Blog de paulafarsoun_25873

Quebra-cabeças

sexta-feira, 30 de maio de 2025

Para a construção de uma obra nova, devemos preparar o terreno, cuidar da limpeza do local, criar o ambiente ideal, promover as adaptações que se fizerem necessárias. Na verdade, essas medidas são mesmo fundamentais. Mas a metáfora dessa ideia é a que me leva a pensar. Não sobre obras, mas sobre pessoas.

Passamos muito tempo de nossas vidas construindo ideias sobre os outros. E o tanto que nos enganamos é algo grandioso. Creio que não somos tão bem-sucedidos nessas obras. Inevitavelmente, nos equivocamos. Erramos o cálculo. Confundimos a perspectiva. Mudamos o projeto.

Para a construção de uma obra nova, devemos preparar o terreno, cuidar da limpeza do local, criar o ambiente ideal, promover as adaptações que se fizerem necessárias. Na verdade, essas medidas são mesmo fundamentais. Mas a metáfora dessa ideia é a que me leva a pensar. Não sobre obras, mas sobre pessoas.

Passamos muito tempo de nossas vidas construindo ideias sobre os outros. E o tanto que nos enganamos é algo grandioso. Creio que não somos tão bem-sucedidos nessas obras. Inevitavelmente, nos equivocamos. Erramos o cálculo. Confundimos a perspectiva. Mudamos o projeto.

Seres humanos não são esse tipo de projeto que elaboramos com técnica. Somos, na verdade, uma obra sempre inacabada e complexa. Imperfeita por natureza. Em evolução (ou involução). O projeto é de vida e não há nada mais pessoal do que isso. O outro, por mais perito no assunto que seja, não pode precisar com exatidão o que acontece no interior da obra, nem apresentar soluções lapidares.

Esse terreno – que somos nós – não está descoberto a ponto de desvendarmos seus desníveis pelo olhar. Tem até areia movediça por baixo do mato verde. Tem de tudo, como se diz.

Investimos preciosos minutos de vida construindo uma imagem do outro. Supondo coisas. Julgando e prejulgando pelo pouco que conhecemos a seu respeito. Por isso o culto reverenciado pela imagem. Nem sempre a real. Quase sempre a projetada. A que pode ser vista. Isso é uma grande tolice, pois ao construirmos pessoas fictícias em nosso imaginário, empenharemos o dobro de energia para desconstruí-las, pois comumente erramos as análises. Os outros não são o que pensamos deles. Os outros são o que são.

Seria interessante se aceitássemos que o jogo começa com as peças do quebra-cabeças desmontadas, para então, com o tempo pudéssemos aprofundar e conhecer a imagem real que será formada. Daria menos trabalho e as surpresas talvez fossem mais prazerosas. Ou mais reais.

Mania estranha essa de querermos jogar um jogo ganho. Imagens preestabelecidas. Vencedores determinados. E no final das contas, a frustração da decepção. O girassol que eu estava montando no meu quebra-cabeça não passa de uma forma geométrica e sem sentido. Uma bola amarela. E vice e versa. Quantos girassóis deixamos de descobrir no meio do jogo justamente por superficialmente só enxergarmos a bola amarela. Sem essência. Forma e não flor.

Desconstruir é preciso. E se tivermos ânimo, reconstruir. Não sei se me fiz entender. Mas também não é preciso. Referenciando mais uma vez Clarice Lispector: “não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento”. Não me preocupo, pois.

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O silêncio das pequenas coisas

sexta-feira, 23 de maio de 2025

Há um tipo de silêncio que não incomoda. Soa inofensivo. Parece mais leve, fluido. Chega a ser cobiçado. Beira um privilégio. Há quem se dedique por esse objetivo, estar em silêncio, alcançar uma ausência de ruído que fomenta a sensação de paz. Não me refiro ao silêncio que pesa, que invade o ambiente depois de um conflito ou que toma tudo e todos depois de uma notícia triste. É outro.

Há um tipo de silêncio que não incomoda. Soa inofensivo. Parece mais leve, fluido. Chega a ser cobiçado. Beira um privilégio. Há quem se dedique por esse objetivo, estar em silêncio, alcançar uma ausência de ruído que fomenta a sensação de paz. Não me refiro ao silêncio que pesa, que invade o ambiente depois de um conflito ou que toma tudo e todos depois de uma notícia triste. É outro. Um silêncio discreto e poderoso, quase tímido embora presente, que se esconde nas dobras do dia, feito de miudezas que quase ninguém nota, mas que tem um potencial tremendo de impactar na vida da gente, seja na sutileza, seja de forma mais profunda. Depende do quanto estamos dispostos a ouvir os sinais que o tempo de vazio e o olhar para dentro podem nos proporcionar.

