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O Ó do borogodó!
Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
Mais uma semana terminando, e a mente começa a procurar um novo tema a abordar. Essa é a sina do escritor: imaginar e produzir textos literários. Não lhe é permitido escrever qualquer coisa e de qualquer maneira. É uma rotina que beira ao delírio em que a imaginação tem de viajar sobre uma quantidade indeterminada de ideias, se concisas ou conflitantes, discordantes ou desajustadas. É um movimento em que tudo encontra sentido desde que a produção do texto seja concluída com qualidade. A sorte do escritor é que a literatura lhe oferece licenças, podendo, ele, inclusive, usar a pontuação aos seus critérios ou inventar palavras; brincar com a Língua Portuguesa e empregá-la com inventividade. Para tal é preciso conhecê-la com perfeita intimidade.
Semelhante a qualquer outro momento da vida em que temos de preencher vazios, a página em branco ou a tela do computador iluminada, com apenas as marcações da página é o “Ó do borogodó!” Uma situação, ao mesmo tempo é atraente à imaginação — posto que o autor pode abrir suas asas e criar com liberdade — mas também repleta de instantes em que o escritor suspira e exclama: “E agora, José? E o pobre José, com a mão no queixo, responde com todas as incertezas do mundo: “É mole não...”
E o relógio corre destemido, sem olhar para trás a escutar “peraí!” ou “tô indo”, a súplica daquele que tem prazos e não sabe o que escrever, porém deseja produzir um texto que seja inteligente, atraente ao leitor e contenha valores humanos.
Hoje, resolvi, sem cerimônias falar deste momento inusitado quando todos nós (e não somente o escritor) desconhecemos qual o caminho que vamos seguir. E de que modo vamos fazê-lo: se vamos pegar um barco, um trem ou um avião; se vamos a pé, a nado ou de charrete. E superar os medos! O escritor precisa abrir suas caixas de receios e liberá-los como chaminés que soltam vapores em intensidades diferentes.
Às vezes, é possível que o leitor pense que o escritor não passe por momentos de indefinição essencial. Pois sim! Produzir um texto de qualidade é o mesmo que construir uma ponte sobre um rio caudaloso com cimento, tijolos, argamassa e milhões de outros etecéteras. Sim, senhor!, como dizia Alice, de Lewis Carroll, acima de tudo, o ato de imaginar é trabalhoso!
Vamos supor que na imaginação esteja a síntese da história de vida do escritor e das vidas de pessoas significativas a ele, dos lugares onde ele mora ou habitou, da herança familiar e genética, de todas as suas leituras e escutas. O imaginário guarda universos infinitos e distintos, visitados neste momento em que o “Ó do borogodó” é imperador. Se o imaginário é empobrecido, o texto não sai do lugar comum e não supera o banal.
E, agora, que superei a vergonha de mostrar minhas inseguranças, resolvo confessar ao meu leitor que não quero abordar um assunto que vá além das minhas fragilidades. E, falando delas, acabo escrevendo sobre este instante original e que o reitero como crucial.
Uau! Escrevi este texto numa tacada só, me sentindo à vontade para empregar expressões não usuais e encontrei bagagens interessantes nesse momento indesejado e carregado de incertezas. De certo, o não-saber pode ser o início da construção de novos saberes e identidades.
Aproveito e vou ler Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Lewis Carroll e James Joyce...
Tereza Cristina Malcher Campitelli
Momentos Literários
Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.
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