomou conta de mim. Busquei o livro de contos, “O Aleph”, considerado uma das maiores obras literárias do Ocidente. Recorrendo a uma literatura fantástica, o livro, publicado em 1949, tem a grandiosidade e a complexidade literária esculpida por um gênio. Com uma cultura universal admirável, Borges está no rol dos autores mais importantes do século XX.

Quando escrevi a coluna sobre os escritores cegos, na qual me referi ao escritor argentino Jorge Luis Borges (1899 – 1986), uma vontade inquieta de conhecer sua obra tomou conta de mim. Busquei o livro de contos, “O Aleph”, considerado uma das maiores obras literárias do Ocidente. Recorrendo a uma literatura fantástica, o livro, publicado em 1949, tem a grandiosidade e a complexidade literária esculpida por um gênio. Com uma cultura universal admirável, Borges está no rol dos autores mais importantes do século XX.

Ele adentra no âmago dos personagens e dos fatos de modo a fazer com que o leitor perceba e sinta a história, cheia de peripécias, contrastes e embates, com plenitude. Com maestria, retrata o movimento dos fatos e dos personagens, motivando a reflexão sobre diferentes pontos de vista, na medida em que realça as incertezas, as incongruências, os embates, os ciclos da vida e da natureza em suas narrativas.

Para compreender os textos, tive que relê-los algumas vezes. Quando conseguia interpretá-los, eu me maravilhava, preenchia os hiatos da minha vida com as ideias expostas, mesmo que extravagantes, e abria outras fendas dado que suas ideias tinham o poder de enfraquecer algumas convicções. Cada frase me oferecia um campo aberto para a análise de questões importantes, que todos nós precisamos fazer para ter ciência das coisas. Quem é o herói? Quem é o traidor? Será o herói o maior traidor da história?

Diante de Borges, meu olhar é inocente, apequenado e infantil!

Em o conto “O Aleph”, o personagem tem o privilégio de se defrontar com o espaço cósmico, um lugar onde estão todos os lugares, vistos de todos os ângulos, através de um ponto de dois ou três centímetros, situado no 19º. degrau de uma escada, no porão de uma casa velha. O espaço, como a lâmina do espelho, mostrava infinitas coisas e que lhe permitia ver claramente todos os pontos do universo, como o mar, as multidões, a rua Soles com as mesmas lajotas de 30 anos atrás, um câncer no peito, cavalos, jardins-de-inverno, todas as formigas, cartas obscenas, as vísceras e o rosto do personagem. E muito mais. 

Naquele instante, clarividente e imaginário, quase louco, o personagem tomava conhecimento do mundo exterior e interior por inteiro. Um momento implacável que lhe permitiu o mais profundo encontro com a natureza de todas as coisas. Inclusive com a dele próprio.

Quem pode ver o Aleph?

Estará numa pedra? No teto? Na tampa de uma caneta?

Será um privilégio, uma aptidão ou uma vontade de encontrar o Aleph e adentrá-lo sem cerimônia. Só quem está vivo pode vivenciar tal momento sublime e de interação plena, de reconstrução da identidade individual, tornando-a integrada e integral, a parte mais e menos significativa de um todo maior. 

Em 2023, a pessoa, depois de se deparar com o Aleph, quem será e como viverá o ano?

“Quero acrescentar duas observações: uma, sobre a natureza do Aleph; outra sobre o nome dele. Como se sabe, essa é a primeira letra do alfabeto da língua sagrada. Sua aplicação ao centro da minha história não parece casual. Para a cabala, a letra significa o Em Soph, a iluminada e pura divindade; também se disse que tem a forma de um homem que aponta para o céu e para a terra, indicando que o mundo inferior é espelho e o mapa do superior; para Mengenlehre, é o símbolo dos números transfinitos, em que o todo não é maior do que uma das partes.” (Jorge Luis Borges)

 

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É tempo de finalizar o ano

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Aqui vou colocar meu afeto nas linhas desta coluna como forma de abraçar os leitores do jornal A Voz da Serra e todos aqueles que trabalham para produzi-lo. Há palavras que guardamos para expressar esse momento de finalização, de um tempo em que vivemos com intensidade. O ano de 2022 foi especial tanto quanto os que já vivemos, com desafios, conquistas, perdas e ganhos. A grande vitória desses dias finais é que podemos estar aqui para verbalizar nossos sentimentos e desejos.

