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O brasileiro cansou da política ou só aprendeu a ignorar?

Lucas Barros
Além das Montanhas
Jovem, advogado criminal, Chevalier na Ordem DeMolay e apaixonado por Nova Friburgo. Além das Montanhas vem para mostrar que nossa cidade não está numa redoma e que somos afetados por tudo a nossa volta.
Todo mundo já ouviu — ou já falou — aquela famosa expressão: “Ah, política não é pra mim”. O problema é que, enquanto você foge da política, ela continua decidindo o valor do seu aluguel, a qualidade do seu ônibus e o preço do seu arroz. Fingir que ela não existe só faz bem para quem quer se esconder dela.
Tem gente que não assiste mais jornal, não vota com convicção, não sabe o nome do vereador da própria cidade. E, sinceramente? Dá pra entender. A política brasileira virou sinônimo de escândalo, decepção e promessas que morrem no palanque. É um ciclo de expectativas frustradas que esgota até o mais otimista dos brasileiros.
Mas será que o brasileiro realmente desistiu? Ou será que ele só cansou de se importar sozinho? Enquanto alguns gritam nas redes, muitos já não acreditam que vale a pena reclamar. A sensação é de que tudo já está decidido por cima. A política virou um jogo de cartas marcadas — e ninguém quer mais jogar.
Cada vez menos “Policarpos Quaresmas”
Lá no começo do século 20, Lima Barreto já deu um aviso que seguimos ignorando: a política não costuma tratar bem quem acredita demais nela. A obra “O Triste Fim de Policarpo Quaresma” conta a história de um homem apaixonado pela pátria, pela cultura nacional, pela ideia de um país mais justo.
Policarpo era um servidor público metódico, honesto, obcecado por fazer do Brasil uma grande nação — e que, por isso mesmo, acabou morrendo nas mãos do próprio sistema em que confiava. Para uma narrativa publicada em 1915, o texto soa estranhamente bem atual.
Quaresma se apaixonou pela política como quem ama com fé cega. Tentou mudar o idioma oficial, defendeu uma agricultura nacionalista, e por fim se alistou na Revolta da Armada, acreditando que poderia ajudar o Brasil de verdade. No entanto, a política que ele tanto venerava o triturou como mais um número — um idealista perdido entre a indiferença do Estado e o cinismo dos poderosos. Morreu traído pelo exato país que queria consertar.
Hoje, ser Policarpo Quaresma virou quase um insulto. A paixão pela política dá lugar à desconfiança, o engajamento vira piada, e o idealismo é confundido com maluquice.
O brasileiro moderno prefere se proteger do que se envolver, rir do que se frustrar, ignorar do que se decepcionar. Ninguém quer morrer pela pátria — e muito menos morrer de decepção por ela. Aos poucos, estamos deixando de ser Quaresmas. E talvez o Brasil e Nova Friburgo nunca tenha precisado tanto de alguns.
Sentimento de apatia
Essa apatia coletiva não surgiu do nada. Ela é o resultado de anos de corrupção exposta, de representações que não representam e de instituições que parecem viver num mundo à parte. O cidadão comum olha para a prefeitura ou para a Câmara de Vereadores e não se vê ali. Parece tudo distante, sujo, inatingível — então pra quê se envolver?
O problema é que o silêncio político não é neutro. Ele é terreno fértil para oportunista. Quando a maioria se afasta, quem se aproxima são justamente os que mais se beneficiam da ausência do povo. A política, como a natureza, não tolera vácuos: se você sai, alguém entra. E nem sempre com boas intenções.
A descrença virou moda. E junto com ela, vieram os discursos perigosos: “todos são iguais”, “tem que fechar tudo”, “precisamos de alguém que mande de verdade”. Frases aparentemente simples, mas que escondem um desejo autoritário, travestido de impaciência. Cansamos da política... e começamos a flertar com soluções fáceis.
Enquanto isso, a democracia vai perdendo força, mas de forma silenciosa. Ninguém derruba a politicagem com tanques mais — é no cansaço, na indiferença, no tanto faz. O voto vai ficando vazio, o debate raso, o interesse ausente. E quando a gente percebe, quem fala por todos já não representa ninguém.
É claro que ninguém é obrigado a virar militante. Mas também não dá pra viver como se política fosse algo opcional, como se fosse possível se esconder da cidadania. Ela tá no IPTU, na fila do SUS, no preço do gás, no tarifaço, nas práticas contra a lei. Fugir dela não resolve. É como ignorar o vazamento do teto achando que a água vai cansar primeiro.
Somos cansados sobreviventes
Talvez o Brasil não precise de mais heróis. Heróis são para as epopeias, e a vida, no fundo, é feita de prosa, café e de cansaço. A política, com suas fanfarras e seus discursos urgentes, passa do lado de fora da janela como um desfile barulhento – e com bastante irregularidades fiscais. Nós, de dentro, apenas espiamos por uma fresta da cortina.
O nosso patriotismo – e não no sentido partidário, deixe-se claro - virou uma coisa doméstica, silenciosa. Mora no armário, junto com os retratos amarelados e as contas do mês. Cuidamos dele como quem cuida de um bibelô frágil, com medo de que uma lufada de vento o derrube da estante.
A verdade é que a Pátria, essa ideia que fez o pobre do Quaresma sonhar tão alto, para nós, encolheu. Hoje, ela tem o tamanho exato da nossa desesperança de um jogo com cartas marcadas, corrupção e TikTok. E ultimamente ficamos assim, vivendo em pontas de pés ao redor dele. Em silêncio. Para não fazer barulho e acordar a dor.

Lucas Barros
Além das Montanhas
Jovem, advogado criminal, Chevalier na Ordem DeMolay e apaixonado por Nova Friburgo. Além das Montanhas vem para mostrar que nossa cidade não está numa redoma e que somos afetados por tudo a nossa volta.
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