É o remanso que vive entre o soar do despertador e o primeiro gole de café. O momento em que os olhos se acostumam com a claridade do dia e ainda tentam entender que é hora de recomeçar. Nessa hora, se consolida o pacto prático entre o corpo e o mundo: mais um dia. Vamos em frente. É o que cabe.

 Quando nos predispomos a nos conectar com a quietude e a calmaria de instantes, podemos aprender com o silêncio do pássaro que pousou no galho da árvore e nos passa a sensação de estar sentindo o prazer dos raios de sol, com o movimento das roupas no varal, dançando no vento como se soubessem de algo que a gente esqueceu. Ah! E o sossego das plantas, que crescem em segredo, adormecem e florescem, enquanto o mundo grita e tropeça.

Dia desses, notei o silêncio de um cavalo parado sob a copa de uma árvore, sem nenhuma amarração. Estava ali como queria, livre. Escolheu aquele lugar e ali parou. Pairou. Um silêncio inteiro, confortável, quase filosófico. Ele não tinha pressa de ser útil, nem medo de parecer improdutivo. Apenas existia. Aquilo me lembrou sobre uma valiosa sensação de paz.

A sutileza das pequenas coisas, por vezes, ensinam mais, muito mais que mil palavras motivacionais. Aquele fiapo de luz entrando pela fresta da janela, o barulho quase inaudível da chaleira antes de chiar, o cachorro se espreguiçando, o toque dos pés descalços no chão frio da cozinha — todas falam. Mas falam baixo. E é preciso estar disposto a ouvir.

Vivemos ofuscados por telas e luzes, cercados de vozes, alertas, opiniões, em meio à energia do caos. Há ruído até no descanso. Aliás, nem toda pausa podemos chamar de descanso. Vez ou outra é só mesmo a limitação física impondo a necessidade gritante de pararmos. Assim o é. Mas acho que o que realmente tem um potencial enorme de nos reconstruir, eu arriscaria dizer, são esses silêncios gentis que não pedem espaço, apenas existem.

A alma, se alimenta mais disso do que de qualquer espetáculo. Porque, no fim, não são os grandes acontecimentos que nos sustentam, mas esse sussurro delicado das coisas simples, que — mesmo caladas — dizem tudo.

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Melhor possível

sexta-feira, 16 de maio de 2025

Lya Luft escreveu: “E que o mínimo que a gente faça seja, a cada momento, o melhor que se conseguir fazer”.  Sim. Que o melhor seja feito dentro das possibilidades existentes. E que novos horizontes ampliem as possibilidades para que mais bem feito ainda possa ser feito adiante.

Lya Luft escreveu: “E que o mínimo que a gente faça seja, a cada momento, o melhor que se conseguir fazer”.  Sim. Que o melhor seja feito dentro das possibilidades existentes. E que novos horizontes ampliem as possibilidades para que mais bem feito ainda possa ser feito adiante.

Os perfeccionistas de plantão sabem que não dar conta de fazer o que se quer, da forma como se deseja, dói. E, às vezes não é pouco. Uma sensação de impotência pode brotar de forma mais simples do que um pé de feijão que nasce do caroço deixado no copo com algodão úmido. (Aliás, aqui vale uma digressão... saudosos tempos em que fazíamos experiências como essa e víamos o milagre acontecer sob nossos olhos.)

São muitos os relatos de pessoas que se sentem constantemente exaustas e sobrecarregadas e muitas vezes a razão disso reside justamente no acúmulo de tarefas que pretendem desempenhar de forma impecável. É seguro afirmar que pessoas com esse perfil podem aliar a satisfação pelo desempenho escorreito de suas funções na vida com uma bagagem pesada de cansaço. E o bonito dessa história é perceber que ainda assim, continuam se esforçando para honrar os compromissos assumidos da melhor maneira com que podem fazer. Dando o melhor de si, não param de descobrir caminhos de expansão interna. Vem o prazer da satisfação, do mérito plantado pelo esforço. O movimento é de dentro para fora e não o contrário. Quanta gratidão das pessoas é colhida pela doação do melhor que se pode oferecer e fazer pelo outro? A felicidade que dessa experiência advém é algo que não tem como valorar.

