Fim da Nêga Fulô

Wanderson Nogueira

Observatório

Jornalista, cronista, comentarista esportivo, já foi vereador e deputado. Ufa! Com um currículo louvável, o vascaíno Wanderson Nogueira atua com garra no time de A VOZ DA SERRA em Observatório, sua coluna às terças e quintas.

sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Fim da Nêga Fulô
A famosa e premiada cachaça friburguense Nega Fulô sairá do mercado. A decisão é da Diageo, multinacional inglesa que é dona de marcas como Johnnie Walker e Smirnoff. Proprietária da marca desde os anos 2000, a dona das famosas marcas de whisky Label teria tomado a decisão de acabar com a Nêga Fulô por considerar que os tempos atuais não permitem mais utilizar esse tipo de nome que poderia ter cunho pejorativo com a raça e com o gênero. Uma decisão em favor do politicamente correto.   

Produção friburguense
Mesmo passando a ser propriedade da Johnnie Walker, a iguaria continuou sendo produzida em Nova Friburgo. As últimas garrafas já saíram da fábrica, na Fazenda Soledade, para o mercado. A produção, portanto, está totalmente finalizada. Os fãs da marca terão agora a última chance de comprar a cachaça neste fim de ano. Pelo contrato, em nenhuma hipótese a marca e receita podem ser repassadas a outro ou mesmo readquirida pelos proprietários originais. Estes seguem no segmento com outra marca de cachaça já consagrada: Fazenda Soledade.

Outros tempos
A Nêga Fulô foi criada nos anos 70 e segundo seus criadores teve esse nome inspirado no poema de Jorge de Lima, provavelmente escrito nos anos 20 do século passado, intitulado “Essa Nega Fulô”. Na obra, o escritor se debruça sobre as condições existenciais dos escravos, que eram concebidos como objetos. Para isso, ele fala do cotidiano da escrava Negra Fulô, retratando seus trabalhos domésticos, que eram solicitados por sua sinhá. No entanto, ao ser açoitada, seu senhor se rende aos encantos da escrava e, por conseguinte, às belezas afro.

Por que não mudou o nome?
A decisão de descontinuar a marca não chega a ser surpreendente por conta dos tempos atuais, onde empresas, governos (não todos) e instituições têm se empenhado em combater todo tipo de racismo e machismo. Mesmo sendo lucrativa e um sucesso, o que surpreende é o simples fim do produto, já que um novo nome poderia ser atribuído à cachaça. Afinal, a mudança de nome seria até vista de forma positiva com as devidas publicidades ante ao mero sepultamento.

Fazenda Soledade
Fato é que, dona de algumas das maiores marcas de destilados do mundo, a multinacional inglesa preferiu simplesmente descontinuar, evitando críticas para outras de suas potentes marcas. O clima de tristeza vem sendo superado pelo líder da Fazenda Soledade, o empresário Vicente Ribeiro. O fim da Nêga Fulô, por óbvio, gerou desemprego. Mas ao mesmo tempo fortalecerá o empenho em outros produtos da fazenda friburguense. Além da cachaça, há planos para produção de rum e gim.

Escassez
Dependendo do tipo de madeira, já é difícil encontrar a cachaça friburguense. A corrida ao mercado por parte de colecionadores também afeta o preço, que pode ter alguma inflação. Certamente, a Nêga Fulô cumpriu com seu papel na valorização do produto nacional, abrindo o mercado de cachaça para um público que até então tratava a bebida como menor diante de outros destilados.

Destaque em saneamento
Nova Friburgo é o 3º melhor município do Brasil em água limpa e saneamento básico. É o que mostra o relatório com o ranking de municípios para 17 objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS) da ONU. O estudo foi elaborado pelo CPL (Centro de Liderança Pública) em conjunto com a Frente Nacional de Prefeitos, Gove, Bank Of America, entre outras instituições e cruza diversas informações para chegar aos denominadores dos municípios com mais de 80 mil habitantes.  

Melhor do Estado
Em água limpa e saneamento, Nova Friburgo tem nota 90,31 e fica atrás apenas de Santos-SP (1º) e Balneário Camboriú-SC (2º). Destaca-se que o 4º e 6º lugares, Niterói e Petrópolis, respectivamente, também têm como concessionária de águas e esgotos a mesma empresa que atua em Nova Friburgo. Entre os 17 objetivos da ONU, esse é o que Nova Friburgo vai melhor em termos de colocação.

