Cadê o autor?

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 14 de setembro de 2020

Eu já estava querendo escrever sobre este assunto faz tempo. Há vinte anos, fiz a montagem de peças de teatro como produtora e dramaturga. Na época, notei que nos cartazes e nos anúncios todos os integrantes tinham seus nomes em destaque, como o diretor, os atores, o figurinista. E o autor?, seu nome era o menos destacado, normalmente colocado sob título em tamanho da fonte reduzido. Às vezes, até no final do cartaz. Nos letreiros, raramente.  Eu me perguntei várias vezes porque tamanha discriminação? Afinal de contas, se não houvesse a criação e o trabalho do autor, a peça não existiria. Intrigada, para não dizer indignada, levantei a questão com outras pessoas envolvidas nas peças, que chegaram a discursar sobre a importância dada ao nome, e o primeiro argumento era para atrair o público. “Se o autor não é conhecido, não tem sentido evidenciá-lo, além do que não há espaço disponível para ter o nome do autor aumentado. De fato, o teatro e o cinema são resultados de um trabalho de equipe, se falta o autor, o iluminador ou mesmo o figurinista o espetáculo fica comprometido. Como também a produção precisa de recursos para custear o local de apresentação, a montagem e toda a equipe envolvida. 

O fazer da arte é um trabalho que tem de ser valorizado; todos os envolvidos precisam ser remunerados. Jamais pode ser encarada como um passatempo ou uma diversão, é um processo economicamente produtivo. Mesmo assim nenhuma justificativa sustenta o não reconhecimento do autor como criador da obra apresentada.

O cinema e o teatro fazem a concretização do texto literário, dando vida aos personagens, vivificando as cenas. O livro valoriza o autor, dá ênfase ao seu nome, à sua vida literária porque guarda em suas páginas o texto para ser degustado pela leitura. É a fusão do autor com sua obra. O teatro e o cinema, aqui incluo os filmes e as séries na televisão, possuem universos amplos e que envolvem equipes diversificadas. A produção do livro, neste sentido, é mais barata. Logicamente, não o estou subestimando. Longe disso. O autor por um custo bem menor constrói um texto e edita o livro, mesmo se computar suas horas de trabalho. Já as produções cinematográficas e teatrais são caríssimas. Certa vez, a encenação exigia que o chão do palco fosse coberto por uma borracha grossa para que os atores não escorregassem e caíssem em cena. Entre as tiras de borracha deveria ser passada uma fita crepe reforçada com cola dos dois lados para que as borrachas não corressem. Elas custavam o cachê de um ator. Enfim, são os ossos do ofício. .

A meu ver, o argumento que apresento não justifica o fato de o nome do autor ficar em segundo plano.  De fato, como disse anteriormente, as apresentações precisam arrecadar os valores necessários para custearem a obra encenada. Pois se o produtor não tomar todas as precauções necessárias, ele termina a temporada com dificuldades financeiras. E o autor não corre tamanho risco, a não ser que ele seja o produtor.

Enfim, é uma questão a ser refletida.   

 

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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