Controlar ou confiar?

César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

quinta-feira, 23 de julho de 2020

“Controlar é uma resposta direta ao nosso medo, pânico e sensação de desajuda. [esta sensação] ocorre quando nós sentimos sobrecarregados ou quando falta confiança.É possível não confiar em nós mesmos e até em Deus no processo da vida. Ao invés de confiar podemos cair no controle. Podemos abordar esta necessidade de controle ao lidarmos com nosso medo. Lidamos com nosso medo ao confiar em nós mesmos, em Deus, no amor e apoio dos outros, e a este processo chamamos de vida e recuperação.

Podemos confiar quando as coisas não funcionam do jeito que queremos, crendo que Deus tem algo melhor planejado. Podemos confiar em nós mesmos para chegar onde queremos ir, dizer o que precisamos falar, fazer o que precisamos fazer, saber o que necessitamos conhecer, ser quem precisamos ser, e nos tornar tudo o que podemos ser feitos, quando temos a intenção de fazer isto, quando estamos prontos e quando o momento é apropriado.

Podemos confiar que Deus nos dá todas as orientações que precisamos. Podemos confiar que tudo o que precisamos em nossa jornada virá para nós. Não obteremos hoje tudo o que necessitamos para a caminhada total. Receberemos o suprimento para hoje, e amanhã para amanhã. Não é suposto que carreguemos todos os suprimentos para a jornada completa. O fardo seria muito pesado, e o caminho é para ser leve.

Não precisamos planejar, controlar e agendar todas as coisas. A agenda e o plano têm sido escritos por Deus. Tudo o que precisamos é estar presente, [abertos, disponíveis]. (Melody Beattie, Recovery Devotional Bible, Zondervan, p.999, 1993).

Para aprender a confiar e, assim, obter serenidade, é importante permanecer “atento à sugestão de me render a seja lá o que for sobre mim ou outra pessoa que eu esteja tentando controlar. Em outras palavras, preciso me soltar do meu ego. Soltar, entregar e manter simples, tudo isso me faz lembrar de que Deus está cuidando de mim e dos desafios da minha vida. Às vezes, quando me sinto excepcionalmente estressado, a rendição não vem com facilidade. Fundamentalmente, preciso até me soltar do processo de rendição. Não posso controlar o momento em que meu poder superior decide me conceder a graça de sentir e agir com serenidade.” (“A esperança para hoje”, Grupos Familiares Al-Anon, p. 163, 2005).

Um dos passos que pode nos conduzir à serenidade e confiança não é nem a questão de desistir do controle, mas desistir da ilusão do controle. Entendeu? Quando vivemos num estilo de vida controlador, vivemos na ilusão de que estamos controlando as coisas e as pessoas. Mas não temos controle sobre as pessoas e sobre tantas coisas em nossa vida.

O medo é uma energia que ativa os nossos defeitos de caráter. Às vezes eles ficam adormecidos como uma pista de carros de brinquedo desligada, e nós não os percebemos. Entretanto, quando estamos com medo, ele funciona como um combustível que faz com que os carros (nossos defeitos) comecem a se mover. Gastam-se nossas energias físicas e mentais andando em círculos, tentando não sermos batidos ou atropelados.

Em primeiro lugar, o que dispara o nosso medo? Tentar controlar coisas sobre as quais não temos poder é sempre um interruptor provável. Como eu o desligo? Utilizar a oração da serenidade ajuda a nos acalmar. Devemos fazer uma lista, com uma coluna intitulada “posso mudar” e outra intitulada “não posso mudar”. Aí, desmembra-se o problema em elementos e colocamos cada um em sua coluna. Quanto terminar, devemos pedir ao nosso poder superior para redirecionar a energia para aqueles elementos que podemos mudar.

Deixar de lado o presente e nos preocupar com o futuro é outro gatilho. Quando sentimos que nossa mente está na frente do corpo, é útil nos concentrar nos nossos corpos e muitas vezes nossa mente o seguirá. Demos lembrar a nós mesmos de soltar e deixar que Deus cuide das coisas da coluna “não posso mudar”. Devemos nos concentrar no que estamos fazendo no momento presente: estou lavando os cabelos; estou fazendo o jantar; estou dirigindo meu carro. Pode parecer bobagem, mas devemos fazer o que pudermos para que sejamos levados de volta ao momento presente. Essa atitude dá o tom para um dia mais sereno e centrado. (“A esperança para hoje”, Grupos Familiares Al-Anon, p. 228, 2005).

“Quando ouvi o Lema “Solte-se e entregue-se a Deus” pela primeira vez, não fez sentido para mim. Soltar o quê? E entregar a Deus o quê? O pouco que entendi foi a inutilidade de meus esforços em tentar controlar outras pessoas, lugares, e coisas. ... Eu me soltei de outras pessoas e comecei a sentir algum alívio. Eu me desliguei do que os outros disseram ou não disseram, e do que fizeram e não fizeram. Eu me desliguei das minhas expectativas. Não mais senti necessidade de agradar a todos. À medida que me soltei, descobri que vivo em maior harmonia comigo e com os outros. Comecei a assumir mais responsabilidades por mim mesmo. Imaginava que se pudesse aceitar a mim mesmo, poderia aceitar também as outras pessoas. Eu me desliguei dos resultados. Sentia-me bem mesmo se as coisas não fossem da maneira que eu tinha imaginado. Às vezes os resultados eram melhores do que eu tinha antecipado... À medida que eu me soltava, aprendia que podia entregar a Deus. ‘Entregar a Deus’ não significa que eu abdique das minhas responsabilidades. Na verdade, eu me torno mais responsável por mim mesmo. ‘Entregar a Deus’ indica que aceito minhas imperfeições e cresço em direção à pessoa que imagino que posso ser. ‘Soltar-se e entregar-se a Deus’ significa que posso desfrutar ser responsável pelo que é meu de direto, e deixar o resto para Deus. ‘Solte-se’ vem antes de ‘entregue-se a Deus’ por uma razão. Não posso esperar que Deus faça nada se eu ainda estiver agarrada ao meu problema.” (Extraído de “A esperança para hoje”, Grupos Familiares Al-Anon, p. 320, 2005).

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