O pior ano das nossas vidas

Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna às terças e quintas.

sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Sei que o título assusta. Me assusta também. Porém, igualmente me enche de esperança. Porque não é um tributo às nossas mazelas, mas um decreto: se foi o pior, só o melhor nos visitará a partir de agora.

Sei que cada um teve suas conquistas e dramas. Individualmente – o ano, essa coleção de meses, semanas, dias e horas – é particular para cada um. Com chegadas e partidas, com perrengues financeiros e de saúde, com progresso e prosperidade, com metas alcançadas e outras abandonadas. Com começos, novos começos e fins que se quis e outros que não se desejou. E os próximos anos seguirão sendo assim, com mais ou menos intensidade, aqui e acolá.

Mas e coletivamente? Seria o coletivo a reunião de cada querer individual? Outras forças nos atravessam e nos influenciam? O quanto o que a sociedade faz me impede ou me possibilita ser mais feliz?

O que suponho saber é que o pior ano das nossas vidas está terminando. E por mais cruel que possa ter sido, é anúncio de boas novas! Se o pior se despede, é porque o melhor ainda está por vir. Não é apenas parte da minha natureza otimista. É a constatação quase que matemática, confirmada pela sabedoria popular no seu célebre ditado: “depois da tempestade, vem a bonança”.

Nunca demos tantos adeuses. E não é uma percepção sem lógica. Nunca se morreu tanta gente. Está nos números que são mais que CPFs. São rostos que só habitam agora a nossa saudade. O triste nisso tudo é saber que várias dessas mortes seriam evitáveis.

Veio a vacina, feita pela ciência em tempo recorde, que repele o vírus. Outra vacina, no entanto, está em processo lento e depende de cada um de nós: a vacina do anti negacionismo.

O negacionismo tem muito a ver com excesso de achismo de inteligência. “Todos são burros, todos estão enganados, quase todas as fotos e fatos são manipulados”. A estupidez saiu de vez do armário, travestida de heroísmo, com arminha na mão e disparando raios de ódio e antipatia. As redes sociais viraram a arena preferida. Campo de guerra em que se agride, se acusa mais do que opina e me pergunto, quem se é verdadeiramente: o que tecla na rede social ou o que no olho no olho não faria o que faz lá? No mundo dos algoritmos não podemos nos permitir se robotizar.                                    

Após todo enclausuramento, que possamos abrir as janelas, fechar as janelas dos aplicativos do smartphone, escancarar o coração, sair para a vida, viver e deixar viver. Deixar ser feliz. Fazer as pazes com a natureza, respirá-la com profundidade, se reconhecer nesse maravilhoso ciclo que é a vida em seu sagrado tempo. Não! Não é a pandemia que nos obrigou a aprender isso. Mas nossa falha jornada até aqui.

Talvez, o pior ano das nossas vidas seja a escada que precisávamos. Ter os músculos das pernas doídos para avançarmos, evoluirmos. Mas nada é a escada se não estabelecemos a relação que temos com os seus desafios. De nada adianta se não guardamos memória da dificuldade em respirar, da saudade doída e apertada da perda antecipada, da vontade de ajudar ao próximo e do quanto é libertário ver o outro crescendo, abrindo sorriso sincero.

A pandemia, a escada são simbolismos dos nossos enfrentamentos, assim como da nossa fragilidade. Talvez mais cientes do quanto somos frágeis, nos tornemos mais fortes ao se ver humanos. Todos, igualmente, humanos.

Eu não sei, mas espero que esse tenha sido mesmo o pior ano das nossas vidas e que nada de tão ruim aconteça conosco. Que os próximos anos sejam os melhores, porque aprendemos a passar pelo pior e saímos mais humanos. Se não formos mais humanos... Sei que com o passar do tempo, tragédias são esquecidas. Mas que todos que aqui estiveram possam ter memória e que façam dessas memórias trampolim para tornar o mundo um lugar mais feliz, harmônico e prazeroso.

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