Maio

Wanderson Nogueira

Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

sábado, 09 de maio de 2020

Quando eu era criança, lembro que confundia o dia do seu aniversário. Meu parâmetro era o aniversário de Nova Friburgo. Adorava desfilar com a escola no 16 de maio. Tinha toda aquela preparação e ansiedade. Minha confusão era se o seu aniversário era antes ou depois. Com o passar do tempo, firmei na memória o dia 17 de maio como sendo o dia de seu nascimento.

Maio também é o mês do seu dia. Dia de todas as mães. Quando criança, sempre confundi se o dia das mães se celebra no primeiro ou no segundo domingo do mês. O que me ajudava a saber, eram as lembranças feitas na escola. O único presente que podia te dar. 

Aqueles sabonetes pequenos embalados no tule e um desenho com letras garranchadas expressando em poucas palavras o amor de filho. Nunca fui talentoso em artes. Sempre escolhi as cores fora do padrão para pintar os desenhos. As rosas de preto, a nuvem de lilás, o céu de laranja, o Mickey de azul como se fosse um Smurf. Não! Isso não me fez um artista como esses impressionantes que expõem em galerias famosas. Lembro que minha mãe ria de mim, carinhosamente, enquanto meu irmão mais velho caçoava da minha excentricidade.

Passado o tempo, eu menino feito, vi alguns desses pequenos sabonetes todos rachados, alguns em pedaços dentro do saquinho transparente. Junto com alguns desenhos, você os deixou guardados em suas coisas, mesmo que já não dessem há tempos cheiro nas roupas. Acho que você gostava mais do significado que tinham do que propriamente dos sabonetinhos em si. Ver aquilo alegrou meu coração de criança pobre que queria poder dar muito mais à sua mãe. Mas mãe só quer amor. Descobri isso muito cedo na sua sabedoria exposta na prática.

Mãe só quer amor e - sem a obrigação de dar em troca - entrega amor incondicional. Desses que a gente não tem como explicar e que talvez um filho nunca de fato vá entender. Possivelmente, as mulheres quando se tornam mães possam experimentar. Os homens, jamais. Esse poder feminino de sentir e se sensibilizar. Nada mais sagrado que amor de mãe. 

São capazes de darem a vida por seus filhos. E, não importa o quanto errem ou o equívoco que tenham cometido. Bravas, ainda assim dirão: “ele tem mãe e a mãe dele sou eu”. Porque mãe não abandona o filho e tampouco vai amá-lo pelo seu sucesso ou fracasso. Vai apenas reconhecê-lo como seu filho. 

É perdão antes do pecado e é compreensão antes de qualquer julgamento. É bênção mesmo quando não se precisa ser amparado, é força que vem de dentro para provocar terremoto, se necessário, fora. Mãe sabe o que é dor e alegria antes mesmo do parto e é conexão que não se corta pelo cordão umbilical. Mãe é exagero, tempero, vivacidade.

Para o filho, a saudade que sabe que ficará, porque já existe antes mesmo de se tornar.

Ah, mãe. Queria poder te cantar de novo músicas do Roberto nas apresentações da escola. Queria poder me confundir de novo e te dar feliz aniversário adiantado para não arriscar errar se é 15 ou 17 de maio. E fazer dia das mães no primeiro e segundo domingo de maio. Mas também no terceiro e quarto de cada mês, em todos os dias de todas as semanas de todos os anos…

Já não sou tão criança. Você nem velha ficou. Tão bonito ver mães com a pele enrugada, cabelos bem branquinhos, avós, bisas... Sinto a chamada inveja boa de quem tem ou teve o privilégio. Creio que, vaidosa que era, seria uma idosa linda. Deitaria em seu colo e no aconchego de seu sorriso sorriria como sorrio agora com esse choro engasgado nos olhos. É choro de agradecimento à existência. Minha por você. Sua em mim. Independente se foi por pouco ou muito tempo.

Hoje, por mais que não te tenha, me vem nas memórias a sua presença e a paz por saber que pode me ouvir. As mães sempre ouvem, afinal. Te amo, mamãe!

 

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