O plenário da Câmara dos Deputados aprovou na última terça-feira, 30 de junho, o texto-base da Medida Provisória 934/20, que suspende a obrigatoriedade de escolas e universidades cumprirem a quantidade mínima de dias letivos neste ano em razão da pandemia da Covid-19. Além da flexibilização dos dias letivos, o texto-base também trata da antecipação da formatura para cursos de graduação da área de saúde.
“O cuidado com o ser humano [na volta às aulas] deverá ser o maior dos critérios ao lidar com uma população com graves problemas socioeconômicos, mas, sobretudo, emocionalmente frágil devido à experiência individual e coletiva com a doença, a morte e o lu
Kelly Cristine
As escolas de ensino fundamental e médio deverão cumprir a carga horária mínima de 800 horas, mas não precisam cumprir, necessariamente, os 200 dias letivos. O Conselho Nacional de Educação (CNE) deverá editar diretrizes nacionais para implantar a regra, segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e sem prejuízo da qualidade do ensino e da aprendizagem.
Em função do tempo que falta até fim do ano e da necessidade de se encaixar a carga horária, nos casos obrigatórios, dentro dos dias letivos, o projeto de lei de conversão, em que a MP foi transformada, permite que o conteúdo acadêmico deste ano seja aplicado em 2021, aglutinando duas séries ou anos escolares.
Para os alunos que estão em situação de risco de contrair o novo coronavírus, será garantido um atendimento adequado à sua condição, como o regime domiciliar ou hospitalar. Para os estudantes das redes públicas, deve ser garantida ainda a continuidade de programas de apoio, como os de alimentação e de assistência à saúde.
Os deputados devem analisar, em outra sessão, em data ainda não definida, os destaques apresentados pelos partidos para tentar mudar o texto da relatora da MP, deputada Luisa Canziani (PTB-PR). Para melhor entender alguns dos mais relevantes pontos dessa questão, que já provoca polêmicas entre profissionais da área educacional, entrevistamos a professora de língua portuguesa das redes pública e privada de ensino, Kelly Cristine Oliveira da Cunha, mestra em Estudos da Linguagem (UFF) e articuladora acadêmica do curso de Letras/UFF (Cederj, Nova Friburgo). Confira:
A VOZ DA SERRA:
Quais as suas primeiras impressões sobre essa MP?
Kelly Cristine: Em relação à flexibilização do ano letivo, traz uma série de questionamentos, principalmente, no que se refere à dispensa do cumprimento dos 200 dias letivos, mas à manutenção das 800 horas, para o Ensino Fundamental e Médio. Entende-se que o objetivo da manutenção das horas consiste em garantir ao aluno o aprendizado em sua totalidade, direito que lhe é legítimo. Porém, como viabilizar seu cumprimento com qualidade? Diante de um cenário tão incerto, resta-nos fazer perguntas e trabalhar pelas melhores respostas.
Que avaliação faz desse período com aulas on-line?
Muitas escolas e sistemas de ensino implementaram o ensino remoto com objetivo de minimizar os danos e manter a rotina de estudos dos alunos. Nas redes privadas de ensino, as aulas remotas têm presença da quase a totalidade dos alunos, com exceção daqueles que foram mais diretamente atingidos pelos efeitos da pandemia. As aulas remotas validarão o ano letivo. No pós-pandemia, seu trabalho será realizar uma avaliação diagnóstica das competências dos alunos e promover a reorganização do fazer pedagógico, baseando-se nos resultados encontrados.
E quanto à rede pública?
As redes públicas de ensino encontrarão grandes dificuldades. Aquelas que implementaram o ensino remoto também terão seu ano letivo validado. Porém, a frequência dos alunos é muito baixa devido a contextos de vulnerabilidade social, ou seja, pouco ou nenhum acesso aos equipamentos necessários às aulas e redes de internet; contextos familiares conturbados e violência; maior exposição ao vírus e, consequentemente, à doença e morte. Uma avaliação diagnóstica das competências dos alunos certamente será realizada, mas como recuperar o ano letivo destas crianças e adolescentes? Embora a MP permita a aglutinação de duas séries ou anos escolares, é difícil visualizar um cenário em que seja possível recuperar os conteúdos e o aprendizado.
É o cenário incerto a que você se referiu...
O problema se torna ainda maior nas redes em que o ensino remoto ainda não foi implementado. Além de todos os problemas acima citados, tais redes ainda encontrarão dificuldade em cumprir a carga horária de 800 horas. Os alunos estudarão em tempo integral? As redes terão estrutura e profissionais para oferecer carga horária diária superior à habitual? Os alunos estudarão mais que cinco dias por semana? Perderão férias? Com isso, como não produzir grande número de evasão escolar?
Qual a sua expectativa com a volta às aulas presenciais?
É muito importante considerar que, em qualquer dos contextos citados, a escola terá um público debilitado de diversas maneiras – equipes administrativas, pedagógicas, professores e alunos. Todos levarão consigo a vivência de uma pandemia, com os números que o Brasil vem produzindo. O cuidado com o ser humano deverá ser o maior dos critérios ao lidar com uma população com graves problemas socioeconômicos, mas, sobretudo, emocionalmente frágil devido à experiência individual e coletiva com a doença, a morte e o luto.
MP estabelece "normas excepcionais" para os diferentes sistemas de ensino
Após passar pela Câmara, a matéria seguirá para o Senado. Resumindo, a suspensão da obrigatoriedade da quantidade mínima de dias letivos enquanto durar o estado de calamidade pública deverá ser a seguinte:
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Na educação infantil, fica dispensada a obrigatoriedade do mínimo de dias letivos e do cumprimento da carga horária mínima anual;
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Nos ensinos fundamental e médio, fica suspensa somente a quantidade mínima de dias letivos e mantida a carga horária mínima no ano.
Ensino superior
A proposta também dispensa as instituições de ensino superior da obrigatoriedade de cumprir o mínimo de dias letivos. Nesse caso, porém, a carga horária anual mínima deve ser mantida.
Cursos de medicina, farmácia, enfermagem, fisioterapia e odontologia podem ter a conclusão antecipada pelas instituições, desde que o aluno cumpra 75% da carga horária do internato ou dos estágios curriculares obrigatórios.
A relatora incluiu, ainda, a possibilidade de antecipar a conclusão dos cursos de educação profissional técnica de nível médio que tenham alguma relação com o combate à pandemia, com a mesma condição de cumprimento de 75% dos estágios obrigatórios.
Enem
As datas de realização do Enem, o Exame Nacional do Ensino Médio, devem ser definidas em articulação com os sistemas estaduais de ensino. A prova, prevista inicialmente para novembro, teve as datas suspensas devido ao avanço da pandemia do Covid-19. O Ministério da Educação ainda não definiu uma nova data para a realização do exame.
Ao anunciar o adiamento, contudo, o MEC abriu uma enquete para que os candidatos opinem sobre a escolha das novas datas. Em seu parecer, a relatora afirmou que “muitos parlamentares manifestaram preocupação com as condições de realização” do Enem em 2020.
(Fonte: Agência Câmara de Notícias)
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