Tudo estava empoeirado. Parecia não existir ninguém ali, aliás, parecia que ninguém trabalhava, conversava, tomava uma xícara de café ou lia um livro naquele ambiente. Era até difícil imaginar o tanto de decisões que poderiam ter sido tomadas naquela sala de reuniões ou a troca de olhares entre os anfitriões. Nas caixas havia sinais de que alguém passara por ali; havia folhas brancas, novas, entre as amareladas e gastas pelo tempo. Nas prateleiras, tesouros em forma de livros novos dividiam espaço com as “relíquias” do século passado.
Notícias de Nova Friburgo e Região Serrana

Paula Farsoun
Com a palavra...
Paula é uma jovem friburguense, advogada, escritora e apaixonada desde sempre pela arte de escrever e o mundo dos livros. Ama família, flores e café e tem um olhar otimista voltado para o ser humano e suas relações, prerrogativas e experiências.
Há quem tenha uma espécie de intolerância ao uso excessivo de verbos no modo imperativo. Eu sou uma dessas pessoas. “Faça. Pegue. Diga. Vá. Venha.” Dependendo do contexto em que essas palavras são ditas, não soam bem aos ouvidos.
O imperativo quando utilizado por aquele que fala ou escreve, comumente expressa a intenção de que seu interlocutor realize uma ação, em tom de ordem. O incômodo acontece quando o modo verbal é empregado em uma frase desacompanhado das palavras básicas da gentileza.
Toda esperança do mundo caberia em uma seringa? Em um sinal de proteção e alívio? E eis que enquanto escrevia a coluna, recebi a informação de que tivemos a primeira pessoa vacinada em nossa cidade. Ufa! Mudei o rumo da prosa da semana. Óbvio! Como deixar de manifestar toda a esperança inerente à primeira agulhada tão perto de nós. Confesso que havia visto um helicóptero vermelho sobrevoando minha casa, quando tempos depois, soube que poderia ser ele a conduzir as doses de vacina para nossa região, senti-me emocionada.
E quando faltam palavras? Acontece com vocês? Por aqui, às vezes a ausência do que dizer se faz presente. Na verdade, não por falta de assunto, mas por excesso. Excesso de acontecimentos. Excesso de preocupações. Excesso de circunstâncias, de argumentos, de pensamentos. De tudo! Por vezes acho até que tantas coisas podem significar vazios de outras. Se há barulho, falta o silêncio. Se o problema persiste, falta a solução. Se o medo, a angústia e a preocupação encontram morada, talvez falte a paz. E por aí vai.
Há momentos na vida em que pausas se fazem mais que necessárias, por uma série de motivos. Talvez seja mais interessante projetá-las com estratégia, inteligência e planejamento, compreendendo sua importância. Não sei se as pessoas conseguem. O que vejo com bastante frequência é a pausa forçada. Aquela imposta pela vida, pelas circunstâncias, por fatores externos. Ou mesmo quando o corpo grita, a saúde é prejudicada, as forças se esvaem e aí, não resta outro caminho, senão sentir na pele os sinais e ... parar.
Adoro gente de verdade. Gente cujo conteúdo é real, cujo comportamento é compatível com a fala. Você olha e vê, tem um quê de transparência. Gente que ri, que chora, acerta e erra, que reconhece o tropeço e que perdoa. Que trabalha duro, preconiza a dignidade, diz a verdade. Que sofre e sente, que vibra e comemora, abraça, acolhe. Esse tipo de gente.
Diante de um enorme desafio sem precedentes, questionou-se a um jovem se ele iria encará-lo, ao que ele respondeu de forma óbvia que sim. Ele não era de se curvar às barreiras. Havia aprendido que ser forte também é uma questão de treinamento, de aprimoramento. Habitava nele uma força interior que impulsionava a energia para a execução e a transposição de qualquer obstáculo.
Em dias ruins, costuma vir o alento de que as coisas vão melhorar. Sim. Também penso assim. Contudo, é necessário viver os dias ruins também, as fases difíceis, os momentos tristes, os desafios e tudo mais que compuser este pacote das dificuldades. Não podemos, ainda que queiramos, num passe de mágica, rebobinar a fita nem pular para a próxima etapa. Porque a vida da gente é segundo após segundo. Sem escapatória. Precisamos viver todas as dores assim como degustamos da alegria de viver.
Em tempos em que vangloria-se tanto a necessidade e coragem em se dizer tudo o que pensa, aqueles que preferem o silêncio muitas vezes passam por involuídos. Isso mesmo. Se antes poupar a si mesmo ou ao próximo de discussões, deixar de falar tudo o que supostamente não seria bem recebido pelo interlocutor, recluir-se em silêncio eram práticas desejadas, hoje, há quem diga que nem tanto. Pelo contrário.
Propuseram-me a criação de um “diário da gratidão”, com a sugestão de que todos os dias elencasse razões para agradecer. Nem precisava. Por aqui, gratidão é praticamente um estilo de vida, uma forma de pensar, um jeito de existir. Quando o sentimento não brota espontaneamente, nos exercitamos para nos reconectarmos com ela. Gratidão é coisa séria, sentimento que deve ser nutrido e cuidado, que transmuta nosso olhar, ressignifica tudo na vida, acolhe dores. É o pontinho de luz na escuridão. A flor no deserto.