A Câmara Municipal de Nova Friburgo aprovou na última terça-feira, 14, o Projeto de Lei Ordinária 131/ 2021 que autoriza o Executivo a conceder subvenções a entidades para o próximo ano. Em pauta na última sessão ordinária do ano, os repasses de recursos financeiros no exercício de 2022 permitindo a destinação de quase R$ 6 milhões às entidades privadas sem fins lucrativos, em áreas como a cultura, esporte, assistência social e saúde, além daquelas responsáveis pela realização de eventos e serviços de interesse público.
Mas, uma emenda transferindo uma parcela significativa dos recursos do orçamento da Secretaria de Cultura para o Carnaval pegou a classe artística de surpresa, causando indignação traduzida em críticas publicadas nas redes sociais e em diversos grupos ligados ao setor.
Para esclarecer os fatos, A VOZ DA SERRA procurou representantes da categoria, como o secretário municipal de Cultura Joffre Evandro, a atriz e diretora teatral Daniela Santi, e o presidente do Conselho Municipal de Política Cultural, Jorge Ayer, além do governo. Destes recebemos as seguintes declarações:
“A emenda foi apresentada, mas não significa que o Executivo acolha essa ideia, tendo em vista a Cultura ser penalizada. Não é nossa intenção seguir nesse caminho, o diálogo entre as partes é sempre mais construtivo. Entendemos, perfeitamente, que o Carnaval deva ser valorizado, sobretudo dentro do aspecto de ser uma manifestação cultural grandiosa, que merece todo nosso apreço e olhar. Em momento algum fomos consultados e acredito que o Conselho Municipal de Política Cultural também não. A partir desse episódio, devemos estreitar mais a fundo a real necessidade cultural da cidade e construir caminhos mais profícuos. É um esforço conjunto. É preciso ouvir, dialogar e desenvolver ações para o setor”, comentou o secretário Joffre Evandro.
O governo assim se manifestou: “A Lei Orçamentária Anual aprovada no Legislativo ainda não retornou para a sanção do Executivo, portanto, ainda não houve a análise detalhada acerca da emenda que transfere recursos destinados às subvenções sociais das entidades ligadas à Cultura para aumentar o repasse às agremiações carnavalescas. Tão logo a prefeitura receba o documento, o prefeito Johnny Maycon fará as devidas avaliações e logo após se posicionará oficialmente. Destacando que a Lei Orçamentária Anual prevê autorização de 20% de remanejamento, o que significa que, havendo necessidade, o Município poderá fazer os ajustes que entender para atender aos interesses da municipalidade.”
ARTIGO: Cultura é setor produtivo e necessário
Por Daniela Santi
“Certamente, o espanto e a incredulidade, tomaram conta do setor artístico/cultural de Nova Friburgo, quando foi veiculado que, na votação efetuada na Câmara de Vereadores, sobre a dotação orçamentária para o ano de 2022, uma emenda referente à parte da verba da Secretaria de Cultura, fora aprovada por aquela casa.
O acontecido na votação da emenda, proposta pelo vereador Christiano Huguenin, foi um absurdo. Propõe a retirada de uma parte significativa do orçamento da Cultura, de R$ 770.883,95, já diminuto e destinado a "Subvencionar e Auxiliar associações e grupos culturais e subvenções sociais", autorizando a transferência de R$ 500 mil para a Secretaria de Turismo e Marketing da Cidade, com a finalidade de "Subvencionar e Auxiliar Instituições Carnavalescas e Subvenções Sociais", vindo a somar, neste item específico, hum milhão de reais.
Deixo claro que, nem eu, nem pessoa alguma da nossa categoria, é contrária ao Carnaval, festa popular que faz parte da identidade cultural do povo, que gera renda, diversão e empregos, e, também, que uma verba maior seja destinada a esse setor, mas não é justo que seja retirado exatamente de onde tem menos. Se esse dinheiro não está chegando ao seu destino de origem, o correto não seria remanejar para as necessidades da própria Secretaria de Cultura, que não são poucas, e buscar outra fonte para o Carnaval?
Retirar dinheiro de quem já tem pouco — restariam R$ 270.883,95 no orçamento total da Secretaria de Cultura, neste item —, para atender a necessidade de outra Secretaria é, na minha opinião, como o dito popular, "desvestir um santo para vestir outro" ou "puxar o lençol para cobrir a cabeça e deixar os pés de fora".
