Ondas que alcançam gerações

Radialistas dão voz à história do rádio em Nova Friburgo
sábado, 13 de fevereiro de 2021
por Alan Andrade (alan@avozdaserra.com.br)

Um meio de comunicação popular, com capacidade para levar sua frequência aos locais mais remotos do planeta, o rádio resiste bravamente às inovações tecnológicas, como o lançamento da TV e o avanço irrefreável da internet. Não só resiste, como também se aproveita da força desta maré (sobre suas próprias ondas), desembocando nas casas e vidas com a mesma magia que lhe é peculiar. Como cantou Freddie Mercury em um dos clássicos do Queen, “você teve seu tempo, o poder, e ainda terá a sua melhor hora”. 

Diante da publicação deste caderno, fomos conhecer os bastidores da Rádio Nova Friburgo, que há 75 anos informa e encanta a cidade. Entre seus diversos funcionários e amigos queridos, conversamos com profissionais de diferentes gerações, mas que possuem em comum a paixão pelo rádio.

Sentado à mesa de operação, que marcou o início de sua trajetória na emissora, um dos mais longevos locutores de nossa história discorreu sobre como sua vida passou a vibrar na mesma frequência das ondas sonoras da Rádio Nova Friburgo.

Pedro Osmar: a voz das manhãs de Nova Friburgo

Nasci em Aperibé, que à época era quinto distrito de Santo Antônio de Pádua, no noroeste fluminense. Eu tinha 9 anos quando meu pai morreu, e com 12 anos eu já queria rádio de qualquer maneira. Eu pegava aquelas cornetas onde se moía o milho, o fubá, e fazia daquilo um alto-falante. Nos comícios que tinham lá, eu fazia versinhos. Um cara me chamava, porque eu gostava de microfone. 

Esse sonho foi amadurecendo, até que um dia seu Bertoldo da Costa Lima me trouxe para Friburgo, e eu pude conhecer a cidade. Fiz feira livre, fui vendedor de mariola, de livro e até servente de pedreiro. Eu já estava há nove anos nesta cidade querendo trabalhar com rádio. E esse dia chegou. A minha avó sempre dizia que quando você tem um objetivo, um dia essa oportunidade chega. 

Em 1969 cheguei pela primeira vez ao estúdio da Rádio, à época lá na praça Getúlio Vargas. Tremia demais, mas consegui. Sempre foi tudo muito difícil, porque a rádio, com parcos recursos, não tinha o que tem hoje. Depois, em 1972, mudamos para este prédio, onde estamos até hoje.

Eu pegava às 14h, operava a mesa fazia a locução até a meia-noite. Começava depois do Projeto Minerva, à época, e ia até o programa Páginas da Saudade. Comecei no jornal falado, era repórter policial, ia no posto de urgência, na polícia e trazia as notícias para entrarem no ar às dez. À época, quem lia o jornal falado era o Jorge Cerqueira. Mas eu cheguei também a fazer, durante muitos anos, a leitura do noticiário Jornal 1080, que hoje voltou ao nome original, Repórter Friburguense

A notícia sempre foi a minha tônica. Por isso que eu tive vários programas na emissora depois que me tornei locutor da rádio. Eu tive o programa Você pede e eu atendo, o Fim de tarde, até chegar ao Show do Pedro Osmar, que entrou no ar em 10 de março de 1997, já tem 23 anos. Comecei com 40 minutos e hoje eu tenho 3 horas com esse programa. 

Aquilo que eu vivi, que trabalhei, que senti, hoje não é nada disso. Dos pratos grandes e caceteiras (equipamento que antecedeu o K7) desafinadas, hoje vivemos num mundo digital. Para quem é apaixonado por rádio como eu, foi um avanço pitoresco. Hoje podemos dizer que temos uma das dez rádios mais modernas do Brasil.

É claro que com a modernidade de hoje é muito mais fácil de fazer notícia. Antigamente tinha que correr atrás da notícia, hoje ela corre atrás da gente. A internet nos deu outro campo. Das pessoas que vivem em outros países e que através do nosso aplicativo nos ouve, que nos ouve através do Facebook e do Instagram. A gente está em todas. Então hoje podemos dizer para o Brasil e o mundo.

