Confissão
de Charles Bukowski
Esperando pela morte
como um gato
que vai pular
na cama
sinto muita pena de
minha mulher
ela vai ver este
corpo
rijo e
branco
vai sacudi-lo talvez
sacudi-lo de novo:
hank!
e hank não vai responder
não é minha morte que me
preocupa, é minha mulher
deixada sozinha com este monte
de coisa
nenhuma.
no entanto
eu quero que ela
saiba
que dormir todas as noites
a seu lado
e mesmo as
discussões mais banais
eram coisas
realmente esplêndidas
e as palavras
difíceis
que sempre tive medo de
dizer
podem agora ser ditas:
eu te
amo.
O poeta norte-americano Charles Bukowski ficou conhecido por ter uma vida errante: boêmio, o seu dia a dia (e também os seus poemas) ficou marcado pelo álcool e pela gandaia. Raros são os poemas do autor dedicados ao amor — Confissão faz parte dessa escassa lista.
Soneto de fidelidade
de Vinicius de Moraes
De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
É o poema de amor mais consagrado do nosso poeta. Os versos foram organizados a partir de uma forma clássica — o soneto — que se organiza em quatro estrofes (as duas primeiras com 4 versos e as 2 últimas com três versos). O tema abordado é um assunto que não perde a validade: nesse caso específico, Vinicius de Moraes compôs em homenagem à sua primeira mulher.
Um dos “20 poemas de amor e uma canção desesperada”
de Pablo Neruda
Sim não foi porque teus olhos tem cor de lua,
de dia com argila, com trabalho, com fogo,
e prisioneira tens a agilidade do ar,
sim não foi porque és uma semana de âmbar,
sim não foi porque és o momento amarelo
em que o outono sobe pelas trepadeiras
e és algum pão que a lua fragrante
elabora passando sua farina pelo céu,
oh, bem amada, eu não te amaria!
Em teu abraço eu abraço o que existe,
a areia, o tempo a árvore da chuva,
E tudo vive para que eu viva:
sem ir tão longe posso vê-lo todo:
veio em tua vida todo o vivente.
O poeta chileno Pablo Neruda, laureado com um Nobel, escreveu centenas de poemas de amor que se tornaram clássicos da literatura latino-americana. O trecho acima faz parte do belíssimo (e longo) Vinte poemas de amor e uma canção desesperada.
Soneto da doce queixa
de Federico Garcia Lorca
Assusta-me perder a maravilha
de teus olhos de estátua e o acento
que pela noite a face me polvilha
a erma rosa que há no teu alento.
Tenho pena de ser sobre esta orilha
tronco sem ramos, e a dor que sustento
é não ter eu a flor, polpa ou argila
pró verme de meu próprio sofrimento
se és meu tesouro oculto, que sitio,
se és minha cruz e meu sofrer molhado
e eu o cão preso de teu senhorio,
não me deixes perder o que me é dado:
vem decorar as águas do teu rio
com folhas de meu outono perturbado.
O espanhol Federico Garcia Lorca deu à luz a esse belo poema apaixonado, que transborda afeto e entrega.
Teus olhos
de Octavio Paz
Teus olhos são a pátria do relâmpago e da lágrima,
silêncio que fala,
tempestades sem vento, mar sem ondas,
pássaros presos, douradas feras adormecidas,
topázios ímpios como a verdade,
outono numa clareira de bosque onde a luz canta no ombro
duma árvore e são pássaros todas as folhas,
praia que a manhã encontra constelada de olhos,
cesta de frutos de fogo,
mentira que alimenta,
espelhos deste mundo, portas do além,
pulsação tranquila do mar ao meio-dia,
universo que estremece,
paisagem solitária.
O mexicano Octavio Paz ganhou o prêmio Nobel de Literatura e passeou pelos mais diversos gêneros literários, entre eles a poesia, e, nesse caso, de cunho romântico.
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