A carne bovina, o feijão, a laranja e outros alimentos devem ficar mais caros devido à seca — a maior dos últimos 44 anos — segundo o levantamento do Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden). De acordo com o estudo, a estiagem já se prolonga por 12 meses, e os efeitos acumulados refletem na agropecuária.
A agricultura familiar, responsável por levar comida à mesa do brasileiro, é a principal prejudicada pelo clima por não possuir sistema de irrigação
A falta de chuvas prejudica, principalmente, pequenos produtores, que, em sua maioria não possuem um sistema de irrigação, explica Ana Paula Cunha, do Cemaden. No Brasil, apenas cerca de 13% da área da agricultura — os grandes produtores focados na exportação — utiliza este tipo de estrutura. A agricultura familiar é a principal responsável pelo alimento que chega até a mesa do brasileiro, correspondendo a cerca de 70% dessa quantia.
O feijão é um dos alimentos mais afetados pela falta de chuvas. O presidente do Ibrafe - Instituto Brasileiro de Feijão e Pulses (sementes secas utilizadas na alimentação), Marcelo Lüders, afirma que das últimas dez safras, cerca de oito foram perdidas devido à estiagem. O ciclo curto de cultivo do feijão torna a plantação suscetível a períodos de seca, o que compromete a produção. Além disso, a seca favorece a proliferação de pragas, afetando ainda mais a produção do grão.
No caso da laranja, os preços já vêm sofrendo altas desde o final de 2023. Além da seca, a incidência da doença “greening” e as altas temperaturas têm prejudicado a qualidade e produtividade da fruta. O Brasil pode levar até três safras para repor os estoques de sucos de laranja, por exemplo.
Já a carne bovina também deve sofrer com a elevação dos preços. A degradação dos pastos devido à falta de água pode atrasar o processo de engorda dos animais, diminuindo a oferta de carne no mercado. A alta demanda este ano pelo produto, aliada aos bons índices de exportação, contribui para uma possível elevação nos preços.
O gado e o churrasco
A seca deixou os pastos degradados, o que atrasa o processo de engorda dos animais, fazendo com que a carne chegue mais tarde ao mercado e, consequentemente, diminuindo a oferta do produto, explica o economista analista da consultoria Safras & Mercado, Fernando Iglesias. Além da criação de bois de pasto, existe a de confinamento, em que os animais são alimentados por ração. Nesta época do ano, o confinamento é o método de produção majoritário.
A falta de água prejudica não só a quantidade de pasto, que depende de água para crescer, mas também a sua qualidade, segundo Laerte Ferreira, pesquisador da Universidade Federal de Goiás (Lapig). Acrescente-se o fato de que os incêndios são mais frequentes em épocas de seca, destaca Patrícia Ferreira, especialista em pastagens da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). “Quando o pasto queima, queima o estoque de alimentos do criador que, em casos extremos, pode até perder os animais”, diz.
Além disso, segundo Iglesias, a demanda elevada pela carne, com bons índices de exportação, pode deixar a disputa por este alimento ainda mais acirrada dentro do Brasil, reforçando a probabilidade de alta nos preços.
Cadê o Planeta Água?
De maneira geral, quem já tinha um sistema de irrigação implementado e acesso à água, não deve ter a sua produção afetada. Por outro lado, aqueles que não têm esse tipo de recurso estão sofrendo com as consequências de diversos períodos seguidos com chuvas abaixo do esperado.
A irrigação exige grandes estruturas, o que a torna de difícil acesso para os agricultores com poucos recursos, explica Sandra Bonetti, secretária de meio ambiente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).
Para os pequenos produtores, a saída é utilizar técnicas de águas de reuso, cisternas e cuidados com o solo para segurar a umidade, como a agricultura agroecológica e as agroflorestas. Para Sandra, a pior situação acaba sendo no Norte do país, onde, além de faltar água para produzir, os agricultores ficam isolados, uma vez que a locomoção na região é por meio dos rios.
“Sequer conseguimos ter a dimensão de quantas comunidades, de quantos agricultores familiares estão sendo afetados nesse momento, porque a gente não tem acesso a eles”, relata.
A previsão de um novo La Niña, agora em setembro, que poderia trazer chuva, não será suficiente para normalizar a situação por vir fraco, afirma a pesquisadora. E nunca é demais frisar: “A seca também é causada pelo desmatamento na Amazônia. A floresta tem a sua umidade distribuída para todo o país, proporcionando as chuvas; mas, com menos árvores, essa umidade é derrubada, impactando as demais regiões. E tornando as secas mais recorrentes”, relata Bonetti.
(Fonte: g1/Agro)
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