A literatura salva!

Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

A literatura salva quando o leitor absorve a leitura e, tempos afora, dias e anos, fica ruminando e fazendo colares de pensamentos. É um processo que decorre da identidade que ele tem com o texto, que vai sendo construída durante a leitura. É uma relação íntima, quase secreta, entre autor e leitor. Segredos e sussurros? Sim. A leitura é um ato solitário e exclusivo. Aquele que tem o livro nas mãos sente as palavras, sempre silenciosas e audaciosas, penetrarem em seu âmago, interpreta-as e, assim, seu olhar capta novas imagens e nuances do acontecer. 

A voz da literatura tem vida real e imaginada. Desenha-a em imagens feitas de frases ou versos em toda sua rudeza e delicadeza. Os estilos literários têm maestria para abordar temas sensíveis de modo que na poesia, no romance, no ensaio ou na crônica o escritor faz suas expressões com intenções pré-definidas para modificar os modos de ser e existir do leitor. O autor é inquieto. Posto que sim. Escreve porque tem insatisfações e querências. Seus desassossegos vão ao encontro aos do leitor, que também quer se modificar, conquistar e fazer com que suas ideias abram novos caminhos. A vida é um espetáculo de cadências. Autores e leitores dançam a valsa dos lobos antes do amanhecer, no auge da madrugada.

Ainda estou lendo “A vida que ninguém que vê” de Eliane Brum, um livro de narrativas que mostra a vida de pessoas que vivem ao nosso lado, mas que não são percebidas. Que me reporta à obra de Richard Bach, “Fernão Capelo Gaivota”, ou ao do médico e psicanalista francês, Jacques-Marie Lacan, ou ainda ao “I Ching, o livro das mutações”. Que me reporta a vários autores literários, filósofos e pensadores, que falam sobre a existência de seres, com seus decorrentes e intensos processos de transformação. 

Somos mutantes!

A partir das características herdadas, das condições socioeconômicas, das experiências diárias e, segundo Lacan, da determinação “TU ÉS”, em que o outro (pessoas próximas) e o grande Outro (como a comunidade, a mídia e a moda) faz a todos nós, vamos nos edificando como pessoas. Por sorte, somos inconformados e borbulhantes. Queremos mais. Ir além. Ser de modo diferente. Melhorar. Estar leve e liberto ao morrer.   

A vida tem crueldades! Apresenta obstáculos, intransponíveis muitas vezes, especialmente para os invisíveis, devido à precariedade das condições de vida a que estão submetidos. A magia da vontade determinada, a resiliência inteligente e criativa, o amadurecimento do espírito, a agilidade da mente e a força do corpo nos possibilitam transformar o nosso status quo. O fundo do poço nos suga, mas a luz do fim do túnel nunca se apaga, inclusive para os cegos. Contudo Há que faz questão de não a ver. 

As impossibilidades são preponderantes. Entretanto temos capacidades que nos possibilitam investir na realização de propósitos. Os modos de ser, fazer e estar são transformados pelos esforços que acontecem na luta diária de uma vida. Podem ser em vão? Acredito que não. Em todas as batalhas há vitórias e derrotas. Não há magias e gratuidades, mas trabalho e mais trabalho.

Salve Fernão Capelo Gaivota!

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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