O ponto final

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

terça-feira, 01 de abril de 2025

Acredito que as pessoas já se depararam com os desafios de terminar algo, colocar um ponto final ou mesmo, como se diz por aí, virar a página. O que começa termina e, se assim não for, o acontecer perde seus sentidos. Se toda praça termina numa rua, como os mares acolhem as águas dos rios, o que finda abre um leque de possibilidades; o fim não extingue as energias. Como dizia Lavoisier, na natureza tudo se transforma, e o que resta tem energia suficiente para fazer novo começo acontecer, uma força capaz de nos permitir dar uma volta no rumo da vida e não nos deixar à deriva da história.

Ao pensar na literatura, também estou me referindo à vida, a arte que espelha o existir. Todo o começo se direciona ao findar, já que não há infinitudes na vida do Planeta Terra. Mesmo quando construímos uma ideia e não conseguimos visualizar seus desdobramentos finais, temos a certeza de que será preciso criar caminhos que os levarão até lá. A beleza da literatura está na inteligência que o autor tem para criar, ou seja, decidir sobre os fatos que vão compor o enredo, sempre fatídico a findar.

Agora mesmo estou percebendo que o mais significativo a este tema são os caminhos desbravados a cada etapa do texto, sendo o fim não mais do que mera consequência. São os detalhes das cenas que vão dar grandeza ao final composto de muitos pormenores, como em tudo na vida.

Não há regras para se construir um final, bem como não pode ser estigmatizado como bom ou ruim. Penso que deva ser avaliado não de modo fantasioso, mas com realismo a partir das relações de causas e consequências estabelecidas ao longo do texto. A imaginação do escritor tem que visualizar a verossimilhança que não pode fugir da coerência das probabilidades.

O fim tem harmonia com os fatos da história. A diferença entre quem escreve uma história e quem vive a vida está no controle dos acontecimentos. Não é fácil escrever uma história, mais difícil ainda é experimentar a vida, a mais interessante e repleta de aventuras de todas as histórias de ficção. Eu li a obra da Ana Cláudia Quintana Arantes, médica referência em Cuidados Paliativos no Brasil, “A morte é um dia que vale a pena viver”, em que aborda a finitude, observada ao acompanhar os pacientes terminais. Segundo a Dra. Ana Claudia, os momentos finais da vida são decorrentes do modo como eles a viveram e tomaram suas decisões, como amaram e estabeleceram relações com seus familiares e amigos, cuidaram de si e do ambiente em que viveram, quais esforços fizeram para realizar seus propósitos, bem como o que aprenderam e de que forma seus conhecimentos na vida.

Os anos que vivemos e as páginas que escrevemos nos amadurecem e nos melhoram por estarem repletos de finais e novos começos. Segundo Nietzsche, a vida é um constante devir. Deve ser vivida em sua plenitude.

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Tereza Cristina Malcher Campitelli

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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