Pegou mal - para a prefeitura - a doação de itens básicos que estavam em falta nos hospitais municipais Raul Sertã e Maternidade Mário Dutra de Castro, feita no último fim de semana por empresários locais. Para a população, o ato mostrou a fragilidade do município na gestão da Saúde. Insatisfeitos, muitos friburguenses comentaram nas redes sociais da prefeitura o que consideraram ser um absurdo. “Parabéns aos empresários! Engraçado o secretário de Saúde dizer que estão demorando a entregar e vocês conseguiram tudo rapidamente”, postou uma internauta.
Outro comentário parabenizou os empresários do setor de moda íntima de Nova Friburgo, que por intermédio da sua representação, o Sindvest (Sindicato das Indústrias do Vestuário), realizou as doações: “Isso não seria uma obrigação da prefeitura? Parabéns aos empresários.”
“Os empresários fazendo o papel da prefeitura. Que vergonha. Isso mostra que quando se quer, se faz. Eu teria vergonha de tentar pegar carona nas boas ações que outros tomaram e não a prefeitura. Em toda sua gestão faltou insumos no hospital, não é por causa da pandemia não”, reclamaram outros internautas.
O vereador Professor Pierre relembra que a saúde municipal passa por dificuldades há alguns anos e que, com a ajuda de colegas parlamentares, vem denunciando o que classifica como corrupção. “A Covid-19 revela o caos que estava na saúde de Nova Friburgo. É um absurdo. Sempre está faltando alguma coisa. Em 2017 identificamos a falta de medicamentos, por conta de corrupção e isso repercutiu em 2018, no Relatório do Hospital Raul Sertã, que acusou também a falta de insumos básicos. Já tivemos sete secretários de saúde, como vai ter planejamento assim? O último processo de compra que a prefeitura fez de material médico hospitalar foi em 2018, que foi aquele caso das seringas. É claro que em algum momento pode faltar coisa, mas cadê o dinheiro, cadê o planejamento, por que faz as coisas em cima da hora?”, cobrou Pierre.
O parlamentar classificou como incompetência o município precisar de ajuda de terceiros. “Chegou em tal nível de desorganização pública que tem que esperar para as pessoas ajudarem porque a prefeitura teve incompetência para rever os próprios processos com a devida rigidez porque muitos são corruptos, gostam de favorecimento para determinadas empresas e o último ponto é o atendimento público”.
Prejuízo à flexibilização
O presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal, vereador Wellington Moreira, diz que o prefeito prejudica a flexibilização e responsabiliza o município pelo caos na saúde e economia da cidade. “Como presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal conheço muito bem a realidade do Raul Sertã e posso afirmar que a falta de insumos, materiais básicos de higiene, entre outros sempre foram comuns no hospital. O mais preocupante é a falta de medicação para a intubação de pacientes que eu já venho denunciando e foi constatado pela Defensoria Pública em vistoria ao hospital. Eu repudio a inércia do prefeito Renato Bravo nesse momento tão difícil de pandemia. O prefeito está prejudicando a flexibilização, pois, não colocou todos os respiradores que chegaram em funcionamento, não providenciou a medicação para intubação e não faz testagem em massa da população. Infelizmente a saúde e a economia estão um caos por falta de gestão do Executivo”, observa Wellington Moreira.
André Montechiari, um dos empresários que participaram da ação, diz que o coronavírus atinge a todos e a solução está na união de todas as entidades e representações da sociedade. “O que tem que ficar claro para a população friburguense é que não tem dois lados, só tem um lado e é o lado do bem estar da população. A hora que as pessoas conseguirem entender. Cada vez que a gente colabora, que fazemos uma doação, estamos contribuindo para o povo friburguense. Não tem o lado da indústria e o lado do trabalhador. Estamos todos passando pelo mesmo problema e a solução só vai existir com a união de todas as pessoas, de todas as entidades, do poder público e a iniciativa privada”, disse.
