O triste fim da chácara do Seu Martins

sexta-feira, 23 de abril de 2021

Antônio Alves Pinto Martins, natural do Minho, em Portugal, estabeleceu domicílio em 1914 em Nova Friburgo com a esposa Carolina, os sete filhos e a enteada. O Seu Martins ou Seu Pinto, como era conhecido, mesmo aos 52 anos, considerada à época como uma idade bem avançada, migrou do comércio para a lavoura adquirindo uma chácara que ficou conhecida como Vila Amélia. Produzia e comercializava laticínios, verduras, legumes, frutas frescas e em conserva, mel e linguiças defumadas com a marca V.A., de Villa Amélia.

Na chácara havia um extenso pomar com pereiras, macieiras, goiabeiras, canforeiras, jabuticabeiras, laranjeiras, caquis, tojos, bananeiras, pita, nêsperas, bem como cafezais. No brejo plantava hortaliças e legumes. Do Sobreiro, árvore que trouxe muda de Portugal tirava a cortiça para fazer as rolhas das garrafas do vinho que produzia na chácara. O Córrego do Relógio era circundado por videiras plantadas por Antônio Martins. Pode-se afirmar que a feira do bairro da Vila Amélia tem origem no quiosque que o Seu Martins possuía próximo a chácara para vender o que produzia.

Martins construiu na chácara para conforto da família um belíssimo palacete inaugurado no dia 18 de maio de 1916, benzido por Monsenhor José Alves de Miranda. Antônio Martins primava pela boa formação educacional dos seus filhos, estudando todos nos melhores colégios. Nenhum deles deu continuidade aos negócios do pai se dedicando ao amanho da terra. No álbum de família percebemos que a vida social dos Martins era intensa. Gostavam de receber no palacete. Adoravam fazer pic nic pela redondeza e festejar com parentes e amigos nascimentos, aniversários e casamentos.

Estes eventos eram registrados em fotografias. Antônio Alves Pinto Martins faleceu dia 25 de junho de 1924, com 62 anos. Já Carolina Martins faleceu em 2 de agosto de 1945, aos 82 anos. A partir da morte da matriarca percebemos que as fotos de uma família unida e coesa era coisa do passado. Aníbal, Antônio, Abílio, Alberto, Alfredo, Álvaro e Amélia residiam no Rio de Janeiro e nos parece não demonstrarem muito interesse pela chácara. Lucia Pontes, a meia irmã, residia em Manaus. Com o falecimento da mãe, Alfredo foi residir com a família na Vila Amélia para tomar ciência dos negócios da chácara e dar início ao inventário.

Desde o início os herdeiros manifestaram o desejo de vender a propriedade. As despesas superavam o faturamento. A chácara tinha uma área de aproximadamente 846.185 metros quadrados, mas só constava na escritura 667.749,20 metros quadrados. Além do palacete haviam cinco casas menores e benfeitorias como cocheiras, paiol e galinheiros. Inicialmente o imóvel seria vendido a Imobiliária Friburgo de propriedade do prefeito José Eugênio Müller. Porém, não fica esclarecido o motivo pelo qual o negócio não foi concretizado. Havia um projeto de aquisição pela Fundação da Casa Popular do Governo do Estado do Rio de Janeiro, e que por intermédio da prefeitura, seria construída uma vila operária. Ali bem próximo ficava Fábrica de Filó. Os herdeiros ao final do inventário entraram com uma ação de extinção do condomínio. Abílio propôs desfazer o condomínio e dividir a propriedade dando a cada um o seu quinhão. Mas havia muita desavença entre os irmãos. Alguns entendiam que a partilha iria desvalorizar o patrimônio. Como não houve acordo o imóvel foi a leilão em 29 de janeiro de 1951, sendo arrematado pela prefeitura por um valor aquém do esperado. Ficaram todos muito arrependidos.

Tudo indica que o espólio tinha uma dívida alta com a prefeitura que exerceu o seu direito de preferência no caso de venda. A Câmara Municipal deliberou autorizando a aquisição da chácara da Vila Amélia pela prefeitura. Amélia Martins de Almeida faleceu em fevereiro de 1950, um ano antes da venda da vila que levava o seu nome, Vila Amélia. Áurea Maria Almeida, bisneta de Amélia nos informa que em 1968, o prefeito Amâncio Mário de Azevedo doou o  palacete e o terreno da Rua Souza Cardoso em frente ao Mercado da Vila Amélia à entidade assistencial Afape (Associação Friburguense de Pais e Amigos do Educando).

Já em novembro de 1982, o prefeito Alencar Pires Barroso e a Afape fizeram uma permuta trocando este terreno por outro localizado na Rua Teresópolis, ao lado do Sesi, que estava cedido ao Governo do Estado. A Secretaria de Segurança Pública fez um contrato de locação do palacete com a Afape pelo prazo de 50 anos para abrigar a 151ª Delegacia de Polícia e a carceragem.

Por falta de recursos para a sua manutenção, o palacete foi se deteriorando enquanto servia como delegacia de polícia. No pátio da residência onde outrora haviam touceiras de hortênsias, um lago com peixes e um chafariz cercado por margaridas, azaléas, orquídeas, palmeirinhas, cravos, boca de leão e roseiras foram instaladas dez celas para carceragem. Transcorridas algumas décadas, o Instituto de Criminalística Carlos Éboli condenou as instalações da carceragem por serem insalubres e devolveu o imóvel à Afape extremamente danificado. Esta instituição não tem condições financeiras para restaurar o histórico palacete que se deteriora a olhos vistos das elites friburguenses.   

  • Foto da galeria

    Antônio Pinto Martins, o Seu Martins

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    Pic nic da família Martins

  • Foto da galeria

    Os Martins em um batizado

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