Por 69 votos, Alerj aprova abertura de processo de impeachment de Witzel

Tribunal será formado por cinco deputados eleitos pela Alerj e cinco desembargadores do TJ, escolhidos por sorteio
quinta-feira, 24 de setembro de 2020
por Guilherme Alt (guilherme@avozdaserra.com.br)
Witzel: situação difícil (Foto: O Globo)
Witzel: situação difícil (Foto: O Globo)

A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou, por unanimidade - 69 votos favoráveis -, na noite desta quarta-feira, 23, o projeto que autoriza o prosseguimento do processo de impeachment do governador Wilson Witzel. Esta foi a primeira sessão de impeachment na história do Legislativo fluminense. A denúncia de crime de responsabilidade, baseada em supostos desvios financeiros na área da Saúde, será encaminhada ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio (TJRJ), que formará um tribunal misto de julgamento - composto por cinco deputados e cinco desembargadores - e definirá os ritos finais do processo com base na Lei Federal 1.079/50.

A resolução será promulgada pelo presidente da Alerj, deputado André Ceciliano (PT), e publicada no Diário Oficial do Legislativo desta quinta-feira, 24. Witzel será afastado por 180 dias após a denúncia ser recebida pelo tribunal misto de julgamento.

O projeto aprovado é baseado no relatório do deputado Rodrigo Bacellar (SDD), aprovado pela Comissão Especial da Alerj que analisou o pedido de impeachment, na última quinta-feira, 17,. Durante a sessão plenária desta quarta-feira, que durou mais de sete horas, 28 deputados discursaram. Witzel preferiu fazer sua própria defesa por videoconferência.

A sessão foi semipresencial, com 45 deputados participando do Plenário e outros 24 de forma virtual. O deputado João Peixoto (DC) está licenciado por problemas médicos. O presidente André Ceciliano comandou os trabalhos e ressaltou que todo o trâmite respeitou decisões judiciais e foi baseado em entendimentos do Supremo Tribunal Federal (STF).

Ceciliano também afirmou que Witzel teve amplo direito à defesa. “Este não é um dia feliz para o Estado do Rio. Não temos como comemorar o fato de um governador eleito ser afastado do cargo por ter traído a confiança de milhões de eleitores que o escolheram de forma democrática”, destacou o presidente.

Defesa de Witzel

O governador Witzel falou durante uma hora e negou todas as acusações. Witzel já havia enviado sua defesa à Alerj com uma petição de 40 páginas e mais de 400 folhas de documentos anexos. Durante a sessão, afirmou que é vítima de linchamento moral e pré-julgamento. “Com essa decisão do parlamento nós estamos matando a nossa democracia, o bem mais preciso e mais caro do estado democrático de direito. Até o presente momento não pude fazer o meu amplo direito de defesa”, afirmou Witzel.

Ele afirmou ainda que não abrirá mão de seu mandato e sua defesa. E que "o erro será reparado" em julgamento técnico no Superior Tribunal de Justiça (STJ). "Não apareceu nada que possa dizer que, minimamente, eu tenha dado orientações para fraudar a Saúde. E é assim que estou sendo julgado e linchado politicamente, de forma muito triste que a história há de reparar", disse.

O presidente Ceciliano respondeu às críticas contra o Parlamento, reafirmando que o governador teve amplo direito de defesa na Casa. “Não atropelamos o processo. O governador teve amplo direito de defesa. Recorreu ao TJ, recorreu ao STF (Supremo Tribunal Federal), questionando a formação da comissão. Os trabalhos chegaram a ser interrompidos até a nova decisão daquela Corte. No fim, ficou claro que havíamos feito tudo de forma correta”, lembrou.

Em seu discurso, Ceciliano também ressaltou que o Parlamento Fluminense é o mais produtivo do país e que a Alerj não mede esforços em economizar recursos e destiná-los para melhor atender à população. Por fim, o presidente da Alerj reafirmou seu compromisso com o Estado do Rio e com a governabilidade do governador em exercício, Cláudio Castro.

“Da minha parte, o Cláudio Castro sabe que tem um aliado. Não dele, Cláudio, mas do Estado do Rio de Janeiro, da governabilidade. Não farei nenhuma indicação - nem técnica, nem política - a ele. Não quero nada do governo. Só quero que ele nos devolva nosso apoio através de projetos, trabalho, eficiência, transparência, emprego, segurança, educação, com respeito ao dinheiro público e às pessoas”, concluiu.

