O Centro de Estudos sobre Tabaco e Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP, da Fundação Oswaldo Cruz) lançou uma campanha sobre os riscos do uso e da liberação dos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) no Brasil.
Além de materiais informativos, divulgados nas redes sociais, a iniciativa conta também com um abaixo-assinado online, cujo intuito é que a sociedade civil se manifeste contra a autorização desse tipo de material no mercado interno pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Também conhecidos como cigarros eletrônicos, vaper, pod, e-cigarette, entre outros, eles têm a comercialização, importação e propaganda proibida no Brasil desde agosto de 2009, por resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Apesar disso, cerca de dois milhões de brasileiros fazem uso dos cigarros eletrônicos, segundo estimativas da BAT Brasil (antiga Souza Cruz), a maior empresa de tabaco do país.
Segundo Silvana Rubano Turci, pesquisadora da Fiocruz, nos últimos anos, a indústria do tabaco tem pressionado a Anvisa para a liberação dos DEFs no país. A agência iniciou, em 2019, um processo regulatório para a discussão e atualização de informações técnicas sobre o tema dos cigarros eletrônicos, e agora está na fase final de elaboração do relatório de Análise de Impacto Regulatório (AIR) desses dispositivos. A decisão final cabe à diretoria colegiada, que decidirá sobre o assunto em votação.
A justificativa apresentada pela indústria do tabaco é de que os produtos oferecem menos prejuízos à saúde dos usuários, e funcionam como uma alternativa aos cigarros tradicionais. O argumento, no entanto, é rebatido pelo Centro de Estudos sobre Tabaco e Saúde e por pesquisadores internacionais. Turci destaca que os cigarros eletrônicos também são produtos de alto risco e causam dependência.
“A Anvisa está sendo muito pressionada para liberar a comercialização e fabricação desses produtos. Por isso, essa campanha é tão importante nesse momento de definição. Não podemos admitir que mais um produto tóxico chegue ao mercado. É nossa obrigação, como órgão de ciência, mostrar que esses dispositivos eletrônicos não trarão benefício algum e também representam um risco para a saúde das pessoas”, afirmou a especialista.
“Porta de entrada” para o tabagismo
Pesquisadores da Universidade College de Londres (UCL) chegaram à conclusão de que o cigarro eletrônico não atua como uma porta de entrada para o tabagismo, ao contrário do que muitos acreditavam.
O trabalho, publicado em março na revista científica Addiction, analisou informações de mais de 37 mil jovens entre 16 a 24 anos, ao longo de uma década, por meio do Smoking Toolkit Study, uma pesquisa mensal sobre tabagismo liderada pela universidade para monitorar os índices do país.
Os resultados indicaram que não há uma relação significativa entre o uso dos chamados “vapes” e de cigarros tradicionais. O estudo avaliou que, no pior cenário, apenas um em cada dez adolescentes que fazem uso dos modelos eletrônicos se tornará eventualmente fumante de cigarro tradicional.
No entanto, a conclusão do estudo não elimina os demais problemas associados ao modelo eletrônico, como o crescimento entre os jovens e os malefícios para a saúde. Em fevereiro, um cigarro eletrônico explodiu na boca do músico Lélio Guedes, de 45 anos, em Ceilândia, no Distrito Federal. O incidente ocorreu quando Guedes estava em casa e foi gravado pela câmera de segurança. Na ocasião, o músico disse que não era fumante, mas decidiu comprar o cigarro por ter recebido avaliações positivas de ouvintes.
A petição da Fiocruz está disponível na plataforma Change.org e conta com mais de 2,4 mil assinaturas até o momento, de uma meta de 2,5 mil.
O que é importante saber sobre o e-cigarro
De acordo com o médico pneumologista Mauro Gomes, cigarros eletrônicos são dispositivos criados com o objetivo de simular a sensação de fumar um cigarro comum. Também conhecido como e-cigarro, contém nicotina, mas não alcatrão e monóxido de carbono presentes nos cigarros tradicionais — substâncias capazes de causar câncer de pulmão e de outros órgãos — mas libera outros tipos de substâncias tóxicas à saúde.
Do que é composto o cigarro eletrônico?
Nele, a nicotina é diluída em uma substância, habitualmente o propilenoglicol. Essa mistura costuma ser comprada em refis e armazenada em um reservatório (cartucho) no dispositivo, ligado a um vaporizador que transforma o líquido em fumaça. A concentração de nicotina nos reservatórios do e-cigarro costuma ser bem maior que aquela encontrada nos cigarros convencionais.
É isento de riscos à saúde?
Não. Embora o propilenoglicol seja uma substância segura para a saúde humana, quando serve de diluente para a nicotina e é vaporizada e inalada libera o formaldeído em concentrações de cinco a 15 vezes maiores do que encontradas nos cigarros comuns, um agente capaz de provocar o câncer.
Quais doenças pode causar?
No curto prazo, o e-cigarro pode ser danoso ao sistema respiratório e cardiovascular. Por ser um produto relativamente novo da indústria do tabaco, desconhece-se ainda todos os males que ele pode causar em longo prazo. Sabe-se que a composição do vapor contém substâncias derivadas de metais pesados, como ferro, alumínio e níquel, que podem levar não só ao câncer de pulmão, mas também ao dos seios da face, enfisema pulmonar e à fibrose pulmonar.
Pode ser usado para ajudar a parar de fumar?
Não deve ser utilizados em programas de combate ao tabagismo no lugar da terapia de reposição da nicotina devido às impurezas e às altas concentrações presentes de formaldeído, substância altamente cancerígena. Como o e-cigarro utiliza a nicotina, que é a substância presente no cigarro que causa a dependência, na verdade o fumante está trocando um vício pelo outro.
Quais os riscos para os jovens?
Os adolescentes são mais propensos do que os não usuários a fumar cigarros convencionais de acordo com estudos científicos nos EUA. Os pesquisadores concluíram que o uso de e-cigarro agrava, em vez de amenizar, o uso de cigarros convencionais, portanto, representam um engodo à população, uma forma de atrair os jovens para a dependência química e, numa etapa posterior, tornarem-se consumidores de cigarros comuns.
(Com informações do O Globo e do pneumologista Mauro Gomes)
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