Mas o ponto curioso, a meu ver, é que ser “certinho”, além de rótulo esquisito, virou tratamento pejorativo, quando não adjetivo empregado com intuito de desmerecer alguém. Chegar na hora do compromisso passou a ser estranho. Cumprir prazos. Dedicar-se para alcançar os objetivos estabelecidos. Olhar para o outro. Ajudar as pessoas, então! Virou coisa de gente chata e fora do padrão.

Em um momento de tanta fluidez, tempo corrido, agendas lotadas, demanda social, interação, inchaço nas relações, ser pessoa cumpridora das regras que ainda assim se esforçam para priorizar o comprometimento, não deveria ser elogio?

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Poucos e Bons

sexta-feira, 09 de maio de 2025

Costumo dizer que o critério qualitativo se sobrepõe quase sempre ao quantitativo quando falamos em relações humanas. Quanto mais afeto melhor? Sim. Quanto mais pessoas para amar e partilhar a vida, melhor? Sim. Mas isso não vale pra tudo. Não temos como dar conta de sermos bons amigos para centenas. Acho que é quase humanamente impossível.

Costumo dizer que o critério qualitativo se sobrepõe quase sempre ao quantitativo quando falamos em relações humanas. Quanto mais afeto melhor? Sim. Quanto mais pessoas para amar e partilhar a vida, melhor? Sim. Mas isso não vale pra tudo. Não temos como dar conta de sermos bons amigos para centenas. Acho que é quase humanamente impossível.

Hoje em dia nossas redes sociais, por menores que sejam, contam com centenas, às vezes milhares, e em alguns poucos casos, milhões de contatos, seguidores e “amigos virtuais”. Mas não tem como se conectar verdadeiramente com tantas pessoas ao mesmo tempo em caráter privado, pra valer, na saúde e na doença, trocando abraços e compartilhando a vida real.

E talvez aí more um grande mal-entendido bastante atual: o fato de alguém estar diariamente na nossa timeline não significa que esteja, de fato, na nossa vida. Da mesma forma, uma mesa cercada de “estranhos-gente-boa” pode ser divertida. Mesmo. Mas ainda assim, não se garante um ombro amigo de verdade. O excesso de conexões pode acabar provocando uma solidão estranha – como se estivéssemos sempre cercados de gente, mas raramente acompanhados de verdade.

O afeto, a meu ver, exige presença qualitativa. Não no sentido físico apenas – porque é possível nutrir e aprofundar os mais sinceros sentimentos à distância –, mas no sentido de envolvimento real, disponibilidade emocional, escuta genuína. E isso, convenhamos, exige entrega, afinidade, sinceridade, confiança, tempo, energia e intenção. Ou seja, não dá pra fazer isso com todo mundo.

O que precisamos talvez é aceitar que a profundidade exige escolha. Que ter poucos vínculos profundos não é fracasso social, mas sabedoria afetiva. Que dar conta de pessoas com quem a gente possa ser verdadeiramente quem é – sem filtros, sem performance, sem medo de não agradar – vale infinitamente mais do que manter uma vitrine de relacionamentos que só existem no plano da aparência.

A boa notícia é que, quando a gente entende isso, começa a valorizar mais o silêncio entre os encontros, a simplicidade dos gestos, a força dos vínculos pra valer.  Começamos a entender que não é sobre ter muitos por perto, mas sobre ter os certos no coração. Prefiro mesmo, enfrentar o processo e viver a vida com poucos e bons.

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Bloco da Mocidade

sexta-feira, 25 de abril de 2025

Diante de um enorme desafio sem precedentes, questionou-se a um jovem se ele iria encará-lo, ao que ele respondeu de forma óbvia que sim. Ele não era de se curvar às barreiras. Havia aprendido que ser forte também é uma questão de treinamento, de aprimoramento. Habitava nele uma força interior que impulsionava a energia para a execução e a transposição de qualquer obstáculo.

Diante de um enorme desafio sem precedentes, questionou-se a um jovem se ele iria encará-lo, ao que ele respondeu de forma óbvia que sim. Ele não era de se curvar às barreiras. Havia aprendido que ser forte também é uma questão de treinamento, de aprimoramento. Habitava nele uma força interior que impulsionava a energia para a execução e a transposição de qualquer obstáculo.

