Ailton Krenak, líder indígena, ambientalista, filósofo, escritor e o futuro ancestral

Ele tem nos ensinado muitas coisas. Suas palavras são cheias de generosidade e poesia.
sexta-feira, 20 de setembro de 2024
por Jornal A Voz da Serra
(Foto: Reprodução instagram Ailton Krenak)
(Foto: Reprodução instagram Ailton Krenak)

Ele tem nos ensinado muitas coisas. Suas palavras são cheias de generosidade e poesia. Em seu livro Futuro Ancestral, ele inicia com uma saudação aos rios, falando sobre e para todos eles. Ao virar a primeira página, embarcamos com ele em um fantástico passeio de canoa por águas ancestrais que nos sustentam, evaporam e choram:

“Esse nosso rio-avô, chamado pelos brancos de rio Doce, cujas águas correm a menos de um quilômetro do quintal da minha casa, canta. Nas noites silenciosas, ouvimos sua voz e falamos com nosso rio-música.

Gostamos de agradecê-lo, porque ele nos dá comida e essa água maravilhosa, amplia nossas visões de mundo e confere sentido à nossa existência. 

À noite, suas águas correm velozes e rumorosas; o sussurro delas desce pelas pedras, formando corredeiras que fazem música. Nesse momento, a pedra e a água nos conectam de maneira tão maravilhosa que nos permitem conjugar o ‘nós’: nós-rio, nós-montanhas, nós-terra. Sentimo-nos tão profundamente imersos nesses seres que nos permitimos sair de nossos corpos, dessa mesmice da antropomorfia, e experimentar outras formas de existir. Por exemplo, ser água e viver essa incrível potência de tomar diferentes caminhos. …

Há mais de 2 mil anos, comunidades humanas já estabeleciam suas aldeias nas margens do Tapajós. E hoje nossos parentes Munduruku e Sateré-Mawé seguem buscando defender o corpo desse rio dos aparatos de infraestrutura que o governo teima em implantar, além do assédio do garimpo, das madeireiras e de outras violências. … 

Rios vivos. Será que vamos matar todos os rios? O que estamos fazendo ao sujar as águas que existem há 2 bilhões de anos é acabar com a nossa própria existência. Elas vão continuar existindo aqui na biosfera e, lentamente, vão se regenerar, pois os rios têm esse dom. Nós é que somos tão efêmeros que vamos acabar secos, inimigos da água, embora tenhamos aprendido que 70% de nosso corpo é formado por água. … 

Vamos escutar a voz dos rios, pois eles falam. Sejamos água, em matéria e espírito, em nossa movência e capacidade de mudar de rumo, ou estaremos perdidos.”

Obras de Krenak: Lugares de Origem, Futuro Ancestral, A Vida Não é Útil, O Amanhã Não Está à Venda, Ideias Para Adiar o Fim do Mundo, O Sistema e o Antissistema: Três Ensaios, Três Mundos no Mesmo Mundo

(Fonte: arvoreagua.org)

Krenak ensina que: 

“A primeira infraestrutura que uma nação deve considerar é seu território; depois você vai pensar em estrada, hidrelétrica etc. No Brasil, já faz muito tempo que ninguém pensa que o território é o que institui a possibilidade de identidade cultural desses povos; por isso a gente corre o risco de ter uma diversidade de povos sem lugar para pousar.

Enquanto o Brasil insiste em querer imitar países ricos, nós vamos continuar sendo essa pobre imitação de país rico. Temos um território imenso, uma biodiversidade escandalosa, uma riqueza natural de dar inveja aos estrangeiros. Mas os brasileiros, principalmente aqueles que têm poder político, que têm capacidade de se articular politicamente, são tão medíocres que não têm conhecimento sobre esse mundo que eles habitam.

É uma tragédia, é um desencontro entre, de um lado, esse território, essa pachamama, essa terra rica e, de outro, a mediocridade das autoridades, dos políticos, que insistem em estragar o melhor que nós temos e produzir pobreza.”

E critica: 

“Eu acho escandaloso que alguém continue pensando na fronteira do Brasil em termos geopolíticos, de um lado o Oceano Atlântico e de outro o resto da América Latina. Essa espécie de enclave, encaixado no resto da América Latina, mas que não consegue pensar no continente americano.

É impossível imaginar que o Brasil vá surfar na riqueza enquanto os países vizinhos estão se debatendo, com suas economias quebrando e suas sociedades explodindo em revoltas. Só mesmo um idiota pode imaginar que o Brasil tem como sair dessa sozinho, sem um amplo diálogo com os vizinhos, com os povos da América Latina, principalmente da América do Sul, sem a Amazônia.

Ela [Amazônia] é formada por nove países, incluindo o Brasil, mas os brasileiros preferem discutir sobre a Amazônia como se a Amazônia fosse um sítio particular de brasileiros. Ignoram, inclusive, o tanto de povos indígenas e não indígenas que vivem na Amazônia e que constituem comunidades urbanas complexas.” 

(Fonte: socioambiental.org)

 

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