Aqui vou colocar meu afeto nas linhas desta coluna como forma de abraçar os leitores do jornal A Voz da Serra e todos aqueles que trabalham para produzi-lo. Há palavras que guardamos para expressar esse momento de finalização, de um tempo em que vivemos com intensidade. O ano de 2022 foi especial tanto quanto os que já vivemos, com desafios, conquistas, perdas e ganhos. A grande vitória desses dias finais é que podemos estar aqui para verbalizar nossos sentimentos e desejos. Penso que a melhor vontade que agora posso ter é, apenas, querer estar no final de 2023, escrevendo uma mensagem para 2024 e reconhecendo que fiz o que me foi possível realizar. O grande trunfo que poderemos esperar dos dias que estão por vir são rotinas movimentadas, construídas com inteligência e vigor. 

Estamos nos trilhos da existência, que, através do sentir, pensar e fazer, vão nos transformando em pessoas melhores. Pelo menos é o que esperamos para nós, para quem nos rodeia e para os demais.

Somos resultantes das forças do universo, da divindade da vida e do desejo individual, enquanto seiva que corre em nossas veias, nas águas dos rios e oceanos, na terra que nos sustenta. É preciso prosseguir para viver o dia seguinte, admirar os nasceres e pores do sol. É preciso saber que vamos recomeçar todos os dias preparados para ler as entrelinhas dos fatos e saber como agir. 

Viver é desejar e realizar, enquanto dinâmica constante da força que nos energiza. É ter coragem para agradecer, dignidade para respeitar o que nos é diferente, amar o próximo sem pieguismos. É ter coragem para perdoar, inclusive e principalmente, a nós mesmos.

Que 2023 seja um tempo a ser vivido com criatividade e genuinidade.

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O poeta cancioneiro

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Na semana passada, nos momentos de solitude, passeando pelo YouTube, me deparei, sem querer, com a história de um rei, Roberto Carlos. Repentinamente, me vi cercada por recordações e pude matar só um pouco das saudades da minha adolescência, do tempo em que sonhar era o passaporte para o futuro. Revi tantos momentos em que as paixões dos primeiros amores tomaram conta de mim, das festas de vitrolas e discos de vinil, dos primeiros sapatos de salto alto, especialmente um de verniz preto e branco.

Na semana passada, nos momentos de solitude, passeando pelo YouTube, me deparei, sem querer, com a história de um rei, Roberto Carlos. Repentinamente, me vi cercada por recordações e pude matar só um pouco das saudades da minha adolescência, do tempo em que sonhar era o passaporte para o futuro. Revi tantos momentos em que as paixões dos primeiros amores tomaram conta de mim, das festas de vitrolas e discos de vinil, dos primeiros sapatos de salto alto, especialmente um de verniz preto e branco. Adentrei a noite e a madrugada impregnada de lembranças, amanheci flutuando sobre um tempo que gostei de viver.

“Para poder lhe explicar\Como é grande meu amor por você\Nem mesmo o céu e as estrelas\Nem mesmo o mar e o infinito\Nada é maior que o meu amor\Nem mais bonito” (Como é Grande o Meu amor Por Você, Roberto Carlos, 1967) 

Certamente a parceira com o Tremendão, Erasmo Carlos, me enterneceu pela empatia que sentiam um pelo outro, através da relação feita pela sintonia poética e musical que construíram a partir de uma história de amizade, inspiração e musicalidade. A poesia permeou a criatividade com que compuseram tantas músicas que se tornaram populares e marcaram época.  

“Você meu amigo de fé, meu irmão camarada\Amigo de tantos caminhos e tantas jornadas\Cabeça de homem mas o coração de menino\Aquele que está ao meu lado em qualquer caminhada” (Amigo, Roberto Carlos e Erasmo Carlos,1977)

Ao assistir a biografia Roberto Carlos em vários vídeos, constatei que ele vê a vida, desde criança, com os olhos sensíveis de um artista capaz de transpor as emoções para letras e acordes musicais. Os caminhos desse poeta cancioneiro, a maioria em parceira com Erasmo Carlos, contam histórias românticas, cheias de afeto e sensibilidade para falar dos mais fatos simples da rotina. Mas quem já não experimentou sentimentos amorosos, que contagiaram os pensamentos diários, expressos em tudo o que fez?  

“Detalhes tão pequenos de nós dois\ São coisas muito grandes pra esquecer\ E a toda hora vão estar presentes\Você vai ver ”(Detalhes, Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1971)

A vida trouxe grandes desafios para o nosso “Rei”, mas sua trajetória existencial nos mostra entusiasmo e determinação para fazer seu destino prosseguir de forma digna, produtiva e bela. 

