As mães não morrem nunca

Wanderson Nogueira

Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

sábado, 01 de maio de 2021
Foto de capa
(Foto: Pixabay)

Essas efemérides que machucam nossa existência. São nas datas de motivos para a família se reunir que mais grita a tal saudade que nunca cessa. Fica lá, todos os dias do ano, em um sossego arisco nas paredes do coração e nos músculos da alma. 

Mas é nessas ocasiões de Natal, Páscoa, aniversários, Dia dos Pais ou das Mães que a visita parece mesmo inevitável. Olha-se para o lado e o vizinho está em festa, os amigos estão em confraternização. Mas ao olhar para o lado também se percebe que você e seus irmãos não são os únicos a ter essa ausência física.  

Já faz algum tempo que eu ficava triste no Dia das Mães. Engulo o choro com saliva quente e ordeno, como se pudesse determinar, para que essa dor, que é serena também, fique aquietada. Mas essa carência segue a me visitar nessas outras datas especiais e em muitos outros momentos do cotidiano. Aliás, é no cotidiano que fica mais evidente essa falta que faz. 

As mães não deveriam morrer nunca. Elas tinham que ser tão permanentes como o amor que deixam. É percebendo esse amor tão presente, mesmo com o passar dos anos, que digo a você que ainda tem ao lado sua mamãe ou a você que, assim como eu, não tem mais esse privilégio, que as mães... As mães não morrem nunca. 

São todas santidades como Maria. São divinas para além do poder da criação. Porque os que as torna mães não é o ato de gerar o feto e parir. O que as torna mães é esse laço que extrapola ventre e cordão umbilical e a faz amar de tal forma que não há nada mais egoísta que um filho querer partir antes de sua mãe. 

Porque a natureza ensina que nem mesmo santa, uma mãe pode suportar o tamanho da dor de perder seu filho. Compreendendo isso, ainda que essa compreensão não nos faça menos egoístas, sigo a vida olhando para o céu como se minha mãe fosse estrela nos pensamentos que me guiam. Mães são guias. Mães são múltiplas metáforas para o amor.           

O tempo na sua fúria incontida nos envelhece, nos faz ser pais, nos faz adultos e esse amor pela mãezinha querida se renova mesmo sem novidades. É um amor que até se reinventa, mas não muda. Ficam os cheiros do perfume na pele ou do café ou do feijão cujos sabores jamais poderão ser experimentados de novo. Fica o tom de voz, mesmo quando mais brava, seguido da nostalgia de sorrisos de quem não sabe brigar. Mães não brigam, aconselham. 

Ficam as preocupações de quem só queria o bem e essas preocupações ecoam mesmo muitos anos depois, daquelas mais corriqueiras, as de cuidar do futuro. Ficam as ligações pelo telefone mesmo nas horas mais inoportunas, para assunto algum que, na verdade, eram apenas uma das muitas formas de dizer eu te amo.

Saudade que se atropela sem causar acidentes. É choro que não se segura e, sabiamente, toma a inundar o peito para fazer se sentir parte de algo mais importante que o mundo. 

Mães nos fazem importantes, protagonistas. E mesmo quando não estão mais a nos dirigir, ainda sim nos salvam, até de nós mesmos. Sentimento maior, próprio do que é divino ou mais. Mães nos perpetuam e as eternizamos. Pois as mães não morrem nunca.  

 

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