Ontem, conversando com mamãe e uma amiga dela, ambas longevas, falamos que o ano começa depois do carnaval. Olhei para as duas, que tinham mais de oitenta anos, minha mãe, 91, e vi que ambas estavam empertigadas, olhando para os dias futuros com altivez. O momento ficou na minha cabeça, sendo embalado pela melodia de Ivan Lins, “Começar de Novo”. Com uma letra forte e poética, a música fez grande sucesso quando foi lançada em 1979 pelo grito de enfrentamento ante as situações difíceis da vida conjugal que desencadeiam a separação.
Notícias de Nova Friburgo e Região Serrana
Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
Hoje é tempo de trilhar caminhos do imaginário para recomeçar o ano, depois da grande festa que veio de longe e de longo tempo, tomou conta das cidades do Brasil, transformando os dias em movimento, liberdade e criatividade. Quando o povo, sem timidez e com abundante energia, se jogou na folia, brindou a vida com festejos barulhentos e ritmados. Quando as pessoas se permitiram ser elas mesmas e não as serem!
“Naquele carnaval, pois, pela primeira vez eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.”
Não tive como deixar de dar continuidade à coluna anterior pelas questões que não me deixaram aquietar, principalmente depois que José Huguenin, autor do livro “Vidas Sertanejas”, me enviou o texto de João Zanetic, “Física e literatura: construindo uma ponte entre as duas culturas”, publicado no livro “História, Ciências e Saúde – Manguinhos”, publicado pela Casa Oswaldo Cruz.
Certa vez, já há alguns bons anos, quando fui à escola Municipal George Pfisterer, no Rio de Janeiro, falar com os alunos sobre um livro meu, conversei com um professor de matemática sobre religião na sala dos professores, que me disse que através da matemática era possível chegar a Deus. Nunca me esqueci dessa afirmação e sempre me pus a refletir a respeito. De todo modo, como educadora e escritora, só posso constatar que tudo o que vivo envolve palavras e números.
A Professora Eunice Nóbrega Portela, doutora em Educação pela Universidade de Brasília, apontou que alguns cientistas têm alertado para o fato de o QI médio da população mundial estar diminuindo desde 1990. Uma das hipóteses apresentadas é o empobrecimento da linguagem, que abrange a busca pela simplicidade das expressões escritas e orais, o abandono de palavras e de figuras de linguagem, como as metáforas, e o emprego reduzido dos tempos e modos verbais.
“De um amigo ninguém se livra fácil. A amizade, além de contagiosa, é totalmente incurável.”
Vinícius de Moraes
Ora pois, não é que há sempre há motivos para escrever? Que podem nascer nas costas que coçam, no sono que não vem, até no bater do martelo que chega aos ouvidos sem harmonia. Hoje, por me aquietar em casa, por ontem tanto abrir o guarda-chuva, correr para não me molhar e me assustar, vou olhar para a natureza.
Sim, Senhor!, a vida brasileira acontece, e a arte vai junto. Sempre. Sem limites e pudor. Com criatividade. É elaborada pela força das emoções e externa os sentimentos do artista, que, por sua vez, reflete as manifestações da brasilidade e as pulsões do povo. A literatura vai junto, atrás, ao lado ou entremeando o acontecer, usando palavras para criar histórias, informações, argumentações, registros e crônicas.
Quando escrevi a coluna sobre os escritores cegos, na qual me referi ao escritor argentino Jorge Luis Borges (1899 – 1986), uma vontade inquieta de conhecer sua obra tomou conta de mim. Busquei o livro de contos, “O Aleph”, considerado uma das maiores obras literárias do Ocidente. Recorrendo a uma literatura fantástica, o livro, publicado em 1949, tem a grandiosidade e a complexidade literária esculpida por um gênio. Com uma cultura universal admirável, Borges está no rol dos autores mais importantes do século XX.
Aqui vou colocar meu afeto nas linhas desta coluna como forma de abraçar os leitores do jornal A Voz da Serra e todos aqueles que trabalham para produzi-lo. Há palavras que guardamos para expressar esse momento de finalização, de um tempo em que vivemos com intensidade. O ano de 2022 foi especial tanto quanto os que já vivemos, com desafios, conquistas, perdas e ganhos. A grande vitória desses dias finais é que podemos estar aqui para verbalizar nossos sentimentos e desejos.