“Cubra-me com seu manto de amor\Guarda-me na paz desse olhar\cura-me as feridas e a dor me faz suportar\Que as pedras do meu caminho\Meus pés suportem pisar\mesmo ferido de espinhos me ajude a passar” (Senhora, Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1993).

Ele contou sua vida através das letras das músicas que compôs, de modo que seus pais, amores, filhos e amigos, bem como situações vividas foram evidenciadas de modo emocionante. Inclusive sua religiosidade foi retratada com devoção. Ele precisou ir além da experiência, pois, enquanto poeta, apenas o viver não lhe bastou; seu modo de sentir é vasto e forte, capaz de extrapolar os limites sensoriais, racionais e corporais.  Para nossa sorte, Roberto não guardou para si os ruídos da alma, mostrou-nos como a plenitude do afeto é infinita, e, assim sendo, foi-lhe insuportável silenciar. 

Por falar nele, vamos tomar sorvete!

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Histórias de família

segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

Basta-me um pequeno gesto

Feito de longe e de leve,

Para que venhas comigo

E eu para sempre te leve.

                                                                           Cecília Meireles

Basta-me um pequeno gesto

Feito de longe e de leve,

Para que venhas comigo

E eu para sempre te leve.

                                                                           Cecília Meireles

Fiz questão de colocar um vestido bonito para me reunir com minha família. Foi um almoço cheio de lembranças e conversas. Estávamos minha mãe, minha irmã, minha prima e uma amiga, filha de amigos dos meus avós e tios. Elos afetivos nos faziam pinçar pedaços de afetos que ficaram no tempo, nunca esquecidos. Aquele momento poderia ser uma inspiração a um romance que seria iniciado no final do século XIX com a chegada de Augusto Pinto Reis no Brasil. 

Tantas histórias atravessam séculos, como o romance “O Tempo e o Vento”, de Érico Veríssimo. Aliás, as trajetórias familiares são essencialmente históricas, cujos personagens, digamos assim, protagonizaram transformações na vida coletiva, a partir dos seus sonhos, necessidades e realizações. As famílias habitam nas dimensões temporal e geográfica, que vão sendo transformadas pelo homem com o passar dos anos. 

Não é de hoje que os refugiados deixam marcas na história das civilizações. Acredito que a maioria das pessoas da minha geração é descendente dos milhares que saíram dos seus países de origem e veio para o Brasil por temor, perseguição ou vontade de buscar um lugar melhor para construir a vida. Graciliano Ramos retratou esse fato com veracidade e contundência em “Vidas Secas”. 

Minha família materna começou com a fuga do meu bisavô, ainda menino, de Braga, norte de Portugal. Ele se fez nas terras brasileiras com suor e disposição, começando como varredor de ruas, lojas e casas. Com trabalho, persistência e esperança construiu um curtume, casou-se, fez família, teve filhos, netos e bisnetos. Teve uma casa fértil e movimentada. Sou da terceira geração e participo da transformação do mundo escrevendo. Minha avó Carmem era professora de canto e ensinou vários artistas, como Bibi Ferreira. Minha madrinha, Mandinha, irmã da vovó, cuidou da família com esmero e casou-se com um construtor que colaborou com a transformação da cidade do Rio de Janeiro. Meu tio-avô Sílvio, também engenheiro, foi um calculista respeitado da época. Minha mãe, Lia, foi bibliotecária e arquivista e esteve à frente da construção do Arquivo Municipal da Cidade do Rio de Janeiro, além de ter trabalhado anos e anos como bibliotecária. Minha irmã, Lygia, é uma advogada atuante. Minha prima, Beth, e a amiga, Tota, também advogadas, porém não advogam mais. Cada um de nós se entrelaçou com a vida de um modo e deu continuidade ao que Augusto Pinto Reis iniciou.

Sou entre flor e nuvem,

estrela e mar. Por que

havemos de ser unicamente humanos, limitados em chorar?

Não encontro caminhos fáceis

de andar. Meu rosto vário

desorienta as firmes pedras

que não sabem de água e de ar.

