No mesmo dia em que as contas de 2018 da Prefeitura foram rejeitadas no plenário da Câmara
Municipal, o Palácio Barão de Nova Friburgo sofreu outro importante revés. Ao analisar o
conteúdo de uma ação popular impetrada pelo vereador Professor Pierre no dia 4 de agosto
deste ano, a qual apontou inúmeras situações possivelmente irregulares, a juíza Fernanda
Telles, da 2ª Vara Cível de Nova Friburgo, concedeu liminar suspendendo o polêmico contrato
nº 163/2019, de valor próximo a R$ 47 milhões, para serviços de iluminação pública com
vigência para os próximos quatro anos, podendo chegar a cinco.
A decisão, com vigência imediata, se pautou na inicial da ação popular e acompanhou
entendimento manifestado previamente pela promotora Claudia Condack, do Ministério
Público Estadual.
Entenda o caso
Já no fim de 2019, enquanto tramitava regularmente no TCE/RJ o processo de licitação de
contratação de empresa para promover a manutenção do parque de Iluminação Pública do
Município, estimado em pouco mais de R$ 7 milhoes pelo prazo de 12 meses, o governo
municipal desistiu da referida licitação para aderir, em tramitação que chamou atenção pela
rapidez, a uma ata de registro de preços do município de Araguaína, Tocantins. O valor do
contrato foi de R$46.842.000,00, com vigência para os próximos quatro anos, podendo chegar
a cinco. É o maior contrato realizado até o momento pelo governo Renato Bravo.
O governo municipal informou ao TCE/RJ sobre a desistência de licitar o serviço, mas ainda não
foi possível confirmar se o órgão também foi informado a respeito da carona na ata de
Araguaína.
Não havia tamanha previsão de gastos na Lei Orçamentária Anual (LOA), e por isso o vereador
Professor Pierre iniciou uma ação fiscalizatória que veio a ser concluída somente no mês de
julho de 2020. Ao longo deste processo verificou-se que, embora os gestores públicos
envolvidos tenham justificado que a substituição de lâmpadas de vapor de sódio por LED traria
economia de até 70% dos gastos com o fornecimento da energia paga à concessionária
Energisa, não havia tal comprovação no processo, nem tampouco projeto básico e cronograma
mínimo de instalação.
Tendo em vista que essa economia é que permitiria, a princípio, arcar com a despesa de
fornecimento de energia concomitantemente com a remuneração da empresa responsável
pelos materiais e mão de obra para a substituição do sistema, a falta de previsão e autorização
na LOA, somada a comprometimentos orçamentários de tão longo prazo, desenharam um
cenário diante do qual o vereador entendeu que deveria agir, considerando os possíveis danos
caso o contrato fosse levado adiante.
Aprofundando as apurações identificou-se que o governo acatou, ou incluiu cláusulas
contratuais não previstas no Edital de Araguaína, assim como não previstas expressamente na
legislação. Cláusulas estas que autorizam a empresa responsável a abrir conta junto a
instituição financeira para gerir os recursos originados pela receita da Contribuição de
Iluminação Pública (CIP) arrecadadas pela Energisa, além de autorizar a cessão desses créditos
públicos a terceiros.
Sem que o processo administrativo tenha passado pela Secretaria de Finanças e pela
Controladoria-Geral para assegurar se havia ou não previsão orçamentária e recursos
suficientes em caixa, e sem que fosse realizada a reserva orçamentária e o prévio empenho
exigido por lei para assegurar a contratação, o procurador-geral achou por bem, no mesmo dia
em que ofertou seu parecer pela legalidade da contratação, lavrar o contrato e levá-lo para a
assinatura do prefeito.
Durante a fiscalização, junto aos documentos e arquivos que foram disponibilizados por um
servidor municipal, vieram juntos um arquivo em documento word que evidenciou que o
nome do autor da minuta contratual não era pessoa vinculada, ou ao menos conhecida, da
PGM, mas sim o nome identificável como sendo o da testemunha da empresa interessada no
serviço, que assinara o contrato nesta condição.
