Ex-aluno do Graças, padre escreve sobre Monsenhor Mielli

"A tarefa de construir um mundo mais justo, fraterno e solidário, respeitoso da dignidade de cada pessoa humana, continua"
sexta-feira, 29 de julho de 2022
por Adriana Oliveira (aoliveira@avozdaserra.com.br)
Padre Roberto (Reprodução da web)
Padre Roberto (Reprodução da web)

Natural da zona rural de Bom Jardim, onde trabalhava desde muito jovem na lavoura, Braz José Pinto mudou-se para Olaria e conseguiu emprego como operário na antiga Construtora  Spinelli. Foi durante as obras de construção da Igreja de Nossa Senhora das Graças que um também jovem Padre Mielli o conheceu e prestou atenção no seu senso de responsabilidade. Depois de uma temporada em Duas Barras, Braz voltou para Friburgo aos 43 anos, com cinco filhos pequenos. Passou então a trabalhar na manutenção do colégio, como zelador. No total, foram 40 anos de serviços prestados a Monsenhor Mielli, que, além de lhe oferecer emprego, matriculou, gratuitamente, todos os filhos de Braz na escola recém-fundada - inclusive a sexta, a única menina, que nasceu em Olaria.

Um dos cinco meninos, Roberto José Pinto, descobriu ali, junto à igreja do colégio onde estudava e o pai trabalhava, a vocação para o sacerdócio. Hoje administrador da Paróquia Nossa Senhora do Rosário, em Riograndina, Padre Roberto enviou à redação de  A VOZ DA SERRA  um comovente texto sobre Monsenhor Mielli, seu mentor e que tanto ajudou seu pai e milhares de outras famílias humildes e trabalhadoras. Braz faleceu em 4 de março  de 1999, aos 72 anos.

Profeta, pastor e sacerdote

"O centenário de nascimento de Monsenhor Caetano Antônio Mielli celebrado neste sábado, 30 de julho, nos oferece a ocasião para uma reflexão sobre muitos aspectos de sua personalidade e ação. Ele viveu e atuou em circunstâncias próprias de uma época. Teve traços de uma personalidade que era somente sua. No entanto, muito do que ele fez e ensinou continua significativo para os nossos tempos. Partilhando, por pura Graça de Deus, do mesmo sacerdócio de Cristo, do qual o nosso homenageado foi “antes de tudo e acima de tudo um padre exemplar, Homem de Deus, totalmente consagrado a seu serviço” (Dom Clemente Isnard), faço a seguinte pergunta: O que diria e o que faria Monsenhor Mielli, se vivesse e atuasse nos dias de hoje?

Certamente, como Homem de Deus, do seu povo e da Igreja de Cristo, ele estaria em comunhão afetiva e efetiva com o sucessor de São Pedro, o Papa Francisco, e acolheria, sem reservas, o seu apelo para sermos, sempre mais uma “Igreja Sinodal e em saída missionária para as periferias geográficas e existenciais”. E veria com grande esperança a renovação da vida da Igreja proposta pelo Papa Francisco, a partir das diretrizes do Concilio Vaticano II. Ele estaria sempre nos lembrando que a igreja é sempre  “nós com Ele”, com o Senhor Jesus, reunida na Caridade, Dom do Espírito Santo. Monsenhor Mielli estaria em comunhão com a Igreja no Brasil, através da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e com o Bispo Diocesano de Nova Friburgo, Dom Luiz Antônio Lopes Ricci, ajudando a discernir sobre as atuais questões religiosas, políticas e sociais do nosso País, à luz do Evangelho e da Doutrina Social da Igreja.

Neste centenário do seu nascimento, brilha para todos que contemplam sua vida e missão, o quanto ele se “entregou, entregando a própria vida” (2Cor 12,15) em favor da Evangelização e Promoção Humana em nossa Diocese de Nova Friburgo. Assim, ao recordarmos seu testemunho de amor e abnegação, surge um verdadeiro sentimento de gratidão, que brota de uma confiante oração e de um belo programa de vida cristã e apostólica.

