Lágrimas de tempestade

Wanderson Nogueira

Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

sábado, 25 de maio de 2024

Toda água corre para o rio e todo rio vira mar. Até as lágrimas que se misturam às tempestades. Elas vão passar por essa correntezas de aflição e medo, mas também de esperança. A dor de ver esvair tudo o que se construiu ao longo de uma vida inteira de trabalho… Mas há a fé de resistir, sobreviver e de pé se reerguer.

Somos tão pequenos, miúdos, diante da fúria da natureza. Tão iguais diante das nuvens que se derretem sobre as cidades, sobre nós. Rico ou pobre, ninguém pode deter a força da lama que se derrete e carrega anos e anos de negligência diante da necessidade de resiliência. Cidades sustentáveis, resilientes. 

Não cola a desculpa da falta de conhecimento para ressignificar nossas cidades. Somos sabedores do que é preciso ser feito e já. As tecnologias nos apontam o que precisa ser feito e já sentimos na pele a omissão contínua e desinibida de certos governos. Há exemplos mundo afora dos que não se omitem e os resultados são expressivos. Mas essa corrente precisa de mais do que ações isoladas.        

Há aqueles que dirão que as mudanças climáticas sempre existiram e existirão, mas até os que negam terão que ceder à clara percepção de que a velocidade das mudanças está em estágio incontível.      

A cada tragédia, acende o farol da solidariedade. Causa empatia e ânimo essa grande rede de ajuda ao próximo, que recupera a fé na humanidade. Mas essa solidariedade não pode emergir apenas em resposta às catástrofes, deve ser permanente. Solidariedade nas nossas atitudes, inclusive nas pequenas, para garantir o planeta às gerações futuras.

Como você tem agido? Como você tem participado? Como você tem votado? Todos pagam por suas (nossas) escolhas. Estamos no mesmo barco. Barco furado não navega.  

Somos todos responsáveis e é preciso agir de forma ética com o planeta e com as pessoas que são o planeta e as que serão o planeta. Seus filhos, netos, bisnetos. Como sua família do futuro, que talvez você nem vá conhecer, olhará para você? Se orgulhará da própria ancestralidade ou será punida pela poluição desenfreada que você plantou? 

Plante árvores, espalhe o verde, diminua o consumo do que é fútil. Ninguém precisa de tanto. O planeta necessita de nosso cuidado. E se o Planeta parecer muito grande, lembre da sua horta, do seu quintal, da sua cidade. É na cidade que o planeta persiste e cada cidade sente o impacto do que fazem em todas as demais. Mas nem por isso e talvez ainda mais por isso, devemos fazer a nossa parte.   

Não basta olhar para trás e achar que nunca mais acontecerá um janeiro de 2011. Essa memória nos convoca a não se acomodar. É preciso visão de futuro e que só haverá futuro para nós e os nossos se agirmos no presente.      

Cuidar da terra, dos rios e nascentes, preservar o meio-ambiente, reflorestar, transformar o lixo, reciclar, promover a equidade enfrentando, inclusive, o racismo ambiental vigente. Varrer o egoísmo e a ganância. É o que está nos matando uns aos outros. Ser vigilante e desenvolver a cultura de prevenção. 

Prevenir ainda é o melhor remédio, mas ser amigo da natureza é a melhor maneira de adicionar décadas à vida coletiva. 

De nada adiantará essa perseguição insana por crescimento em cima de crescimento, lucro e mais lucro, se mais cedo ou mais tarde não haverá mais recurso e ninguém para consumir. Não é tanto altruísmo assim, apenas sobreviver e garantir sobrevida ao próximo. 

Será preciso apelar à consciência, o direito fundamental de respirar? Se o céu chora, cuidemos uns dos outros para que não choremos. A água vai baixar. A lama vai secar. A poeira vai passar. Será que a gente vai ficar? 

Não precisa morrer pra ver Deus, como diz Criolo. Não precisa ver nossa gente morrer e tudo se perder para começar a cuidar do planeta, diz, com certeza, o incerto. Talvez seja essa a solidariedade das solidariedades: cuidar do planeta é zelar por nós.

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