A sinceridade do coração

A Voz da Diocese

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Buscando trazer uma palavra de paz e evangelização para a população de Nova Friburgo.

terça-feira, 09 de fevereiro de 2021

A liturgia do último domingo, 7, nos apresentou a figura de Jó. O homem justo e piedoso que foi acometido por grandes perdas e é conhecido em nossos ditos populares como uma pessoa paciente. Quem nunca usou ou ouvir alguém usar a expressão “paciência de Jó” ao enfrentar as provações da vida?

Contudo, as palavras destacadas pela liturgia dominical nos apresentam um homem angustiado e desesperado diante a tanta dor que recai sobre a sua vida: “Como um escravo suspira pela sombra, como um assalariado aguarda sua paga, assim tive por ganho meses de decepção, e couberam-me noites de sofrimento” (Jó 7, 2-3).

Parece uma contradição. Palavras como estas proferidas por quem é conhecido por suportar com resignação os maiores sofrimentos, injúrias e injustiças. Mas não o é!

A angústia de Jó é também a minha, a sua e de toda a humanidade. Ouvimos pela boca do profeta Jeremias que Deus tem um projeto de felicidade para nós (cf. Jr 29,11). Por isso, quando nos deparamos com a limitação, com a dor e com a finitude, é natural que nosso coração se angustie e busque respostas.

Em seu olhar atento e misericordioso, Deus não escuta as palavras proferidas por Jó como uma blasfêmia, mas como fruto da transparência de um coração que confia. A sinceridade expressada nestas circunstâncias são o modelo mais perfeito de oração, pois nela se revela a consciência sobre a própria vida e a reflexão sobre sua condição.

O catecismo da Igreja Católica, repetindo o ensinamento de Santa Teresa do Menino Jesus, afirma que “a oração é um impulso do coração, é um simples olhar lançado ao céu, um grito de reconhecimento e amor no meio da provação ou no meio da alegria” (§ 2558).

Assim, as palavras de Jó são uma perfeita oração que deve ser almejada por toda a humanidade. Modelo de uma alma que se abre totalmente a Deus como um amigo, com quem não se tem segredos.

Infelizmente, ao longo dos séculos fomos preenchendo com formalismos, ressalvas e proibições nossa relação com Deus. Transformamos nossa oração em escolhas polidas de palavras, nos esquecendo que ele é capaz de enxergar nossos corações e conhecer o que está no mais íntimo de nós, conhecendo a nós mais que nós mesmos.

Poderíamos então pensar: qual o sentido da oração? Por que haveríamos então de pedir se Deus conhece o que precisamos? Porque a oração é expressão máxima de humildade e reconhecimento do poder de Deus que tudo pode realizar em nosso favor. “A atitude de pedir deve ser tomada sobretudo por nossa causa, pois quem não pede e não quer pedir fecha-se em si mesmo” (YouCat, 486).

Enfim, a oração é, ao mesmo tempo, fruto do conhecimento de si mesmo manifestado na sinceridade e transbordamento do coração a Deus, em quem confia e se entrega. É como nos disse o Papa Francisco: “A consciência de que nas dificuldades podemos sempre dirigir-nos ao Senhor, e de que Ele jamais refuta nossas invocações, é um grande motivo de alegria” (Angelus, 16 dez. 2020).

Por isso, não podemos negar a nossa dor, ela é, na verdade, a fonte e o alimento de nossa relação com aquele que nos criou para o bem e a felicidade. E assim podemos alcançar a resposta de Deus à nossa angústia, não por palavras, mas por sua constante presença.

 

Padre Aurecir Martins de Melo Junior é coordenador diocesano da Pastoral da Comunicação. Esta coluna é publicada às terças-feiras.

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