O crime bárbaro que vitimou duas mulheres, uma delas grávida de seis meses, na última sexta-feira, 13, no bairro Cônego, coloca Nova Friburgo diante de dois duplos feminicídios em menos de dois anos. O primeiro deles, em outubro de 2019, quando Rodrigo Marotti ateou fogo à uma casa no Stucky, distrito de Mury, onde estavam sua ex-companheira Alessandra Vaz e a amiga dela Daniela Mousinho, até hoje não foi julgado.
No caso de sexta-feira passada, segundo informações da 151ª DP, Ricardo Pinheiro Juca responderá por dois feminícios (as mortes da esposa, Nahaty Gomes de Mello, e da sogra, Rosimery Gomes da Cunha); um crime de aborto (do próprio filho); e por uma tentativa de homicídio (contra o sogro, Wellington Braga Mello, que foi baleado), por arma de fogo (abaixo). Somadas, as penas podem chegar a 84 anos de prisão. Ambos os réus devem ir a júri popular. Em abril deste ano, em mais um caso de feminicídio na cidade, uma mulher de 28 anos morreu após ser agredida a golpes de faca por seu ex-companheiro no bairro Rui Sanglard.
Conforme o jornalista Wanderson Nogueira divulgou ontem, 18, em sua coluna, Observatório, em A VOZ DA SERRA, um estudo sobre o índice de feminicídios no município em relação ao estado do Rio, realizado pelo Tecle Mulher – Assessoria e Pesquisa no Âmbito dos Direitos da Mulher, Nova Friburgo está acima da média estadual e nacional. Levando-se em conta a média populacional e o número de casos, durante a pandemia (que começou em março de 2020) até abril deste ano, Nova Friburgo teve 1,05 feminicídio em relação a 100 mil habitantes, enquanto o estado do Rio teve 0,43 e o Brasil, 0,64. Se considerar os assassinatos da última sexta-feira, o número salta para 2,9, o que, provavelmente, coloca Nova Friburgo como o pior município do estado, quiçá do Brasil, ressalta ele na coluna.
Segundo o relatório do Tecle Mulher, esse aumento das mortes de mulheres com o viés no gênero não se dá apenas pelas questões da convivência diária com seus agressores, mas principalmente pela desistência das mulheres de procurarem ajuda quando o ciclo da violência em suas relações domésticas já vem avançando de forma grave. Wanderson lembra que o feminicídio é o assassinato de mulheres pela condição de ser mulher. O termo se refere a crime de ódio contra mulheres, estipulado pela impunidade e indiferença da sociedade e do estado.
A pesquisa “Visível e Invisível – A vitimização das mulheres no Brasil”, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, informa que, a cada oito minutos, oito mulheres sofreram violência física em tempo de pandemia e, após a agressão, 45% das mulheres não fizeram nada; 22% procuraram ajuda da família; 13% procuraram ajuda de amigos; 12% denunciaram em uma delegacia da mulher; 8% procuraram uma igreja; 7,5% procuraram uma delegacia comum; 7% chamaram a PM; 2% ligaram para a Central de Atendimento à mulher 180. As demais, 33% informaram que resolveram a questão sozinhas; 15% não quiseram envolver a polícia e 17% não acham importante denunciar.
Caso de Stucky ainda sem data de julgamento
No caso do duplo feminicídio de Stucky, no início de setembro de 2020 foi realizada a primeira audiência de instrução e julgamento. A audiência teve por finalidade a produção de provas orais contra Rodrigo Marotti. Foi durante essa audiência que as partes prestaram depoimentos pessoais, o perito deu seu parecer e demais pessoas envolvidas no processo, como testemunhas, também se manifestaram.
Rodrigo foi trazido a Nova Friburgo do presídio na capital onde está sob um esquema especial de segurança. Consultados por A VOZ DA SERRA, nem o Ministério Público nem o Tribunal de Justiça têm previsão de quando será realizado o julgamento. Até então, as mortes de Alessandra e Daniela tinham sido as únicas no município registradas em Friburgo como feminicídio.
Em depoimento na 151ª DP na madrugada em que foi preso em flagrante, Rodrigo confessou ter ateado fogo à casa (acima) de Alessandra Vaz, sua ex-companheira, onde também estava a amiga dela, Daniela Mousinho, depois de trancar as duas. Dias depois, as duas amigas morreram em consequência das graves queimaduras que sofreram.
Na época, uma reportagem de A VOZ DA SERRA (relembre aqui) revelou supostas ameaças de morte de Rodrigo a Alessandra, confidenciadas por ela mesma a uma amiga de longa data horas antes do crime. Isto poderá servir como mais um qualificador do crime (premeditação), aumentando ainda mais a pena. Como houve duplo feminicídio e prisão em flagrante, com confissão, o caso rapidamente seguiu para a 1ª Vara Criminal de Nova Friburgo, cabendo à Promotoria acusar o réu perante um júri popular. Outros agravantes, até agora, seriam: motivo fútil, emprego de fogo, impossibilitar a defesa das vítimas e o próprio feminicídio em si.
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