Tem gente que olha para o céu e agradece quando as oportunidades surgem ainda que venham acompanhadas de dedicação extrema, de trabalho árduo. Gente que acolhe uma missão e por ela se transforma no melhor que pode ser. Gente que não se acomoda, que encara, vai à luta, mesmo diante das dificuldades e da desconfiança dos outros, das indagações constantes sobre se é ou não capaz de dar conta do que está por vir. É claro que ele é capaz. Ele acredita nisso e faz acontecer.

Dá a sensação de que pessoas com esse perfil de enfrentamento e superação trazem consigo a marca da coragem, apesar de todo medo pelo novo, pela missão grandiosa que pode estar por vir.

Seria bom se os jovens fossem incentivados e encorajados a darem o melhor de si para vencerem a si mesmo e aos desafios impostos pela vida. Podem ser grandiosas oportunidades de crescimento e evolução, instrumentos úteis à formação de uma sociedade em que superar desafios pessoais em prol de um objetivo, de um projeto, de um trabalho que seja valorizado. Não é questão de retorno financeiro. Não apenas. É questão também de repercussão social. De ser exemplo para outras pessoas que continuam investindo sua energia e acreditando que vencer obstáculos pode ser uma forma eloquente de crescimento pessoal e profissional. Ser jovem que ensina jovem; que acredita em jovem; que aprende com jovem; que compartilha com jovem. Ser jovem que vai encarar sim, o que der e vier, com dignidade e hombridade. É disso que estou falando.

Nas palavras de Martin Luther King, temos um bom conselho: “Suba o primeiro degrau com fé. Não é necessário que você veja toda a escada. Apenas dê o primeiro passo.” Que esse jovem corajoso que vai vencer o mundo – o seu mundo, tenha força e sabedoria para investir o mais nobre de si na construção de algo melhor.

Há que se endossar cada palavra e concordar com Gonzaguinha quando pronunciou a bela canção que diz assim: “Eu acredito é na rapaziada/ que segue em frente e segura o rojão/ eu ponho fé é na fé da moçada/ que não foge da fera e enfrenta o leão. Eu vou à luta com essa juventude/ Que não corre da raia a troco de nada/ Eu vou no bloco dessa mocidade/ Que não tá na saudade e constrói a manhã desejada.”

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Reflexão de Sexta

sexta-feira, 18 de abril de 2025

“De tanto pensar tudo, não consigo pensar em nada”. “Penso tanto que não tenho tempo para pensar”. “Minha mente está cheia, porém está um tanto vazia”. “Tudo sei, mas não sei de nada”. São sensações do momento. Não minhas (não apenas). De muita gente. As coisas estão profundamente rasas. Inteiramente partidas. Constantemente voláteis. Densamente esparsas. Apertadas de tão largas. Entupidas de nada. Estamos vivendo tempos contraditórios. A começar pela mente.

“De tanto pensar tudo, não consigo pensar em nada”. “Penso tanto que não tenho tempo para pensar”. “Minha mente está cheia, porém está um tanto vazia”. “Tudo sei, mas não sei de nada”. São sensações do momento. Não minhas (não apenas). De muita gente. As coisas estão profundamente rasas. Inteiramente partidas. Constantemente voláteis. Densamente esparsas. Apertadas de tão largas. Entupidas de nada. Estamos vivendo tempos contraditórios. A começar pela mente.

Muito pensamento desencontrado, influenciado, maculado, desnorteado, desencadeado, acumulado, precipitado, acelerado. Muita informação na mente. Muita inutilidade disputando espaço e atenção com o que verdadeiramente importa. Um cabo de guerra que está difícil de ser equilibrado pelo lado da essência da vida. Do que é útil. Do que acrescenta. Do que ensina. Do que compartilha coisas boas. Do amor.

Talvez meditar nunca tenha sido prática tão aconselhada entre pessoas que se querem bem e recomendada por profissionais das mais diversas áreas. E por leigos que tudo sabem. E por praticantes que sabem muito do assunto. E por quem não pratica mas simpatiza. E por quem não simpatiza nem pratica, mas acha legal. Que acha legal e não consegue praticar. Pelo que vive de aparência e finge que acha legal e que pratica. Pelo que tenta e não consegue. Pelo que gosta e pelo que não gosta.  Por quem tem recomendação médica. Ou terapêutica. Ou religiosa. Ou nada disso, ou tudo isso.

