Entre pedidos de demissão e pré-candidaturas, Raul Sertã fica sem 11 profissionais

“Não houve reposição de funcionários. Ninguém enxerga as condições de trabalho”, diz médico que trabalhou na unidade até a última semana
sábado, 29 de agosto de 2020
por Guilherme Alt (guilherme@avozdaserra.com.br)
Setor de Covid do Raul (Arquivo AVS)
Setor de Covid do Raul (Arquivo AVS)

Agosto ainda nem terminou e já reserva perspectivas preocupantes para setembro, na saúde friburguense. Isso porque a equipe médica do Hospital Municipal Raul Sertã perdeu em poucas semanas sete médicos – três para campanha eleitoral e quatro que alegaram péssimas condições de trabalho.

Além dos médicos, outros quatro profissionais de enfermagem também se afastaram de suas funções para concorrer às eleições municipais. São 11 profissionais de saúde a menos atuando no município, fora os afastados por Covid-19, o que tem gerado preocupação em quem precisa utilizar a saúde pública.

Soma-se a esse problema, o avanço da pandemia do coronavírus no município com a explosão de casos confirmados e óbitos, ao cenário político turbulento que atravessa a prefeitura, após ter as contas de 2018 rejeitadas por 17 vereadores na última quinta-feira, 27, o que pode atrapalhar os planos do prefeito Renato Bravo de se candidatar à reeleição.

De acordo com um dos médicos do hospital, que pediu para não ser identificado, pesou para o seu afastamento a falta de estrutura e a insegurança de trabalhar no Raul Sertã. “Nós pedimos (para sair) porque estava inviável trabalhar na emergência. Não contrataram médicos extras para o setor de Covid. Também não houve cobertura para os profissionais de saúde que tiveram de se afastar por vários motivos – dentre eles o coronavírus – e as eleições”, disse o ex-funcionário.

Ainda de acordo com o médico, a direção do hospital trabalha engessada, sem ter meios para contratar novos funcionários. Nossa fonte também questionou ter sido possível contratar funcionários para outros setores e não ter havido a reposição de médicos. “Para o setor de Covid teve contratações para a enfermagem, equipes de limpeza, leitos de CTI, mas profissional médico na emergência para atender a demanda não teve contratação”, se queixou.

O médico lembrou da responsabilidade incutida na profissão, mas reclamou da falta de respaldo da unidade hospitalar para dar as mínimas condições de trabalho. “Um mínimo erro e a culpa é toda do médico, mas ninguém enxerga as condições de trabalho oferecidas. Por isso que eu saí. Muita exposição tanto à nossa saúde, quanto ao risco de erro médico”, desabafou.

Sucessivas baixas 

De acordo com o ex-funcionário eram cinco clínicos, dois internistas para atender traumas e as intercorrências dos pacientes internados, três socorristas para fazer o atendimento de porta. “Sendo que depois do Covid a equipe teve que ficar com apenas socorrista para tudo no Covid (porta e internados) e os outros dois para todo o resto do movimento normal”, enumerou.  

De acordo com o médico, através de informações de ex-colegas, nesta sexta-feira, 28, só havia um clínico atendendo no Hospital Raul Sertã. Segundo a prefeitura, em um aviso à imprensa pela manhã, a justificativa é devido ao afastamento de profissionais por adoecimento. “Um médico clínico geral está realizando somente atendimentos de emergências. As demais especialidades, ortopedia e pediatria, continuam em atividade na unidade. Lembramos que a Unidade de Pronto Atendimento, UPA, em Conselheiro Paulino está disponível para o atendimento de pacientes”, informou o comunicado.

Em nota enviada na tarde desta sexta-feira, 28, à redação de A VOZ DA SERRA, a prefeitura justificou que alguns motivos de afastamento são pontuais, como atestados pelo Covid-19. “A demanda da procura pelo Pronto Socorro (CTU) aumentou devido a flexibilização. Dentro deste contexto, reforçando o trabalho de prevenção com os profissionais e com a população. Em relação ao engessamento, o poder público segue os trâmites legais nas ações da Secretaria de Saúde. Faz-se importante salientar que, com a flexibilização, houve um refluxo de pacientes ao hospital, bem como acidentes de trânsito, agravos com armas, entre outros procedimentos. Com relação ao preenchimento de vagas, vale ressaltar, que o RH foi acionado, para encontrar a melhor forma de solucionar as baixas não previstas”.

MP cobra explicação sobre falta de insumos no Raul Sertã

Em julho deste ano, a titular da 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Nova Friburgo, Cláudia Condack, tornou pública diversas cobranças feitas à prefeitura com relação ao Hospital Municipal Raul Sertã. Desde maio o MP tenta obter da prefeitura informações sobre a disponibilidade do estoque de insumos e medicamentos, visando o gerenciamento, para uma possível ampliação de demanda. O primeiro ofício foi enviado no dia 12 de maio, com prazo de cinco dias para ser respondido. O que segundo o MPRJ, não aconteceu. Em nova tentativa, no dia 15 de junho, a promotora voltou a cobrar informações, mas também não obteve resposta.

No dia 24 de junho, Cláudia Condack destacou uma alarmante taxa de ocupação de leitos naquele dia atingindo 80%. A promotora alertou para a necessidade de verificação quanto à capacidade de atendimento da unidade, incluindo o estoque de medicamentos e insumos de saúde necessários ao tratamento dos pacientes, diante da alta demanda. A promotora entregou, então, um ofício diretamente ao prefeito Renato Bravo e ao secretário de Saúde, Marcelo Braune, com várias determinações, entre elas, que seja informada quais medidas se pretende adotar diante da elevação da taxa de ocupação do Raul Sertã, apontada no boletim divulgado no dia 23 de junho, comunicando ao MP as medidas em execução, tais como eventual requisição de leitos da iniciativa privada ou regulação de pacientes, evitando-se o desatendimento dos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS).

Também foi feito questionamento à direção do Raul Sertã para saber se há carência de insumos, equipamentos hospitalares, equipamentos de proteção individuais (EPI ́s), profissionais de saúde, medicação e outros instrumentos. A Promotoria solicitou ainda que caso haja essa carência, fosse apresentada uma listagem com os itens necessários ao funcionamento do hospital.

Os vereadores Johnny Maycon e Márcio Alves, junto com membros do MP e da Defensoria Pública, fizeram uma vistoria no Raul Sertã e constataram a falta de itens. A promotora, em mais um ofício no dia 30 de junho, solicitou ao município esclarecimentos sobre os protocolos e a metodologia de tratamento aplicada aos pacientes com Covid-19, partindo de critérios de classificação por gravidade, informando, ainda, se há disponibilidade de estoque suficiente de insumos e medicamentos, visando seu gerenciamento, ante uma possível ampliação de demanda.

A promotora reforçou que os ofícios anteriores foram ignorados e por isso oficiou, mais um vez, a Secretaria Municipal de Saúde, a fim de que a pasta se manifestasse quanto ao contido no relato, devendo esclarecer, ainda, se há previsão para o recebimento dos medicamentos mencionados, bem como se eles fazem parte da farmácia básica, ou se são componentes especializados fornecidos pelo Estado. 

Doação de empresários

Em junho, empresários do setor do vestuário se mobilizaram para doar ao Raul Sertã 600 fardos de papel toalha (com 1.000 unidades, cada); 50 caixas de álcool 70 (com 12 unidades, cada); 70 galões de sabão líquido neutro (5 litros, cada); 25 mil copos descartáveis e 30 borrifadores. 

 

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