A Amazônia é mais do que sua floresta em pé ou o carbono que ela absorve. Parte essencial dela são os seus povos originários que, historicamente, carregam o fardo de protegê-la contra o desmatamento, o avanço do agronegócio, o garimpo e pesca ilegais - tudo isso a um custo alto. O relatório anual publicado pelo Conselho Indigenista Missionário mostrou que a violência contra os povos indígenas aumentou no ano passado, o primeiro desde a vigência do Marco Temporal. Em meio a outras polêmicas, é nesse cenário que se dará a próxima Conferência do Clima, a COP 30.
Inicialmente, a escolha por uma cidade amazonense para receber delegações do mundo todo teve o objetivo de evidenciar as contradições entre o crescimento a qualquer custo, típico da sociedade em que vivemos, e a importância de preservação da Amazônia, através de ações concretas, visando frear o colapso climático. Outro fator é a oportunidade de exaltar, in loco, o conceito de justiça climática e social, no qual os que menos contribuem com as emissões de gases do efeito estufa são os que mais sofrem seus efeitos e os que têm menos condições financeiras de se adaptar às mudanças climáticas. Na grande maioria das vezes, essa minoria sequer tem sua voz e reivindicações ouvidas nas negociações.
Entretanto, o que fica cada vez mais evidente é o descompasso entre o que o governo propõe e o que ele é realmente capaz de realizar. Mesmo com os números oficiais de desmatamento caindo desde a retomada das políticas públicas ambientais e ações dos agentes fiscalizadores, eles ainda estão aquém do comprometimento brasileiro em COPs passadas. A cada dois anos, os países têm a oportunidade de atualizar sua Contribuição
Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês), que é um documento que estabelece metas e ações voluntárias de redução de emissões. Há dois anos, a NDC brasileira instituiu uma meta, já ambiciosa, de desmatamento ilegal zero até 2030, mas recentemente o governo anunciou que apresentará uma nova meta, ainda mais ambiciosa, em novembro.
No entanto, a projeção atual mostra que os esforços não têm sido suficientes para atingir a meta inicial, sendo necessário dobrar os números oficiais de redução do desmatamento durante os próximos 5 anos. Atualmente, metade das emissões do Brasil vêm do desmatamento que está intimamente ligado à agropecuária. Segundo especialistas, com 34% da floresta já degradada, a Amazônia aproxima-se do ponto de não retorno (tipping point) que significa um limite crítico de desmatamento que, uma vez ultrapassado, pode levar a floresta a virar uma savana alterando, desta forma, todo o regime de chuva do país com consequências globais.
Em vista disso, a imagem de líder ambiental mundial que o Brasil deseja propagar está ameaçada. Com o agravante da continuidade, às vésperas da Conferência, do garimpo ilegal na Amazônia, que tem visto a transformação dos seus territórios tradicionais em zonas de conflito e em estudos de caso sobre racismo ambiental. Diante de um ambiente de negociações desafiador no qual o maior emissor global histórico estará ausente, espera-se que dessa vez quem também esteja presente nas mesas de negociações sejam os
representantes dos povos originários. O bioma envolve 9 países e sua preservação interessa a todo o planeta.
A COP 30 tem a oportunidade de criar uma agenda comum entre os países amazônicos e servir de ponte entre o povo das florestas, com seus conhecimentos tradicionais, e os tomadores de decisões.
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