***

Durante seu programa, enquanto um jazz dançava suave pelo ar, Ernani Huguenin gentilmente nos concedeu um breve – porém tocante – depoimento de sua vasta trajetória como locutor.

 

Ernani Huguenin: não perca pela hora!

É com muito prazer que estou recebendo vocês, para dizer que estou já aqui na rádio há quarenta e nove anos. É uma vida, né? É o que eu sempre digo aqui: “A AM apaga, mas fica na história”. Comecei aqui no dia 17 de setembro de 1971, ano em que me casei com a minha Nadinha, Nádia Elisa Huguenin. Professora, radialista, trovadora. O que sou hoje, agradeço minha querida Nadinha. 

Nossa Rádio Friburgo é minha segunda casa, onde pretendo ficar até não poder mais. Todos os dias eu pego o Jornal A Voz da Serra nas bancas e sempre leio as manchetes. Voz da Serra... nos lembra muito bem do meu amigo Venturinha...

***

Quando a música estava prestes a terminar, deixamos Ernani voltar à condução de seu programa, com sua energia contagiante. Contudo, após cruzarmos a porta até a mesa de operação, ainda fomos surpreendidos pela sua marcante voz: “Alô A Voz da Serra! Não perca pela hora!”.

Atravessando salas e gerações, fomos conversar com um querido colega de A VOZ DA SERRA, que há 11 anos faz parte da equipe da Rádio Nova Friburgo, onde atualmente é editor-chefe de jornalismo. Ele teve sua primeira oportunidade de trabalhar como locutor no quadro de esportes do Show do Pedro Osmar, a quem chama carinhosamente de “padrinho na comunicação e no rádio”.

 

Vinícius Gastin: o rádio é uma cachaça

Eu sempre fui muito tímido, não imaginava trabalhar com rádio, falar em microfone, me apresentar em público, porque por mais que a gente não esteja com a presença do público aqui, a gente sabe que está chegando longe, para muita gente. É uma coisa incrível, porque quando ligam o microfone, as coisas fluem. O lado profissional aflora de um jeito que realmente a timidez fica em segundo plano. A própria timidez para outras coisas foi vencida com o trabalho no rádio, isso me ajudou também na vida pessoal. 

Hoje tenho meu programa próprio nas tardes de segunda à quinta-feira, mas mantenho também esse quadro de esportes no qual comecei minha carreira aqui na Rádio, no quadro de esportes do Show do Pedro Osmar. O Pedro me ensinou muitas coisas em termos de dicção, de locução, mas eu acho que uma coisa que ele me ensinou, que eu sempre vou levar para minha vida é a questão da transparência. É de você falar a verdade para os ouvintes, prezar pela veracidade da informação. Eu acho que o fato realmente não tem dois lados. 

Desde minha chegada aqui há 11 anos, sigo evoluindo, aprendendo a cada dia – a timidez, a questão da dicção, tudo isso – é um aprendizado diário e a gente vai se aposentar, a gente vai deixar o rádio e não vai ter aprendido tudo. Eu fui tomando gosto e, como dizem, realmente, “o rádio é uma cachaça e a cada vez que a gente faz, a gente quer fazer mais ainda. É realmente muito bom. 

***

Este vício inebriante que acomete os amantes do rádio também foi relatado por Fernando Moreira, repórter de A VOZ DA SERRA durante o dia e locutor esportivo nas noites de futebol da Rádio Nova Friburgo. O rádio foi sua primeira experiência profissional em Comunicação, iniciada há 13 anos na própria emissora.    

No fim de 2019, Fernando assumiu a equipe de esportes da Rádio, um sonho que ele já alimentava há tempos. Dono de um talento fora do comum e de um carisma que desperta admiração em todos ao seu redor – inclusive em mim –, Fernando estreou seu recente programa no dia 6 de janeiro, num clássico Fla x Flu do Campeonato Brasileiro. 

