Educação colhe os frutos das escolas fechadas na pandemia

Brasil registra piora no aprendizado de estudantes com maior impacto na alfabetização
terça-feira, 27 de setembro de 2022
por Christiane Coelho (Especial para A VOZ DA SERRA)
(Foto: Pexels)
(Foto: Pexels)

Foi mais de um ano para algumas escolas e dois anos para outras. Esse período de fechamento devido às restrições causadas pela pandemia da Covid-19 já mostra as consequências através de avaliações dos alunos. E, a etapa que sofreu o maior impacto foi a da alfabetização, medida no 2º ano do ensino fundamental. Os resultados são do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2021 e do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2021, divulgados este mês pelo Ministério da Educação (MEC) Crian e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Aplicado a cada dois anos, desde 1990, o Saeb é a principal avaliação nacional de aprendizagem. Nele, estudantes do 2º, 5º e 9º ano do ensino fundamental e do 3º ano do ensino médio resolvem questões de língua portuguesa e matemática. Alguns estudantes do 9º ano respondem ainda a questões de ciências humanas e ciências da natureza. Ao todo, 5,3 milhões de estudantes foram avaliados entre 8 de novembro e 10 de dezembro de 2021, em todo o Brasil.

Os resultados mostram que houve piora em todas as etapas de ensino. A maior queda ocorreu na etapa da alfabetização. A porcentagem dos estudantes do 2º ano que não conseguem sequer ler palavras isoladas, passou de 15,5% em 2019 para 33,8%, em 2021. Em matemática, a porcentagem dos que não são capazes de resolver problemas de adição ou subtração passou de 15,9% em 2019 para 22,4% em 2021. Nesta etapa as provas são aplicadas de forma amostral, a apenas um grupo de estudantes de escolas públicas e particulares.

“Não foge do esperado. Para a alfabetização, a mediação presencial é especialmente importante”, diz a coordenadora-geral do Saeb, Clara Machado. "O resultado permite entender o que aconteceu na pandemia e planejar a melhor intervenção na alfabetização, que é ponto de atenção", acrescenta.

Presença fundamental nessa fase

A família do pequeno Pedro estava feliz com o início do ano letivo em  2020, quando ele seria alfabetizado. Mas, com a pandemia e a suspensão das aulas presenciais, tudo mudou. O quarto se transformou em sala de aula, o computador em quadro, a professora em aulas online e a mãe, a fisioterapeuta Andrezza Monteiro Araújo, teve que se transformar em professora também. Isso porque Pedro estuda em escola particular e as aulas passaram a ser através da internet.

“O processo não foi fácil. Fiquei um ano em casa, assistindo todas as aulas com ele diariamente e auxiliando nas atividades. Até porque foi tudo novo, modo online, plataformas. Acredito que se não houvesse minha companhia, o Pedro não conseguiria ser alfabetizado, pois tenho amigas que os filhos até hoje carregam a dificuldade da alfabetização, por não poderem ter estado presente em casa durante esse processo”, disse ela.

Mas a família teve que se adaptar. Ela, apesar de manter sua clínica de fisioterapia aberta, teve que deixar de atender para poder acompanhar o filho nas aulas. “Me sinto vitoriosa junto dele, pois conquistamos uma fase muito importante. Agradeço também ao meu marido, porque graças a ele, pude ficar em casa, um ano sem trabalhar”, revelou. Pedro, hoje, está no 3º ano do  fundamental e acompanha bem o conteúdo escolar.

(Os pais Andrezza Monteiro e Daniel Ribeiro e os filhos Pedro e Maria Clara)

Rede pública 

Mas nem todas as crianças que cursaram o 1º ano em 2020 e 2021 tiveram a mesma condição do Pedro. Nesses anos, nas escolas municipais o Caderno de Atividades foi o material oficial para o cumprimento da carga horária letiva e a Agenda Pedagógica como atividade complementar para a integralização da carga horária mínima obrigatória de 800 horas anuais. Junto seguiram roteiros escritos contendo o passo a passo das atividades propostas no Caderno Pedagógico e/ou atividades complementares com exemplos. Depois, o responsável levava a apostila à escola para correção, com feedback para que os alunos conseguissem refazer as atividades que não realizaram com êxito.

A Secretaria Municipal de Educação disponibilizou conta junto ao Google (Google Classroom), possibilitando salas de aulas virtuais (Google Meet) de acesso fácil e gratuito para professores e alunos. Houve também outras formas de interação, como vídeos e áudios via WhatsApp. Mas o uso dos recursos tecnológicos não era obrigatório. Professores utilizaram computador, celular, internet próprios para interagir e dar aulas, caso pudessem. Em janeiro deste ano, professores municipais receberam R$ 1 mil e demais profissionais de educação R$ 500, como compensação pelos investimentos durante a pandemia, como celulares e internet para auxílio na transmissão de aulas remotas. 