                                                   Cecília Meireles

Durante o almoço, as histórias da família iam e voltavam, passeavam entre as conversas que visitaram os momentos, as pessoas e as casas que abrigaram a família, onde, todas nós, de alguma forma moramos ou frequentamos. Nossa família foi e é afetuosa e entre seus braços fomos e somos acolhidos. Passamos por momentos difíceis e perdas, houve desacordos e desentendimentos, mas nos foi ensinado a não perder o brilho nos olhos.

A nossa família não se difere, acredito, de milhares de outras. São essas histórias que construíram o Brasil, as Américas e o mundo. Tenho orgulho dos meus antepassados, não somente pelo que fizeram, mas pelo amor e determinação que nos mostraram o valor de dar prosseguimento à vida. 

Eu canto porque o instante existe e a minha vida está completa. Não sou alegre nem sou triste: sou poeta.

                                                              Cecília Meireles

 

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A literatura científica

segunda-feira, 05 de dezembro de 2022

Ao elaborar minha dissertação de Mestrado na PUC-RJ, “A 4ª. e a 5ª. séries do primeiro grau: uma passagem refletida pelos diretores de escolas”, minha orientadora, Menga Ludke, me devolvia o que escrevia com correções incontáveis, que me sugeriam reescrever o texto com mais clareza, objetividade e veracidade. Foram muitas revisões. A cada argumentação que eu apresentava tinha de fundamentá-la com estudos já realizados por autores considerados no meio acadêmico.

Ao elaborar minha dissertação de Mestrado na PUC-RJ, “A 4ª. e a 5ª. séries do primeiro grau: uma passagem refletida pelos diretores de escolas”, minha orientadora, Menga Ludke, me devolvia o que escrevia com correções incontáveis, que me sugeriam reescrever o texto com mais clareza, objetividade e veracidade. Foram muitas revisões. A cada argumentação que eu apresentava tinha de fundamentá-la com estudos já realizados por autores considerados no meio acadêmico. Pesquisei sobre as relações de poder na escola junto aos diretores de escolas públicas e particulares através de entrevistas, utilizando o Survey, técnica de coleta de dados. Busquei leituras em textos atuais e passados, estudei a formação do povo brasileiro e a história da educação desde o período jesuítico. Dentre outras fontes teóricas, pesquisei a Constituição atual e as passadas. Escrevi minha dissertação na biblioteca, mergulhada em livros e cercada de correções durante dois anos de trabalho exaustivo, depois de cumprir vinte e quatro créditos em aulas teóricas, não podendo tirar nota abaixo de oito, pois tinha bolsa de estudos. Enfim, apresentei a dissertação em 1989 para uma banca formada pela minha orientadora e dois professores. Fui aprovada por unanimidade. Mas ainda tive que fazer melhorias no texto para que fosse publicada. 

Foi naquele período que comecei a aprender a escrever. As correções da minha orientadora, apesar de me incomodarem e causarem desânimo, me fizeram entender que escrever não é uma tarefa fácil. É desafiadora porque ao mesmo tempo em que se quer dizer algo, é preciso escrever para que outra pessoa possa entender o conteúdo, sentir respeito pelo trabalho e vontade de continuar lendo. Aprendi que não se produz um texto para si. Escreve-se para sensibilizar pessoas que não se conhece e colaborar para a melhoria da vida.

Nesta dissertação tive a primeira experiência com o fazer literário, cuidando da elaboração da narrativa e do emprego das palavras, e aprendendo a realizar pesquisas em fontes fidedignas para não apresentar falsas afirmações. E, acima de tudo, busquei a delicada arte de transpor minhas ideias para o papel.

A literatura científica é composta por textos que têm a finalidade de apresentar informações objetivas sobre pesquisas em várias áreas da produção do conhecimento. É uma literatura que é necessariamente publicada em livros e revistas especializadas, sendo disponibilizada aos professores, alunos e profissionais que buscam informações formais baseadas na pesquisa científica.  É uma produção textual que avança sobre a literatura já existente na medida em que acrescenta conhecimentos aos estudos já realizados, permitindo a evolução do saber nas áreas humanas, ecológicas, geográficas, tecnológicas, exatas, astronômicas, médicas, dentre outras.

São textos fundamentados em bases na experiência, através da coleta de dados criteriosa e fontes bibliográficas produzidas em diferentes lugares e épocas do planeta. Atualmente os sites da internet oferecem aos pesquisadores mananciais de informações, porém nem todos merecem confiabilidade; é preciso investigar a veracidade dos conteúdos.