Por que? As pessoas estão sem tempo de pensar em nada. De viver o tempo presente. De conseguir alguns instantes da vida, ou do dia, para centrarem-se em si mesmas. Para lembrarem-se que respiram. Entra ar. Sai ar. Quase ninguém nota. Até que chegue a próxima virose, a gripe, a bronquite, a asma, a falta de ar. É verdade, precisamos respirar. Dar valor ao ar precioso que circula por nossos pulmões. Ar da vida.

E quem lembra que tem olhos até que a vista embace de tanto fixar o olhar nas telas dos computadores e dos smartphones? Olhos que são o portal do corpo que habitamos para o mundo externo. Eles mesmos. Os que podem contemplar. Apreciar. Admirar. Ver a natureza. Ver as pessoas. Ver o tempo. Ver o belo. Ver a vida. Esses mesmos, que deixamos embaçar com o excesso de tudo para o que não paramos de olhar.

Boca e voz para falar coisas boas. Quem se lembra que tem voz que não seja apenas para protestar e discutir política?  E brigar? E bater boca sem chegar a lugar nenhum? Que não se restrinja a falar da vida alheia, reclamar reclamar, reclamar.

Tanta gente perecendo sem se dar conta. A vida nos foi dada, o momento presente é o maior presente, um corpo humano para nossa alma habitar está aqui e agora, clamando pela devida atenção aos seus verdadeiros propósitos de existir. Estamos empregando nossa energia vital naquilo que é substancial?

O estado natural das coisas talvez seja mais simples. Está tudo tão complexo. Tão desconexo. Basta avaliarmos nossa existência pelo nosso próprio olhar, mas como se fôssemos uma terceira pessoa, que nos ama e é imparcial, avaliando o que temos feito de nossas vidas, do que temos recheado nossos pensamentos, do valor que damos ao ar que respiramos, de como utilizamos as palavras para impactar em alguma coisa útil no mundo, do que estamos fazendo com nosso tempo, de como estamos cuidando, sobretudo, dos nossos sentimentos.

Não fomos criados em uma realidade paralela. Não estamos no Planeta Terra sozinhos. Somos bilhões de seres vivos consumindo, interagindo, construindo, destruindo, plantando, colhendo, pensando, amando, odiando, movimentando energia. Saber viver de forma civilizada, no século 21, me parece uma realidade que já devia estar superada. Já era para termos aprendido a viver (e conviver) com respeito, civilidade, compaixão, cooperação e empatia. Mas não sabemos de nada, apesar de acharmos que sabemos de tudo. Vai ver está tudo na mais perfeita ordem. Ou não.

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Tudo passa

sexta-feira, 11 de abril de 2025

        A moça estava com os olhos cheios d’água, com um semblante triste e o corpo contraído. Dava para ver que não estava bem. Só não sabia o que ela tinha. Resolvi perguntar... afinal de contas, quem sabe não poderia ajudar de alguma forma. Aproximei-me e indaguei: “O que você tem? Está passando mal? Precisa de algo que eu possa auxiliar?”. E a resposta foi: “Não, obrigada por perguntar. O que eu tenho é dor de alma”.

        A moça estava com os olhos cheios d’água, com um semblante triste e o corpo contraído. Dava para ver que não estava bem. Só não sabia o que ela tinha. Resolvi perguntar... afinal de contas, quem sabe não poderia ajudar de alguma forma. Aproximei-me e indaguei: “O que você tem? Está passando mal? Precisa de algo que eu possa auxiliar?”. E a resposta foi: “Não, obrigada por perguntar. O que eu tenho é dor de alma”.

        Pronto. Foi o suficiente para eu nunca mais esquecer a resposta. E refletir. E me identificar. Eu acho que entendi, no ato, o que ela quis dizer. Já senti também. É um tipo de dor para além do corpo físico, que não é palpável, não é determinada e não se resolve com analgésico. Aliás, há dores que não se explicam... dor da saudade, dor do tempo perdido, dor do que poderia ter sido e não foi, dor da frustração, dor da separação, dor do conflito, dor do medo, dor no encerramento de ciclos, dor da escassez e tantas outras dores.

        E se não sabemos muitas vezes como ajudar os outros, talvez não saibamos também como nos ajudar nesses momentos. Já me disseram certa vez: “Deixa doer. Dor dá e passa”. Mas fácil, não é. Hoje em dia temos muito mais discernimento, de um modo geral, para compreendermos que podemos necessitar de ajuda profissional para auxiliar nos processos de cura, e procurarmos por ajuda quando for preciso.