Denúncia

A denúncia contra Witzel foi protocolada pelos deputados Luiz Paulo e Lucinha, ambos do PSDB, sendo baseada em supostos desvios financeiros cometidos pelo governador na área da Saúde, sobretudo junto a Organizações Sociais de Saúde (OSs) e na construção de hospitais de campanha para combate à pandemia do coronavírus. A denúncia teve como base as Operações Favorito e Placebo do Ministério Público Federal (MPF) e da Polícia Federal (PF).O relatório aprovado pela comissão e ratificado pelos deputados da Alerj na sessão desta quarta ressalta, principalmente, a relação entre o governo Witzel com duas organizações sociais: Unir Saúde e Iabas. O relatório pontua a confusão existente entre os reais proprietários das duas empresas, uma vez que as investigações realizadas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal afirmam que ambas seriam na verdade controladas pelo empresário Mário Peixoto. O relatório também cita que investigações dos órgãos federais e a denúncia protocolada na Alerj apontam indícios de recebimento de vantagens indevidas por Witzel através do pagamento de honorários à sua esposa, Helena Alves Brandão Witzel. Nesse sentido, as investigações apontam que a primeira dama teria sido contratada por cerca de R$ 500 mil pela DPAD Serviços Diagnósticos LTDA, empresa que seria controlada, segundo as investigações, por operadores ligados à Mário Peixoto.

Especificamente sobre a Unir Saúde, o relatório ressalta a controversa requalificação da organização social, que havia sido desqualificada por resolução conjunta das Secretarias de Estado de Saúde e da Casa Civil, em outubro de 2019. Já com relação ao Instituto Iabas, o relatório levanta a questão de irregularidades sobre a construção dos hospitais de campanha para o combate da pandemia de coronavírus. O documento relacionou indícios do Ministério Público Federal de suposta existência de orçamentos fraudados para serviços de montagem e desmontagem de tendas, instalação de caixas d'água, geradores de energia e piso para a formação da estrutura dos hospitais de campanha.

Trâmite do processo

A abertura do procedimento para apuração de crime de responsabilidade do governador Wilson Witzel ocorreu durante sessão plenária no dia 10 de junho, com a aprovação unânime dos deputados. Na prática, a abertura do processo poderia ser uma decisão exclusiva do presidente da Casa, que preferiu consultar seus pares. Após a abertura, foi instalada no dia 18 de junho a comissão para analisar o pedido de impeachment e a denúncia protocolada pelos deputados Luiz Paulo e Lucinha.

O grupo, composto por 25 deputados, de todos os partidos com representação na Casa, foi validado por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes no dia 28 de agosto, após o rito do impeachment ter sido suspenso pelo presidente do STF, Dias Toffoli, no dia 27 de julho, que atendeu ao recurso da defesa questionando a formação da comissão especial. Na última quinta-feira, 17, a comissão aprovou parecer favorável ao prosseguimento do impeachment, decisão que foi ratificada nesta quarta em plenário.

O trâmite segue os ritos da Lei Federal 1.079/50, que regulamenta o julgamento de crimes de responsabilidade, e a interpretação do próprio STF na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 378, que orientou o rito de impeachment da presidente Dilma Roussef, em 2016.

Atualmente, Witzel já está afastado cautelarmente do cargo por decisão do STJ, após deflagração da Operação Tris In Idem, no último dia 28 de agosto. Com a aprovação do prosseguimento do processo de impeachment pela Alerj, a denúncia seguirá para o TJRJ e somente após o tribunal misto de julgamento aceitá-la que Witzel ficará duplamente afastado - pelo inquérito que responde no STJ e pelo processo de impeachment.

Próximos passos do processo de impeachment:

1-      O resultado da votação em Plenário é publicado no Diário Oficial do Legislativo;

2-      O Tribunal de Justiça do Estado do Rio (TJRJ) é comunicado para dar início à formação do tribunal misto;

3-      Este tribunal será formado por cinco deputados - eleitos pela Alerj - e cinco desembargadores - eleitos por sorteio com critérios definidos pelo TJRJ;

4-      Após o Tribunal Especial Misto receber a denúncia começa uma nova etapa, onde o governador é afastado por até 180 dias enquanto o tribunal analisa a questão. O presidente do TJRJ terá voto de minerva caso haja empate sobre o impeachment no tribunal misto.

 

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TAGS: Governo