Desde que começou a retomada gradual das atividades em Nova Friburgo, no último dia 3, as atenções ficaram voltadas para o crescimento do número de infectados pelo coronavírus e para a taxa de ocupação dos hospitais locais, em especial, para os leitos de UTI exclusivos para pacientes com Covid-19. Esta taxa, aferida toda sexta-feira, é utilizada para estabelecer a métrica que define a cor da bandeira da flexibilização que vigora no município durante a semana seguinte.
Segundo o decreto, a bandeira vermelha será adotada sempre que a taxa de ocupação dos leitos de UTI para Covid estiver acima de 70%; na bandeira laranja a taxa fica entre 60% e 70%; na bandeira amarela, entre 50% e 59% e na verde a taxa, abaixo de 50%. O município está em bandeira amarela desde que o decreto passou a vigorar, mas chama atenção que, desde que a retomada das atividades começou, a taxa de ocupação do Hospital Raul Sertã teve média de 90% de ocupação, enquanto, na última semana, os hospitais particulares alcançaram média de 40%.
Estes dados mostram que a população friburguense que utiliza o Sistema Único de Saúde (SUS) – grande maioria – está sentindo os reflexos dessa retomada, enquanto a população que tem condições financeiras para ter um plano de saúde – a minoria – está mais protegida. Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em maio de deste ano foram totalizados 49.424 usuários de planos de saúde na segmentação de assistência médica em Nova Friburgo. Isso significa dizer que somente 25,92% da população tem acesso à saúde privada, enquanto 74,08% utilizam o SUS.
Taxa de ocupação x perfil dos pacientes
De acordo com o defensor público Raymundo Cano é possível fazer uma relação entre os altos números da taxa de ocupação do Raul Sertã e o perfil dos pacientes atingidos pela Covid-19. “A população mais pobre é a que mais sofre as consequências da pandemia, com certeza. Os percentuais de ocupação do CTI Covid do Raul Sertã nas últimas semanas estiveram sempre em 80% ou mais. Por certo, isso representa um maior risco para aqueles que não possuem plano de saúde”, observa o defensor público.
Ele também ressaltou que, segundo o Boletim Coronavírus divulgado pela prefeitura a ocupação dos leitos de UTI tem sido de 100% na rede pública. “Se um novo paciente precisar de CTI, o que será feito? Por certo que existe a possibilidade de regulação já que os leitos do Estado do Rio contam com folga. Porém, dadas as especificidades do vírus, nem sempre há tempo hábil para que o paciente seja removido”, destacou o defensor.
De acordo com um médico que trabalha na rede pública e privada de saúde em Nova Friburgo, mas que preferiu não se identificar, existe sim uma diferença entre quem tem plano de medicina privada e quem depende dos SUS. Segundo o médico, as pessoas que têm condições de pagar um plano, em sua grande maioria, tem acesso melhor a saneamento, são pessoas que tem uma condição financeira melhor. “Além disso quem tem plano de saúde tem acesso a ambulatórios e faz tratamentos contínuos. Isso resulta em um paciente mais ‘saudável’, digamos assim, com suas comorbidades controladas e medicadas de acordo”, relatou.
“Já o paciente do SUS carece das três estratificações: primário (postos de saúde), secundário (clínicas especializadas) e terciário (hospital municipal). Logo, temos um paciente que não tem consulta de rotina, que não consegue dar continuidade a um tratamento de doença crônica e vai parar num hospital onde há saturação de todo seu serviço. O paciente do SUS aqui em Friburgo só tem o atendimento terciário como recurso. Recurso esse, escasso.”, continuou o médico.
O médico ainda afirma que há saturação de profissionais na rede pública de saúde, sendo que muitos profissionais fazem rodízio entre os setores o que ajuda na proliferação da doença, inclusive entre funcionários. “O hospital (Raul Sertã) teve aumento de dois setores, uma nova enfermaria para Covid e um novo CTI para Covid, mas só foi contratado médico para o CTI Covid. A enfermaria ficou a cargo dos colegas que já se dividem em três para trabalhar no pronto socorro. No hospital público não tem fluxo adequado para os pacientes contaminados. Logo o rodízio de médicos e funcionários entre as áreas e setores do hospital levam à contaminação coletiva. A unidade coronariana por exemplo teve aproximadamente 80% de sua equipe contaminada. Chegou a ficar sem médico. Toda semana tem um profissional é afastado sintomático e nenhuma reposição do colega. Isso leva ao overwork (excesso de trabalho) de quem está lá. Seja enfermeiro, médico, técnico e etc”, denunciou.
O médico também corrobora com o defensor público Raymundo Cano e afirma que quando um paciente do SUS (especificamente com Covid-19) chega ao hospital, ele está mais debilitado do que um paciente que tem acesso à saúde privada. “Um paciente com comorbidades não controladas está mais suscetível a ter uma piora clínica e não responder bem a evolução da doença. Isso vale para qualquer doença, não só a Covid-19. E sim, acredito que a qualidade de infraestrutura e organização influenciam na evolução do paciente, embora a Covid tenha suas particularidades e imprevisibilidades, não conhecemos a doença por completo ainda”, observa.
Segundo o defensor, o órgão está atento ao estoque de itens básicos do Hospital Raul Sertã, que há pouco tempo estava baixo. “No momento, não tivemos ainda notícias de falta de atendimento por Covid no Raul Sertã, mas na última semana foram propostas três ações por pessoas necessitando de CTI não Covid e sem vaga no hospital público. Temos enorme preocupação em especial quanto a estoque de insumos”, destaca o defensor.
Estudo da PUC-Rio aponta que Covid-19 é mais letal em negros
O Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (Nois), liderado pelo Departamento de Engenharia Industrial do Centro Técnico Científico da PUC-Rio (CTC/PUC-Rio), analisou a variação da taxa de letalidade da Covid-19 no Brasil (número total de óbitos dividido pelo total de casos encerrados, ou seja: com alta ou óbito) conforme as variáveis demográficas e socioeconômicas da população.
Com dados atualizados até o último dia 18 de maio, a equipe de pesquisadores do Nois avaliou cerca de 30 mil casos encerrados das notificações de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) confirmadas para Covid-19, disponibilizados pelo Ministério da Saúde e que constituem apenas os casos graves. O Nois ressaltou que essas notificações não necessariamente representam o total de casos confirmados no país, embora sejam uma das principais fontes de dados a respeito da doença.
De acordo com o estudo, quase 55% dos pretos e pardos morreram enquanto que, entre os brancos, esse valor ficou em 38%. Ainda de acordo com o estudo, na avaliação por faixa etária, os pacientes pretos e pardos apresentaram um número maior de óbitos em relação aos brancos, em todas as faixas etárias. Ao separar por tipo de internação e raça/cor, pretos e pardos ainda apresentaram maior proporção de óbitos em relação aos brancos. A diferença entre as proporções de óbitos é maior nas internações em UTI que em enfermaria (diferença de aproximadamente 80%).
Justiça derruba liminar que obriga planos a cobrir testes
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região derrubou nesta terça-feira, 14, uma liminar que obrigava as operadoras de saúde a cobrir o teste de sorologia para a detecção do novo coronavírus. O recurso foi impetrado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Os consumidores, no entanto, ainda podem fazer o teste de virologia pelos planos de saúde. Isto porque, a agência ainda não suspendeu a Resolução Normativa 458, publicada em 29 de junho, no Diário Oficial, que garante a cobertura do exame. A expectativa é que a decisão pela suspensão da norma ou inclusão definitiva do teste no rol de procedimentos pode ser tomada em reunião a realizada, nesta quarta-feira, 15.
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