        Já percebi que nem todo mundo se conecta com a dor do outro. Aliás, às vezes as pessoas não conseguem se conectar nem mesmo com suas próprias dores, incorporando o estado de melancolia em suas vidas e jogando para debaixo do tapete situações que precisam ser resolvidas e superadas.

        A vida é mesmo muito curta e se não nos esforçarmos para tentarmos ser felizes, dentro de nossas felicidades, quem o fará por nós? E diante do reconhecimento de que a existência nos impõe altos e baixos, momentos de alegria e de tristeza, de saúde e de doença, de força e de vulnerabilidade, de completude e solidão, de compaixão e egoísmo, de confiança e insegurança, de metade do copo cheio e a outra metade vazia, porque afinal de contas, somos todos humanos, me parece um desafio compreender o limite em que acolher a “dor de alma e deixar passar” é o simples “sentir faz parte da vida”.

        Ou se é justamente o alerta para buscar ajuda profissional porque isso que a moça me falou naquele dia é sinal ou sintoma de algo que demanda cuidados profissionais.

        Seja como for, é fato que há caminhos de ajuda. Há pessoas habilitadas para o cuidado médico, psicológico e multidisciplinar. E assim como essa premissa é verdadeira, também é uma realidade que devemos ser mais atentos, proativos e empáticos com os outros e com nós mesmos e vivermos a esperança de que dor de alma também passa.

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Tomada de decisão

sexta-feira, 04 de abril de 2025

            Falarei sobre escolhas. Daquelas que apertam o peito, tiram o sono e fazem a gente pensar e repensar um milhão de vezes antes de dar o próximo passo, ou mesmo às que nos levam a pensar pouco, simplesmente diante do fato de nos paralisarmos diante da necessidade de decidir sobre algo importante que pode impactar nossas vidas. Quem nunca se viu diante de uma encruzilhada, tentando adivinhar qual caminho leva à felicidade e qual pode ser um beco sem saída?

            Falarei sobre escolhas. Daquelas que apertam o peito, tiram o sono e fazem a gente pensar e repensar um milhão de vezes antes de dar o próximo passo, ou mesmo às que nos levam a pensar pouco, simplesmente diante do fato de nos paralisarmos diante da necessidade de decidir sobre algo importante que pode impactar nossas vidas. Quem nunca se viu diante de uma encruzilhada, tentando adivinhar qual caminho leva à felicidade e qual pode ser um beco sem saída?

            Tomar decisões importantes demanda coragem. E coragem não significa ausência de medo, mas sim agir apesar dele. Até porque, por vezes o caminho que parece mais fácil e atrativo é a inércia, enrolar, deixar para depois, fingir que o tema não existe. Mas não tem jeito, diante da necessidade de uma real tomada de decisão, não fazer nada também pode significar a escolha.

            Decidir sobre algo que nos impõe dúvidas, cujas consequências sejam desconhecidas, sobre assuntos que nos remetem a dores ou mesmo que demandem investimentos caros materiais e imateriais, importa em medo e este sentimento é um acompanhante fiel da escolha, um fantasma que sussurra dúvidas no ouvido e nos faz questionar: "E se eu estiver errado?". Só que o erro faz parte da vida. Se nunca errarmos, é porque nunca tentamos.

            Há decisões que mudam tudo. Pedir demissão de um trabalho que não faz mais sentido, optar por determinada conduta diante de uma situação de doença, mudar de cidade, de profissão, de relacionamento, de estilo de vida. Algumas vêm aos poucos, como um vento que vai empurrando a gente até a borda do precipício. Outras chegam como um soco no estômago, inesperadas e inadiáveis. O que fazer?

            Muitas vezes, tentamos adiar a decisão esperando o momento perfeito, a certeza absoluta, um sinal divino. Mas a verdade é que o momento perfeito não existe. O que existe é o nosso instinto, a nossa intuição e a nossa capacidade de análise. Tomar uma decisão importante é como saltar no desconhecido sem garantia de pouso seguro. Mas ficar parado também tem um preço: o peso da estagnação.

            É preciso lembrar que toda escolha pode envolver renúncias. Não dá para ter tudo ao mesmo tempo. E está tudo bem. A gente sempre perde alguma coisa para ganhar outra. A vida, no fundo, é um jogo de trocas. A pergunta que realmente importa é: o que você está disposto a abrir mão para conquistar aquilo que deseja?