Quando se fala em literatura, pensa-se em poesias, contos, romances, crônicas, até em narrativas jornalísticas. Mas, confesso, que nunca ouvi referências a respeito do valor da literatura científica no meio literário em que frequento. É uma literatura que sustenta o avanço das ciências, o trabalho minucioso dos cientistas, produtores do saber consistente, objetivo e fundamentado.  

E, por que fica tão esquecida nos meios literários?

Será que o conhecimento empírico se sobrepõe ao científico?

Até que ponto os sentimento, as divagações, os sonhos se tornam mais relevantes do que o saber construído em bases formais?

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Até os dedos dos pés têm seus conflitos

segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Ao avaliar os textos que Nívea Maria Dutra Pacheco enviou à Academia Friburguense de Letras no intuito de tornar-se acadêmica, eu me deparei com uma questão que faz parte do quotidiano, o conflito. Em seu artigo “Mediação de Conflitos, Um Novo Paradigma, in Direito”, publicado na coletânea, “Cidadania e Processo”, editado em 2015 pela Editar, comecei a refletir sobre o assunto, especialmente do modo como lidamos com ele na vida diária.

Ao avaliar os textos que Nívea Maria Dutra Pacheco enviou à Academia Friburguense de Letras no intuito de tornar-se acadêmica, eu me deparei com uma questão que faz parte do quotidiano, o conflito. Em seu artigo “Mediação de Conflitos, Um Novo Paradigma, in Direito”, publicado na coletânea, “Cidadania e Processo”, editado em 2015 pela Editar, comecei a refletir sobre o assunto, especialmente do modo como lidamos com ele na vida diária. Como sou formada em pedagogia e minha visão de mundo tende ao pensamento explicativo e conceitual da filosofia, vi nesse artigo uma praticidade com a qual não estou habituada a refletir. O conflito tem de ser resolvido!

Cá para nós, estamos cercados de visões diferentes, como a religiosa, a psicológica, a social, a geográfica. Cada campo aborda o conflito de um modo particular. Por sua vez, a literatura abraça todas. E, nós, meros viventes mortais, estamos enrolados com conflitos diversos. Inclusive, até os dedos dos pés, volta e meia, são prejudicados por estarem em desarmonia com sapatos, pisos e pés de móveis. Pobre mindinho!

Os conflitos podem ser compreendidos a partir de formas distintas de interpretar os interesses divergentes, a legitimidade dos modos de pensar e agir. As disputas de posse não tomam conta dos quartos em que duas crianças ou mais compartilham? Enfim. O conflito é necessário e faz parte da nossa vida. Emerge da adversidade e implica no prejuízo de uma ou mais partes envolvidas. Faz parte do processo dinâmico da interação humana, isto é, entre indivíduos, grupos, organizações e coletividade. 

O desenvolvimento, seja individual, coletivo, institucional ou familiar, está relacionado aos modos como as questões adversas são negociadas, e a ideia de cooperação ganha importância suprema. Até nos nossos conflitos pessoais podemos contribuir ou não para que sejam resolvidos. Ah, como tem gente que emperra e dificulta as situações! Nas circunstâncias mais simples, como situações relacionadas à vizinhança. Os conflitos exigem atenção e tratamento objetivo. A vida é rápida demais para que fiquemos tropeçando na mesma pedra.

Todas as pessoas envolvidas nos conflitos têm responsabilidade diante do problema. Ninguém é ingênuo e vítima, não há vencedores e perdedores. Todos coexistem na situação problemática que necessita de uma solução inteligente e eficiente entre as partes. O diálogo e o acordo são vantajosos para os implicados. 

O artigo da Nívea assinala que vivemos numa cultura que alimenta o litígio, que estende as situações pendentes e não resolvidas. E não é verdade que existe uma dificuldade imensa na praticidade das soluções? Entretanto, a ética, os princípios que orientam o comportamento humano e refletem as normas, os valores e os direitos do cidadão, não podem estar ausentes das formas como as soluções dos conflitos serão buscadas e definidas. 

  Para finalizar, deixo uma frase de Daisaku Ikeda, 1928, mestre budista: “Obviamente, desde que somos seres humanos, eternamente existirão algumas espécies de conflitos, rivalidades ou mesmo divergência de opiniões. Entretanto, terminantemente, jamais haverá necessidade de nutrirem-se de ódio ou mesmo matarem-se uns aos outros.”

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Conta uma história para mim!

