Pesquisa mostra que brasileiros são os que mais engordaram na pandemia

Em Nova Friburgo, especialistas veem o mesmo cenário
sexta-feira, 19 de março de 2021
por Christiane Coelho, especial para A VOZ DA SERRA
Pesquisa mostra que brasileiros são os que mais engordaram na pandemia

A pesquisa Diet & Health Under Covid-19, realizada em 30 países, revelou que os brasileiros foram os que ganharam mais peso na pandemia. Entre os que participaram da pesquisa, 52% dizem ter engordado. Enquanto a população dos demais países teve um aumento médio de 6,1 quilos, os brasileiros relataram ter aumentado 6,5 quilos em média.

Em Nova Friburgo, o cenário não foi diferente. O nutricionista Carlos Henrique Padilha Pirazzo (foto), que atua na cidade há 15 anos, também viu essa consequência da pandemia em seu consultório. “Observo na minha prática de consultório, um aumento significativo de peso em pacientes. Alguns conseguiram se adequar rapidamente, em até três meses após o início da pandemia, tiveram pouco ganho de peso, em torno de um a dois quilos. Pacientes que demoraram mais, só conseguindo se adequar após um ano, apresentaram um ganho de peso maior, em média nove quilos, chegando em alguns casos a mais de 20 quilos em um ano”, relatou o médico.

A micro empresária Andréa Chaves já trabalhava em home office. Mas desde março do ano passado, teve a rotina totalmente modificada, quando foi instituído o isolamento social, e se viu em casa com duas crianças com aulas online e uma delas sendo alfabetizada nessa modalidade. Além desse desafio, ainda se somou a  preocupação com a economia do país, com o medo de perder receita para o sustento da família. A rotina, antes estabelecida pelos compromissos fora de casa, foi totalmente alterada e, tendo petiscos e alimentos calóricos à mão, aliados à ansiedade de todo o cenário, fez com que Andréa engordasse. “Ganhei dois quilos. Sei que não foi muito, mas isso me incomoda e sei que pode interferir na minha saúde como um todo”, disse.

Mudança de comportamento

De uma hora para outra, a rotina e o cenário mudaram completamente para muitas famílias mundo afora. Passou-se a ver, então, a casa como o principal cenário da vida humana. O conforto passou a ser prioridade em tudo, nos móveis, nas roupas e também na comida. “ Além de não precisar se expor, por estar em casa de pijama, roupas largas, as pessoas começaram a buscar maior prazer na comida, como uma compensação por tudo o que estavam perdendo. Não faço julgamento de valores, pois a situação foi extremamente atípica para todos nós. Porém, passado este período inicial, era necessário se adaptar”, acredita Carlos Henrique.

E, o que já era uma tendência no mercado, o delivery (entrega em domicílio) passou a ser um serviço essencial. Restaurantes e empreendedores do setor de alimentação, que antes só faziam vendas para consumo local, por uma questão de sobrevivência, aderiram ao novo formato, oferecendo comodidade e facilidade para a aquisição de comidas já prontas.

Para o nutricionista Carlos Henrique, as facilidades do dia a dia, como aplicativos de entrega, contribuem significativamente com o ganho de peso. Geralmente são ofertadas comida com maior apelo no prazer imediato, como carboidratos refinados e gorduras saturadas, sendo a pedida “certa” para quem está com baixa emocional e com preguiça de ir para cozinha.

Atividades físicas também diminuíram

Além da alimentação, um outro fator que contribuiu para o aumento de peso foi a diminuição da prática de exercícios físicos. Num primeiro momento, a insegurança e o medo fizeram com que todos ficassem trancados em casa. Com adoção do uso das máscaras e a liberação de funcionamento de alguns setores, as pessoas começaram a se sentir mais seguras para sair e até para fazer atividades físicas ao ar livre. Mas, as academias ficaram fechadas em Nova Friburgo entre março e julho e, ao retornarem, com limitações para ocupação, viu o número de alunos despencar.

“Hoje, funcionamos com uma média de 50% do nosso público, mudando o percentual, de acordo com o que é estabelecido pelo bandeiramento decretado pelo município”, esclarece Raphael Corrêa, profissional em educação física, que faz parte da Comissão de Profissionais de Educação Física em Nova Friburgo.

Uma das alternativas foi a oferta de treinos online por meio de aplicativos, mas, de acordo com Raphael, essa modalidade atinge apenas entre 1% e 2% dos clientes das academias. Além disso, outra saída é a contratação de um personal trainer para oferecer as aulas em casa. Uma realidade não acessível para todos.

Além da obesidade, muitas doenças crônicas, como a hipertensão arterial sistêmica, o diabetes e doenças respiratórias são fatores de risco em caso de ser acometido pela Covid-19. E a prática de atividade física é fundamental para prevenção dessas doenças, além de auxiliar na manutenção de taxas em níveis melhores, quando já se tem essas comorbidades. “A prática de atividades físicas também reduz a chance de desenvolver depressão, ansiedade e diminui os níveis de estresse, outra questão que tem preocupado bastante os profissionais de saúde pelo aumento da incidência”, explica.

Por que a ansiedade contribui para o aumento de peso?

