Esse novelo chamado tempo

Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

Mas nada muda, só nós podemos mudar

Não é a primeira vez que conto isso, mas a proximidade do fim do ano me fez lembrar.  Meu filho, quando tão pequeno que passado, presente e futuro se misturavam em sua cabeça, assistia a um desenho na TV. Estávamos saindo para ir à casa de meu irmão, e ele tanto queria estar lá, brincando com o primo, quanto ficar em casa, vendo o resto do desenho.  Ainda não tinha aprendido essa dura realidade da vida: quem escolhe renuncia.

Foi então que ele teve uma ideia tão verdadeiramente brilhante que brilhou em seus olhos. Sugeriu que a TV ficasse desligada, até que ele estivesse com o primo, e juntos continuassem a acompanhar a história, a partir do ponto em que ele a havia deixado, ao sair de casa.

Coisa de criança! diremos nós, com toda a razão. Mas também nós, tantas vezes queremos que o tempo pare, ou que se apresse, ao sabor de nossas necessidades e conveniências. Vemos os anos despencando um a um pelas folhas dos calendários e dizemos que o tempo passa, quando nós é que passamos, o tempo é túnica inconsútil, não tem remendos nem costuras.

O tempo nos ignora e vai em frente, indiferente às nossas alegrias ou sofrimentos, que fazem com que ele nos pareça apressado demais ou desesperadoramente lento. Ai, como o tempo voa no leito do amor! Ai, como o tempo se imobiliza no leito do hospital!

A nossa tão imensa, mas tão limitada inteligência não consegue abarcar a noção de infinito. Quando falamos que algo é infinito, estamos pensando em algo finito, pois mais do que isso não conseguimos compreender. O tempo, sim, é infinito, mas nossa passagem por ele é tão curta, tão já-é, já-era, já-foi, que precisamos dividi-lo para lidar com ele, para aprisioná-lo nos limites da nossa compreensão.

E foi por isso que inventaram a passagem de ano, quando nos parece que uma mudança acontece de verdade. Mas nada muda, só nós podemos mudar. Então esforcemo-nos verdadeiramente para que a virada que vai acontecer entre 31 de dezembro e 1º. de janeiro realmente nos impulsione, nos motive a fazer coisas novas e boas, na busca de um ano melhor, uma vida melhor, um mundo melhor para nós todos que aqui estamos neste momento, e para todos os que nos sucederão no infindável desenrolar desse novelo chamado tempo.

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No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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