            No fim das contas, decidir é um ato solitário. Podemos ouvir conselhos, listar prós e contras, mas, no momento final, a decisão é nossa. É nesse instante que descobrimos quem somos, o que queremos e o quanto estamos dispostos a pagar pelo que realmente importa. E é aí que o autoconhecimento pode ser um grande diferencial: saber quem somos, o que se desejamos, a que estamos dispostos a fazer, e qual o sentido de tudo isso. Não é fácil, mas uma coisa que tenho tentado fazer diante de uma escolha difícil, é avaliar as possíveis consequências das decisões compreendendo que não tenho controle sobre tudo, não sei o que realmente vai acontecer e que trará maior satisfação e realização pessoal, e entendendo que diante de uma necessária tomada de decisão, pior pode ser não decidir. Porque viver é, acima de tudo, seguir em frente.

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Respeito é bom...

sexta-feira, 28 de março de 2025

“Respeito é bom e todo mundo gosta”, diz a frase. Ser respeitado realmente é algo bastante reivindicado. Mas respeitar... bem, aí a coisa muda de figura. Respeitar pessoas é mais do que um ato de educação, de civilidade.  É uma escolha de vida, um princípio essencial para a construção de uma sociedade mais equilibrada. Quando respeitamos o outro, reconhecemos sua individualidade, sua história e seu direito de existir com dignidade. Compreendemos que há espaços a serem respeitados, limites através dos quais não devo forçar a passagem.

“Respeito é bom e todo mundo gosta”, diz a frase. Ser respeitado realmente é algo bastante reivindicado. Mas respeitar... bem, aí a coisa muda de figura. Respeitar pessoas é mais do que um ato de educação, de civilidade.  É uma escolha de vida, um princípio essencial para a construção de uma sociedade mais equilibrada. Quando respeitamos o outro, reconhecemos sua individualidade, sua história e seu direito de existir com dignidade. Compreendemos que há espaços a serem respeitados, limites através dos quais não devo forçar a passagem. O respeito é a base das relações saudáveis e, quando praticado de forma genuína, traz como consequência algo valioso: paz. Eis algo que dinheiro nenhum compra, a verdadeira paz de espírito. E posso apostar que muito deste sentimento advém da consciência tranquila de que a sua forma de existir não fere nem ao outro e nem a si mesmo, a partir do momento em que o respeito pauta suas relações.

Vivemos tempos de intolerância e pressa. No trânsito, no trabalho, nas redes sociais, no âmbito das relações íntimas e privadas, e também com estranhos, no campo individual e coletivo, a falta de respeito se impõe de maneira por vezes abrupta, violenta e, por outras, silenciosa, mas destrutiva. Julgamos antes de conhecer, falamos antes de ouvir, reagimos antes de compreender. Colocamos nosso ego à frente dando importância maior às vontades próprias, custe o que custar. Criamos conflitos desnecessários e nos afastamos uns dos outros. No fundo, ao desrespeitar o próximo, estamos criando muros dentro de nós mesmos. E isso nos afasta da serenidade que tanto buscamos.

Respeitar pessoas não significa concordar com tudo, mas reconhecer que cada um tem sua própria trajetória, seus desafios e sua maneira de ver o mundo. Significa saber o momento de falar e o momento de silenciar, entender que o outro merece consideração mesmo quando suas opiniões e atitudes diferem das nossas. O respeito não exige que sejamos iguais, apenas que sejamos justos.

A paz nasce do respeito. Quando tratamos os outros com consideração, recebemos de volta o mesmo cuidado. Quando evitamos alimentar conflitos desnecessários, libertamo-nos de pesos que não precisamos carregar. Quando aceitamos que cada um faz o melhor que pode dentro das suas possibilidades, deixamos de lado a amargura e encontramos a leveza.

O respeito é uma via de mão dupla. Ele fortalece laços, cria oportunidades de diálogo e torna a vida mais harmoniosa. É ele que nos permite viver em sociedade sem atropelar o espaço do outro. É ele que nos faz crescer como indivíduos. Quem respeita, abre portas. Quem desrespeita, ergue barreiras. E a escolha entre ser ponte ou muro é diária.

Respeitar pessoas é, no fim das contas, respeitar a própria vida. É um ato de amor e consciência. Que possamos escolher essa prática todos os dias. Porque é no respeito que encontramos a verdadeira paz de espírito.