Desigualdades sociais
O objetivo que Nova Friburgo vai pior é o da redução de desigualdades sociais, sendo um dos piores do Brasil. Fica à frente de apenas 48 municípios, com nota 28,60. Derrubam a nota final de Nova Friburgo ainda quatro outros objetos da ONU: Paz, Justiça e Instituições Eficazes (265º e nota 59,35); Fome Zero e Agricultura Sustentável (262º e nota 44,62); Trabalho decente e crescimento econômico (235º e nota 28,66) e Parcerias e Meios de Implementação de Políticas (221º e nota 62,33).

Ladeira abaixo
Percebe-se em uma análise, ainda que rasa, que os grandes desafios de Nova Friburgo estão na economia e na política: ineficiência e crescimento tímido. Um cenário impensável para um município que já foi exemplo de pujança econômica e respeito institucional e que vem empobrecendo e perdendo identidade a passos largos. Os números, por exemplo, do objetivo número oito da ONU, Indústria, Inovação e Infraestrutura corroboram para essa sensação: 178º lugar, com nota 55,65. Contra números não há argumentos e eles são essenciais para estabelecer metas e mudanças em confronto a ideologias.    

Melhores notas e posições

Ainda que sejam trágicos os dados de desigualdades sociais e agricultura sustentável que acopla também fome zero, Nova Friburgo vai bem na erradicação da pobreza, 36º lugar e nota 78,19. As melhores notas entre os 17 objetivos da ONU para o mundo estão em Vida na Água (97,47 e a 23ª posição) [por não ter mar, a nota pode ser elevada em comparação a municípios banhados por oceanos] e Consumo e Produção Responsáveis (39º e nota 90,90). As melhores posições, independente da nota mais baixa: Vida Terrestre 31º com 74,47 e Educação de Qualidade 34º do País e nota 63,04.

4º melhor do Estado
A média final de Nova Friburgo para as metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável foi de 67,85 e a 101ª posição entre os 411 municípios brasileiros com mais de 80 mil habitantes. Niterói é a melhor do Estado com nota final 72,83 e a 29ª posição nacional, seguida de Petrópolis com nota final 70,16. A melhor do Brasil para os objetivos da ONU em 2021 é a cidade de São Caetano-SP com média final de 80,75.    

As notas de Nova Friburgo e o melhor entendimento de cada objetivo 

1. Erradicação da pobreza - acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares.
36º no Brasil. Nota 78,19

2.  Fome zero e agricultura sustentável - acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável.
262º no Brasil. Nota 44,62

3. Saúde e bem-estar - assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades.
112º no Brasil. Nota 77,07

4. Educação de qualidade - assegurar a educação inclusiva, e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos.
34º no Brasil. Nota 63,04

5. Igualdade de gênero - alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas.
117º no Brasil. Nota 75,08

6. Água limpa e saneamento - garantir disponibilidade e manejo sustentável da água e saneamento para todos.
3º no Brasil. Nota 90,31

7. Energia limpa e acessível - garantir acesso à energia barata, confiável, sustentável e renovável para todos. Esse índice não foi medido pela pesquisa por ausência de dados mais concretos

8. Trabalho de decente e crescimento econômico - promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para todos.
235º no Brasil. Nota 28,66

9. Inovação infraestrutura - construir infraestrutura resiliente, promover a industrialização inclusiva e sustentável, e fomentar a inovação.
178º no Brasil. Nota 55,65

10. Redução das desigualdades - reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles.
363º no Brasil. Nota 28,60

11. Cidades e comunidades sustentáveis - tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis.
116º no Brasil. Nota 78,67

12. Consumo e produção responsáveis - assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis.
39º no Brasil. Nota 90,90

13. Ação contra a mudança global do clima - tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos.
101º no Brasil. Nota 80,63

14. Vida na água - conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares, rios e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável.
23º no Brasil. Nota 97,47

15. Vida terrestre - proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da Terra e deter a perda da biodiversidade.
31º no Brasil. Nota 74,47

16. Paz, justiça e instituições eficazes - promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.
265º no Brasil. Nota 59,39

17. Parcerias e meios de implementação - fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável.
221º no Brasil. Nota 62,33

Palavreando
“Não espero o leito de morte para suprir minhas urgências. Tenho urgência de amor, de fascínio, de vida, de pessoas ao redor para brincar nesse parque de diversões que é o mundo”. Trecho da crônica que será publicada na íntegra na edição deste fim de semana do Caderno Z, o suplemento semanal de A VOZ DA SERRA.

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