Retalhos da vida de João Baptista da Silva

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Há algumas semanas atrás li o livro “João Baptista da Silva. Sua vida, sua história”. Organizado por seus filhos trata-se na realidade de uma autobiografia já que o saudoso João Baptista deixou muitos relatos escritos nos quais os autores se valeram fazendo poucas intervenções. Casado com Adília Gomes teve quatro filhos Lúcio Flavo, Renato Henrique, Maria Inês e José Antônio Gomes da Silva, se empenhando com sacrifício para que todos tivessem curso superior.

Nascido em Nova Friburgo em 19 de setembro de 1919 era o caçula de sete irmãos. Era neto de uma escrava, Esperança de Jesus, cuja origem se orgulhava e gostava de destacar. Segundo o jornalista Nelson Kemp “era uma baiana prendada. A melhor doceira que Friburgo conheceu”. Toda a sua formação educacional foi feita com muito esforço em razão de sua condição financeira alcançando a graduação em Direito, cujo bacharelado concluiu com quase 60 anos de idade. João Baptista era conhecido como JB e escreveu durante muitos anos a coluna “Retalhos” aqui em A VOZ DA SERRA e produziu e apresentou dois programas de rádio “Ondas Verdejantes” e “Esperança no Ar”.

Em razão de seu talento como artilheiro foi admitido na Fábrica Rendas Arp. Era muito comum à época as indústrias cooptarem bons jogadores de futebol para reforçar o seu time nos jogos dos industriários. João Baptista trabalhou na Rendas Arp no período de 1941 a 1970. No ano de 1952, disputou a primeira eleição para vereador. Porém, um homicídio ocorrido em seu local de trabalho prejudicou a sua candidatura.

Este homicídio relatei em artigo na semana passada nesta coluna pois teve grande impacto no município dividindo opiniões entre a população friburguense. Em novembro de 1952, o operário José Alves Pinheiro em legítima defesa feriu com uma faca o gerente da fábrica Rendas Arp, Henrique Frederico Fernando Witte, que faleceu quase um mês depois desse incidente. Neste conflito, antes de sua ação o operário buscara a intermediação de João Baptista já que ele era muito respeitado pelos funcionários da fábrica e trabalhava no mesmo setor que a vítima. Baptista intercedeu mas não obteve sucesso e em sua autobiografia, quando se refere sobre esse acontecimento, parece indicar a “deflagração de uma luta de classe”. Sugere que o operário José Alves Pinheiro estaria contaminado por um determinado movimento político que implantara a “semente do ódio” nos indivíduos, envenenado lhes a alma.

Passado esse episódio no ano de 1958 João Baptista elegeu-se vereador pelo Partido Trabalhista Nacional sendo reeleito para dois outros mandatos como vereador. Em 1962 foi eleito pelo Partido Social Democrático e no ano de 1966 pelo Movimento Democrático Brasileiro, recebendo a maior votação dada a um vereador. Participou de inúmeras associações recreativas, sociais e culturais no município que faz questão de destacar em sua biografia.

Entre os anos 50 e 70 do século passado era difícil imaginar uma instituição em Nova Friburgo no qual não fizesse parte. Para ficar em apenas alguns exemplos, João Baptista foi presidente do Recreio dos Empregados da Fábrica de Rendas Arp, presidente dos clubes de Malha de Nova Friburgo, vice-presidente da Sociedade União Humanitária dos Operários, conselheiro do Esperança Futebol Clube, membro do Conselho Deliberativo da Santa Casa e igualmente das duas sociedades musicais Euterpe e Campesina.

Baptista amava o seu torrão natal e podemos perceber isso quando escreveu “O segredo enigmático de querer sempre retornar à cidade de Nova Friburgo é que o criador houve por bem, entre os píncaros de elevados montes, num país maravilhoso, de permitir a existência de um paraíso em miniatura, onde os homens pudessem antegozar as delícias do éden celestial”.

Considerado um excelente orador fez o discurso na inauguração do obelisco em homenagem aos expedicionários do município de Nova Friburgo, na Praça do Suspiro. Gosto muito de destacar outro episódio importante de que foi partícipe. Foi secretário da Comissão de Repulsa à proposta de um grupo de áulicos getulistas que objetivavam a mudança do nome de Nova Friburgo, para Amaral Peixoto para homenagear ao genro do presidente Getúlio Vargas. Não fosse a sua intervenção estaríamos hoje dizendo que somos peixotenses ao invés de friburguenses.

O livro traz depoimentos de pessoas que conviveram com João Baptista, como o de José Carlos Schuenck que disse ser ele um exímio prosador. De fato escrever poemas, poesias, acrósticos e trovas foi uma de suas paixões e no livro podemos conhecer parte de sua obra. Uma parte interessante de sua biografia foi o discurso que fez em 1964 em homenagem ao embaixador da Alemanha. Ele nos brinda com um histórico sobre os industriais e técnicos alemães que instalaram as indústrias têxteis em Nova Friburgo na segunda década do século 20.

Falecido em 2 de agosto de 1988, a autobiografia de João Baptista da Silva nos lega o registro de um homem de seu tempo cuja trajetória orgulha muito os seus filhos e netos e nos presenteia com importantes eventos do passado da vida cotidiana de Nova Friburgo.  

  • Foto da galeria

    João Baptista da Silva na tribuna da Câmara Municipal

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    João Baptista foi vereador em três mandatos

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    O livro é uma autobiografia organizada por seus filhos

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