Conta uma história para mim!

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

A vida nos apresenta situações inesperadas e de ternura especial. Fui, na semana passada, depois do inverno gélido de Nova Friburgo, surpreendida ou presenteada por uma dessas situações, quando minha mãe, com 91 anos, veio passar uns dias comigo. Decidi ficar ao lado dela como se estivesse no seu marsúpio. Assim, conversávamos, víamos filmes e ficávamos em silêncio, um silêncio carregado de lembranças, afeto e vontade de aproveitar aqueles momentos que, para nós, tinham preciosidades. Foram dez dias de mãe e filha, cheios de confidências e afagos.

Numa noite, ao me despedir dela, eu me deitei ao seu lado e vi que ela estava lendo “Mais de 100 Histórias Maravilhosas” da Marina Colasanti. Mamãe é uma leitora compulsiva, daquelas não conseguem ficar sem ler. Como tinha acabado de ler a mais recente obra da Marina, perguntou-me se eu tinha outro livro dela. Peguei uma coletânea de contos infantis, um pouco em dúvida, achando que não iria despertar o seu interesse. E, como eu não esperava, dona Lia, pôs-se a lê-lo, com o mesmo empenho de um suspense ou romance. Mas compreendi sua atitude, pois os contos possuem qualidade literária inquestionável. 

Fiquei bem satisfeita ao vê-la adentrar no universo imaginário infantil. Qual adulto ou pessoa de idade avançada que não guarda a criança que foi? Então, também como uma criança de oito anos, pedi baixinho para que lesse uma história para mim. Mamãe me olhou um pouco sorridente, mas com um estranhamento no semblante. Eu ler para você? Que ideia! Fiz sim com a cabeça. Então, mamãe, folheou o livro e começou a ler “Bela, das Brancas Mãos”. Fechei os olhos e me pus a escutá-la em todas as suas palavras, em suas pausas, em toda a sua respiração. Eu, aos 69 anos, escutando minha mãe ler um conto de fadas para mim em voz alta, senti a divindade tomar conta do quarto. Era o melhor pedaço do mundo que nos abraçava. Tive a impressão de que o tempo passou mais devagar, apenas para que pudéssemos levar aquele momento para a eternidade. 

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Tereza Cristina Malcher Campitelli

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Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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