Em 2020, eram 1.542 crianças no primeiro ano na rede municipal de educação. Já em 2021, foram 1.710 crianças se alfabetizando nas escolas municipais, cujo único material obrigatório para aprender a ler e escrever era o Caderno de Atividades. Aulas on-line não eram obrigatórias.

Hoje, esses alunos estão respectivamente no 3º e 2º ano do ensino fundamental e, de acordo com as Avaliações Diagnósticas e Formativas da rede municipal, no início do ano letivo eao término do 1º semestre, respectivamente, 83% dos estudantes do 3º ano estão nos níveis silábico-alfabético e alfabético. Já no 2º ano são 72% dos estudantes nos níveis silábico-alfabético e alfabético.

No nível silábico, a criança entende que existe uma correspondência entre as letras e o que é falado. Para ela, existe um traço representando o que é falado, mesmo que não seja o correto em relação à Língua Portuguesa. Cada sílaba possui uma letra. No nível alfabético, a criança já consegue reproduzir adequadamente todos os fonemas de uma palavra. Ela passa então a perceber o valor das letras e sílabas.

De acordo com a prefeitura, as avaliações foram elaboradas a partir das habilidades da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), para desenvolver as competências de leitura e escrita, entre elas habilidade de compreensão, vocabulário, conhecimento das letras e habilidade de consciência fonológica.

A BNCC mudou o fim do ciclo da alfabetização, que passou do 3º para o 2º ano. Ao final do 3º ano, é esperado que os alunos tenham fluência para ler e escrever e percebam as regularidades do sistema ortográfico e os principais padrões da escrita.

Ações para reverter a defasagem

De acordo com a Secretaria Municipal de Educação foi estruturado um Planejamento Pedagógico para este ano letivo, com ações que visam garantir a oferta de estratégias para a recuperação da aprendizagem, minimizando os danos causados pelo distanciamento presencial dos estudantes.

O início do trabalho foi a avaliação diagnóstica dos alunos, para conhecer as habilidades de cada um. “Novamente, ao final do 1º semestre, foram elaboradas as Avaliações Formativas baseadas nas habilidades desenvolvidas durante os dois primeiros bimestres, objetivando identificar os avanços e fragilidades do trabalho pedagógico proposto nos Contínuos Curriculares para um replanejamento destinado ao 2º semestre, visando melhorar o desempenho dos alunos. 

Atualmente, a Secretaria elabora as Avaliações Finais baseadas nas habilidades desenvolvidas nos dois últimos bimestres, que serão aplicadas em novembro, com o intuito de levantar dados e planejar as ações pedagógicas para 2023.”

Bom desempenho no 5º e 9º anos 

Nos demais anos, a avaliação do Saeb é feita de forma censitária, com a aplicação a todos os alunos. No 5º ano do fundamental, o aprendizado dos estudantes tanto em língua portuguesa quanto em matemática retornou ao patamar de 2015. Em língua portuguesa, a média nacional foi de 208 pontos, mesma pontuação de 2015 e uma queda de sete pontos em relação aos 215 obtidos em 2019. Em matemática, a pontuação média foi 217, uma queda de 11 pontos em relação a 2019, com 228 pontos; e dois pontos abaixo de 2015.

No 9º ano, quatro a cada dez alunos estão nos três primeiros níveis de aprendizagem em língua portuguesa. Essa porcentagem passou de 40,8% em 2019 para 42,4% em 2021. Cerca de 15% dos alunos estão abaixo do nível 1, com habilidades mais básicas do que o sistema consegue aferir. Em matemática no 9º ano, o país tinha registrado melhora, passando de 258 pontos em 2017 para 263 pontos em 2019. Agora, o país volta ao patamar de 2015, com uma média de 256 pontos e com 44,4% dos estudantes nos três níveis mais baixos de proficiência.

De acordo com a prefeitura, Nova Friburgo apresentou maior média de proficiência em língua portuguesa e em matemática quando comparada aos resultados da média do Estado do Rio e do país. Dos resultados, destaca-se, nos anos iniciais, a Escola Municipal São Pedro da Serra, que apresentou a nota no Ideb 7.0, alcançando a 22ª posição entre as 1.470 escolas avaliadas no Estado do Rio. Nos anos finais, das sete unidades que foram avaliadas na rede municipal, as escolas Dante Magliano e Ceffa Rei Alberto I estão entre as 30 primeiras posições no Estado do Rio, dentre as 863 escolas. A Ceffa Flores apresentou 305,72 pontos em proficiência em língua portuguesa e 305,07 pontos em matemática.

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