O brasileiro está vivendo cada vez mais e com maior qualidade de vida. Apesar de ainda existir muito preconceito sobre o assunto, o sexo após os 60 anos existe e deve ser estimulado, adaptando-se e contornando as mudanças no corpo que acompanham o envelhecimento.
Para que a prevenção seja efetiva, é necessário superar barreiras culturais e educacionais
Muitos acham que fazer sexo é característica da juventude — quando muito da maturidade — e que a atividade sexual inexiste a partir de determinada faixa etária. Em geral, admite-se que nos homens, lá pelos 60 ou 70 anos, ela declina e, depois, desaparece de vez. Em relação às mulheres, a crença é que o fenômeno seja ainda mais precoce. A moral vigente durante séculos reforçou o mito de que o momento da menopausa e a consequente perda da capacidade de gerar filhos marcavam o fim do interesse sexual feminino.
Hoje, já existe a comprovação de que esses conceitos estão completamente equivocados. Do ponto de vista médico, o papel da sexualidade após os 60 anos é de fundamental importância para a saúde física e psíquica de homens e mulheres mais velhos. Qualquer disfunção nessa fase da existência merece ser avaliada com cuidado, porque pode ser sinal indicativo de outros problemas de saúde, como a diabetes e a hipertensão.
Mas, quando falamos sobre HIV, a imagem do idoso não é a que costuma vir à nossa mente. No entanto, é necessário tratar da incidência do vírus nas pessoas mais velhas, ainda mais quando constata-se que o número de casos vem crescendo nessa população: um aumento de mais de 400% em dez anos. Em 2012, foram 378 pessoas com 60 anos ou mais infectadas. Em 2022, esse número subiu para 1.951, segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde.
Mais campanhas e diagnósticos
O aumento expressivo de casos tem chamado a atenção de profissionais da área, que destacam a necessidade urgente de ampliar a informação e os cuidados voltados à população mais velha. A desinformação ainda é um dos principais fatores para esse crescimento.
“Muitas mulheres acreditam que o HIV não é uma preocupação nessa fase da vida, e muito menos algo que as atinja diretamente. Mas, o que temos visto é justamente o oposto”, afirmam especialistas, como o médico infectologista André Bon, do Hospital Brasília e membro do Comitê Técnico Assessor para Terapia Antirretroviral para Adultos do Ministério da Saúde, que faz alerta para fatores que contribuem para essa alta.
“A falta de campanhas direcionadas à população idosa acarreta menos acesso à informação neste grupo. Desta forma, desinformados, eles ficam mais expostos ao risco, contribuindo para o aumento do número de casos”, ressaltou.
Outro ponto é a negligência quanto às medidas preventivas. Muitos idosos deixam de usar preservativos por pensarem que não precisam mais se preocupar com gravidez. Mas a questão não está restrita a essa possibilidade. “Eles esquecem que o uso de preservativos reduz também o risco de HIV e outras ISTs”, destaca André Bon.
Além disso, o acesso ampliado a medicamentos para tratar disfunção erétil tem melhorado a vida sexual dessa faixa etária que, por outro lado, aumenta o risco de exposição ao vírus. A maior frequência de testagem também contribui para a detecção de mais casos. “Com a testagem mais acessível e indicada pelos profissionais de saúde, mais diagnósticos de HIV estão sendo feitos entre os idosos”, completa.
Estigma e desafios sociais
Se o aumento de diagnósticos é um reflexo de avanços na saúde pública, ele também expõe desafios sociais. O preconceito em relação ao HIV ainda é um problema latente e que, na terceira idade, pode ser ainda mais intenso. Segundo dados do Ministério da Saúde, 35% dos diagnósticos entre idosos ocorrem em estágios avançados, evidenciando como o estigma pode atrasar a busca por testagem e tratamento.
“Nos pacientes idosos, devido a características sociais, o preconceito pode ser ainda maior. Este problema impacta diretamente no diagnóstico e tratamento adequado dessa população”, aponta André Bon.
De fato, o estigma faz com que muitos idosos evitem a testagem, sendo diagnosticados apenas quando adoecem. O diagnóstico tardio pode reduzir significativamente as chances de um tratamento eficaz.
Prevenção
As medidas preventivas contra o HIV são universais e independem da idade. O médico infectologista chama a atenção para o conceito de prevenção combinada, que inclui várias estratégias para reduzir o risco de infecção. “Testagem regular para o HIV, hepatites virais e outras ISTs; profilaxia pós-exposição (PEP); profilaxia pré-exposição (PrEP); diagnóstico e tratamento de ISTs e hepatites virais; uso de preservativo masculino ou feminino; e tratamento de todas as pessoas vivendo com HIV, são medidas essenciais”, reitera.
Segundo Bon, para que a prevenção seja efetiva, é necessário superar barreiras culturais e educacionais. “Muitos idosos ainda veem o uso de preservativos como algo desnecessário ou desconfortável. Campanhas que abordem de forma respeitosa, mais clara e mais eficiente a sexualidade na terceira idade podem ajudar a mudar essa percepção”.
Comorbidades além do HIV
Quando se trata do manejo do vírus, os idosos enfrentam desafios adicionais. “A população idosa frequentemente possui outras comorbidades além do HIV, como diabetes, hipertensão e doenças cardiovasculares. Portanto, além dos cuidados com os efeitos adversos das medicações para o HIV, é fundamental que haja atenção para a possibilidade de interações medicamentosas”, observou o infectologista.
Hoje, o tratamento para HIV é mais simples e acessível do que nunca. Atualmente, o tratamento é realizado com dois comprimidos por dia e apresenta poucos ou nenhum efeito colateral. Ainda assim, é essencial que os profissionais de saúde avaliem cuidadosamente as condições clínicas dos pacientes idosos e ajustem o tratamento conforme necessário. Alguns mitos e verdades que ainda cercam o HIV:
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Pessoas com HIV têm uma expectativa de vida curta
- Mito: Com o tratamento adequado, uma pessoa diagnosticada com HIV pode viver tanto quanto uma pessoa sem o vírus.
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O HIV é uma doença de jovens
- Mito: A prevalência de HIV entre pessoas com 60 anos ou mais tem crescido nos últimos anos.
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O HIV não é transmitido pelo beijo, suor e lágrimas
- Verdade: O vírus é transmitido apenas por relações sexuais sem preservativo, compartilhamento de agulhas ou de mãe para filho durante a gravidez, parto e amamentação.
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Todas as pessoas com HIV podem transmitir o vírus por relação sexual
- Mito: Pessoas vivendo com HIV em uso de antirretrovirais e com carga viral indetectável não transmitem o HIV por relação sexual.
(Fontes: Drauzio Varellae Ministério da Saúde)
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