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

A vida nos apresenta situações inesperadas e de ternura especial. Fui, na semana passada, depois do inverno gélido de Nova Friburgo, surpreendida ou presenteada por uma dessas situações, quando minha mãe, com 91 anos, veio passar uns dias comigo. Decidi ficar ao lado dela como se estivesse no seu marsúpio. Assim, conversávamos, víamos filmes e ficávamos em silêncio, um silêncio carregado de lembranças, afeto e vontade de aproveitar aqueles momentos que, para nós, tinham preciosidades. Foram dez dias de mãe e filha, cheios de confidências e afagos.

A vida nos apresenta situações inesperadas e de ternura especial. Fui, na semana passada, depois do inverno gélido de Nova Friburgo, surpreendida ou presenteada por uma dessas situações, quando minha mãe, com 91 anos, veio passar uns dias comigo. Decidi ficar ao lado dela como se estivesse no seu marsúpio. Assim, conversávamos, víamos filmes e ficávamos em silêncio, um silêncio carregado de lembranças, afeto e vontade de aproveitar aqueles momentos que, para nós, tinham preciosidades. Foram dez dias de mãe e filha, cheios de confidências e afagos.

Numa noite, ao me despedir dela, eu me deitei ao seu lado e vi que ela estava lendo “Mais de 100 Histórias Maravilhosas” da Marina Colasanti. Mamãe é uma leitora compulsiva, daquelas não conseguem ficar sem ler. Como tinha acabado de ler a mais recente obra da Marina, perguntou-me se eu tinha outro livro dela. Peguei uma coletânea de contos infantis, um pouco em dúvida, achando que não iria despertar o seu interesse. E, como eu não esperava, dona Lia, pôs-se a lê-lo, com o mesmo empenho de um suspense ou romance. Mas compreendi sua atitude, pois os contos possuem qualidade literária inquestionável. 

Fiquei bem satisfeita ao vê-la adentrar no universo imaginário infantil. Qual adulto ou pessoa de idade avançada que não guarda a criança que foi? Então, também como uma criança de oito anos, pedi baixinho para que lesse uma história para mim. Mamãe me olhou um pouco sorridente, mas com um estranhamento no semblante. Eu ler para você? Que ideia! Fiz sim com a cabeça. Então, mamãe, folheou o livro e começou a ler “Bela, das Brancas Mãos”. Fechei os olhos e me pus a escutá-la em todas as suas palavras, em suas pausas, em toda a sua respiração. Eu, aos 69 anos, escutando minha mãe ler um conto de fadas para mim em voz alta, senti a divindade tomar conta do quarto. Era o melhor pedaço do mundo que nos abraçava. Tive a impressão de que o tempo passou mais devagar, apenas para que pudéssemos levar aquele momento para a eternidade. 

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A literatura e as terras sinistras da Romênia

segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Lendo o jornal A Relíquia, um informativo dos antiquários, leiloeiros, galeristas e colecionadores, em que são publicadas interessantes matérias sobre artes, eu me senti motivada a escrever sobre o papel da crueldade nos romances e contos de ficção. A edição de número 305 traz um breve ensaio sobre o Castelo de Poenari, onde o príncipe Vlad Tepes viveu no século XV, brutal governante da Valáquia, que inspirou o irlandês Bram Stoker, a criar o aterrorizante romance “O Conde Drácula” no século XIX.

Lendo o jornal A Relíquia, um informativo dos antiquários, leiloeiros, galeristas e colecionadores, em que são publicadas interessantes matérias sobre artes, eu me senti motivada a escrever sobre o papel da crueldade nos romances e contos de ficção. A edição de número 305 traz um breve ensaio sobre o Castelo de Poenari, onde o príncipe Vlad Tepes viveu no século XV, brutal governante da Valáquia, que inspirou o irlandês Bram Stoker, a criar o aterrorizante romance “O Conde Drácula” no século XIX.

Apesar de ser um assunto que até me incomoda pesquisar e escrever, é relevante por ser o personagem vilão com maior número de aparições na mídia, como também é fonte de inspiração de outros personagens, como o Lobisomem, por exemplo. A história do Conde Drácula, instigante, envolvente e assustadora, impacta a todos por ter sido tão bem construída que chega a criar a impressão de que existe na realidade. É importante ressaltar que a obra compõe a literatura universal.

