Perdoar: esquecer ou lembrar?

César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

quinta-feira, 14 de julho de 2022

O conceito popular de perdão afirma que quem perdoa, esquece. Entretanto, penso que para existir perdão genuíno é preciso primeiro lembrar do que houve para depois esquecer. Como é isso? Vamos pensar.

Alguém feriu você quebrando e prejudicando o bom relacionamento que havia antes. Se já não era bom, piorou. Se você mantiver a raiva pela pessoa, será prejudicial para sua saúde, porque você terá perdido a serenidade. Se fingir que está tudo bem, não será verdade, o que também é ruim para sua saúde.

Uma pessoa muito dependente quando ferida pelos outros, pode fingir que está tudo bem porque sente que não pode viver sem a aprovação alheia. Então, ela pode dizer que perdoou, quando mantém a mágoa em seu interior. Joga em baixo do tapete da consciência a percepção da verdade emocional pessoal que diz: “Ainda sinto raiva do que aquela pessoa fez comigo.” Então, para perdoar, ela precisará lembrar primeiro. Lembrar o quê? Do que houve, da dor, da tristeza pelo que ocorreu ao ter sido ferida. E lembrar pode doer e muito. Mas é preciso sentir a dor original para que ela possa ir embora.

Então, quem perdoa, lembra. Lembra, vive a dor, expressa adequadamente seu pesar, chora, dorme mal algumas noites talvez, perde o apetite ou come demais por um tempo, se entristece. Isto é normal e depois passa se ela realmente perdoa.

Um extremo de conduta é ficar focado nas próprias falhas e não viver a dor causada por erros dos outros. É como atacar a si mesmo o tempo todo dizendo: “Por que não pensei antes?”, ou “Por que fui confiar tanto?”, ou “Por que não coloquei limites?”. Outro extremo é focar demais nas formas como tem sido maltratado e usá-las como desculpa para manter um comportamento ruim. Ambos extremos de conduta devido a abusos sofridos, prejudicam a recuperação emocional pessoal. O que ajuda?

“Ser perdoado pelos erros que temos cometido contra outros não nos desculpa de nossas ações nem faz nossas ações corretas. Quando perdoamos outros pelos erros que eles têm cometido contra nós, não os desculpamos pelo que eles têm feito. Simplesmente reconhecemos que temos sido feridos injustamente e entregamos o assunto a Deus.” (The Life Recovery Bible, Tyndale, p.1121).

No processo de perdão genuíno não devemos dizer à pessoa que nos feriu: “Tudo bem!  Não foi nada! Não me importo! Deixa prá lá!”. A verdade é que não está tudo bem, foi algo que machucou, importa sim, doeu. Você pode e deve falar como doeu ou ainda dói para a pessoa, se isto couber, e deixe o fazer justiça nas mãos de Deus.

Viva a dor. Fale dela com alguém confiável. E deixe-a ir embora. Daí você poderá estar pronto para perdoar. Porque ao perdoar você se livrará do fardo da ira, do ressentimento, da mágoa. Estará livre. Readquirirá a serenidade. O resto é com a pessoa e com Deus. Se você perdoar, será também perdoado. Uma vez que não somos perfeitos, todos precisamos de perdão. Será que você merece perder a paz interior por causa dos erros dos outros? Lute para perdoar e esquecer a ofensa.

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