O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por 7 votos a 4, suspender a aplicação da lei que determina o piso nacional da enfermagem no Brasil. O julgamento no plenário virtual terminou nesta sexta-feira, 16. Seguiram o relator Luís Roberto Barroso, os ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Luiz Fux. André Mendonça abriu uma divergência e recebeu o endosso de Kássio Nunes Marques, Edson Fachin e Rosa Weber.
“No fundo, afigura-se plausível o argumento de que o Legislativo aprovou o projeto e o Executivo o sancionou sem cuidarem das providências que viabilizariam a sua execução, como, por exemplo, o aumento da tabela de reembolso do SUS à rede conveniada”, disse Barroso, acrescentando “ser importante valorizar os profissionais de saúde”, mas voltando a citar os mesmos motivos que havia exposto na decisão liminar: “Ter o bônus da benesse sem o ônus do aumento das próprias despesas, terceirizando a conta.”
A lei aprovada pelo Congresso não especifica de onde sairão os recursos para bancar a iniciativa, que deve pressionar os cofres públicos. Segundo estimativa apresentada por um grupo de trabalho criado pela Câmara para analisar a proposta, o piso dos profissionais da enfermagem pode gerar um impacto financeiro de pelo menos R$ 16,3 bilhões.
Com isso, a Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos de Serviços (CNSaúde) ajuizou uma ação no STF questionando o fato de o Legislativo não ter previsto quais recursos serão utilizados para o pagamento, além da constitucionalidade da lei. A entidade alega que “a norma que criou o piso desrespeita a auto-organização financeira, administrativa e orçamentária de estados e municípios tanto por repercutir sobre o regime jurídico de seus servidores quanto por impactar os hospitais privados contratados pelos entes para realizar procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS)”.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), lamentou a decisão do STF, mas garantiu que o Congresso vai achar uma saída. Na quinta-feira, 15, quando a Corte já havia formado maioria, ele anunciou que o Congresso iria apresentar na próxima semana as fontes para bancar o piso salarial nacional da enfermagem.
"A posição do STF não sepulta o piso nacional da enfermagem, mas o suspende, algo que o Congresso Nacional evidentemente não desejava. Chamarei uma reunião de líderes imediatamente e, até segunda-feira, apresentaremos as soluções possíveis", afirmou Pacheco.
Histórico em andamento
Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, a Lei 14.434/2022 instituiu o piso salarial nacional para enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras. Para enfermeiros, o piso previsto é de R$ 4.750. Para técnicos, o valor corresponde a 70% do piso, enquanto auxiliares e parteiras terão direito a 50%.
No dia 4 de setembro, Barroso atendeu pedido de liminar feito pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) e concedeu prazo de 60 dias para que os envolvidos na questão encontrassem soluções para garantir o pagamento. Reiterando ser a favor do piso salarial da enfermagem, no entanto aceitou a suspensão “diante do risco de descumprimento imediato da lei”.
Após a decisão, o caso foi levado à referendo dos demais ministros da Corte no plenário virtual, modalidade de votação na qual os votos são inseridos em um sistema eletrônico e não há deliberação presencial. Além de Barroso, os ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes votaram para manter a suspensão. E os ministros Nunes Marques, André Mendonça e Edson Fachin foram a favor da derrubada da liminar.
Com o voto do ministro Gilmar Mendes, na quinta-feira, 15, já estava formada a maioria (6 votos a 3) pela suspensão. Faltavam os votos de Luiz Fux e da presidente Rosa Weber. O julgamento virtual começou na sexta-feira anterior, dia 9, sendo finalizado nesta sexta-feira, 16, por 7 votos a 4.
Ainda segundo Barroso, hospitais particulares estavam realizando demissões por antecipação. Além disso, obras sociais, santas casas e prefeituras relataram não ter recursos para fazer o pagamento do piso.
A liminar do ministro determina que entidades privadas, públicas e do terceiro setor se manifestem dentro de dois meses. Após isso, ele deve tomar nova decisão sobre o caso, e o tema pode voltar ao plenário da Corte para decisão definitiva.
Impactos da medida
De onde virá o dinheiro para garantir o pagamento do piso salarial dos profissionais de enfermagem? Essa é a questão central que o Senado vai tentar resolver nos próximos dias. O Congresso aprovou e o governo sancionou o piso, mas o STF suspendeu a medida que garantiria o pagamento do piso nacional. Os ministros alegam que deputados e senadores não apontaram a fonte de recursos. O impacto anual da medida seria de R$ 5,5 bilhões para o setor público e R$ 11,9 bilhões para o setor privado, segundo cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado. A estimativa está no Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF) de setembro, publicado na quinta-feira, 15. Municípios, estados e o setor privado dizem que não há dinheiro.
Manifestação da categoria em Friburgo
Na última sexta-feira, 9, profissionais de enfermagem de Nova Friburgo organizaram um protesto na Praça Dermeval Barbosa Moreira. A data foi definida como Dia Nacional de Mobilização em Favor do Piso Salarial Nacional da Enfermagem, pelo Fórum Nacional de Entidades de Enfermagem, do qual o Conselho Federal de Enfermagem faz parte.
A lei, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, estabelece o piso salarial dos enfermeiros em R$ 4.750, o dos técnicos de enfermagem em R$ 3.325 e o dos auxiliares de enfermagem e parteiras em R$ 2.375. A decisão de suspensão temporária dos efeitos da lei foi anunciada no último dia 4 de setembro, e atendeu ao pedido da Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), que questionou a constitucionalidade da lei, alegando que há risco de demissões em massa, pois o setor privado não teria condições de arcar com os novos salários da categoria.
Os conselhos de enfermagem se manifestaram por meio de nota oficial discordando da medida cautelar. “Tomaremos as devidas providências para reverter esta questão junto ao plenário do STF, pois a eficácia do piso é precedida de estudo de viabilidade orçamentária e de nenhum risco de demissões de profissionais ou de prejuízo ao sistema de saúde do país”, informa trecho do documento.
Pela previsão legal, o piso salarial da enfermagem deveria ser pago a partir da folha de pagamento seguinte à publicação da lei, ou seja, no último dia 5, aos profissionais que atuam na rede privada e filantrópica. Já a União, os estados e os municípios tinham o prazo até o fim do exercício financeiro de 2022 para regularizar os novos salários junto à enfermagem.
Mil profissionais na rede pública
A Prefeitura de Nova Friburgo informou que atualmente tem 1.083 profissionais de enfermagem atuando na rede pública. São 186 enfermeiros, que recebem o salário mensal de R$ 2.800. A maior parte da rede é formada por técnicos de enfermagem, com 680 profissionais, recebendo salário de R$ 1.600. Tem ainda 217 auxiliares de enfermagem, com salário mensal de R$ 1.300. Em nota, a prefeitura informou também que ainda não houve elaboração de impacto financeiro do novo reajuste, tendo em vista a decisão do STF. (Por Christiane Coelho, em 10-12/09/2022)
(Fontes: Agência Brasil; Agência Senado; R7; Carta Capítal)
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