Se o Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC) existe, e é atuante, este tem poder, não só de fiscalização como de deliberação (no caso graças ao empenho de poucos, os quais aplaudo), é preciso que o Executivo e o Legislativo utilizem-se desse, como via de comunicação com as categorias da cultura.
Com diálogo há entendimento e se encontram soluções. Basta de embates inúteis, nocivos ao bem-estar geral, os lados interessados na questão a ser resolvida, devem se comunicar. É absurdo que passem por cima de um CMPC, legalmente constituído. Que política é essa em pleno século 21? Não avançaremos nunca? Continuaremos sempre com as regras ditadas de "cima para baixo"? As categorias de trabalhadores nunca serão ouvidas? O que podemos fazer para que isso seja entendido e respeitado?
A proposta do vereador Christiano Huguenin, no mínimo, foi completamente arbitrária. E não haver argumentação contrária por parte dos outros vereadores (pelo que soube), em especial da Comissão de Educação e Cultura da Casa, demonstra que, para eles, a Cultura como setor produtivo e necessário para a formação da cidadania, inexiste ou, que só é válida quando pode dar-lhes votos.”
PONTO DE VISTA: Manifestação pública do Conselho de Política Cultural
Por Jorge Ayer, presidente do CMPC de Nova Friburgo
“Sobre a Emenda Modificativa nº 1, aprovada pela Câmara de Vereadores, propondo a transferência de R$ 500 mil do orçamento da Secretaria Municipal de Cultura para a Secretaria Municipal de Turismo e Marketing da Cidade, para o pagamento de subvenções às entidades carnavalescas, destacamos que não existe essa falsa dicotomia Carnaval x Cultura.
Embora em secretarias diferentes, somos todos fazedores de cultura, e é a partir disso que nos identificamos e buscamos o mesmo objetivo: exercermos o nosso ofício de profissionais da cultura, cada um com suas singularidades. É nessa relação de respeito entre as manifestações e sua diversidade que a arte e a cultura crescem e garantem ao nosso município um lugar de destaque na Região Serrana e, também, no Estado como um todo.
Entendemos que é justo e necessário que a municipalidade subvencione o Carnaval, assim como entendemos ser justo e necessário que as três bandas centenárias, a União Brasileira de Trovadores (UBT), os corais e todas as manifestações culturais também sejam subvencionadas e apoiadas, o que se dá através de provisão na Lei Orçamentária (que nem sempre é executada na sua integralidade!). No entanto, não conseguimos entender o porquê da retirada do já exaurido orçamento da Cultura, de uma importante fonte de recursos, deixando descobertas entidades centenárias e prejudicando o fomento às atividades no município.
Essa questão tem como origem duas causas principais: a primeira delas é o histórico subfinanciamento da pasta, que precisa ser enfrentada. Este Conselho tem várias propostas para esse enfrentamento, entre elas a de um Projeto de Lei de Incentivo à Cultura, com recursos do ISSQN e do IPTU, construído a partir de um ano de trabalho, com realização de audiência pública por um GT constituído especificamente para este fim e que propõe soluções para uma cidade do porte de Nova Friburgo e que aguarda retorno do Poder Executivo.
Em segundo lugar, lamentamos que tanto o Legislativo quanto o Executivo não dialoguem entre si em uma questão como essa e, mais grave, não chamem o Conselho e os artistas e profissionais da cultura para um debate aberto e democrático sobre o orçamento. A cultura acontece fora dos gabinetes, e é nesse espaço que deve ser debatida, com quem faz e conhece as reais necessidades do dia a dia dos fazedores de cultura da cidade. Gostaríamos muito de ver, no próximo orçamento, uma emenda que destine recursos ao Fundo Municipal de Cultura, esta é apenas uma das possíveis sugestões de financiamento à cultura que partem da sociedade civil.
Por último, solicitamos ao prefeito Johnny Maycon que garanta a totalidade do orçamento da Cultura e que, através dos créditos extraordinários que foram aprovados, garanta também a subvenção às entidades carnavalescas, companheiras e parceiras na construção de uma Nova Friburgo melhor, plural, diversa e que, junto com todos os artistas, artesãos e demais trabalhadores da Cultura, tornam esta cidade um espaço melhor para quem aqui mora e para os que nos visitam.”
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