Relembre Dona Júlia, rezadeira que se confunde com a história de Olaria

Filho escreve sobre a trajetória e as lições de vida de uma mulher admirada por todos
sexta-feira, 22 de abril de 2022
por Christiane Coelho, especial para A VOZ DA SERRA
Dona Júlia (Álbum de família)
Dona Júlia (Álbum de família)

Falando em Olaria, não podemos deixar de falar dos ícones do bairro e um deles é a minha saudosa Vovó Júlia, rezadeira tradicional, que morou por anos na Rua São Roque e, que hoje, dá nome a uma das creches do bairro. Sou filha do Joandy Coelho, filho dela, e tive o privilégio de crescer no seio dessa família linda.

Vovó Julia morreu quando eu tinha 19 anos. Guardo na minha memória imagens marcantes que vivenciei na casa dela, como as enormes filas de pessoas que a procuravam, em busca de soluções para suas dores. Ela, franzina, em pé durante horas, atendia uma a uma, rezava com as mãos, passava a receita de unguentos, chás, ervas, banhos. Quando falo que sou neta dela, ouço muitos relatarem curas.

Além da reza, sempre lembrarei dela pela sua religiosidade. Vovó rezava o terço todos os dias às 6h da manhã. Lembro sempre de vê-la com seu tercinho e eu, como neta mais nova, na ocasião da sua morte, fui incumbida de colocar em suas mãos o terço, com o qual foi sepultada. Também me lembro dela, com saúde debilitada, não poder ir às missas dominicais, e meu pai levando a comunhão para ela. Era realmente um encontro de Vovó Júlia com Jesus, tamanha sua fé.

E, como Vovó Julia era caridosa. Tinha um senhor, chamado Agenor, que morava em um quartinho alugado nos fundos de uma casa na Rua São Roque. Quando criança, não entendia porque Seu Agenor ia almoçar todos os dias na casa dela. Depois de adulta que entendi a história. Era um homem só, sem família, sem condições de se cuidar. E ela oferecia o almoço a ele diariamente, colocava o prato dele e ainda coava o feijão, porque ele não comia os caroços.

São tantas ações e detalhes que demonstram porque ela era tão amada e até hoje tão lembrada por quem a conheceu. E meu pai, Joandy Coelho, escreveu um texto contando um pouco da sua história.

 

História de Dona Júlía

por Joandy Coelho

          

“Júlia Irene Coelho Gomes nasceu no dia 9 de maio de 1906, em Retiro, distrito de Bom Jardim. Filha de Antônio Coelho Gomes e Dorcelina dos Santos Gomes, tinha mais sete irmãos. Aos 12 anos de idade, a pequena Júlia, foi visitar o seu tio Lulu, que estava doente. Lá chegando, perguntou a ele se gostaria que ela o rezasse. Embora fosse pessoa de caráter grotesco, mas para agradá-la, permitiu que o fizesse. Dessa forma, de uma maneira anônima, começou sua peregrinação através de suas orações, interceder junto a Deus no sentido de trazer conforto às pessoas que a ela procuravam, já que o seu tio a partir de então começou a sua recuperação.

Ela casou-se com José Andrade Baptista em 18 de julho de 1924, com quem teve cinco filhos: Ézio, Idelcy, Joana, Lauriê e José de Alencar. A sua vida financeira sempre foi de muita dificuldade. Seu marido trabalhava como pedreiro, na época sem vínculo empregatício.

Durante toda a sua vida, além dos filhos biológicos, sempre acolheu vários filhos “afetivos”, em especial o filho de criação, Joandy Braz Coelho, que era seu sobrinho e de seu marido biologicamente, já que era filho de seu irmão, João, com a sua cunhada (duplamente) Adelaide, que era irmã de seu marido. O pai morreu atropelado em 1948 e a mãe doente em 1949. Alguns tios propuseram interná-lo em um orfanato. Ela não teve dúvida, assumiu juntamente com seu marido a criação desse filho, que conside rava como seu filho biológico.

Depois de 48 anos de casamento, ela perdeu seu marido, em 1972. Outro golpe que a vida lhe pregou foi em 1974, quando seu filho José de Alencar, que trabalhava na construção civil, foi eletrocutado e morreu.  

A sua vida foi inteiramente voltada para a caridade, não só dos bens materiais que proporcionava àqueles que mais necessitavam, mas principalmente para as pessoas que recorriam às suas orações e conselhos que eram de uma profundidade e sabedoria impar.

 No dia 5 de novembro de 1994, aos 88 anos de idade, Júlia faleceu e teve um funeral digno de uma santa, já que no cortejo fizeram sua urna de andor, transportando-a da capela mortuária até a sepultura nos ombros daqueles que se propuseram a levá-la em sua última passagem aqui na terra.

Hoje, temos a certeza de que a Santa Júlia, intercede por cada um de nós, junto a Deus Pai, para que possamos continuar a nossa caminhada até que cheguemos atingir a plenitude de nossa vida, e, tenhamos condições de um dia estarmos gozando da glória eterna, vendo Deus face a face.”

 

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