Entenda o caso
Na última sexta-feira, 26, os membros da Defensoria Pública Estadual em Nova Friburgo fizeram uma vistoria no Hospital Municipal Raul Sertã e não encontraram alguns itens considerados básicos para prestação de serviços aos pacientes internados na unidade. A equipe constatou que medicamentos utilizados no processo de intubação de pacientes e até mesmo sabão e papel toalha, indispensáveis nestes tempos de pandemia, estavam em falta.
Ainda naquela noite empresários de 80 empresas da cidade se mobilizaram para doar no dia seguinte, 600 fardos de papel toalha (com 1.000 cada); 50 caixas de álcool 70 (com 12 unidades cada); 70 galões de sabão líquido neutro (cinco litros cada); 25 mil copos descartáveis e 30 borrifadores. A entrega dos materiais aconteceu no sábado, 27, pela manhã.
“Nós do setor do vestuário, através do SindVest, resolvemos nos mobilizar de maneira urgente emergencial para poder viabilizar esses insumos básicos, uma vez que a gente trabalha em parceria com a municipalidade que precisa desse apoio para garantir o suporte para a população friburguense e a indústria tem total interesse em colaborar com prevenção à saúde. Cada um fez uma contribuição voluntária e somos cerca de 80 empresas envolvidas para municiar o Raul Sertã e Hospital Maternidade. Todos os itens foram comprados em Nova Friburgo”, disse um dos empresários.
A Secretaria municipal de Saúde esclareceu que, devido à pandemia e a grande demanda por esses itens, a pronta entrega pelos fornecedores está dificultada. A pasta reforçou também que o hospital, no entanto, não está desabastecido desse itens para o atendimento a pacientes com a Covid-19.
Na inspeção, a Defensoria também questionou qual o total real de leitos exclusivos para Covid no hospital municipal. A Secretaria de Saúde respondeu que possui dez leitos de UTI e outros oito semi intensivos que não são lançados nos boletins diários que mostram o status da pandemia no município, por isso é que nestes boletins não constam o total de 18 leitos de UTI para pacientes com Covid no HRS.
Denúncias desde maio
Em maio deste ano, o Ministério Público do Estado do Rio (MPRJ) recebeu um ofício da Comissão de Saúde da Câmara de Vereadores com denúncias relacionadas ao atendimento a pacientes na rede pública de Saúde de Nova Friburgo diante da pandemia do coronavírus e ausência de materiais considerados básicos, além de uso inadequado de EPIs, falta de equipamentos e medicamentos.
De acordo com o presidente da Comissão de Saúde do Legislativo, o vereador Wellington: “Os profissionais que trabalham no Raul Sertã recebem apenas uma máscara para cada 12 horas trabalhadas. Plantões de 24 horas recebem duas máscaras. O tempo ideal de uso para cada uma delas é de apenas duas horas. Não há vitamina C, essencial no tratamento da Covid-19; faltam com frequência papel toalha, álcool 70º, óculos de proteção, capotes e luvas”, denunciou em ofício.
O que diz a prefeitura
Em nota, o município informou que tais itens estão contemplados no processo 6660/2020, aquisição de material de limpeza, aberto em caráter emergencial, tendo sido finalizado e enviada a nota de empenho para as empresas vencedoras no último dia 18, para a entrega que, segundo os fornecedores, ocorrerá ainda nesta semana. “Pela data do empenho é possível confirmar que havia um planejamento, mas que o aumento da demanda pelos insumos culminou na falta dos mesmos.”
A prefeitura não respondeu quando questionada se a doação dos empresários mostrou fragilidade do poder público e confiança estremecida da população quanto a uma retomada gradual das atividades comerciais diante do episódio e preferiu informar que o Comitê Operacional de Emergência (COE) tem debatido diariamente, e aferido cada setor e suas particularidades, e o Governo municipal tem se reunido com representações dos vários segmentos empresariais para avaliação de cada etapa, de forma a garantir e preservar a população.
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