Em busca da lucidez plena

Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 07 de fevereiro de 2022

Os conceitos são relevantes para que possamos saber com o que estamos lidando, fazendo ou mesmo querendo. São concepções que definem o modo como nos posicionamos diante das situações.

No Clube de Leitura Vivências, refletindo a respeito do livro “Amores Improváveis”, de Edney Silvestre, nós nos deparamos com a palavra “criatura” e conversamos livremente sobre o que pensávamos a respeito. Particularmente, não gosto da palavra, talvez porque tenha mais consoantes do que vogais. Ou porque minha avó se referia à “criatura” quando havia algo recriminativo em alguém.

Fui cutucada pela vontade de saber como somos definidos pelos diferentes conceitos que nos dão significados. A literatura, enquanto arte da palavra, se utiliza de todos os conceitos para expor-se e cumprir seus propósitos, o que me mostra que é uma arte que harmoniza os modos como somos tomados pelas diferentes áreas da produção do conhecimento.

Mas, afinal de contas, quem somos: criatura, ser, pessoa, sujeito, indivíduo? Ou somos um somatório de ideias, como confetes coloridos que dançam ao vento antes de tombarem ao chão?

De fato, os cidadãos são seres de identidade e possuem características intrínsecas. Temos um registro de nascimento que nos nomeia, informa a data e o local onde nascemos, a paternidade e a maternidade. Somos registrados como criaturas vivas. Temos existência concreta e própria. Não somos, por conseguinte, personagens ou seres imaginados.  

Nascemos situados num contexto natural, social, econômico e cultural, somos sujeitos subordinados a condições pré-estabelecidas, que podem ser modificadas pela ação das pessoas através do tempo. A pessoa é um indivíduo único capaz de interagir e transformar. Se o sujeito é subordinado às regras e circunstâncias, sua pessoa, usando a consciência que adquire ao longo da vida, é capaz de conquistar o livre-arbítrio, na medida em que desenvolve capacidades e responsabiliza-se pelos seus atos. Por meio das experiências existenciais, aprimora seu modo individual de ser, estar e de fazer, definindo uma personalidade, tornando-se único no mundo.   

Agora algo me ocorre. A saúde é consequência do desenvolvimento das capacidades físicas e mentais que nos permitem integrar e aprimorar os conceitos que nos dão significados.

Ah, a literatura, em cada texto, tem a sabedoria de nos mostrar quem podemos ser.

O fazer desta coluna me evidencia que pensamos e desejamos tantas coisas, mas nunca podemos esquecer da nossa existência real, que se concretiza através de uma corporeidade, única dimensão constitutiva e construtiva que expressa a humanidade que temos e a vida que possuímos, através da qual fazemo-nos presente no mundo.

Desse e apenas desse modo, segundo Pierre Furter, somos seres em educação permanente, na medida em que estamos em constante processo de desenvolvimento e transformação. Vivemos num eterno despertar provocado pelas habilidades e conhecimentos que as experiências nos oferecem. Tocamos, de momento a momento, em todos os seres que abrigamos, na criatura, no indivíduo, no sujeito, na pessoa. Somos, enfim, seres em busca da lucidez plena. Como o que sucede neste instante.

Salve a literatura!

 

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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