 

Fernando Moreira: só não ouve quem não quer!

Meu interesse pela locução esportiva veio através do meu gosto também pelo futebol. Desde pequeno eu já tinha esse gosto pela narração. Meus pais contam que eu mal sabia falar ainda quando imitava o Galvão Bueno narrando jogos da seleção. 

O rádio é uma paixão. Para quem gosta de Comunicação, de passar informação, de narrar os fatos, é viciante. Você, quando fica de fora de uma transmissão, sente falta. Eu comecei no rádio e tenho plena convicção de que foi a minha grande escola. Eu sou formado em jornalismo, mas muito do que eu sei hoje eu aprendi em rádio. A gente até brinca que o profissional de rádio se vira muito bem se é colocado na TV, numa emergência, porque ele já tem essa dinâmica, esse jogo de cintura de falar ao vivo, de improvisar. 

Eu gosto muito de rádio, como ouvinte e como locutor. Eu costumo dizer que é uma terapia, porque eu entro ali com prazer, saio dali satisfeito e depois, quando chego em casa, ainda escuto a transmissão toda novamente para saber onde posso melhorar e que parte ficou bacana. 

Acho que a rádio não vai morrer nunca. Quando surgiu a TV, diziam que ia acabar a rádio, mas a rádio está aí até hoje. Depois, com o surgimento da internet, todo mundo apostava que o rádio ia morrer, e ele está vivo – e eu diria até cada vez mais forte, porque pode ser ouvido hoje em várias plataformas, não só no radinho, no dial. “Só não ouve quem não quer”, como brinco durante as minhas transmissões. Acho que o rádio está voltando cada vez mais a ter a força que tinha algumas décadas atrás.

***

E um dos grandes responsáveis por esta força que se mantém incólume através do tempo, aqui na cidade e agora em toda a região norte, noroeste, centro-norte, região dos lagos e até mesmo na capital, é o seu Carlos Reis, uma das figuras mais queridas da Rádio Nova Friburgo. Conhecido nos bastidores como “Professor Pardal” por entender tudo sobre os equipamentos – desde os mais antigos aos mais novos –, ele tem uma vida inteira dedicada à emissora.

 

Carlos Reis: o “Professor Pardal” das montanhas

Eu nasci em Volta Redonda, estou nesta cidade há mais de 70 anos. Eu também já tive programa na nossa Rádio Friburgo, onde trabalho desde 1966, mas estou agora naturalmente afastado dos microfones. No decorrer do tempo, tivemos a transferência da rádio velha para a rádio nova. Foi me dada a oportunidade de ajudar a montar a rádio, com a permissão do dr. Aluísio Chaves de Moura. 

Mais adiante, nós conseguimos fazer um programa de rádio nesta emissora, o “Carlos Reis Show”. Eu já fiz viagens de futebol, transmissão do Hotel Avenida... Quando eu cheguei aqui, tive que fazer a cobertura do Carnaval, e eu carregava aquelas malas pesadas, porque na época era equipamento de válvula. 

Hoje dou uma assistência, porque o pesado eu não estou fazendo mais. Eu estou aqui há mais de 50 anos cuidando da “emissora das montanhas”, não deixando que ela fique muito tempo fora do ar, participando desta emissora em vários momentos difíceis. Muitos acontecimentos ocorreram durante minha trajetória. E estou agora nesta emissora nova, no fechamento do AM, uma rádio de ondas médias, que passa a ser FM. 

Esse apelido, Professor Pardal... é porque eu preciso manter a rádio no ar. Quando acontece alguma coisa, eu tenho que dar uma solução para o problema. Se não pode ser redondo, vai quadrado mesmo, mas tem que funcionar! E assim eu vim fazendo com tudo. Eu digo realmente que fazer radiodifusão é muita alegria para mim.

 

  • Assista o vídeo desta reportagem no site www.avozdaserra.com.br

  • Guto Soares - locutor

    Guto Soares - locutor

  • Gabriella Bini - locutora

    Gabriella Bini - locutora

  • Rogério Dias - operador de áudio

    Rogério Dias - operador de áudio

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