Eu não quero ser mais um machista

Wanderson Nogueira

Palavreando

Aos sábados, no Caderno Z, o jornalista Wanderson Nogueira explora a sua verve literária na coluna "Palavreando", onde fala de sentimentos e analisa o espírito e o comportamento humano.

sábado, 06 de março de 2021

Paz: substantivo feminino

Que toda violência - física, moral, psicológica, sexual - seja rechaçada por todos. Absolutamente todos. E não pode ser apenas um desejo exposto na escrita ou para evitar cancelamentos. Não é só porque soa bem aos ouvidos coletivos. Tem que ser prática cotidiana, mesmo no silêncio de nossas intimidades. Tem que ser combate permanente a nós mesmos e a tudo aquilo que acumulamos erroneamente como sociedade ao longo dos tempos. Chega! Basta! Tantos séculos não nos serviram de nada?

Gentil: adjetivo feminino

Eu não posso falar por elas. Como homem, tenho tentado aprender que não tenho lugar de fala e que preciso escutá-las, ouvi-las, se colocar ao lado delas nas suas batalhas sofridas e diárias, históricas. Não por gentileza. Não se trata de gentileza, mas de obrigação. Reconhecer as falhas e o quanto precisamos avançar por mais igualdade de gênero. Num mundo tão machista, precisamos, nós homens, entender que: não podemos ser mais um machista. O Brasil - grifo - já está cheio deles. Mais do que vigilantes, atentos para não escorregar nos equívocos presentes que a história nos põe goela abaixo. As piadas já não fazem mais rir nesse circo que necessita ser desmontado urgentemente. O assédio já não faz o homem ser mais homem, o torna apenas ignorante. Compreender é, portanto, verbo essencial para se desvencilhar das tantas besteiras preconceituosas que nos acompanham desde muito pequenos. Eu entendo o produto que somos, mas não posso aceitar ser esse pacote medíocre fechado e retrógrado. Dirão que o mundo está chato. Não! O mundo é injusto e desigual.

Sensivelmente: advérbio feminino

Eu não quero ser mais um machista. E não é pelo politicamente correto. Eu quero aprender a não ser machista. Não por vaidade moral, mas porque quero respeitar em sua integralidade o espelho que reflete minha mãe - toda mulher - vinculada a mim ou não. Eu disse: todas as mulheres em suas mais diversas personalidades. Minha mãe, minha irmã, minha amiga, minha professora, minha vizinha, a atendente de telemarketing ou da loja de biscoitos, a que se senta ao meu lado no ônibus, a que me chefia no jornal, a faxineira que limpa lá em casa uma vez a cada 15 dias, a desconhecida da padaria, a moça da praça que por motivos que não nos cabem exerce a profissão mais antiga do mundo, a minha avó quase centenária que é filha de sinhá, as mães de santo dentro e fora dos terreiros, as pastoras, a mulher rural, a vereadora. Reconhecer cada uma delas, reverenciar, fortalecer, se sensibilizar na sensibilidade que só o feminino tem e só o feminino pode nos emprestar.

Amar: verbo feminino

Ironizo as normas cultas para amar o feminino e suas lutas e provar que amar é feminino, é mulher. Não as doces mulheres dos livros de José de Alencar, tampouco as Helenas das novelas de Manoel Carlos. Elas todas e tantas outras, todas as outras com suas particularidades reais, das quais singularmente são amor... E com o amor não se pode guerrear. Que esse amor feminino seja a paz que encerra toda violência e gere a gentileza em todos os homens em se reconhecer e sensivelmente dizer para si mesmo: eu não quero ser mais um machista. E, para além de toda fala se comporte e, humildemente, queira aprender constantemente, até o fim da vida, a não ser mais um machista, a não ser machista. 

 

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(Foto: Reprodução Internet)
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