A testemunha, segundo pesquisas externas realizadas pelo vereador, seria um grande
empresário do ramo de iluminação por LED que modernizou o sistema de iluminação Pública
do Município de Atibaia, em São Paulo. A suspeita, assim, é que o contrato tenha sido
formulado pela própria empresa interessada, ou por pessoa próxima a ela, e não pelo
Município.
Na visão do parlamentar, os gestores públicos municipais enxertaram, ou aceitaram o enxerto,
de cláusulas contratuais que abriram as portas para que a receita da CIP, ainda prevista para
ser arrecadada pelos próximos quatro ou cinco anos, fosse a garantia para um potencial
agente fomentador de crédito, o que resolveria, na visão dos agentes públicos, a falta de
orçamento e de dinheiro nos cofres da Prefeitura. Assim, ainda de acordo com a interpretação
do vereador Professor Pierre, o governo municipal autorizou, na verdade, a prática de
factoring pela empresa prestadora dos serviços, cuja operação seria garantida pelos recursos
públicos derivados de tributos que nem sequer ingressaram no orçamento e, ainda que
ingressem ao longo dos próximos anos, estão comprometidos com o pagamento da conta de
energia.
Diante da situação o vereador ajuizou Ação Popular fundada em indícios da prática de atos de
improbidade administrativa, a qual recebeu parecer favorável do Ministério Público, e decisão
também decisão favorável nesta quinta-feira, 27, de deferimento de liminar para suspender o
contrato do Município com a empresa RH ENGENHARIA, sob pena de multa pessoal de
50.000,00 para os gestores públicos municipais envolvidos.
Existe ainda a suspeita quanto a duplicidades de contrato pois, apesar da empresa ser
responsável pelo fornecimento de material e fazer as instalações, o governo paralelamente
acaba de publicar o terceiro termo aditivo ao contrato com a empresa NW Paluma, para o
aluguel de dois caminhões guindauto (que eleva o funcionário até o alto do poste) e uma
caminhonete para atender à demanda da manutenção dos pontos de iluminação pública nos
postes de todo o município. A renovação de contrato vale por 180 dias, ao custo de R$ 410 mil.
A ação popular e as manifestações que suscitou também observam que não foram respeitados
critérios estabelecidos no decreto federal de adesão de ata, na medida em que a adesão foi de
100%, quando deveria ter sido de 50%.
A ação tem seis réus: o Município de Nova Friburgo; o prefeito; o procurador-geral; titular e
ex-titular da secretaria de Serviços Públicos e a prestadora dos serviços em Araguaína/TO e em
Nova Friburgo.
Confira trecho da decisão
"Há lastro probatório do qual se extrai a verossimilhança das assertivas autorais, a atual
situação é de extrema contenção de gastos públicos indiscriminadamente pelos entes públicos, o contrato nº 163/2019 estar orçado em 46 milhões, sendo necessário o resguardo
do erário.
Há a inadequação do projeto básico dos serviços a serem prestados, a despeito do transcurso
de seis meses da data da assinatura do contrato.
Há séria e fundada controvérsia, notadamente à luz do princípio da primazia do interesse
público, quanto aos termos da cláusula quarta do contrato em tela, segundo a qual haveria
umaantecipação de créditos em desfavor do erário, mediante a criação de conta vinculada a
instituição financeira independente, sob gestão da contratada, que passaria a administrar
recursos arrecadados com a CIP, depositados pelo agente arrecadador, no caso a
concessionáriaEnergisa, dando ensejo, assim, ao pagamento de seus próprios serviços ou
eventuais cessionários de direitos creditórios.
Por fim, há de se ter toda a cautela numa contratação de tamanha monta e analisar sua
consonância com os princípios regentes da atuação administrativa, especialmente da a
legalidade, moralidade, economicidade e eficiência.
Isto posto, concedo, parcialmente, a medida liminar postulada para determinar a suspensão
do contrato Nº 163/19 e, por conseguinte, a imediata suspensão de qualquer pagamento
oriundo deste contrato ao MNF, sob pena de multa pessoal aos ordenadores da despesa no
âmbito municipal para o contrato em questão no importe de cinquenta mil reais, em caso de
eventual descumprimento da presente decisão."
Nota da Procuradoria
Já na noite de sexta-feira, 28, a Procuradoria-Geral do Município divulgou nota sobre o tema.