Insegurança e incerteza sobre o futuro, medo de se pegar a Covid-19 e infectar parentes e amigos, viver sem uma rotina e pior, sem prazo para tudo isso acabar, viver o luto por perder parentes e amigos queridos. Tudo isso pode levar a um quadro de ansiedade. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil já era o país com a maior taxa de pessoas com transtorno de ansiedade no mundo, e o quinto em casos de depressão, antes mesmo da pandemia. “Pessoas com essas patologias, muitas vezes recorrem à comida como forma de “fuga”, escolhendo alimentos com altos níveis de carboidratos e açúcar, consumindo muito café, álcool e tabaco, logo, o aumento de peso é inevitável”, observa a psicóloga Mariana Nidecker (foto).

Entre maio e julho do ano passado, uma pesquisa da Universidade do Rio Grande do Sul (UFRGS), revelou que 80% da população brasileira tornou-se mais ansiosa na pandemia. “A ansiedade, muitas vezes causa, compulsão alimentar. Além disso, geralmente, pessoas com ansiedade tem uma baixa adesão às atividades físicas e, por vezes uma baixa autoestima”, explica a psicóloga.

Crianças também preocupam

A obesidade infantil já era uma questão preocupante antes da pandemia. De acordo com o Ministério da Saúde, em 2019, entre as crianças atendidas pelo programa de Atenção Primária à Saúde do Sistema Único de Saúde (SUS), 7% dos menores de 5 anos e 13,2% das crianças entre 5 e 9 anos, apresentavam obesidade. E, com o isolamento social, a tendência é que esse número aumente. “A meu ver crianças e adolescentes foram os que mais sofreram alterações em seu comportamento, consequentemente também percebi ganho de peso neste grupo”, disse o nutricionista Carlos Henrique Pirazzo.

Ana Paula Marun viu seu filho, João Pedro, de 13 anos, engordar cerca de sete quilos em um ano de pandemia. Ficando o dia inteiro em casa, ele diminuiu a prática de atividade e passa praticamente o dia inteiro em frente às telas. “A rotina não existe mais. Ele come a hora que quer e, como trabalhamos fora, não temos como ficar vigiando o tempo todo”, disse.

As crianças tiveram que se adaptar a um modo de vida totalmente novo. As aulas passaram a ser online. O lanche que antes era enviado pelo responsável, com quantidade e qualidade específica para o período do intervalo, foi substituído pelo armário e geladeira a poucos passos do computador ou celular, a hora que quiser. As atividades físicas, tanto na escola, quanto na academia foram interrompidas. No lugar, filmes, vídeo games, aplicativos de jogos nos celulares.

“As crianças reduziram drasticamente sua rotina de atividades físicas, não se deslocando mais de casa para a escola, sem participação em aulas esportivas, além do maior quadro de ansiedade e desequilíbrio familiar provocado pela pandemia; muitas vezes compensado com premiações gastronômicas como doces e biscoitos recheados”, esclareceu o nutricionista Carlos Henrique.

A obesidade infantil é um fator de risco para o desenvolvimento precoce de doenças como diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares, distúrbios psicológicos e obesidade na vida adulta.

Engordei, e agora? Como reverter?

Um ano passou e a expectativa de sair desse cenário foi frustrada muitas vezes, devido ao aumento do número de casos da Covid-19 e ao surgimento de novas cepas, e muitas pessoas estão esperando voltar à “normalidade” para dar o primeiro passo para ter uma alimentação balanceada e para começar a praticar exercícios físicos. Mas, o nutricionista Carlos Henrique Padilha Pirazzo adverte que o primeiro passo para reverter esta situação do ganho de peso, é a aceitação do momento que vivemos. “É necessário se adequar a realidade atual, às circuntâncias atuais e não ficar esperando melhorar, para começar a ter hábitos alimentares saudáveis e prática regular de esportes”, explica ele.

Para tanto, é preciso estabelecer uma nova rotina. Para o nutricionista é importante ter horários específicos para cada atividade, assim fica mais fácil cumprir as metas estabelecidas. O equilíbrio também é importante para adesão a um estilo de vida saudável. “É sabido sim que a comida mais calórica e a bebida podem fazer parte de uma vida saudável, mas com equilíbrio. Quando o consumo é além da dose, há muitos efeitos colaterais indesejados entre eles, o ganho de peso. Cortar o ciclo, sem radicalismo mas sabendo o momento certo de encaixar estes prazeres se faz necessário”, esclarece ele.

A prática de atividades físicas é fundamental nesse processo. O educador físico Raphael Corrêa (foto) alerta sobre a importância de ter um profissional para instruir na prática para não se lesionar ou adquirir problemas no corpo. “Mas, quem não tem condições, pode optar por exercícios de baixo impacto, como as caminhadas ao ar livre ou atividade já feitas no dia a dia, como optar por escadas, em vez de elevadores”, explica ele.

O acompanhamento de um psiquiatra e de um psicólogo também é recomendável no processo de emagrecimento. “Identificar gatilhos que levam ao consumo excessivo de alimentos ricos em açúcar e gordura, além do álcool, faz toda a diferença”, finaliza a psicóloga Mariana Nidecker.

 

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TAGS: saúde