 Aqui, passados cem anos do seu nascimento, vemos que “o tempo corre veloz e a vida escapa das nossas mãos. Mas pode escapar como areia ou como semente” (Thomas Merton). Certamente, para Monsenhor Mielli, escapou como semente de qualidade na Evangelização, na edificação da Igreja de Cristo e na Promoção Humana, sobretudo na educação da Juventude e na valorização dos meios de comunicação. Vendo o seu legado, podemos repetir com Santo Inácio de Loyola: “O amor consiste mais em atitudes e atos do que em palavras”.

 

Ah, se Monsenhor Mielli estivesse vivo...Mas precisa ele estar vivo para que nos sintamos comprometidos com as mesmas causas? A tarefa de construir um mundo mais justo, fraterno e solidário, respeitoso da dignidade de cada pessoa humana, continua. E não abandonamos o sonho, a utopia de ver um mundo melhor, e bom para todos, unido em torno dos mesmos grandes ideais, justo e atento às necessidades dos mais carentes, aberto a receber as legítimas contribuições de todos os cidadãos. Segue o desafio permanente da Evangelização e Promoção Humana. Monsenhor Mielli, no seu centenário de nascimento, nos recorda que essas causas não são dele, mas de todos nós. Nesta época e diante das atuais circunstâncias, somos nós os protagonistas da construção de um mundo novo.

“Conhecer a Jesus é o melhor presente que qualquer pessoa pode receber; tê-lo encontrado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é nossa alegria” (Documento de Aparecida, n°29).

Como anotou com fidelidade e senso de oportunidade a sua fiel e generosa colaboradora Thereza de Jesus Fernandes, Dona Therezinha, estas foram as suas palavras em 12/03/1979, véspera da sua Páscoa definitiva: “A vida tem seus momentos alegres e felizes, bem como momentos de dores e sofrimentos. Em ambos devemos estar unidos a Cristo: ao Cristo Glorioso do Tabor ou ao Cristo Vítima do Calvário”.

A vocação e a missão do saudoso e inesquecível Padre Mielli foi ser o coração de Cristo juntos aos homens e ser o coração dos homens junto a Deus.

Acerca do nosso homenageado podemos parafrasear Santo Alberto Hurtado: “Minha Missa é minha vida e minha vida é uma missa prolongada”.

Repito aqui um belo testemunho de sua colaboradora Thereza de Jesus Fernandes: “Padre Mielli tinha uma grande Fé e amor a Deus. Dotado de profundo conhecimento religioso, muita devoção a Nossa Senhora, tinha muita cultura e o dom da palavra, quer nos sermões, nas palestras religiosas, como em recepções importantes ou inaugurações. Ele era sempre convidado por ser um grande orador. Falar de seus trabalhos e virtudes é impossível e, só Deus, em sua infinita misericórdia, pode gratificar sua alma por tudo o que ele fez neste mundo”. 

Termino esta breve homenagem àquele que me conferiu os Sacramentos de Iniciação à Vida Cristã, foi meu professor e diretor e muito contribuiu com minha família e de muitas outras.

 Mensagem ao Padre Mielli, de feliz e fecunda memória:

Um padre deve ser, ao mesmo tempo, pequeno e grande, de espírito nobre, como de sangue real, simples e espontâneo como um colono, um herói no domínio de si, um homem que lutou com Deus, uma fonte de santificação, um pecador que Deus perdoou, senhor de seus desejos, um servidor humilde para os tímidos e fracos, que não se rebaixa diante dos poderosos, mas se curva diante dos pobres, discípulos de seu Senhor, chefe de seu rebanho, um mendigo de mãos largamente abertas, um portador de inumeráveis dons, um homem no campo de batalha, uma mãe para confortar os doentes, com a sabedoria da idade e a confiança de um menino, voltado para o alto, os pés na terra, feito para alegria, experimentado no sofrimento, longe de toda inveja, que vê longe, que fala com franqueza, um inimigo da preguiça, sempre fiel, tão diferente de mim! (De um manuscrito medieval).

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