Se a vida é passageira, dirija-a

Wanderson Nogueira

Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

sábado, 27 de novembro de 2021

O mundo está muito depressa. Quero mais tempo para viver. Eu não quero morrer. Não que eu tenha medo da morte. Mas é que tenho muito apreço pela vida. Maior encantamento ainda pelas suas intensidades.

A intensa Clarice Lispector nos ensina: “a vida serve é para se morrer dela”. Não interpreto como um pensamento meramente existencialista. Encaro como se ela estivesse profetizando que o destino é certo: morrer. E já que esse é o fim de todos nós, que se morra cada hora consciente disso, e ao saber, que se faça bom proveito dos minutos a nós concedidos.

Essa corrida maluca que tem sido os nossos cotidianos me assusta. Não sei se o mundo está acelerado, se a contemporaneidade está nos acelerando ou se somos nós mesmos que estamos velozes demais. No fim, somos o mundo e o contemporâneo – nós. Autoflagelo? Não nos culpemos arbitrariamente. Desaceleremos. Contemplemos.  

O que sei é que quero ficar mais tempo, mais do que for possível. Tenho sede de vida e não quero que a vida se esgote. Por isso, bebo a vida apreciando todos os seus sabores. Até os amargos ou salgados demais. Mas louvo os temperos, mesmo quando em excesso. Deixo me consumir para não ser consumido. Se a vida é passageira, eu a dirijo.

Assim, não espero o leito de morte para suprir minhas urgências. Tenho urgência de amor, de fascínio, de vida, de pessoas ao redor para brincar nesse parque de diversões que é o mundo. Compartilho. Cancelo os medos e embarco nas aventuras. Leio. Aprendo. Valorizo o que as ruas me ensinam, especialmente os saberes dos não acadêmicos. Canto. Rio. Deixo de contar o tempo para não padecer em agonia. 

Desejo e a experiência me conta que alguns desejos são traidores. Mas não me puno. Sou o responsável, o único responsável pelos meus rumos. Sonho. Choro. Clamo por paixões e apaixonado faço coleção de emoções. Ah, a emoção! Esse sentir tão extraordinário, quase mágico. Mas real. E o que é mistério, simplesmente classifico como metafísica ou sobrenatural. E fico maravilhosamente bem com isso. O arrepio é visita sempre bem-vinda.

Sabe, a vida é um convite permanente, mas que em algum instante é cassado de nós. Por sua imprevisibilidade, nos resta uma só previsão: é preciso viver agora enquanto esse agora perdurar. Por isso, só peço que perdure muito, para além da futura terra que serei. Mas, enquanto adio ser pó, não me peça apenas para sobreviver. Quero vida e vida em abundância. 

Não se pode se permitir nada menos do que a felicidade. Ciente, é claro, que tristezas virão e são essenciais para a percepção das felicidades. Mas se há uma razão para existir e persistir nesse mundo aceleradamente insano é ser feliz! Não espere um câncer ou a hipertensão para entender isso. Não espere a velhice para querer ser criança de novo! 

Parafraseando Clarice: vida é pouco. O que quero ainda não tem nome. Vou vivendo e ao viver encontro o que não se precisa nomear.      

 

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(Foto: Freepik)
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