Mas a questão a que trago aqui são as razões pelas quais a crueldade impulsiona a ficção dado que, nas obras literárias, o enredo causa suspense quando é contraposto com a bondade através das relações de causa e efeito. A crueldade abrange palavras e ações que ameaçam e causam sofrimento em outra pessoa. Tem origem na ausência de sentimentos de estima, respeito e de valores éticos, bem como na sensação de prazer em causar medo e dor alheia.  O herói na literatura é o personagem que enfrenta os desafios impostos por um vilão, pela natureza ou pelas tragédias inesperadas que o surpreende. Ao vencer o mal ou as dificuldades, preenche os vazios do leitor, empondera-o, fazendo-o refletir a respeito do enfrentamento dos impedimentos que a vida lhe apresenta.  

A ficção explora o pensamento maniqueísta que se define na contraposição entre o bem e o mal. Nesse universo imaginário a crueldade não tem limites, muito menos as possibilidades de o herói em defrontar-se com o perigo. O vilão e o herói coexistem no limiar entre a fantasia e a realidade, uma vez que se situam no desejo inconsciente de o leitor salvar o mundo, de proteger as pessoas e a si, além de fortalecer as capacidades pessoais. As sociedades cultivam mitos e lendas que confrontam o herói com os fatos ou vilões porque o ser humano precisa imaginar a presença de heróis na vida quotidiana como forma de buscar o melhor da experiência existencial. A identidade com os heróis literários decorre da fantasia da perfeição que inspira a sensação de completude. 

Para as crianças e os jovens os heróis exercem a função de ensinar valores como responsabilidade, altruísmo, trabalho em equipe, coragem, cuidar das pessoas, dos animais e da natureza, respeito, amizade, justiça, valor do ser humano, dentre outras.

O Conde Drácula nos traz questões a serem refletidas, como o perigo da sedução, a importância de manter a calma diante do perigo e pensar antes de agir, uma vez que as decisões impensadas podem trazer arrependimentos. Acima de tudo, o mal existe e pode estar bem ao nosso lado e é preciso, por conseguinte, ter cuidado com estranhos. 

Para finalizar, ressalto uma ideia que me tocou: às vezes o mundo não precisa de mais um herói; às vezes o que ele precisa é de um monstro!

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O amor que a saudade guarda

segunda-feira, 07 de novembro de 2022

Escrevo esta coluna no dia de finados com o livro “Meu Amigo Partiu” nas mãos, de Andrea Viviana Taubman, delicadamente ilustrado por Sandra Ronca, ambas amigas que guardo com carinho no coração. Cada palavra minha retrata a saudade que sinto por aqueles que partiram, pessoas que amei e por quem fui amada. Cada palavra minha é uma rosa que lhes ofereço com o melhor do meu afeto, principalmente a meu filho amado a quem gostaria de dar uma rosa amarela, cor de sua preferência, e ao filho da Sandra Ronca. 

Escrevo esta coluna no dia de finados com o livro “Meu Amigo Partiu” nas mãos, de Andrea Viviana Taubman, delicadamente ilustrado por Sandra Ronca, ambas amigas que guardo com carinho no coração. Cada palavra minha retrata a saudade que sinto por aqueles que partiram, pessoas que amei e por quem fui amada. Cada palavra minha é uma rosa que lhes ofereço com o melhor do meu afeto, principalmente a meu filho amado a quem gostaria de dar uma rosa amarela, cor de sua preferência, e ao filho da Sandra Ronca. 

Andrea escreveu “Meu Amigo Partiu”, Centro de Estudos Vida & Consciência Editora, em homenagem ao melhor amigo de sala de aula do seu filho, vítima da tragédia em 2011, que ocorreu em Teresópolis, região serrana do Rio de Janeiro. Nós três, unidas pela literatura, fomos tocadas pela perda. Hoje é o dia do ano em que nos recolhemos para homenagear pessoas que nos deixaram e contemplar as histórias de amor que com elas tivemos.

A literatura nos abraça com belos textos que mostram que a vida termina, como “A Morte é um Dia que Vale a Pena Viver”, Editora Sextante, em que a médica Ana Cláudia Quintana Arantes, geriatra e gerontóloga, com pós-graduação em Psicologia, narra sua experiência com pacientes terminais. E “É de Morte”, editora FTD, em que Flávia Savary escreve contos juvenis para abordar a morte. 

Li esses livros querendo entender a morte e para melhor aceitar a ideia que a vida é finita, haja vista que é um dos mais difíceis entendimentos que alguém possa ter. Penso que talvez seja necessário viver anos e anos para aceitar com firmeza e desprendimento de espírito essa certeza imponderável.

