Queimar livros é destruir ideias que alimentam a vida

Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 16 de outubro de 2023

Por que livros são queimados?! Não consigo pensar em uma resposta que me seja razoável para justificar esse ato predador, insano e autoritário. Quem o faz, destrói a cultura com violência, no intuito de aniquilar completamente modos de pensar e de viver diferentes do seu. É uma atitude que cultiva sensações de onipotência e comportamentos paranoicos de poder.

Os livros são objetos, sem dúvida. Entretanto possuem vida na medida em que trazem, em cada página, um pouco da alma dos seus autores, contam histórias de uma época, expressando esperanças, dores e conquistas deste tempo. Existem para serem lidos, manuseados e pesquisados. Presenteá-los, inclusive, revela gestos de afeto a outro. Se repousados em estantes de bibliotecas, ficam à disposição dos leitores. Se em estantes pessoais, são tratados com cuidados em razão das motivações de cada um. Livros não podem ser esquecidos em caixas fechadas. Em suas páginas, geralmente, há anotações, frases sublinhadas e parágrafos marcados por conta do conteúdo do texto, que trazem significados relevantes. Quando amados, costumam envelhecer ao lado dos seus leitores e, apesar dos custos, podem ser restaurados. Os livros são como seres que carecem de atenção e cuidados para terem vidas longas e enriquecerem pessoas com seus saberes, cultura e modos de perceber a vida e estar no mundo.

Ao longo da história, infelizmente, livros foram destruídos com fogo. O ato de queimá-los é essencialmente político, sendo praticado em local público, com a finalidade de censurar ideologias. Os livros ficam em cinzas, irrecuperáveis. Algumas obras são perdidas para sempre porque não há outros exemplares. A história nos apresenta inúmeras cicatrizes contra o patrimônio cultural da humanidade, como aconteceu na Biblioteca de Alexandria, quando foram destruídos 9.000 manuscritos ou durante a colonização da América quando foram queimados manuscritos maias e astecas em1499. Como aconteceu com os livros protestantes na Áustria, em 1730.  Em Nova Friburgo, cidade que cultua a literatura, em outubro deste ano, o tradicional quiosque do Sr. Jorge dos Livros, banca que existe há mais de vinte anos no centro da cidade, foi queimado! Tantos livros, alguns raros, foram destruídos... Não se sabe ainda se foi um ato com intenções políticas ou vândalas. Foi um crime contra a cultura da região, o crescimento intelectual da população e os esforços para incentivar a leitura.

A Academia Friburguense de Letras mobilizou seus acadêmicos para oferecerem livros ao Sr. Jorge, de modo que ele possa reconstruir seu quiosque. Espero que esse triste acontecimento chame a atenção para a importância do livro e da leitura na vida diária de nossa Friburgo querida. 

Mas não é só isso! Que mostre a todos o trabalho persistente do Sr. Jorge ao longo dos anos. Não é fácil tirar o sustento pessoal com a venda de livros. Apenas o amor pelas histórias, poesia, filosofia e tantas outras áreas da produção literária pode tê-lo motivado a sustentar seu quiosque.

Quem puder colaborar, levando livros que já foram lidos, não deixe de fazê-lo. O livro não é para ficar esquecido num canto da casa; haverá sempre alguém que gostará de tê-los nas mãos.

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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