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Oportunidade

sexta-feira, 21 de março de 2025

A vida nos oferece oportunidades a todo instante. Algumas chegam de maneira sutil, quase imperceptíveis, outras vêm abruptas, forçando-nos a agir. Nem sempre as reconhecemos de imediato, e muitas vezes só percebemos seu real valor quando já passaram. Mas a verdade é que elas podem estar ali, na espreita, esperando nosso olhar atento, nossa disposição para enxergar além do óbvio. Quantas vezes nos lamentamos por não termos aproveitado uma chance que passou? Quantas vezes, tempos depois, percebemos que aquela porta fechada nos direcionou para um caminho muito melhor?

A vida nos oferece oportunidades a todo instante. Algumas chegam de maneira sutil, quase imperceptíveis, outras vêm abruptas, forçando-nos a agir. Nem sempre as reconhecemos de imediato, e muitas vezes só percebemos seu real valor quando já passaram. Mas a verdade é que elas podem estar ali, na espreita, esperando nosso olhar atento, nossa disposição para enxergar além do óbvio. Quantas vezes nos lamentamos por não termos aproveitado uma chance que passou? Quantas vezes, tempos depois, percebemos que aquela porta fechada nos direcionou para um caminho muito melhor?

Oportunidade não é apenas aquele momento grandioso que muda tudo. Aquela porta que uma terceira pessoa escancara à sua frente e te convida a entrar. Às vezes, ela se apresenta nas pequenas coisas: no convite inesperado, na conversa aparentemente banal, no erro que nos ensina. Cada instante carrega em si a possibilidade de um novo começo, de uma nova escolha, de uma nova versão de nós mesmos. Mas, para enxergar isso, é preciso estar aberto. É preciso querer. E, principalmente, é preciso aprender a identificar a oportunidade quando ela ainda parece disfarçada de rotina, de acaso ou até mesmo de fracasso.

Curioso como passamos tanto tempo esperando por uma grande oportunidade, sem perceber que a vida já nos oferece várias diariamente. Não enxergamos porque estamos ocupados demais desejando algo extraordinário, sem notar que o extraordinário, muitas vezes, se constrói no ordinário, no que fazemos repetidamente, no que parece pequeno, mas que, aos poucos, transforma tudo. Oportunidade não é só um evento isolado, mas um conjunto de pequenas escolhas que tomamos todos os dias. É o que decidimos aprender, é a forma como encaramos os desafios, é a atitude que temos diante dos obstáculos.

Muitas oportunidades chegam disfarçadas de desafios. Quantas vezes uma situação difícil se revelou uma chance de crescer? Quantas vezes um "não" nos impulsionou a encontrar um caminho melhor? A verdade é que oportunidades nem sempre são fáceis. Algumas exigem coragem. Exigem que deixemos para trás o que é confortável para abraçar o que é novo e incerto. Mas e se for justamente essa incerteza que nos leva ao que sempre buscamos? E se for o medo do desconhecido que nos impede de enxergar o que está além da nossa zona de conforto? Aceitar a mudança e aprender a confiar no processo é fundamental para aproveitar as oportunidades que surgem.

Há também as oportunidades que criamos. Porque nem sempre elas chegam até nós. Às vezes, é preciso ir até elas. É preciso ousar, arriscar, sair do roteiro. Esperar que algo aconteça sem fazer nada para que aconteça é como esperar que um livro seja escrito sem nunca tocar na caneta. É preciso ação. Oportunidade não é só algo que se encontra, é algo que se constrói. E construir oportunidades exige esforço, disciplina e persistência.

Muitas vezes, as maiores conquistas vêm de anos de dedicação silenciosa, de pequenas tentativas, de ajustes de rota, de recomeços que não parecem gloriosos, mas que, no longo prazo, fazem toda a diferença.

Oportunidades podem vir disfarçadas de um caminho inesperado, de uma reviravolta, de uma simples decisão. Quantas histórias de sucesso começaram com um desvio de percurso? Quantas pessoas encontraram sua verdadeira vocação por acaso, depois de um erro, uma demissão, uma mudança forçada? A vida tem maneiras curiosas de nos guiar para onde devemos estar, e aprender a confiar nesse fluxo pode tornar o caminho mais leve.

Então, talvez o grande segredo seja aprender a olhar para a vida com a curiosidade de quem busca, com a coragem de quem se arrisca e com a paciência de quem entende que nem tudo acontece no nosso tempo, mas sim no tempo certo. Oportunidade não é sorte. É movimento. E quem se move, mais cedo ou mais tarde, encontra o que procura. A grande pergunta não é se a oportunidade vai surgir, mas sim: estaremos prontos para reconhecê-la e agarrá-la quando ela aparecer?

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