Por outro lado, é bom pensarmos nas relações que estabelecemos com as pessoas que partiram, revermos como estivemos ao lado delas e como contribuíram para a construção do nosso destino. É bom recordar os fatos até para interpretar os momentos difíceis que com elas tivemos e chegar a conclusões que venham a melhorar nossos modos de viver. É bom orarmos pelos mortos porque a religiosidade nos ensina a respeitá-los e a aproveitar o legado que nos deixaram. 

Hoje é o dia de acenarmos a eles com alegria por tê-los tido em nossas vidas.  Certamente, em um tempo futuro também não estaremos mais aqui. Quando eu partir, confesso, gostaria de receber acenos calorosos dos vivos para fortalecer minha caminhada espiritual. 

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A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

Hellen Keller

segunda-feira, 31 de outubro de 2022

As colunas passadas, em que abordei a literatura construída por escritores cegos, me sensibilizaram. Não tenho privação de sentidos, mas eu me identifiquei com eles através da admiração que senti ao conhecer os processos de superação pelos quais passaram. Foram além dos limites extremos impostos pela ausência de visão e tornaram-se escritores valorizados no universo literário. Todavia não fosse a vontade implacável de ir além, teriam permanecido nas fronteiras impostas pelos limites físicos. 

As colunas passadas, em que abordei a literatura construída por escritores cegos, me sensibilizaram. Não tenho privação de sentidos, mas eu me identifiquei com eles através da admiração que senti ao conhecer os processos de superação pelos quais passaram. Foram além dos limites extremos impostos pela ausência de visão e tornaram-se escritores valorizados no universo literário. Todavia não fosse a vontade implacável de ir além, teriam permanecido nas fronteiras impostas pelos limites físicos. 

Nós, pessoas dotadas de corpos em boas condições de funcionamento, tendemos a nos acomodar diante de algumas dificuldades implacáveis com as quais nos deparamos, com pouca coragem para romper as linhas divisórias que nos cercam. A privação impulsiona de modo extraordinário o desenvolvimento e aperfeiçoamento das capacidades humanas. 

Por isso não poderia deixar de aplaudir a filósofa, escritora, conferencista Hellen Keller, exemplo da capacidade de alguém sobrepujar os piores desafios que a limitação dos sentidos possa impor. Hellen nasceu nos Estados Unidos, no estado do Alabama, em 1880. Aos dezoito meses de idade ficou cega e surda em decorrência de uma doença, na época denominada febre cerebral, provavelmente teria sido meningite ou escarlatina. Ela teve como professora Anne Sullivan, também deficiente visual, que a acompanhou ao longo de quarenta e nove anos. Sem se habituar às limitações, foi a primeira pessoa com surdez e cegueira a conquistar o bacharelado. Visitou mais de quarenta países como ativista e defensora dos portadores de deficiências, além de outras questões como o controle da natalidade e respeito aos direitos humanos. Sua história tem uma beleza especial em termos de humanidade, coragem e perseverança.

Ao longo de sua vida publicou doze livros e escreveu artigos diversos. Sua primeira obra foi escrita durante o curso de filosofia, em 1903, aos 22 anos, uma autobiografia “The History of My Life”, em que narrou sua história de vida até aos 21 anos. Em 1908 escreveu “The World I Live In” em que relatou o modo como se sentia em relação ao mundo.  

Hellen Keller recebeu títulos e diplomas honorários em vários países, como a França, Japão e Índia. Foi indicada duas vezes ao Prêmio Nobel da Paz, em 1953 e 1958. No Brasil recebeu a “Ordem do Cruzeiro do Sul”, comenda que o Presidente da República atribui a personalidades notáveis nascidas em outros países.

 Faleceu em 1968, aos 87 anos, legando-nos um exemplo de vida. Além de tudo, usou a literatura para contar sua história, expor sentimentos e ideias. 

Para finalizar, deixo algumas frases sua para reflexão.

“As melhores e as mais lindas coisas do mundo não se podem ver nem tocar. Elas devem ser sentidas com o coração.”

“O otimismo é a fé em ação.”

“A ciência poderá ter encontrado a cura para a maioria dos males, mas não achou ainda o remédio para o pior de todos: a apatia dos seres humanos.”

“A vida é ou uma aventura audaciosa ou não é nada. A segurança é geralmente uma superstição. Ela não existe na natureza.”

“Podemos fazer tudo o que quisermos se formos perseverantes.”

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