“A respeito da liminar que suspende contrato de iluminação com lâmpadas de LED, que prevê
a substituição dos pontos de luz de toda a cidade, a Procuradoria Geral do Município informa
que irá, indubitavelmente, recorrer da decisão, já que na petição popular, que subsidiou a
medida, constam informações absolutamente inverídicas.
O Município não pagou, em hipótese alguma, R$ 12milhões, para a empresa que aderiu a ata e
passou a prestar o serviço de locação de equipamentos de luminárias do parque municipal.
O contrato é de cinco anos, sendo que nos 12 primeiros meses ainda está em fase de
adaptação o projeto do Executivo. Então, o valor inicial apontado na petição não corresponde
a realidade, não foi pago, é uma afirmativa inverídica.
Além disto, o Município sequer foi intimado para se manifestar sobre o pedido de liminar, o
que também configura uma postura errônea do ponto de vista legal.
Vale destacar também que a própria empresa que se figura como ré vai interpor recurso,
porque quer fazer valer o contrato, já que tem, inclusive, um laudo pericial que prova a
economicidade e vantagem para o Município a locação destes equipamentos, que, ao final,
serão revertidos para o patrimônio municipal, sendo necessário, futuramente, somente a troca
de lâmpadas.
Outro ponto que merece destaque é que o parecer do Ministério Público faz presunções de
indícios de improbidade, contudo, presunção não é prova de lesão ao erário municipal.”
Resposta à nota
Em relação à nota da Prefeitura, o vereador Pierre apontou o seguinte questionamento:
“quero que o Executivo aponte, na inicial da ação popular, onde está expressamente
registrado que o município teria pago R$ 12 milhões. O que eu disse foi que não existe
previsão orçamentária. Não há, portanto, inveracidade.
Já na manutenção, renovado o aluguel de caminhões por R$ 410 mil
Paralelamente ao contrato das lâmpadas de LED, a Secretaria Municipal de Serviços Públicos continuará fazendo o atendimento das ordens de serviço referentes à manutenção e conservação da iluminação pública.
Coincidentemente, foi publicado no Diário Oficial eletrônico da prefeitura desta quinta-feira, 27, o terceiro termo aditivo ao contrato com a empresa NW Paluma, para o aluguel de dois caminhões guindauto (que eleva o funcionário até o alto do poste) e uma caminhonete para atender à demanda da manutenção dos pontos de iluminação pública nos postes de todo o município. A renovação de contrato vale por 180 dias, ao custo de R$ 410 mil.
O serviço de manutenção da iluminação pública é realizado pela Secretaria Municipal de Serviços Públicos desde outubro de 2018. Desde então, nenhuma outra terceirizada foi contratada pela prefeitura para fazer a troca das lâmpadas. Para atender essa demanda, desde janeiro de 2019 o Governo Municipal aluga veículos para dar maior agilidade ao serviço.
A troca de lâmpadas queimadas nos postes é responsabilidade das prefeituras desde 2014, conforme determinação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A taxa de iluminação pública cobrada pelas concessionárias de energia elétrica nas contas de luz é transferida para as prefeituras, que devem aplicar os recursos na manutenção do serviço. Em Nova Friburgo, a concessionária Energisa repassa para a prefeitura cerca de R$ 1,2 milhão por mês da taxa de contribuição da iluminação pública.
No início de junho deste ano, A VOZ DA SERRA publicou outra reportagem com diversas denúncias de ruas às escuras. Na ocasião, a prefeitura informou que “o serviço de iluminação pública vem sendo prestado normalmente” e que “a Secretaria de Serviços Públicos fará uma ronda nos locais mencionados pela reportagem a fim de identificar possíveis pontos com problemas e saná-los”.
Porém, de lá para cá pouca coisa mudou: “Na minha rua tem cinco postes sem luz. Já reclamamos, e nada”, disse uma leitora. “A taxa de iluminação pública é muito bem paga e para o serviço ficar ruim ainda tem que melhorar muito”, ironizou outro. “Já que pagamos e não temos o serviço, deveríamos acionar o Procon. Eu tive que puxar uma extensão e colocar no portão da minha casa para iluminar a rua”, denunciou mais um leitor.
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